A Sirene Ed.38 (Maio/2019)

Page 8

8

A SIRENE PARA NÃO ESQUECER

Não temos mais sossego Tem muita gente que tá adoecendo. Um alarde, qualquer coisa, um carro toca e já fica achando que é sirene. Em fevereiro que começou isso. Minha neta falou: “Vó, parece que vai estourar uma barragem lá no Gongo”. Alguns dias depois desse sufoco, estava fazendo almoço e pensando: “Se essa lama vier pra cá agora, essas panelas vão pra longe”. Fico pensando: “Meu Deus, e se estourar lá agora?”. O caso é sério demais, eu não vou dar conta de correr. Eu vou fazer 80 anos. Queríamos ter uma resposta mais certa pra termos um pouco de sossego. Gercina dos Santos Silva (China), moradora de Barão de Cocais Eu tenho problema de pressão alta, fico nervosa e com medo de estar dormindo e a barragem estourar. Ela não tem hora. Sou moradora há pouco tempo, mas me preocupo porque não sou só eu, tem muitas pessoas, famílias. Trabalho perto da barragem, na Vila Samarco. Fico com medo, ainda mais porque falaram que lá é um dos primeiros pontos que vão ser atingidos. Não podemos deixar de trabalhar nem de dormir, mas a gente fica com essa preocupação no dia a dia. Célia Gomes de Araújo, moradora de Antônio Pereira No dia em que aconteceu isso em Brumadinho, minha sobrinha estava comigo e ficou transtornada. Nós estávamos

Maio de 2019 Mariana - MG

vendo televisão. Quando vi, ela estava perto da imagem de Nossa Senhora que eu tenho, e falei: “O que é isso, Ana Amélia?”, ela disse: “Nossa, tia Tê, estou rezando para Mamãe do Céu. Estou pedindo para ajudar aquele povo lá, igual a nós”. A menina tem só seis anos. A empresa acaba com a vida da criança, acaba com a vida dos idosos, acaba com tudo. Eles não estão nem aí, falam: “É 100 mil reais!”. E é isso, isso paga uma vida? Não paga. Terezinha Quintão, moradora de Bento Rodrigues De uma forma geral, a Vale tenta te comprar, a ideia é que o dinheiro compra tudo. É muito fácil, pra ela, colocar todo mundo dentro de hotéis, encaixotar todo mundo como se fossem objetos e, depois que passar, ver o que faz. O negócio deles é o dinheiro. É indenização e pronto, acabou. Roziny Santos Silva, moradora de Rio Doce e natural de Barão de Cocais Esse estado de medo já é uma forma de ser atingido, mesmo que a barragem não rompa. A empresa tem que pagar esse transtorno causado à população dessas regiões. Em Barão de Cocais, famílias das comunidades rurais foram evacuadas, mas não as do centro da cidade, assim como é o caso de Itabirito. Isso gera muito medo, as pessoas pensam: se retiraram alguém é porque há perigo, e eu continuo na área

“Nós crescemos na casa da minha mãe. Aí eu te pergunto, como que você se desfaz dessa história?” Roziny. Da esquerda para direita: Rosemare, China e Roziny.


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.