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Uma luta feminina

Georgia Giacomazzi, Giulia Militello e Paula Braga

Com a volta do talibã ao poder do Afeganistão, ressurge a preocupação com os direitos das mulheres em países islâmicos

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Aretomada do Talibã em Cabul, capital do Afeganistão, em agosto de 2021, fez despertar o caos e o desespero na população afegã novamente, principalmente entre as mulheres. Elas correm o risco de perder os direitos sociais e econômicos que vinham conquistando enquanto o Talibã estava fora do poder.

Após 20 anos lutando pelos seus direitos, as mulheres afegãs estão vendo seus sonhos e conquistas serem enterrados diante de seus próprios olhos. Sem ter a aprovação dos homens, as mulheres não podem fazer quase nada. É impossível ingressar em universidades ou estudar. O mesmo acontece com o trabalho. “Se um homem não autoriza, ninguém quer comprar briga, simplesmente não aceitam a mulher, o emprego para uma mulher no Afeganistão não a sustenta ”, explica a turismóloga Ana Maria Brogliato. Ana Maria faz parte da Abhigyane Foundation, organização não governamental em que atuou de maneira colaborativa por mais de dois anos. Ela quis ajudar a fazer a diferença e, desde janeiro de 2020, está como integrante ativa, pela condição e desafios de diversas mulheres. A fundação tem como principal objetivo dar novas oportunidades de um futuro melhor para os jovens, inclusive pessoas com deficiência, seja por meio dos estudos ou trabalho, sempre lutando por respeito e tolerância entre religiões.

No Paraná, outra organização sem fins lucrativos realiza ações para melhorar o cenário socioeconômico de centenas de pessoas. A Cáritas Brasileira é um organismo da Conferência Nacional dos Bispos Brasileiros (CNBB), parceira da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) que opera em benefício dos imigrantes, refugiados e apátridas. Ela está organizada em 187 entidades-membro dispostas em 12 regionais e cinco articulações.

Em Curitiba, a Cáritas tem requisições diversas, com interface de atuação em várias frentes, como explica Kassia Cordeiro, assistente social responsável pelo programa de migração e refúgio. Ela cita alguns dos projetos vigentes da Cáritas para esse grupo específico. “Economia popular solidária, emprego e renda, incentivo ao empreendedorismo, horta comunitária, vida no campo e vida urbana, entre outros.”

Tainá Aragão

Celebração de conclusão III ciclo formativo do projeto.

Kassia também relata sobre o acolhimento das mulheres. “Elas não andam sozinhas, elas estão sempre com filhos ou maridos. Vemos que não procuram asilo político sozinhas e isso se dá pela cultura do seu país que na maioria das vezes é patriarcal.” Heba Altabakh é uma jovem síria de 25 anos que enfrentou as piores circunstâncias que uma guerra pode trazer, de 2012, quando a guerra civil na Síria se agravou, há 2017, quando ela finalmente conseguiu deixar o seu país.

Além da assistência social, a Cáritas tem requisições como reconhecimento e legalização de documentos. Algo muito procurado por mulheres que migram de seus países nativos na tentativa de conquistar melhores condições de vida, inserção no mercado de trabalho, liberdade e sobrevivência.

Maha Mamo, que hoje é palestrante global, nasceu no Líbano e lutou durante 30 anos em busca de cidadania. Em 2014 foi naturalizada brasileira. Na época, ela estudava Medicina na Universidade de Damasco e tinha o sonho de viajar para outros países para fazer especializações. “Mas a situação na Síria foi ficando cada vez mais difícil e eu via que muitas portas estavam sendo fechadas para mim.”. Mas mesmo com a guerra, Altabakh persistiu em seus estudos até o momento em que precisou optar por sua vida e deixar o país, colocando sua educação de lado.

Hoje, Heba Altabakh reside em San-

“Eu procurei ajuda ta Catarina e agradece por ter saído da Síria, e diz que são poucas as de diversos países, o mulheres que conseguem estudar aqui, mas

Brasil foi o único que está sempre procurando pensar de forma posime acolheu.” tiva e é um exemplo de força feminina. “Depois

Maha Mamo, palestrante global que voltava pra casa eu repetia as aulas mil vezes até falar, ouvir e escrever o português. A partir de uma imposição jurídico- Não tinha vida social, mas o aperto -religiosa do seu país, Maha viveu sem no coração por tudo o que aconteceu documentos de identificação durante e por ter deixado a minha família me a maior parte da sua vida, em que não ajudou muito.” pode dispor dos direitos básicos de qualquer cidadão. A estudante fez das dificuldades a sua motivação, usando seu sofrimento, Essa é uma situação recorrente de diante das coisas que teve que supemulheres de diferentes países do rar, para aprender o português, inmundo, que mesmo com nacionali- gressar na universidade e chegar cada dade, não se sentem parte de algum vez mais perto dos seus objetivos. lugar. Segundo dados da Plataforma Arquivo pessoalinterativa de Decisões, do Ministério da Justiça e Segurança Pública do Brasil, e da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), 21.515 pessoas se encontravam em condição de refúgio, sendo 10.421 mulheres (48,4%).

Assim como no Afeganistão, as moradoras da Síria também sofrem com organizações extremistas que comandam o país. Todas as mulheres na Síria, da mais idosa até as meninas mais jovens, foram afetadas de alguma maneira pela crise humanitária que resultou em uma guerra civil.

HIJAB

A expressão da espiritualidade é um sinal de libertação

O uso do hijab, lenço utilizado pelas mulheres muçulmanas, é uma forma de compromisso dessas mulheres com Alá, mas muitas pessoas acreditam que o hijab é utilizado pelas mulheres por serem submissas ou submetidas a algo machista. Bárbara Vieira, brasileira convertida para a religião islâmica, explica que fazer o uso do hijab é uma escolha pessoal de cada mulher.

Vieira se converteu pelo fato de, após estudar muito, achar uma religião muito interessante e perceber que a religião possui diversos fatores positivos para as mulheres: “O islamismo é uma das religiões mais libertárias”. Entretanto, o uso do hijab ainda é visto por diversos veículos de comunicação como uma imagem generalizada, fazendo com que a normalização do uso do véu fique cada vez mais difícil.

A brasileira já recebeu comentários maldosos e preconceituosos dentro de um ambiente de trabalho, mas acredita que o uso do véu auxilia na sua luta pessoal para que ela e demais mulheres tenham o direito de serem quem são e não serem julgadas por suas vestimentas.

As mulheres são desvalorizadas em todos os lugares, e muitas dessas imposições envolvem a religião, mas diferentemente do que as pessoas pensam, no Islã as mulheres possuem todos os seus direitos reservados. Marian Zabad, descendente libanesa, diz que se sente muito mais vulnerável no Brasil do que em um país árabe, onde a mulher pode votar desde a época do profeta, e aqui o direito do voto foi uma luta muito demorada.

Zabad conta que o hijab faz parte de uma doutrina,mas não é uma doutrinação. Marian não utilizou o véu por 27 anos, e agora mais madura decidiu usar e que, sim, ainda sofre preconceitos no Brasil, pois as pessoas têm dificuldade em aceitar o uso do véu, e o associam a violência. A jovem acrescenta que mulheres que usam o hijab não podem levar a culpa da ação das pessoas dentro dos países árabes. “Os islâmicos não têm culpa, não defendem a violência.”

Veja também

Entenda um pouco sobre o feminismo islâmico com episódios desses dois Podcasts.

portalcomunicare.com.br

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