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in-Prรณprio Coletivo


Esta deveria ser a hora em que me recolheria como um poente no bater do teu peito mas a solidĂŁo entra pelos meus vidros e nas suas enlutadas mĂŁos solto o meu delĂ­rio. (Mia Couto)


OraMortem é um momento inesperado, um delírio disparado no encontro da Velha com o Menino. Dois personagens se fragmentam em reflexos e projeções para expor aquilo que não cabe, que é desajustado, que escapa das clausuras do espaço-tempo. A proximidade da morte como sintoma de vida. O corpo dela transborda e o espaço inundado está na iminência de derramar.


in-Próprio Coletivo

O in-Próprio Coletivo surgiu em 2013 a partir do encontro entre artistas com mútua admiração e afeto. A partir de processos compartilhados de criação, aposta num modo de fazer junto que busca nas fronteiras borradas entre diferentes linguagens os atravessamentos e contágios possíveis para uma dramaturgia que privilegia a pluricentralidade de propostas. Essa rede de afetos concebeu OraMortem. OraMortem in-Percurso é a primeira turnê do coletivo e contempla apresentações e oficinas em cinco municípios do estado de Mato Grosso. Contou com a aprovação no edital Circula MT - Teatro 2015, da Secretaria de Estado de Cultura (SEC MT). Em simultâneo, participa do projeto SESC Palco Giratório 2016, um dos maiores circuitos de difusão e intercâmbio das artes cênicas com apresentações em 25 cidades brasileiras.


Daniela Leite

DO IMPULSO VITAL

OraMortem é inspirado num instante de delírio e transbordamento dos afetos da minha avó, dona Maria de Lourdes, uma mineira de 90 anos. Ela viveu junto a José durante 65 anos, seu companheiro que faleceu em 2011 devido a um enfisema pulmonar. Logo após a viuvez, Lourdes passou por uma cirurgia de catarata e, possivelmente devido ao uso de anestésicos somados às fragilidades emocionais daquele período, passou a ter delírios. Acreditava ser jovem, como numa mudança brusca de percepção do tempo. Preparava-se para o encontro com seu namorado, com todos os anseios peculiares de uma adolescente. Além disso, confiava que suas filhas eram, na verdade, suas irmãs e, desde então, começou a compartilhar intimidades nunca antes reveladas. Essa abertura disparou em mim a possibilidade de um olhar menos óbvio para a velhice. Além disso, e enquanto coletivo, passamos a questionar com mais interesse as potencialidades do corpo como matéria para a criação artística.


Tudo o que muda a vida vem quieto no escuro, sem preparos de avisar. (GuimarĂŁes Rosa)


DO PROCESSO DE CRIAÇÃO

A partir da narrativa do delírio da Dona Lourdes, criamos imagens que nos levaram à construção do espelho d'água como o lugar do acontecimento. Ele foi o disparador de possibilidades para a composição da trama e de todos os corpos em cena. Os procedimentos criativos foram acessados em fluxo contínuo e em justaposição de camadas, nas quais as partes envolvidas, ou seja, o espaço, a luz, a música e a atuação retroalimentaram-se e influenciaram-se simultânea e constantemente. A construção das personagens se pautou em aspectos do teatro performativo. Assim, optamos por investigar estados de presença e não apenas explorar uma representação óbvia do que seria uma senhora e um jovem. Os desenhos de cenário, trilha sonora e luz foram construídos no encontro e através de experimentações com objetos e instrumentos disponíveis, bem como suas possibilidades em relação com o espaço. Assim, foram criados recortes, intensidades, tons e efeitos que propuseram diretamente os desenhos das cenas. A dinamicidade desse modo de criar arte interage criação, processo e formalização. A obra, pensada na via do work in process (Renato Cohen), é inteiramente dependente do processo, sendo permeada pelo risco e, sobretudo, pelas vicissitudes do percurso.


DO ESPETÁCULO

O que é possível ver pela fresta da memória? OraMortem é um exercício de projeção do que é recôndito. É um momento inesperado, fragmento de sonho, fração de loucura, desarranjo do tempo, a última gota, o delírio. Trata a iminência da morte como um sintoma de vida. Dois personagens se fragmentam em reflexos e projeções para expor aquilo que não cabe, que é desajustado, que transborda das clausuras do espaçotempo, que está fora do esquadro. O espetáculo desarticula a noção de ficção e propõe fricções de presença entre os artistas e o público. Não esconde as engrenagens técnicas pois escancara a estrutura interna da criação, em que a iluminadora/performer e os músicos manipulam seus instrumentos luminosos e sonoros dentro da cena. Manejam múltiplas linguagens, recursos e hibridizações para tecer a dramaturgia que é engendrada no fluxo de estímulos e contaminações proposto por todas as linhas envolvidas, como a luz, a música, o espaço e os atores.


EXPERIMENTAÇÕES DE GRAFIAS NO ESPAÇO

CORPO E LUZ:

O cina

Partimos do pressuposto que um corpo é primeiramente encontro com outros corpos e capacidade de afetar e ser afetado. Nesta oficina, o corpo, a luz e o espaço serão experimentados numa mesma zona de compartilhamento. Defendemos que as fronteiras entre corpo e luz sejam borradas, num exercício concomitante de retroalimentação, descartando qualquer centro hierárquico entre as duas linguagens. A proposta é investigar as imagens, grafias no espaço e cenas que surgem a partir dos atravessamentos que a relação entre corpo e luz pode disparar.


NOSSO FELIPE VICENTIM A estrela do Felipe se expandiu. Transbordou de tanta luz! Depois de um período em suspensão, imersos na experiência das lágrimas incontidas frente a dor e a saudade, entendemos que é necessário produzir outros sentidos para a partida do Felipe. Decidimos que a morte deve ser lida e escrita enquanto pulsão do amor. Isso implica novos sentidos, enlaces e diagramas: orAMORtem, talvez (!). A partir desse acontecimento nos permitimos (re)inventar cotidianamente a vida e (des)fazer esse clima de "último instante". A intensidade e a audácia do instante-último nos impulsiona a continuar. Ou seja, dor sim, mas com narrativa e, principalmente, beleza... Derramados estamos, mas não de dor e sim da alegria dos bons encontros, da curiosidade quase infantil que o Felipe silenciosamente nos ensinou, assim como sua sede de emoções outras que nos colocam a desdobrar OraMortem juntinhos a tantos outros corações. in-Próprio Coletivo. In memoriam Felipe Vicentim | ator-criador OraMortem


Ficha Técnica

Concepção: in-Próprio Coletivo Argumento: Daniela Leite Elenco: Daniela Leite e Pedro Vicente Concepção e operação de luz: Karina Figueredo Criação e execução da trilha sonora: Estela Ceregatti, Jhon Stuart e Luiz Gustavo Lima Cenário: Luis Segadas e Daniela Leite Figurino: Einstein Halking Cenotécnico: Hiago Gonçalves Confecção de figurino: Loraine Costa, Roseni Peron, Kimberly Cristy e Adalgiza Barros Designer gráfico: Jan Moura Fotografias: Latitude Filmes, Tarcísio de Paula e Junior Panela Agradecimentos especiais: Felipe Vicentim (in memoriam) Contatos in-Próprio Coletivo in.propriocoletivo@gmail.com producaooramortem@gmail.com www.facebook.com/inProprioColetivo www.instagram.com/in_proprio_coletivo (65) 9 8105-2449 | 9 8112-0169 | 9 9284-3663


Velha, não. Entardecida, talvez Antiga, sim. Me tornei antiga Porque a vida, Tantas vezes, se demorou. E eu a esperei Como um rio aguarda a cheia (Mia Couto)

Realização:

Apoio:

Patrocínio: núcleo de pesquisas teatrais

ENCONTROS

POSSÍVEIS


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