Aula Magna #00

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Além disso, uma pessoa com 18 anos não está preparada para a universidade. Eu, pelo menos, não estava. Aos 18 anos é-se uma besta. Não se está minimamente interessado em aprender. Agora, tenho outra vontade Qual foi o objectivo do teu regresso à universidade? Fazer o que sempre quis. Se tivesse podido escolher sem constrangimentos, quando acabei o 12.º ano, teria seguido Literatura. Mas os meus pais acharam que não tinha saídas profissionais, que não se ganhava dinheiro a escrever, que jornalismo era melhor. Vê-se mesmo que não percebem nada do mercado de trabalho. Não há jantar de família em que não lhes recorde isso amargamente. Depois de velho, vim tentar recuperar esse projecto. Um investimento pessoal nessa área, como autodidacta, não era suficiente? Com o mestrado posso continuar a faze-lo. Compro e leio tudo o que me apetece, mas ter uma orientação, ainda por cima a este nível, é muito importante. É óptimo ter Miguel Tamen ou António Feijó como professores, uma grande mais-valia.

Hoje levas-te mais a sério? Talvez menos ainda... Se calhar esse é o problema quando se tem 18 anos, em que tudo tem uma enorme importância. Hoje, tenho uma perspectiva diferente sobre o assunto. Mas não quero estar a fazer a rábula do tipo que envelheceu e ficou mais maduro. No meu caso, aos 18 anos era uma besta. Sentiste diferenças entre o ensino público e privado? Não muito. Na Católica foi diferente, mas provavelmente porque o curso estava no início. Suponho que os cursos de Direito e de Economia sejam exigentes e estimulantes como noutras faculdades, admitindo que esses cursos possam ser estimulantes. Por isso, não tenho nada contra a Católica. A biblioteca, por exemplo, era bastante boa e permitia o acesso directo às estantes, como o Umberto Eco defende. Também fiz o curso todo sem grande interesse pelo jornalismo e pelo fenómeno da comunicação em geral. Aproveitei todas as hipóteses que tinha para escolher opções relacionadas com os meus gostos pessoais. Foi assim que fiz Literatura Brasileira ou Cultura Clássica, por exemplo. Como é a tua vida de estudante? Igual às dos outros, imagino. O mestrado ainda vai muito no início, mas apresento-me aqui à hora marcada e vou-me embora quando a aula acaba. E acompanhas a vida académica? Referes-te a quê? Lutas estudantis, tunas, jornais, esplanadas... Nada. Só venho aqui pela razão por que isto foi criado. Não tenho interesse em mais nada. Por exemplo, praxes... coisa linda, não é?

Como está a ser a experiência de voltar às aulas? Simpática. Sempre gostei de estudar. Entretanto, tive uma experiência fugaz na Universidade Nova de Lisboa. Inscrevi-me na licenciatura de Estudos Portugueses [na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas], mas por falta de tempo só fiz duas cadeiras. Agora que tivemos a inteligência de assinar um contrato [com a SIC] em que a carga horária é mais leve, fiquei com tempo para este tipo de coisas.

Nem pelas associações de estudantes? Não, embora tenha sido presidente de uma. Mas na Católica aquilo tinha outra piada. Dava para passar o tempo e para chatear algumas pessoas. Foi divertido fazer uma associação de extrema-esquerda. Uma vez organizámos um conjunto de colóquios, com Francisco Louçã e Al Berto, entre outros. Quando pedimos uma sala deram-nos uma das melhores, na Biblioteca João Paulo II, visível de todos os pontos da faculdade. No entanto, assim que afixámos o Encontraste muitas diferenças no ensino supe- cartaz com os oradores, fomos remetidos para uma rior, passados dez anos? subcave impossível de encontrar. No mestrado é tudo diferente. A própria sala, enquanto espaço físico, muda (estamos todos à volta de uma mesa) e não há exactamente uma matéria que se vá percorrendo ao longo das aulas. Na Universidade Católica o curso de Comunicação Social estava a começar. Por essa razão ou por outras, era uma grande balbúrdia, com cadeiras canceladas, outras que fazíamos por cancelar porque não tinham interesse algum. Além disso, uma pessoa com 18 anos não está preparada para a universidade. Eu, pelo menos, não estava.

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Porquê? Aos 18 anos é-se uma besta. Não se está minimamente interessado em aprender. Agora, tenho outra vontade.

A ideia de haver um tipo a falar para vários que estão a ouvir é divertida de corromper


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