Televangelismo & Consumo: o caso da Igreja Universal do Reino de Deus

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TELEVANGELISMO & CONSUMO

O CASO DA IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS


ESPECIFICAÇÕES TÉCNICAS Trabalho de Conclusão de Curso de Jornalismo da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Ano 2016 São Paulo Orientador: Prof. Dr José Arbex Jr Banca examinadora: Prof. Ricardo Mariano e Jornalista Mônica Marques Revisão: Kate Kaspar Design Gráfico: Mayra Martins Ilustração: Gabriel Monteforte Palavras chave: Igreja Universal do Reino de Deus; consumo; televangelismo; prosperidade; neoliberalismo Impressão e banca em Dezembro

AGRADECIMENTOS

Dedico esta pesquisa a meu pai Ogum, que está sempre ao meu lado me fortalecendo e me ajudando a superar os obstáculos da vida, e a minha família. Em segundo lugar, às pessoas que têm fé no amor divino, mas que só estão perdidas. E, finalmente, a meu parceiro de trincheira, Rafael.


TELEVANGELISMO & CONSUMO

O CASO DA IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS

Escrito por Isabela Campos Palhares

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo 2016


“A televisão e a admiração do público constituem armadilhas para os espiritualmente desprevenidos. Não só o narcisismo implícito no culto da personalidade é incompatível com a transcendência do ego, que deve caracterizar a busca espiritual, como o televangelista também pode se distanciar da realidade. As fortunas controladas pelas redes de maior sucesso não combinam com o desprendimento da riqueza material preconizada pelo evangelho.”

KAREN ARMSTRONG,

Em Nome de Deus, 1994

“[De acordo com os princípios do neopentecostalismo] a tudo pode ser imbuído o espírito santo e, assim, [tudo pode se tornar uma commoditie, que é vendida ou comprada e] fazer parte da vida do crente. É essa a ligação próxima entre a disseminação do capitalismo, o consumo e o pentecostalismo: o último ‘incorpora’ as políticas econômicas neoliberais.”

BIRGIT MEYER,

antropóloga holandesa, 2010


SUMÁRIO INTRODUÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10 1. AS ORIGENS DO MOVIMENTOS PENTECOSTAL E DO TELEVANGELISMO 1.1 Modernização da sociedade e Reforma Protestante . 1.2 A religião nas colônias inglesas. . . . . . . . . . . . . . . 1.3 A Origem das Espécies e a Cruzada contra a religião 1.4 O caso Scopes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1.5 Os pentecostais. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1.6 O início do televangelismo . . . . . . . . . . . . . . . . 1.7 Televangelistas norte-americanos . . . . . . . . . . . . 1.8 Os evangélicos norte-americanos na política . . . . .

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2. O TELEVANGELISMO NO BRASIL E A UNIVERSAL .

2.1 Números do pentecostalismo no Brasil . . 2.2 Canais religiosos na TV brasileira. . . . . . . 2.3 Eu sou a Universal. . . . . . . . . . . . . . . . . 2.4 Teoria do domínio midiático . . . . . . . . . 2.5 Programação televisiva da Igreja Universal 2.6 Sobre os programas . . . . . . . . . . . . . . .

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3. DIAS DE CULTO

3.1 Primeira experiência Neopentecostal. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39 3.2 Congresso Para o Sucesso no Templo de Salomão . . . . . . . . . . . . . . . . 41 4. MAL AQUIAS 3:9,10

4.1 A Teologia da Prosperidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47 4.2 Do Neopentecostalismo ao Neoliberalismo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50 4.3 Fetichismo da mercadoria e alienação dos fiéis . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52 CONSIDERAÇÕES FINAIS BIBLIOGRAFIA ANEXOS LISTA DE TABEL AS

Tabela 1 - Canais religiosos da TV brasileira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 Tabela 2 - Algumas emissoras que transmitem programas religiosos . . . . . . 31


INTRODUÇÃO

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uando iniciei essa pesquisa, não imaginava que o poder da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) estava tão enraizado no imaginário da sociedade brasileira. A chegada ao poder do senador Marcelo Crivella (PRB/RJ), como prefeito do Rio de Janeiro, marca um novo momento na vida política e econômica da Igreja, no qual as promessas de felicidade pregadas por ela deram frutos políticos. A presença da IURD nesse imaginário social, todavia, se deu por diferentes meios, desde os midiáticos até os impressos e os presenciais. A presença da IURD na televisão, que se configura como uma das igrejas evangélicas mais presentes nesse meio, me motivou a analisar sua influência na vida dos brasileiros, tendo em vista que a televisão está presente em 98% dos lares do país. Essa inserção tem relação com a teoria do domínio midiático, que tem como objetivo cristianizar o país também pela mídia, e que guarda semelhanças com o Seven Mountain Prophecy dos EUA, que tem como um dos pilares de dominação nacional a mídia. Os cultos presenciais nos templos e especialmente no Templo de Salomão, no centro de

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São Paulo, são transmitidos pela TV e propagam as doutrinas que a Igreja abraçou desde seu surgimento em 1977 no Rio de Janeiro para milhões de pessoas no Brasil. O teor consumista das pregações que tem sua origem na Teologia da Prosperidade, muito se relaciona com o neoliberalismo, que comoditiza tudo, tornando tudo vendável e comprável, inclusive bens religiosos simbólicos e a própria religião. Foi surpreendente observar a extensão do apelo consumista da Igreja, principalmente nas quatro reuniões do culto da prosperidade, ou Congresso Para o Sucesso, que eu frequentei. Pela televisão e pela internet, propagandas de bens luxuosos invadem a programação da Igreja e incitam o fiel a consumir, mesmo que não haja necessidade, sempre focando no desejo e na promessa de felicidade que virão junto com o consumo. Paralelamente ao apelo consumista preconizado pela Igreja, a pesquisa observou que a mesma produz uma relação alienada com a religião pois promove a instrumentalização da fé como uma ferramenta útil ao acesso de bens de consumo, por meio da TV também, estimulando o fetiche da mercadoria nos fieis, como abordado por Karl Marx, e, assim, vendendo a própria religião como mercadoria.

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1.1 MODERNIZAÇÃO DA SOCIEDADE E REFORMA PROTESTANTE

1O. CAPÍTULO AS ORIGENS DO MOVIMENTO PENTECOSTAL E DO TELEVANGELISMO

Com o passar dos séculos, a partir do Renascimento, a transformação e a modernização da sociedade global, que incidiu diretamente na mudança local das tradições culturais, científicas e religiosas dos povos, fez a humanidade remanejar suas visões sobre Deus, religião, individualidade, ciência, sociedade e Estado. Especificamente, as descobertas científicas a partir do século XVI constituíram um novo espírito, científico e pragmático, em marcha para o futuro, que foi afetando e reduzindo o vínculo das pessoas à esfera da espiritualidade. Tendo isso em vista, as tradições religiosas foram, pouco a pouco, perdendo seu espaço e temporalidade e tiveram que, com isso, ir se adaptando conforme a sociedade se transformava. Era necessário, então, “enxugar” a religião e torná-la mais eficiente (ARMSTRONG, 1994). Esse processo ganhou impulso com a Reforma Protestante no século XVI. O reformador protestante Martinho Lutero contribuiu para a constituição da secularização da política por acreditar que Deus pertencia ao plano espiritual e não ao plano físico, caracterizando a realidade mundana oposta à realidade espiritual, advogando a separação entre Igreja e Estado. Mal sabia Lutero que, séculos depois, seus discípulos estariam reivindicando o poder das Associações Religiosas de interferir na política.

1.2 A RELIGIÃO NAS COLÔNIAS INGLESAS Nos início do século XVIII, muitos protestantes migraram da Inglaterra para as colônias da América do Norte, em busca de riqueza e novas oportunidades de vida, mas também fugindo do poder punitivo e centralizador da Igreja Anglicana. Eram das mais diversas denominações, incluindo os Quakers, Batistas e Presbiterianos. Uma das práticas adotadas para assegurar a coesão das novas comunidades era o Rito do Despertar, que

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fortalecia as convicções religiosas e construíam a fé na possibilidade da conquista da bem-aventurança mediante a devoção. Essa prática ajudou a preparar o terreno para a revolução norte-americana, por mais que os sermões não tivessem conotação política (ARMSTRONG, 1994). O primeiro Despertar ocorreu em Northampton, Connecticut, em 1734 e como primeiro movimento de massa no país, proporcionou aos adeptos uma sensação de participação nos rumos da história. Esse Despertar afetou todas as denominações que passaram a atribuir significados apocalípticos a fatos do cotidiano. Por exemplo, a Guerra de Sete Anos entre a França e a Itália era vista como uma batalha cósmica entre o bem e o mal, que apressaria a vinda de Cristo enfraquecendo o poder do Papa, que era tido como o anticristo. Nesse período violento e assustador que contavam com guerras e conflitos, os norte-americanos que ainda eram em sua maioria calvinistas , pressentiam transformações mais radicais e iminentes, o que os levou a desenvolver uma religião do ódio. Para eles só haveria salvação se o Papa fosse destruído (ARMSTRONG, 1994). E uma dessas transformações seria a Independência em 1776, que teve seu estopim no aumento da cobrança de impostos pela Inglaterra, advindo dos efeitos econômicos da Guerra dos Sete Anos. Como a religião frequentemente fornecia e ainda fornece os meios para que os fiéis consigam superar e lidar com ritos de passagem da sociedade para a modernidade, os ministros da época cristianizavam a retórica revolucionária. Depois da Revolução, como relata Karen Armstrong em seu livro Em Nome de Deus, o reitor da Universidade de Yale, Timothy Dwight, e o reitor da Universidade de Harvard, figuras religiosas e politicamente importantes, diziam que a revolução era o caminho certo para a Terra do Santíssimo e que os EUA seriam seu novo reino. Portanto, por mais paradoxal que pareça, a religião desempenhou um papel importante na criação da primeira república secular moderna, os Estados Unidos da América.

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Em 1787, em consonância com os princípios iluministas e com a concepção luterana sobre o lugar da política, Thomas Jefferson, propôs a inscrição do “muro da separação” entre Igreja e Estado na Constituição. A fé pertenceria à esfera do privado e voluntário. Entretanto, em meados do século XIX, os “secularistas” passariam a ser vistos por correntes do protestantismo como uma ameaça, um mal de proporções satânicas. Nessa época, a população se sentia negligenciada pela elite e passou a dar ouvidos a uma nova espécie de pregadores. As revoltas de escravos e a subsequente Guerra de Secessão (1861-65), as rápidas transformações sociais, com a “conquista do oeste” e a profusão de novas invenções, a formação das metrópoles que estimulavam o consumo de álcool e drogas: tudo contribuía para gerar um clima de perplexidade e incerteza quanto ao futuro. A fé nos princípios da Bíblia – raiz do fundamentalismo religioso – oferecia solução e conforto. Os novos incentivadores da fé não tinham diploma e não eram homens cultos, pregavam com uma linguagem popular e por isso seu proselitismo era facilmente compreendido. Então foram surgindo novas denominações que tinham desejo de mudança social e dialogavam com os pobres, como os Mórmons e os Metodistas. Muitos acreditavam na ideologia do Destino Manifesto, que diz que os EUA receberam de Deus a incumbência de liderar as nações do mundo, desde que fossem portadores da fé cristã. Como resultado desse processo, até meados do século XIX, o número de Congregações Evangélicas cresceu quase 21 vezes (de 2.500 para 52 mil) (ARMSTRONG, 1994).

1.3 A ORIGEM DAS ESPÉCIES E A CRUZADA CONTRA A RELIGIÃO Em 1859, Charles Darwin lançou A Origem das Espécies. O livro, na interpretação dos religiosos fundamentalistas, ensejou o início da “cruzada

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contra a religião no mundo”. O termo fundamentalismo foi usado inicialmente pelos protestantes para distinguir-se dos protestantes mais liberais, que, para eles, distorciam a fé cristã. Os fundamentalistas queriam ressaltar o fundamental da fé cristã que viam como a interpretação literal das Escrituras e a aceitação de certos dogmas. Desde então aplica-se o termo fundamentalismo a movimentos reformadores radicais de outras religiões. Os fundamentalistas veem a luta travada pela sociedade global como uma guerra cósmica entre o bem e o mal. Temem a aniquilação e procuram fortalecer sua identidade sitiada por meio do resgate de certas doutrinas e práticas do passado. Seus líderes, em geral carismáticos, são fundamentais no processo de elaboração de uma ideologia capaz de fornecer um plano de ação. Em 1910, contra os ataques de protestantes liberais, os Presbiterianos de Princeton publicaram uma lista de cinco dogmas essenciais a serem seguidos por todo cristão de respeito: (1) infalibilidade das escrituras; (2) o nascimento virginal de Jesus; (3) a remissão dos nossos pecados pela cruxificação; (4) a ressurreição da carne; (5) a realidade objetiva dos milagres de Cristo. Também contra a empreitada liberal e científica, os milionários do Petróleo, Lyman e Milton Stewart, que fundaram o Bible College de Los Angeles, financiaram projetos de educação de fiéis nos ditos princípios centrais da fé. Produziram folhetos com falas de teólogos conservadores disseminando seus interesses e, nesse passo, toda sala de aula de teologia no país havia sido influenciada por eles. Esse ato, como relata Karen Armstrong, foi considerado como um dos germes do movimento fundamentalista. Os conservadores achavam a filosofia da evolução responsável por “um monstro tramando a dominação do mundo e a destruição do cristianismo”, tomando como exemplo a Primeira Guerra Mundial, que confirmou profecias apocalípticas e incitou – ainda mais - um sentimento xenofóbico, demonizante e conspiratório que, como apontou a autora, podia facil-

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mente tornar-se agressivo. O objetivo a partir de então era expulsar os liberais das várias denominações e agrupar outras denominações protestantes conservadoras como os Pentecostais, Mórmons, Discípulos de Cristo e Adventistas do 7º Dia, o que foi, até então, realizado com sucesso.

1.4 O CASO SCOPES As atrocidades militares cometidas durante a Primeira Guerra (1914-18) deram aos fundamentalistas protestantes norte-americanos o pretexto para uma nova investida. Atribuíram a responsabilidade ao “materialismo darwinista” e, em 1920, iniciaram uma cruzada contra o ensino da teoria da evolução nas escolas e faculdades dos Estados Unidos. O maior expoente desse movimento foi o político e religioso, William Jennings Bryan. Ele estava convencido de que a teoria de Darwin era incompatível com a moralidade e sobrevivência da civilização. Lotou auditórios e recebeu vasta cobertura da mídia ao redor do país esbravejando sobre as “ameaças do darwinismo” e influenciando politicamente uma boa parte da sociedade dos EUA. Em vários estados do sul, como Flórida, Mississipi, Louisiana e Arkansas, surgiram projetos de lei proibindo o ensino da teoria darwiniana. No entanto, um acontecimento que viria a marcar os fundamentalistas para sempre, e transformar os rumos da política, da religião e da comunicação no país, ocorreu em uma pequena cidade, chamada Dayton, no Tennessee. Como também mostra o filme O Vento Como Herança, de Stanley Kramer, em 1925, o jovem professor de Biologia, John Scopes, confessou ter infringido a lei em uma de suas aulas. O professor foi levado a julgamento e a recém criada American Civil Liberties Union (ACLU) enviou o advogado racionalista, Clarence Darrow, para defendê-lo. O julgamento, altamente noticiado, assumiu dimensão de embate entre Deus e ciência.

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Bryan ganhou o julgamento na corte mesmo tendo fracassado em tentar defender seu ideal religioso, sendo visto pela mídia posteriormente como um anacronismo irremediável, juntamente com seus colegas fundamentalistas. Darrow saiu como perdedor somente na corte, pois a opinião pública o endossou. Scopes foi preso, mas a ACLU pagou sua fiança. A vitória nacional, no entanto, coube a Darrow que defendeu a liberdade da ciência com bons argumentos e que foi louvado pela imprensa. O jornalista H. L. Mencken denunciou os fundamentalistas como flagelo da nação (ARMSTRONG, 1994). Depois dessa derrota, os fundamentalistas se calaram e os liberais entraram em cena com o controle das Congregações. E esse afastamento só serviu para estreitar ainda mais a mentalidade dos fundamentalistas, prevalecendo o criacionismo e um inabalável literalismo bíblico, que mostraria suas garras novamente no futuro. Agora, o evangelho social estava corrompido pela associação com os liberais e o espectro político passou a ser o da extrema-direita.

1.5 OS PENTECOSTAIS Enquanto os fundamentalistas remontavam a uma base doutrinal do cristianismo, os pentecostais, que não se importavam com dogmas, remontavam a uma religiosidade primitiva que ultrapassava as formulações de um credo (ARMSTRONG, 1994). Em 1906, em Los Angeles, o primeiro grupo de religiosos experimentou o espírito com o líder William Joseph Seymour, por meio de cultos de manifestação física do espírito. Quatro anos depois, a congregação Pentecostal, originária do metodismo e mais diretamente do movimento Holiness, contava com centenas de grupos nos EUA e estava presente em mais de 50 países. Sua principal diferença com os protestantes era a variedade de línguas faladas, coisa que futuramente veio a ser menosprezada pelos protestantes fundamentalistas.

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A difusão rápida do movimento revelava um descontentamento com o status quo e com a ênfase no amor e na inclusão do movimento, que contrastava nitidamente com o exclusivismo fundamentalista.

1.6 O INÍCIO DO TELEVANGELISMO Depois da Segunda Guerra Mundial, começaram a surgir organizações e cadeias de emissoras concebidas e administradas por uma nova geração de evangelistas que se tornaram verdadeiros impérios no setor de comunicações e publicidade. Com o advento da televisão em 1950, os jovens Billy Graham, Rex Humabrd e Oral Roberts deram início ao seu ministério como televangelistas, substituindo os pregadores itinerantes. Segundo a autora Karen Armstrong, “uma vasta rede de rádio e televisão, aparentemente invisível, unia os fundamentalistas de todo o país. Eles se sentiam forasteiros empurrados para as periferias da sociedade, mas agora suas faculdades bíblicas e emissoras lhes proporcionavam um refúgio num mundo hostil”. E esses extremistas eram influentes: em 1934 ainda, cerca de 600 mil pessoas assinavam o jornal Defender Magazine de Wynrod e 120 mil o Christian Beacon de Carl McIntyre. Em 1979 existiam cerca de 1300 emissoras de rádio e televisão evangélicas com uma audiência de cerca de 130 milhões de pessoas e um lucro estimado entre 500 milhões e alguns bilhões. Em Virginia Beach, o ministro Pat Robertson instalou sua Christian Broadcasting Network e o 700 Club, em Lynchburg, na Virgínia, Jerry Falwell por sua vez iniciou seu ministério televisivo em 1956. Em Charlotte, na Carolina do Norte, Jim e Tammy Faye Bakker tinham sua sede, com o cinturão bíblico acabando na Califórnia. Agora, com o poder retomado e os objetivos traçados, os fundamentalistas viram que era essencial mudar a política de modo que os EUA ficassem livres do humanismo secular – que era seu inimigo principal e que caminhava de mãos dadas com o Estado e com a Suprema Corte – mo-

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bilizando radicalmente a política para eleger representantes, com a ajuda dos meios de comunicação. Obviamente, os televangelistas se tornaram mais competentes no marketing do cristianismo. “Pareciam fazer do Deus banido de grande parte da esfera pública uma presença poderosa e tangível. Ao assistir às aparentes curas de doentes e inválidos operadas pelo pregador pentecostal Oral Roberts, os fundamentalistas viam o poder divino em ação. Ao ouvir o televangelista Jimmy Swagart, que se vangloriava de salvar 100 mil vidas por semana, proferir virulentos ataques contra católicos, gays e a Suprema Corte, sentiam que alguém estava expressando opiniões que precisavam ser levadas em consideração. Ao saber das polpudas doações que Pat Robertson ou os Bakker recebiam semanalmente em seus programas, convenciam-se de que Deus era a solução para os problemas da economia. Os cristãos deviam dar para receber, diziam. “No Reino de Deus não existe recessão nem escassez. Era uma verdade que parecia corroborada pelo imenso sucesso dos dez grandes impérios televisivos cristãos, que arrecadavam mais de 1 bilhão de dólares por ano, empregando mais de cem mil pessoas e revelando ser um negócio altamente profissional” (ARMSTRONG, 1994).

1.7 TELEVANGELISTAS NORTE-AMERICANOS “A televisão e a admiração do público constituem armadilhas para os espiritualmente desprevenidos. Não só o narcisismo implícito no culto da personalidade é incompatível com a transcendência do ego que deve caracterizar a busca espiritual, como o televangelista também pode se distanciar da realidade. As fortunas controladas pelas redes de maior sucesso não combinam com o desprendimento da riqueza material preconizada pelo evangelho.” (ARMSTRONG, 1994) O casal fundamentalista Tim e Beverly LaHaye tinha o manual do sexo, The Act of Marriage: The Beauty Of Sexual Love, que influenciava mi-

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lhões de crentes. Jerry Falwell também era outro nome importante. Em 1960 e 1970 quatro em dez famílias sintonizavam em sua emissora Old Time Gospel Hour. Em 1988 a Thomas Road Baptist Church tinha 18 mil devotos e 60 pastores associados, a renda total da igreja superava 60 milhões e os serviços eram transmitidos por 392 canais de TV e 600 emissoras de rádio. Falwell era um ministro adepto da moderação e do capitalismo. Sem, no entanto, ceder ao gosto pelo espetáculo, ele construiu seu império inspirado nos shoppings centers, que ofereciam uma variedade de serviços, o que se assemelha à Igreja Universal do Reino de Deus. Sua igreja parecia provar a viabilidade religiosa do capitalismo, multiplicando os ministérios e expandindo-os, ele compreendia a dinâmica da moderna sociedade capitalista e tinha plenas condições de enfrentá-la de igual para igual. Os pentecostais Jim e Tammy Faye Bakker da Rede PTL (Praise The Lord and People That Love) que funcionou de 1974 a 1989, levantaram críticas pelo seu extravagante estilo de vida. Como é de costume até hoje em outras igrejas, como a Igreja Universal do Reino de Deus, eles convidavam os telespectadores a fazerem sacrifícios e ajudar os necessitados, mas segundo o jornal Charlotte Observer, tinham uma mansão com espelhos que custavam até 22 mil dólares. Os Bakker também se destacaram pelo seu parque temático, Heritage USA, que retratava a experiência evangélica norte-americana como a Disney. O parque usa de uma cultura pós-moderna, diferente do ethos racional do protestantismo, que mistura prazer, divertimento e espetáculo. O culto acontecia em um estúdio de televisão e nunca era transmitido um serviço comum, sendo preferível o espetáculo e a fantasia (ARMSTRONG, 1944). Tammy Faye e Jim eram apresentadores do popular programa infantil Jim and Tammy e também criaram um ministério para crianças no Christian Broadcasting Network, de Pat Robertson. Toda a riqueza, fama e espetáculo que o casal televangelista detinha não

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os impedia, no entanto, de “pecar” e até cometer crimes em nome de Deus, explicitando a distorção religiosa a qual os pentecostais se subjugaram com muito prazer. Em 1987, eclodiram alguns escândalos envolvendo o casal, que foi denunciado por outro pregador pentecostal, Jimmy Swaggart, e noticiado pelo Charlotte Observer. Em 1980 Jim Bakker havia drogado e seduzido a secretária de uma de suas igrejas, Jessica Han, de Long Island, e depois tentado comprar seu silêncio por 250 mil dólares. Também, Tammy Faye se apaixonara pelo cantor de country, Gary Paxton, e acabara separando-o da esposa. O casal se desvencilhou dos escândalos trazendo-os à tona em suas pregações falando sobre a misericórdia infinita de Deus ao que Armstrong aponta, “velhas categorias de certo ou errado podiam se dissolver tão facilmente quanto a verdade e ficção no Heritage USA, trata-se, evidentemente de uma distorção do cristianismo”. O pregador Jimmy Swaggart da Assembléia de Deus era um dos pentecostais mais famosos que sempre se gabava por ter audiência em 145 países. Seu ministério, que se iniciou em 1975, continua indo ao ar nos EUA e internacionalmente. O semanal Jimmy Swaggart Telecast e o programa A Study in the Word passam em 78 canais em 104 países e pela internet. Homem de Deus, ele também se envolveu em um escândalo com uma prostituta em Baton Rouge, que divulgou que ele se interessava por rituais humilhantes ao invés de sexo. A religião do ódio de Swaggart, sendo tão autodestrutiva e niilista quanto as outras, e sua fama, mostraram não só que havia um anseio de êxtase em um mundo super racionalizado, como também que essa procura podia se tornar insana. Todavia, esse ódio desenfreado com o qual os televangelistas se tratavam acabou por sepultar muitos fundamentalistas. Emissoras foram fechadas e Pat Robertson fracassou na campanha à presidência em 1988. Tudo indicava o fracasso dessa nova direita cristã fundamentalista. Mas da mesma maneira que Deus opera milagres nos humildes de fé, o

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Deus-Mercado é justo com seus devotos de fé. A expansão do pentecostalismo pelo mundo e ainda mais pelos EUA, na sociedade e na política, não tinha planos para acabar.

1.8 OS EVANGÉLICOS NORTE-AMERICANOS NA POLÍTICA Em 1979, o evangélico Jerry Falwell fundou a Maioria Moral, instigando fundamentalistas protestantes a se envolverem na política e contestar a agenda humanista secular, como já vimos nas últimas páginas. No entanto, o que se mostrou difícil foi a tradução em logoi político das visões messiânicas ou místicas dos fundamentalistas, o que prejudicou a integralidade dos religiosos em uma esfera tão pragmática como a política. A Maioria Moral foi formada por setores fundamentalistas e conservadores de várias religiões que queriam entrar na política. Eles pregavam contra tudo que vinha junto com o humanismo secular, desde o feminismo até a homossexualidade, prescrevendo o porte de armas e outras leis, que os faziam parecer menos sensíveis e mais hostis de como os homens devem se portar, tudo com o intuito de restaurar as fundações morais da nação. Em pouco tempo o movimento se tornou altamente influente na política dos EUA, sua irreverência constante e exclusiva à Bíblia fez com que fosse ridicularizado e amado ao mesmo tempo tendo sob sua alçada a atenção dos políticos, que não conseguiam e/ou podiam ignorá-lo. (ALEXANDER, 2011) A rede de rádio e TV da Maioria Moral começou a funcionar como campanha política, onde ensinavam os adeptos a votar, como votar e também técnicas de lobby. De pouco em pouco iam conquistando espaço e sucesso na política jogando o jogo moderno, que até aceitava o pacto com o diabo pelo bem da governabilidade. Em 1975, Bill Bright, fundador da Campus Crusade for Christ e Loren

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Cunningham, fundadora do Youth with a Mission, definiram as ordens de marcha da dominação cristã e conservadora dos EUA, que há muito vinha sendo exigida pelos cristãos conservadores em todos os aspectos da vida da sociedade norte-americana. Sete áreas estratégicas de influência foram identificadas, incluindo negócios, governo, mídia, artes e entretenimento, educação, família e religião. Johnny Enlow, em seu livro, The Seven Mountain Prophecy: Unveiling the Coming Elijah Revolution, escreve que as sete áreas de influência são arenas específicas que Deus estaria fornecendo-lhes para retomar e colocar sob sua influência, usando ao em vez de exércitos, (o que configuraria como uma ditadura, para eles) a pressão cultural para a conformidade. A influência na Montanha da Mídia pode ser percebida nos veículos de massa que se alinham com as ideias da Direita Cristã e acabam os favorecendo, entrando na narrativa de Deus, compartilhando histórias, notícias e opinião sempre com um aspecto cristão, com temas bíblicos. A Tea Party é um exemplo da narrativa midiática favorável que concedeu atenção e, portanto, presença na sociedade. (ALEXANDER, 2011) Em conluio com o Partido Republicano e com a Direita Cristã está um dos canais mais importantes e mais assistidos dos EUA, o Fox News. Conhecido no país todo por sua cobertura parcial, os religiosos e políticos conservadores já tem espaço favorável garantido na programação, sendo o canal reconhecido, pelos extremistas, por ser uma organização da Direita Cristã que está conquistando a esfera midiática para avançar com o projeto de Deus para a nação. (ALEXANDER, 2011).

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2O. CAPÍTULO O TELEVANGELISMO NO BRASIL E A UNIVERSAL

No sentido evangelizador e conquistador da palavra de Deus pregada nos EUA, o Brasil, desde a década de 1910 já estava cotado para a lista de evangelização dos pentecostais e protestantes norte-americanos e europeus. O missionário canadense Walter Robert McAlister viu no país tupiniquim, bem como viram os missionários que trouxeram primeiramente a Assembleia de Deus (em Belém, em 1911) e a Congregação Cristã (em São Paulo, 1910), uma porta aberta, receptiva e calorosa para a palavra de Deus. McAlister, missionário oriundo de uma família tradicional pentecostal, atuou como evangelista em diversos países até chegar ao Brasil. Chegou no bairro de Botafogo, no Rio de Janeiro, em 1960, e ali fundou a Igreja Nova Vida, que faria parte da terceira onda do pentecostalismo que alcançou o Brasil: a onda do neopentecostalismo. A Nova Vida está na origem da Igreja Universal do Reino de Deus, da Igreja Internacional da Graça e da Igreja Cristo Vive. As primeiras igrejas a chegarem no país na década de 10 fazem parte da primeira onda do movimento a chegar no país, do pentecostalismo clássico. (MARIANO, 1999) Ao lado da Igreja Brasil para Cristo, pentecostal, pertencente à segunda onda do movimento que chegou ao país, do deuteropentecostalismo de 1950 e 1960, a Igreja Nova Vida já transmitia em 1960 o programa de rádio Voz da Nova Vida, pela Rádio Copacabana e foi pioneira no uso da TV. Entre 1965 e 1967, McAlister protagonizou um programa na TV Tupi, que depois foi retomado em 1978 e 1981 com o nome Coisas da Vida, no mesmo canal, configurando o missionário como um dos primeiros televangelistas brasileiros. A Igreja, no entanto, teve problemas com sua expansão e acabou não figurando como um nome importante em meio às outras e, principalmente, frente à sua “filha” que viria a se tornar um império.

2.1 NÚMEROS DO PENTECOSTALISMO NO BRASIL O neopentecostalismo se forjou no Brasil como a vertente pentecostal que mais cresceu nas últimas décadas, acompanhado da expansão mundial do pentecostalismo e que se deu de forma surpreendente na América Latina e

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no Brasil, sendo esse o país mais protestante da América Latina, abrigando pouco menos da metade dos cerca de 50 milhões de evangélicos estimados no continente. De 1970 a 2010, os evangélicos subiram de 5,2% a 22,2% no Brasil, de acordo com o CENSO IBGE de 2010. Entre 2000 e 2010, o total de evangélicos no país subiu de 26,2 milhões para 42,3 milhões. E dados mostram que quem puxou esse aumento foram os pentecostais: em 1991 eram 13.189.282. os evangélicos no país, 8,98% da população, sendo 65.1% pentecostais, já em 1994, eles somavam em 76%, equivalente a um crescimento de 111,7%, concentrado nos estratos mais pobres, negros, marginalizados e menos escolarizados da sociedade. Tal pluralização do espectro cristão tem propiciado a inserção da religião na economia e a formação de um grande mercado religioso, com muitos e variados produtos religiosos que se tornaram vendáveis. As igrejas, além dos milhares de templos espalhados pelo país, possuem escolas, editoras, livrarias, emissoras de rádio e TV, hospitais, videolocadoras e lojas online., principalmente as neopentecostais, que acabaram tomando essa pluralidade de negócios como marca. Se o telespectador quiser assistir diversos tipos de programas evangélicos na TV, ele terá uma gama de opções que variam de funk gospel até cultos de libertação demoníaca.

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2.2 CANAIS RELIGIOSOS NA TV BRASILEIRA Além das igrejas protestantes, a Igreja Católica, que sempre comandou o pensamento religioso no Brasil e que há um tempo perdeu espaço para outras denominações, também estão presentes no sistema de comunicações brasileiro, com emissoras de rádio e TV. Abaixo, segue uma tabela com todos os canais de televisão religiosos no país: TABELA 1: Canais religiosos na TV brasileira Fonte: TV Digital SP e Wikipédia - Ano: 2016

IGREJA

CANAL

DENOMINAÇÃO

Com. Católica Canção Nova

Rede Canção Nova

Católica

Igreja Católica

Rede Vida

Católica

Santuário Nacional de N. S. de Aparecida Católica

TV Aparecida

Católica

Igreja Católica

Rede Século 21

Católica

Igreja Católica

TV Evangilizar - RCI

Católica

Igreja Católica

Rede Nazaré (*)

Católica

Igreja Católica

TV Horizonte (**)

Católica

Igreja Universal do Reino de Deus

TV Universal (#)

Neopentecostal

Igreja Universal do Trono de Deus

TV Plenitude

Neopentecostal

Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD)

RIT

Neopentecostal

Igreja de Deus Internacional

TV Verdade

Restauracionista

Comunidade Evangélica Sara Nossa Terra

Rede Gênesis

Neopentecostal

Igreja Mundial do Poder de Deus

Rede Mundial

Pentecostal

Igreja Renascer em Cristo

Rede Gospel

Pentecostal

Assembleia de Deus - Manaus

Rede Boas Novas

Pentecostal

Ministério Jimmy Swaggart

SBN

Pentecostal

Igreja Reino dos Céus

TV Reino

Pentecostal

Igreja Adventista do Sétimo Dia

Rede Novo Tempo

Adventista/Protestante

Igreja Batista da Lagoinha

Rede Super

Batista

Federação Espírita Brasileira

FEB TV

Espírita

Legião da Boa Vontade

Boa Vontade TV

Ecumênica

Fundação Espírita André Luiz

TV Mundo Maior

Espírita

(*) - Afiliada à Rede Século 21-PA / (**) - Afiliada à TV Aparecida-MG

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Optei por destacar a TV Universal com o sinal (#) pelo fato de ela atuar principalmente online, sendo transmitida pela televisão algumas vezes apenas e em algumas regiões. No site Universal.org podemos encontrar o blog do Bispo Macedo, da Cristiane Cardoso, sua filha, da Ebi, o blog Fonte a Jorrar, de Ester Bezerra, o blog do Júlio Freitas, o blog Godllywood, o blog do Renato Cardoso, da Tânia Rubim e da Vivi Freitas e os canais do Facebook, do Twitter, do Youtube. No site pode-se encontrar orientação espiritual online, o Pastor Online. No site também tem a agenda da igreja, os vários editoriais das matérias publicadas sobre vida à dois, estudos bíblicos, notícias de Israel, dentre outros. Há um link direto para os fiéis ouvirem à Rede Aleluia de Rádio, que conta com os programas: A Escola do Amor Responde (fala da vida à dois, com os apresentadores Cristiane e Renato Cardoso), Fala que eu te escuto (com o bispo Clodomir Santos), Mensagem Amiga (com o bispo Macedo), A última pedra (com o bispo Formigoni), Obreiros em foco (com o bispo Sérgio Corrêa), Momento presidiário (com bispo Afonso da Silva) e Santo culto em seu lar (também com o bispo Macedo). Esses programas também são transmitidos pela TV Universal online e na programação da igreja nas emissoras. Na página a seguir, observe a tabela com as emissoras que não são religiosas mas que transmitem programação religiosa:

TABELA 2: Algumas emissoras que produzem programas religiosos Fonte: TV Digital SP e Wikipédia - Ano: 2016

EMISSORA

TRANSMITE

TV Cultura

Missa de Aparecida da TV Aparecida

TV Globo

Missa com Padre Marcelo Rossi

Rede Record

Igreja Universal (IURD)

Rede TV!

IURD, IIDG, Bola de Neve, Assem. de Deus, programas da TV Ultrafarma

Gazeta

Igreja Universal e TV Ultrafarma

Band

Igreja Batista, IURD, IIGD, Assembleia de Deus Vitória em Cristo

RBI

TV Plenitude

Rede 21

Igreja Universal

TVCI

RCI

CNT

Igreja Universal

Ideal

TV Mundial

Record News

Igreja Universal

NGT

Igreja Sinos de Belém Missão das Primícias

Rede Brasil

TV Plenitude

TVZ

TV Mundial

Rede Família

Igreja Universal

TransTV

Retransmite TV Mundo Maior

Rede do Bem

Retransmite TV Reino

2.3 EU SOU A UNIVERSAL Tendo esse cenário em vista, não é de se surpreender o impacto positivo dos brasileiros com relação à Universal e seu crescente número de adeptos. Em 1977 nascia, em uma salinha de uma ex-funerária na zona norte do Rio de Janeiro, a Igreja Universal do Reino de Deus, das mãos dos ex-fiéis da Nova Vida, Edir Macedo e R.R. Soares, que foi chamada inicialmente de Cruzada do Caminho Eterno, e que por várias cisões internas conseguiu, em apenas três anos, expandir a Universal a ponto de chegar a 3 mil templos e mais de 50

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países atingidos com mais de 1 milhão de fiéis em 1980. (MARIANO, 1999) A expansão da Igreja Universal se dá em grande parte pela sua eficiência no uso dos meios de comunicação de massa, tendo como eixo principal o rádio. Em 1980 já realizava investidas na TV. Transmitia o Despertar da Fé na Rede Bandeirantes para São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Pernambuco e na TV Tupã, na Bahia. Em meados de 1983, a Universal já era transmitida em 27 programas de rádio. Em 1989, comprou a Rede Record por $45 milhões. Para tal, a liderança da igreja que se manteve anônima na compra, realizou campanhas de “Sacrifícios de Isaac”, nas quais seus pastores doavam cinco salários mensais, carros, casas. E os fiéis também foram convocados pelos pastores a doarem propriedades, dízimos, jóias e desde então a Universal não parou mais de fazer aquisições milionárias. (MARIANO, 1999). No ano da compra, a igreja possuía 571 templos e, dez anos depois, tinha 700 templos inclusive em Portugal, Angola, Moçambique, África do Sul e Argentina. Em 1990, já havia adquirido emissoras de televisão no Rio de Janeiro, em São Paulo, no Ceará, em Minas Gerais, em Goiás, na Bahia, no Rio Grande do Sul e no Paraná. Atualmente, segundo a Tabela 2, vista acima, a Universal está presente em muitos canais de televisão. Em 1998 a Igreja formou a Rede Aleluia de Rádio, com 17 emissoras próprias espalhadas pelo país. No final dos anos 1990, a Universal constituía já um verdadeiro império de comunicação. Com a Rede Record, cuja programação e administração foram alterados com os recursos da igreja, ela também possui a Folha Universal (que tem uma tiragem de mais de um milhão de exemplares), a revista Mão Amiga e o Jornal Tribuna Universal em Portugal. Por ordem da liderança da igreja e dada a inviabilidade de se ter uma TV aberta estritamente evangélica – que não seria de interesse dos anunciantes e do público e portanto, não seria lucrativa –, a programação religiosa do canal aparece somente nos horários de início e término da programação normal. E também tem um diferencial marcante em relação aos televangelistas norte-americanos, que inspiraram, pode-se dizer, o movimento pentecostal no Brasil.

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Segundo a professora Magali Cunha, a peregrinação da IURD pelos outros canais de televisão se deu para “manter a presença da igreja na mídia e não comprometer a imagem da Rede Record. Porque sempre foi um projeto da igreja não ter a Record como rede religiosa. A igreja precisa da credibilidade da Record como rede secular para fazer lucro, para ter público, vender programa e ter anunciante, porque sendo uma rede religiosa nunca alcançaria um público grande e nem estaria na competição com a Rede Globo. Hoje ela é a segunda rede, porque ela é secular.” (veja a entrevista na íntegra em Anexo I ) Os ministérios eletrônicos norte-americanos são personalistas e autônomos em relação às suas denominações. Por exemplo, um programa do ministro Oral Roberts normalmente não era transmitido de sua igreja e ela também não era abordado na pregação. Aqui no Brasil, acontece o inverso: os ministérios eletrônicos estão inseridos em uma lógica de crescimento denominacional, o qual favorece e insiste na ida ao templo e não na pregação de casa. O Bispo Macedo falou sobre isso na década de 90 em entrevista para as revistas Veja e Istoé Senhor, respectivamente. (MARIANO, 1999): — Na minha igreja preferimos o contato direto com o povo. Divulgaremos o evangelho na TV Record, mas em programas na abertura e no encerramento da programação. — Sou radicalmente contra a igreja eletrônica. O que se faz nos EUA é um erro muito grave, até contra o próprio Deus, contra a própria fé. Eles fazem um show da fé em cima de seus próprios nomes – é programa Jimmy Bakker, é programa Jimmy Swaggart, programa Rex Humbard, não anunciam o nome da igreja. Eles controlam as pessoas, levam as pessoas a ficarem acomodados em suas próprias casas.

2.4 TEORIA DO DOMÍNIO MIDIÁTICO Para melhor compreender a empreitada comunicacional da Igreja Universal, é preciso observar que da mesma forma que a denominação segue uma pers-

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pectiva teológica de guerra sobrenatural contra as forças do mal e em prol da teologia da prosperidade que será abordada mais à frente, ela também segue a teologia do domínio, que é um ideário de dominação sociopolítica, que acredita na recristianização da sociedade “pelo alto”, pela via político-partidária e pela mídia eletrônica (MARIANO, 1999) – via essa que faz seu caminho pela TV, pelo rádio, pela internet. Pode-se perceber que a Igreja Universal é a Igreja que mais tem presença na televisão. Fato que pudemos analisar no movimento da Direita Cristã nos EUA com o Seven Mountain Prophecy, no qual o pilar da mídia era um dos necessários para a dominação cristã da nação. Como o Brasil é um país que se comunica e se reconhece pela televisão, qualquer ação que ela protagonize gera grandes efeitos, o que pode também evidenciar a importância desse veículo na formação da opinião pública. Segundo dados de 1999, seriam aproximadamente 38 milhões de lares brasileiros com um ou mais aparelhos de televisão, representando 87% de todas as moradias. De acordo com o jornalista paulista Gabriel Priolli, 90% sintonizava em alguma emissora pelo menos uma vez na semana e, de acordo com o Grupo de Mídia de São Paulo, pelo instituto Marplan Brasil, 98% da população entre 10 e 65 anos de idade via televisão pelo menos uma vez na semana e a TV atraía duas vezes mais público do que todos os meios impressos, incluindo livros, revistas e jornais (BUCCI, 2000).

2.5 PROGRAMAÇÃO TELEVISIVA DA IGREJA UNIVERSAL A igreja detém uma vasta programação televisiva detalhada que pode ser encontrada na tabela em Anexo 5. Nela estão o nome do programa, o horário, dia e canal em que são transmitidos. As informações são da grade de programação dos sites de cada emissora e foram analisadas da semana do dia 17 de outubro ao dia 23 de outubro.

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2.6 SOBRE OS PROGRAMAS De acordo com informações retiradas do site da Universal, o programa Fala que Eu te Escuto aborda discussões dos assuntos mais recentes de relevância social, com participação ativa do público, dos telespectadores. Fala sobre drogas, comportamento, família, saúde, etc. É apresentado pelo bispo Clodomir Santos e está no ar desde 1997. Os telespectadores entram em contato com o bispo e com a igreja para auxílio, que funcionam como verdadeiros psicólogos bíblicos. O programa The Love School (Escola do Amor) tem “como foco abordar temas sobre o amor”. É apresentado pelo casal de “professores” Renato e Cristiane Cardoso que, “em linguagem acessível, dá dicas para a realização afetiva”. Os fiéis vão ao programa discutir com os apresentadores, sempre com o viés bíblico. O casal também dá aula no curso “Casamento Blindado”: devido ao sucesso, o curso já rendeu um livro. O Escola do Amor Responde é um programa de meia hora no qual o casal responde dúvidas dos alunos ouvintes. O programa A Última Pedra, ministrado pelo bispo Rogério Formigoni, fala sobre cura de vícios, com conversas com fiéis, com viés bíblico. O programa tem uma central de telefonemas que atende aos fiéis. Pelo Santo Culto em Seu Lar é possível acompanhar a reunião realizada pelo bispo Macedo aos domingos, de casa. Já em Retratos de Família mostra exemplos de pessoas que obtiveram vitórias após conhecer a Igreja Universal. O programa Ponto de Luz é “voltado para a conscientização espiritual levando a palavra de Deus até a casa dos telespectadores” e fala sobre a cura pela saúde dos fiéis enfermos, mostrando os cultos também com libertação de demônios. O programa Nosso Tempo, apresentado pelo bispo Clodomir Santos, segue a mesma linha do programa anterior. Além disso, ajuda fiéis ao vivo e faz o exorcismo de demônios. Esse programa foca na cura da saúde dos fiéis e na liberação de demônios ao vivo, o bispo fala com o fiél incorporado no demônio e com o telespectador ao mesmo tempo, mostrando exemplos de superação dos fiéis.

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Os programas mostram os cultos gravados nos templos de Santo Amaro e no Brás em São Paulo, sendo alguns gravados em estúdio. Em todos os programas o endereço dos templos aparece no rodapé da tela em destaque. O programa Congresso Para o Sucesso, que será analisado mais detalhadamente no capítulo seguinte, transmite as reuniões do culto da prosperidade que acontecem no Templo de Salomão, em São Paulo, toda segunda-feira. O culto é ministrado pelo bispo Rogério Formigoni. O programa se inicia com uma breve reportagem sobre marcas de luxo, roupas, carros, itens de lazer, promovendo uma vida luxuosa e com dinheiro como um lazer abençoado, exaltando a vida material. Logo em seguida o bispo Formigoni entra em cena dizendo para o fiel que ele merece ser rico e que na Universal ele pode conquistar essa benção. Em seguida entram as imagens e filmagens das reuniões de segunda-feira no Templo, mostrando casos de fiéis que prosperaram financeiramente. Alguns fiéis também são entrevistados separadamente sobre seus êxitos financeiros conquistados na igreja depois de inúmeras decepções financeiras.

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3.1 PRIMEIRA EXPERIÊNCIA NEOPENTECOSTAL

3O. CAPÍTULO DIAS DE CULTO

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A primeira vez que eu entrei no suntuoso Templo de Salomão na região central de São Paulo, no Brás, foi em um culto de domingo, às 10 horas da manhã. Eu conheci, no local onde trabalhava, o casal que me introduziu à casa, e eles concordaram em me levar para conhecer o Templo. Depois, eu descobri que a felicidade deles com a perspectiva de ganhar mais um adepto para seu exército e salvar mais uma alma era maior que seu interesse pelo meu trabalho da faculdade. Solange e Augusto Jacobino, 52 e 53 anos, são um casal comum de classe média do Tatuapé, zona leste da cidade. Me pegaram no metrô Tatuapé em um Corola cinza, ar condicionado ligado, – era nosso primeiro encontro – extremamente simpáticos. Me perguntaram sobre minha pesquisa, eu expliquei e me perguntaram sobre minha religião, menti. Eu tinha a pesquisa para avançar e não queria saber o que aconteceria se eu dissesse que sou do Candomblé. Conversa vai, conversa vem, me contaram que frequentam a Igreja Universal do Reino de Deus desde 1994, ouvem frequentemente a Rádio Aleluia “sempre que estão no carro” e assistem ao programa The Love School. Antes de conhecer a igreja, ele fazia uma mistura eclética das fés Adventista e Espírita e ela uma mistura de Católica com Espírita. Entraram na Universal pois estavam com problemas financeiros fortes e “descobri os milagres que fazem lá, pela minha sogra que já frequentava”, disse Solange. “Eu tinha a saúde muito debilitada, sofria de depressão e nossa situação financeira estava em crise forte”, continuou. Quem levou Solange foi o marido e, dentro de alguns meses, indo diariamente, Solange foi curada e a situação financeira do casal, prosperou. Já no templo, logo na entrada, o detector de metais e os seguranças confiscam os alimentos e pedem que bebamos nossos líquidos, a entrada de eletrônicos é igualmente proibida. Meu caderninho e lápis não foram aceitos de primeira pelos seguranças, pelos fiéis e pelos obreiros que indicavam

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nossos assentos, “o que essa menina vai escrever?”, logo sobre essa igreja que é constantemente denunciada por suas mil controvérsias. Sentamos no meio do Templo enquanto passavam no telão imagens de Israel e dos jardins da Galiléia. Logo, o obreiro se aproximou para reclamar que o casal estava falando muito alto ao responder minhas várias de dúvidas. Tocam as trombetas e surge em meio às gigantes cortinas de seda o bispo Clodomir Santos. Por ser o culto de domingo, não tem uma pregação específica, portanto, o bispo falou desde política até saúde e, o assunto que não podia faltar: dinheiro, ou sacrifício. “As pessoas acham que nossa fé é loucura (…) É verdade que fazemos lavagem cerebral, mas fazemos através da água ungida.” Nesse momento a multidão de cerca de 7 mil pessoas que estava calada, começou a conversar alto com Deus, eram muitas vozes por todos os lados. No culto que durou duas horas, nos primeiros trinta minutos o envelope com o dízimo do mês (10% do salário mensal, que é um imperativo de cada fiel, para não dizer obrigatório) já foi pedido pelo bispo e os obreiros e as levitas se posicionaram com as máquinas do cartão e com as redes de veludo – que simbolizam as redes de pesca nas quais Pedro obteve êxito na pesca com a ajuda de Deus – para a entrega dos envelopes com as ofertas em dinheiro. “A fé tem um preço”, disse o bispo, e completou “a fé que não cobra é porque não tem nada a oferecer.” Após a sessão financeira, o bispo iniciou a sessão de exorcismo ou libertação de demônios. Ordenando que todos pusessem as mãos na cabeça e gritassem “sai demônio destruidor de sonhos, seja repreendido, sai!” o Templo até então silencioso, ficou preenchido por vozes desesperadas para se livrar dos “demônios das ruas seculares repletas de entidades e homossexualismo”, o que inclui Solange e Augusto, que clamavam pelas bênçãos de Deus e contra os encostos, ao meu lado. Em algum lugar do Templo, que eu procurava mas não achava, podia ouvir os gritos demoníacos dos “manifestados” que logo eram estabilizados pelos obreiros. Na volta para o metrô, o casal tentou me envangelizar, mostrando versí-

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culos bíblicos que “provavam” a demonização da homossexualidade. Desde então, nunca mais nos falamos ou nos vimos.

3.2 CONGRESSO PARA O SUCESSO NO TEMPLO DE SALOMÃO Acompanhei por um mês quatro reuniões do Congresso Para o Sucesso, o culto da prosperidade e/ou dos empresários da Igreja Universal no Templo de Salomão, ministrado pelo bispo Rogério Formigoni. O culto tem duração de duas horas e acontece em diversos horários durante a segunda-feira. O horário que escolhi foi o das 15 horas da tarde, pois a probabilidade de os fiéis presentes serem desempregados e, por isso, duplamente desesperados, era bem grande. Esse culto midiatizado pela televisão não apresenta muita diferença com relação ao culto no Templo, o programa na TV somente aproveita para inserir imagens e vídeos de um estilo de vida luxuoso e rico e também adiciona entrevistas com fiéis que conquistaram prosperidade financeira, mas no geral apresenta imagens gravadas do próprio culto no Templo. Esses entrevistados primeiramente testemunham no culto e logo em seguida, pelo o que presenciei na reunião, os pastores e obreiros reúnem estas pessoas, pegam seus dados e as entrevistam para a programação na TV. No Templo de Salomão, durante as reuniões, a presença das câmeras é intensa. Elas são móveis e fixas, estão em todos os cantos e paredes do Templo, junto com o cinegrafista que acompanha o bispo no altar com a câmera ao lado. O bispo Rogério Evandro Formigoni é natural do interior de São Paulo, da cidade de Lucélia. De acordo com informações do Wikipédia, licenciado na Igreja Universal, era coordenador e realizador do projeto denominado Tratamento Para a Cura dos Vícios, que tem como objetivo libertar os usuários viciados em quaisquer tipos de drogas. Começou a se dedicar à essa campanha depois de superar a dependência química do crack que

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teve por sete anos. É autor do best-seller A Última Pedra, com mais de 1.2 milhão de exemplares vendidos, onde ele conta detalhes sobre o mundo dos vícios. Possui um canal no Youtube chamado Vício tem Cura no qual aparecem vídeos do bispo libertando usuários do vício das drogas no Brasil e em diversos países, como nos Estados Unidos. É importante ressaltar que os cultos realizados nos EUA aconteciam com a população latina do país, pois os EUA são um país, como o Brasil, cuja presença pentecostal é muito grande e, por isso, igrejas como a Universal não conseguem competir a população norte-americana com os bispos locais. Atualmente, ele realiza a reunião Congresso Para o Sucesso, que funciona da seguinte maneira: DIA 11/07/2016, 15 HORAS DA TARDE, NO TEMPLO DE SALOMÃO:

O público presente é extremamente diverso, com pessoas de todas as idades, cores e raças, homens e mulheres procurando prosperidade e felicidade. Em todas as reuniões há o momento da manifestação de demônios nos fiéis. Isso se repete em todos os cultos. Pontualmente, as cortinas se abrem ao som de trombetas angelicais. Todos de pé. Formigoni entra logo dizendo “segure no alto os propósitos da sua felicidade, o dízimo. Deus proverá na vida de quem sacrificar. Vocês não aguentam mais acumular dívidas, perder o carro, a casa e sabem que o senhor pode mudar e fazer a diferença. CHEGA de miséria. CHEGA! Sai espírito de pobreza!” A reunião de segunda-feira tem como objetivo tirar o fiel da pobreza e arrancar o espírito da miséria através dos sacrifícios e dízimos que os bispos pedem e que são, segundo eles, oferecidos à Deus. A prosperidade material é exaltada desde o início até o final do culto e indica ser o caminho mais próximo para as bênçãos de Deus. Nesse mundo de luxo e ego, quem não quer ser rico? A questão abordada

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aqui não é ser feliz. É ser rico. Só que não tão rico quanto o bispo Edir Macedo. Após 20 minutos do início do culto os/as obreiros/as se movimentam com redes vermelhas de veludo e máquinas de cartão para a coleta dos dízimos e eventuais envelopes com ‘sacrifícios’. Fiéis com chaves e carteiras ao ar, determinando, quase exigindo bênçãos, e o bispo dizia “o grande segredo desse culto é a obediência. A fé somada a obediência. Se você quer ver resultado, tem que obedecer. Só saberá se somos ladrões se você obedecer”. “Tem uma grande diferença entre dar à Deus e à Igreja: à Deus faz a diferença. Se você não prosperar eu como a bíblia!” O bispo se referiu a “sacrifícios de 10, 100, 1000, 100.000 reais” como porta para abrir caminhos e prosperar e perguntou quem havia vendido o carro semana passada, e trouxe o dinheiro naquele dia – algumas pessoas levantam a mão e vão até o altar. “Então além do envelope que está colocando, vai pegar outro”. Nesse momento, Maria, cerca de 50 anos, foi testemunhar no altar. “Sacrifiquei tudo que tinha no banco e vou fazer mais quando cair. Minha vida financeira estava amarrada com um espírito ruim”. Maria foi possuída por algum tipo de entidade, o que já é recorrente na IURD. E o espírito disse, quase que repetindo as súplicas de sacrifício do bispo, “quem está aqui não vai nem sacrificar 10%. Quem não sacrifica tem medo”. A caracterização da “manifestação de demônios” na Igreja Universal é bastante similar à incorporação de espíritos nas religiões afro-brasileiras. Em diversos cultos, dos quais não participei pessoalmente, os bispos falam os nomes das entidades específicas da Umbanda. Minha opinião é que isso se configura como um ataque direto a essas religiões, tendo em vista que a IURD compete o seu público com o da Umbanda, que pertencem à mesma classe social e racial no Brasil, não tendo respeito aos direitos humanos e religiosos e propagando o

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ódio, tendo em vista que nos cultos, ouvi os bispos chamando as entidades da Umbanda de “encostos ruins” que deveriam ser “expurgados” e falando das oferendas como “trabalhos para o mal”. Igualmente, o fato de o bispo Edir Macedo ter frequentado a Umbanda antes de entrar no movimento Pentecostal, na minha opinião, mostra da onde pode vir esta semelhança de características. Ainda, na mesma experiência, o bispo aproveita o ensejo: “Se você me obedecer, o diabo sai. Você quer? Então pare de fazer oração e sacrifique. Ligue sua televisão no canal 21”. E então há uma breve pausa para canto de algumas músicas com a letra aparecendo no telão. “Abra mão do que você tem de mais valioso para Deus. Só tem um chinelo? Dê! Só tem o sofá da empresa? Dê! Nós não tocamos em nada!” Agora outra rodada para os envelopes com os sacrifícios. “Você não quer ser rico e ser feliz?”, fiéis: “Eu quero ser rico!”. “Então já deixa o carro aqui com os documentos com os obreiros aqui do lado do altar, que semana que vem você terá dois carros, se não, eu como a bíblia!” O casal Taís e Adriano foram testemunhar no altar e ela disse: “Não me interessa o que eu bispo Macedo faz com o dinheiro. É para Deus!” DIA 18/07/2016:

“Se eu quisesse roubar eu dizia ‘dá o que você puder, que Deus entende’. Mas eu digo ‘dá até o chão dos seus pés’.” E continuou, “se eu sacrifiquei para Deus, eu não quero saber o que a Igreja faz com o dinheiro. Mas na Universal eu sei, é para ganhar almas para o céu. A pobreza é o diabo, sai espírito ruim”. Entre momentos de dízimo, envelopes de sacrifício e canto, que se repetem em todas as reuniões, o bispo suplica: “Deus, abençoa eles. Serão milionários. Esse Congresso é para quem quer ser rico!”

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DIA 08/08/2016: “O sactel onde você põe o seu dízimo representa Deus. Estenda suas mãos para o altar com toda a raiva que você tem da pobreza.” O bispo deixa bem claro em todas as reuniões que se o sacrifício financeiro for feito, Deus tem a obrigação de te ajudar, responder e abençoar. Ele pede que os fiéis repitam “Pai, sou seu servo, sua serva, eu te obedeci e te servi. Agora me abençoa Pai, me livre da pobreza”. Mais um momento de coleta de envelopes, dízimo e cantos, que acontece cerca de quatro vezes em cada reunião. Em todo momento se fala em sacrifício. DIA 15/08/2016:

Testemunhos de fiéis que prosperaram: João disse que vai nas reuniões, obedece (financeiramente) à Deus e agora vende mais; José diz que vai no culto, obedece (novamente) à Deus e agora tem vários imóveis no Brás; Vinícius tinha um contrato preso há quatro anos que agora liberou, pois obedeceu; Jalison agora tem seu comércio no primeiro lugar no ramo de vendas, pois obedeceu; Mônica conseguiu fechar um contrato de vendas pois obedeceu e disse ao bispo “você não vai precisar comer a bíblia!”. E o bispo completa sempre: “você obedeceu a Deus, agora cobra Dele!” Procurado para conceder entrevista, o bispo Rogério Formigoni não aceitou contribuir para o trabalho.

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4.1 A TEOLOGIA DA PROSPERIDADE

4O. CAPÍTULO MAL AQUIAS 3:9,10

“Trazei todos os dízimos à casa do tesouro, para que haja mantimento na minha casa, e depois fazei prova de mim nisto, diz o Senhor dos Exércitos, se eu não vos abrir as janelas do céu, e não derramar sobre vós uma benção tal até que não haja lugar suficiente para recolherdes.” Malaquias 3:9,10

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A Teologia da Prosperidade nasceu nos Estados Unidos na década de 1940, na liderança do texano pentecostal Kenneth Hagin e também é conhecida pelos nomes Health and Wealth Gospel, Faith Movement, Faith Prosperity Doctrines, Positive Confession, ou Confissão Positiva, dentre outros. A doutrina reúne crenças sobre cura, prosperidade e fé, mas só se constituiu plenamente na década de 1970, quando encontrou apoio em grupos norte -americanos carismáticos. Kenneth se inspirou em Essek William Kenyon (1867-1948). Kenyon, por sua vez, inclinou-se aos ensinos de “seitas metafísicas”, derivados da filosofia do New Thought (ou Novo Pensamento), considerada como seita “manipulacionista” por alguns críticos. Essa, por sua vez, teve inspirações no espiritismo, ocultismo, hipnose e parapsicologia. A Teologia da Prosperidade, portanto, seria um resultado de tradições religiosas ocidentais, práticas esotéricas, paramédicas e de auto-ajuda, que viriam a influenciar muito o movimento pentecostal (MARIANO, 1999). Primeiramente, foi o televangelista Oral Roberts quem iniciou a pregação da doutrina da prosperidade, que prometia retorno financeiro muitas vezes maior do que o ofertado pelo fiel, e que prometia saúde perfeita, prosperidade material, triunfo sobre o Diabo e vitória sobre todo e qualquer sofrimento. O pregador começou a conceder maior prioridade à doutrina a partir de 1943, quando suas despesas aumentaram por causa de sua investida na TV. A origem da doutrina da prosperidade aconteceu em paralelo com a expansão do televangelismo nos EUA. Por causa do aumento da competição entre os televangelistas, o tempo na TV ficou muito caro para eles e o custo dos programas subiu mais que a audiência. Pressionados pelas despesas crescentes, que foram se tornando cada vez mais ambiciosas, os televangelistas aprimoraram as formas de levantar fundos, integrando os apelos financeiros à teologia. Assim, as exigências econômicas do veículo de transmissão da mensagem religiosa acabaram por moldar o conteúdo da teologia. Pode-se

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observar que ao entrar no Brasil, ela se disseminou, principalmente, pelos segmentos evangélicos mais ativos do televangelismo. No Brasil, a teologia inicia sua trajetória na década de 70, mas é sabido que desde a década de 1960, o missionário Robert McAlister, responsável por trazer a Igreja Nova Vida para o Brasil, que originou a IURD, como já falamos, já tratava a questão da prosperidade financeira no movimento pentecostal, sendo o pioneiro, mas não da teologia propriamente dita. Ele acreditava que para o fiel garantir um futuro financeiro, ele deveria pagar seu dízimo e realizar ofertas. A Igreja Universal foi uma das que abraçaram as ideias da teologia, sendo uma delas a ideia de que o plano de Deus é tornar o homem próspero em tudo. Muitas são as características teológicas que a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) abraçou da Teologia da Prosperidade e que eu pude confirmar no trabalho de campo realizado no Templo de Salomão. Os fiéis cristãos devem exigir de Deus as bênçãos de que têm direito, ao em vez de suplicar; o homem é tido como semelhante em natureza com Deus e, portanto, tem a mesma autoridade Dele; pelo meio do dízimo os indivíduos podem refazer sua sociedade com Deus, quase como sócios, para desfrutar das promessas bíblicas; os bispos exercem autoridade sobre o Diabo para que as promessas divinas se cumpram, entre outras. O bispo Edir Macedo afirma: “Quando pagamos o dízimo a Deus, Ele fica na obrigação (porque prometeu) de cumprir a Sua Palavra (…) Quem é que tem o direito de provar a Deus, de cobrar d’Ele aquilo que prometeu? O dizimista!” (MARIANO, 1999). O dizimista estabelece, assim, uma relação de sócio com Deus. Usando o versículo de Malaquias 3,9-10 para comprovar os pedidos constantes, essa teologia promete abundância aos fiéis que obedecem à Deus, ou seja, que são fiéis ao pagamento do dízimo e que também realizam as ofertas de “sacrifício” como a Fogueira Santa da Universal. Juntos, os fiéis que querem enriquecer são incentivados a trabalhar duro, a abrir negócios, a serem patrões e a aproveitar as oportunidades, sendo sempre estimulados

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a alcançar uma vida de bens materiais e luxo. Nos cultos de prosperidade no Templo, o bispo repetia sempre, durante muitas partes, que o fiel pode ser feliz e próspero tendo “carro do ano, relógios, roupas, casas” e ainda salientava, “olhe esse Templo, Deus abençoou o bispo Macedo e também pode fazer isso por você”. É bom ressaltar algumas coisas, todavia. Segundo a linha teológica aplicada nos cultos da Universal, quanto menos você “sacrifica”, menos serão suas possibilidades de ser abençoado, ao passo que quanto mais é dado (de dinheiro), mais é recebido (em bênçãos). Também, de acordo com dados da pesquisa Novo Nascimento do ISER, os adeptos da Universal (27%) contribuíam mais e em maior número do que os adeptos da Assembleia de Deus (14%) e 24% da Universal não contribuíam com nada, contra 33% da Assembleia. Cabe ressaltar que os crentes que mais doaram acima do dízimo (35%) são pessoas cuja renda não ultrapassa dois salários mínimos (MARIANO, 1999). Tendo como objetivo central de todos os seus cultos o estímulo da oferenda, os bispos, em nome de Deus, prometem bênçãos infinitas e lembram os fiéis, na mesma frequência, dos custos elevados das emissoras de rádio, TV e das contas a serem pagas. Nesse passo, quem não paga é acusado de roubar de Deus, não recebem as bênçãos e chegam a ser ameaçados com maldições (MARIANO, 1999). Em meio a críticas de diversos setores da sociedade e inclusive do próprio meio neopentecostal, que acusam a Universal de estelionato, charlatanismo e manipulação, os bispos da casa dizem que todas as ofertas e dízimos são feitos voluntariamente e, se você perguntar a algum fiel, como eu fiz ao casal entrevistado, eles não creem estarem sendo forçados a fazer nada contra sua vontade. Entre outras críticas, é dito que a teologia questiona a soberania de Deus, quando os bispos dizem ser seus representantes diretos na Terra. O engenheiro e teólogo que seguiu o caminho do marxismo, Bento Guerreiro, líder de célula da Igreja Videira da Rede Vinha Internacional, de Goiás, diz: “o

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que a Universal faz é uma heresia. Eles dizem que são Deus. Eles não crêem que Ele vai voltar, pregam no culto, mas não acreditam. O cristão tinha que ter prazer em morrer por Jesus, mas agora eles querem viver e ter shoppings centers.” (Veja a entrevista na íntegra em Anexo III) As lideranças religiosas, como da Universal, no entanto, têm sua parcela de culpa pois não apresentam relatórios financeiros aos membros. Desse modo, os fiéis não têm ciência das quantias de dinheiro que circulam pela suas igrejas. O neopentecostalismo e a Teologia da Prosperidade têm sua afinidade com o capitalismo, mas não no viés puritano da crença no trabalho. Baseiam-se na defesa da prosperidade como algo legítimo e mesmo desejável ao cristão, no estímulo ao consumo e progresso individual e em acentuado materialismo, ão tecendo críticas ao capitalismo nem às desigualdades sociais do mundo (MARIANO, 1999).

4.2 DO NEOPENTECOSTALISMO AO NEOLIBERALISMO O desenvolvimento da IURD nos últimos trinta anos pode ser explicado pelas transformações sócio-culturais que aconteceram no mesmo período que a integração da sociedade brasileira no contexto da economia neoliberal globalizada, em uma condição pós-moderna. O crescimento do pentecostalismo coincide com a era da globalização (MATTOS, 2013). Por ser o neoliberalismo um conjunto de ideias políticas e econômicas capitalistas que defende a não participação do estado na economia, onde deve haver total liberdade de comércio, para garantir o crescimento econômico e o desenvolvimento social de um país, a globalização neoliberal, que implica na “profunda problemática da comoditização de tudo”, na redução do estado de bem estar social, e os grandes fluxos de capital de investimento especulativo fizeram grandes rupturas nas vidas ao redor do mundo. O movimento Pentecostal achou novas demandas por significado em uma sociedade que

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se moderniza rapidamente e que se incorporou dentro das rupturas e fissuras que a globalização neoliberal acarretou, como a retirada do estado da esfera pública e a desregulamentação da mídia de massa estatal. O neopentecostalismo da IURD se configura como uma religião global, tendo em vista seu próprio nome, Igreja Universal do Reino de Deus. Adequado aos dilemas do capitalismo neoliberal, ele se aproveita de suas novas oportunidades. Além disso, pode-se notar, que os impactos da globalização no contexto do neoliberalismo global são maiores nos países onde a liberdade religiosa é maior, pois se formam “mercados religiosos” competitivos em um cenário no qual a participação da maioria das pessoas no mercado global de bens e riqueza se reduz à olhar as vitrines. O uso massivo da mídia eletrônica, incluindo a internet, permitiu que o pentecostalismo transnacional se tornasse virtualmente onipresente ao redor do mundo, 24 horas por dia, 7 dias na semana (MATTOS, 2013). Segundo o professor da UMESP, Paulo Ayres Mattos, “o consumismo precisa dos meios midiáticos, especialmente da TV, para vender a imagem da pessoa bem sucedida. Se você perceber, as propagandas não tem gente mal sucedida, não tem gente maltrapilha, pobre. Eu acho que a TV é um mecanismo, um instrumento fundamental para o neoliberalismo. Porque é a questão da massificação cultural” (veja a entrevista na íntegra em Anexo IV) Nesse mundo globalizado pós-moderno a lógica do Mercado domina todos os aspectos da vida cultural, há uma tendência a considerar tudo como commoditie que pode ser vendida ou comprada, incluindo a própria religião. Forçada a competir no mercado, a religião tende a se tornar outro produto de consumo dentro dos valores do Mercado; o crente é livre para escolher entre uma gama de possibilidades de crenças. É neste ponto que se assemelha ao capitalismo neoliberal: o neopentecostalismo incorpora políticas neoliberais, o que acontece em paralelo com a imposição de políticas neoliberais nas nações subdesenvolvidas por instituições financeiras, como o FMI e o Banco Mundial (MATTOS, 2013). A fim de responder às demandas do mercado, o consumo deve ser con-

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tinuamente sustentado pelo desejo, o desejo que deseja o desejo. O que acaba se tornando uma ideia involuntária e irracional que os adeptos da Igreja Universal compram, também, pela promessa de felicidade, seja de uma vida mais próspera pelo mercado ou pela política, o que pode explicar a vitória do candidato à prefeito pelo partido da Universal, Marcelo Crivella (PRB/RJ).

4.3 FETICHISMO DA MERCADORIA E ALIENAÇÃO DOS FIÉIS Como vimos nos capítulos anteriores, parte da esfera social que compõe o público da Universal é integrada por pessoas pobres, negras, marginalizadas e com baixa ou nenhuma escolaridade. São justamente as pessoas pertencentes à esfera social daquilo que o filósofo alemão Karl Marx qualificaria como os produtores alienados de mercadorias. São aqueles que vendem sua força de trabalho e criam a riqueza material, sem a possibilidade de usufruir dos frutos do seu esforço. A produção capitalista, diz Marx, desfigura o trabalhador, a partir do momento em que, ainda no processo produtivo, a mercadoria se encontra sob domínio do sujeito que trabalha, mas quando essa mesma mercadoria é posta à venda, em circulação, ela já não pertence mais ao produtor que a criou, ela se torna parte do ciclo do consumo. Por ser o trabalhador uma pessoa explorada, a mercadoria se afasta de sua realidade social, passa a integrar o ciclo do consumo, apresentada em formas sedutoras, nas vitrines, na TV, no rádio e na páginas de jornais e revistas (CUNHA, 2014). Esse processo, ainda segundo Marx, apaga o trabalho humano, físico e mental empregado na produção da mercadoria. A sedução, cujo ingrediente mais atraente é a promessa de felicidade a quem tomar posse do objeto de consumo – não importa se é uma peça de roupa, um calçado, um sabonete, um perfume, um carro -, adquire um valor abstrato, sem qualquer relação com o valor de uso. Uma mesa, por exemplo, terá o mesmo valor de uso, não

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importa o material do qual é feita, mas, obviamente, uma mesa de jacarandá custará muito mais do que uma de fórmica, pelos valores supostamente associados à posse do jacarandá: prestígio, riqueza, poder. Atribui-se portanto, ao jacarandá, um valor “mágico”, como aquele que os primitivos acreditavam estar embutido nos amuletos. A esse processo, Marx qualificou como “fetichismo” (ou enfeitiçamento) da mercadoria. O estímulo ao consumo e o acentuado materialismo que a Igreja Universal preconiza, seguindo a linha da Teologia da Prosperidade, seriam, de acordo com as teorias de Marx, incentivadores da alienação desses trabalhadores e da fetichização de bens e mercadorias, que acabam por dominar os fiéis que desejam carros, relógios e casas que, em primeira instância, foram eles mesmos que produziram. Com a particularidade de que, no caso da igreja, a fé serve como uma espécie de vetor, uma ferramenta de trabalho para garantir a posse do bem desejado, por meio de um compromisso com Deus. A IURD ocupa, assim, por meio dos cultos nos templos, ou por meio do televangelismo e de seu império de comunicação, uma peça fundamental numa engrenagem que promove um ciclo interminável de trabalho e doação de energias (na forma de dízimos e contribuições) por parte do público fiel. Trabalhar, sacrificar, pagar o dízimo, ganhar e consumir. A equação é permanentemente reforçada pelos rituais no Templo, nas pregações em reuniões como o Congresso Para o Sucesso, em peças de publicidade e propaganda mostradas pela televisão e via Youtube, como as filmagens de mansões e iates de luxo, mostrando lojas de marcas, carros, roupas e um estilo de vida altamente luxuoso.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao final desta pesquisa foi possível analisar que a investida da IURD nos meios midiáticos muito se relaciona com as políticas neoliberais implantadas no país no mesmo tempo que se iniciou o movimento do neopentecostalismo. A TV sendo um meio de disseminação do consumo é utilizada pela Igreja para propagar sua doutrinação consumista, a qual prega que a felicidade está na posse de bens materiais os quais serão conseguidos se o fiel obedecer o pagamento do dízimo, enriquecendo a Igreja. Ao mesmo tempo, concluí que a fé, na perspectiva consumista da Teologia da Prosperidade, deixa de ser a devoção incondicional a Deus ou a uma esfera transcendente – como no caso da obediência de Abraão, pronto para sacrificar o filho Isaac sem nada a obter em troca, nem sequer uma promessa –, para apresentar-se como uma chave para abrir a porta da esfera do consumo de mercadorias. Nessa medida, a própria fé se transforma em mercadoria, fetichizada em todo esse processo, contribuindo para a alienação dos adeptos da Igreja, que acabam sendo afastados do ciclo de mercadorias que eles próprios ajudaram a construir no sistema capitalista. A promessa de felicidade pelos meios da IURD como plano de poder do bispo Edir Macedo é propagada incessantemente e aguarda seus frutos com o passar do tempo, sendo a inserção da Igreja na política um deles, a partir do momento que o fiel acredita que o deputado ou prefeito escolhido pela Universal irá priorizar a felicidade que tanto se fala na Igreja e que ele concorda, o que pode explicar a vitória de Marcelo Crivella (PRB/RJ) para a prefeitura do Rio de Janeiro. O que vemos no público adepto da IURD são pessoas trabalhadoras alienadas que esqueceram seu papel na relação social da produção de mercadorias e que acabam sendo dominadas por elas, vendo pela TV que a felicidade está shopping mais próximo.

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BIBLIOGRAFIA ALEXANDER, A. F.. Religious Right: The Greatest Threat To Democracy. Colorado Springs: Blazing Sword Publishing Ltd., 2011. ARMSTRONG, Karen. Em Nome de Deus. São Paulo: Companhia das Letras, 2001. ARBEX, José. Fascismo cristão avança nos Estados Unidos. Caros Amigos. Ed. 191, São Paulo, 15 fev, 2013. BENJAMIN, Walter. O Capitalismo Como Religião. São Paulo: Boitempo, 2013. BUCCI, Eugênio. Sobre Ética e Imprensa. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. CUNHA, Cliciane Sampaio Pinheiro et al. Fetichismo e alienação do trabalho na atualidade a partir das concepções de Marx. In: Semana da Economia, 8, 2014, Vitória da Conquista. Anais…: UESB, 2014. CUNHA, Magali do Nascimento. O conceito de Religiosidade Midiática como atualização do conceito de Igreja Eletrônica: em tempos de cultura gospel. In: Congresso Anual em Ciência da Comunicação, 25, 2002, Salvador. Núcleo de Pesquisa Teorias da Comunicação: INTERCOM, 2002. MARIANO, Ricardo. Neopentecostais: a Sociologia do Novo Pentecostalismo no Brasil. São Paulo: Edições Loyola, 1999. MATTOS, Paulo Ayres. The Theology of Sacrifice of Bishop Edir Macedo: A Theological Critique. New Jersey: Drew University, 2013. Universal. Portal Oficial. Disponível em: <www.universal.org>. Acesso em: set-out 2016.

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ANEXO I ENTREVISTA COM MAGALI CUNHA

Professora de Comunicação na Universidade Metodista de São Paulo (UMESP) e líder do grupo de pesquisa Mídia, Religião e Cultura (MIRE) no Simpósio Internacional Religiões, Políticas e Mídias na América Latina, em outubro, em São Paulo.

ISABELA PALHARES – Professora, fale um pouco do movimento de entrada dos televangelistas norte-americanos no Brasil. MAGALI CUNHA - Os televangelistas norte-americanos entraram no Brasil por meio de programação de televisão de horário comprado seguindo as estratégias que eles já tinham, de ter uma presença lá nos EUA, no rádio e na TV. Na América Latina eles têm um projeto de inserção, nos grandes países daqui. E todos os grandes televangelistas entram então no país com sua programação nas redes de TV, eles não foram tão presentes no rádio. Realizando grandes cruzadas no Brasil em estádios de futebol. A programação da TV servia para recrutar esse grupos para quando eles viessem. Tem muita gente que acha e atribui à vinda dos televangelistas uma espécie de modelo pro Brasil, mas quando eles chegaram já existia no rádio muita programação e na TV o R.R. Soares já era um estouro midiático. Na realidade, o que acontece não é que eles vão copiar o modelo desses televangelistas, eles na realidade vêm para impulsionar isso que já existia no Brasil. ISABELA PALHARES - Você acha que desde esse momento de entrada

até hoje houve um impulso real do movimento religioso televangelista e, se sim, em qual direção? MAGALI CUNHA – Desde sempre essas características de pregação da cura e da prosperidade já estavam nesse trabalho dos televangelistas. O conversionismo é que se perdeu ao longo da trajetória no Brasil. Os pregadores midiáticos brasileiros não são tão conversionistas. Na verdade, a pregação maior é de convite para presença nas igrejas, mas não para

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aceitar Jesus. Busca-se um recrutamento de fiéis e, no caso da IURD, em relação com a coleta de ofertas, o que é importante para sobrevivência da igreja. Então a gente pode perceber o impulsionamento da abordagem da cura e da prosperidade no Brasil. ISABELA PALHARES – Você acha que a maneira que a Igreja Universal utiliza a televisão para cooptar fiéis é eficaz? MAGALI CUNHA – Creio que sim. A televisão é um veículo muito popular no Brasil e na América Latina, então essa popularidade torna possível a popularização desses grupos religiosos também. Então existe um público muito fiel em torno dessa programação tanto é que a IURD e a IIDG são igrejas fundamentalmente de televisão, cujos líderes se projetaram pela TV e tem público agregado em torno da TV e isso se deve ao fato de a TV ser um veículo popular. As pesquisas de mídia mais recentes mostram que 97% da população tem TV aberta. ISABELA PALHARES – O que acha da relação Rede Record-Bispo Macedo-Igreja Universal? MAGALI CUNHA – A Record é fundamental para os projetos da igreja. É uma rede secular de TV, não tem nada de religiosa. Então é uma forma de a igreja se projetar e fazer lucro, pois uma rede de TV dá muito lucro. Então a IURD lucra muito com a Rede Record, por conta de anunciantes, os programas que são vendidos para fora do Brasil. A Universal não é o carro chefe da Record. O carro chefe da emissora são os programas de entretenimento e o jornalismo. ISABELA PALHARES – O que acha dessa peregrinação religiosa da Universal para outros canais de TV? MAGALI CUNHA – É justamente para manter a presença na mídia e não comprometer a imagem da Rede Record. Porque sempre foi um projeto da igreja não ter a Record como rede religiosa. A igreja precisa da credibilidade da Record como rede secular para fazer lucro, para ter público, vender programa e ter anunciante, porque sendo uma rede religiosa nunca alcançaria um público grande e nem estaria na competição com a Rede Globo. Hoje ela é a segunda rede, porque ela é secular.

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ANEXO II

ENTREVISTA COM DEPUTADO JOÃO CAMPOS (PRB/GO),

Membro da Assembléia de Deus, presidente da Frente Parlamentar Evangélica (FPE) do Congresso Nacional, no culto da FPE no Congresso Nacional, em setembro, em Brasília. No dia da saída oficial da presidente impeachmada, Dilma Rousseff (PT).

ISABELA PALHARES – Deputado, o senhor poderia comentar a afir-

mação da advogada Janaína Paschoal, durante a fase final do impeachment de Dilma, em que diz: “Foi Deus que fez com que várias pessoas, ao mesmo tempo, cada uma na sua competência, percebessem o que estava acontecendo com o nosso país e conferisse a essas pessoas coragem para se levantarem e fazeram alguma coisa à respeito”. JOÃO CAMPOS – Penso que seja uma manifestação que traduz a formação dela, mas que traduz também a formação religiosa de mais 90% da sociedade brasileira, que é cristã, tem um povo que tem o Senhor como seu Deus a quem servimos. Sem outras considerações, eu acho que basta isso. Ela exprime um sentimento dela mas também um sentimento do povo brasileiro e eu concordo com ela. ISABELA PALHAREs – Eu sei que o senhor é o idealizador da PEC

99/2011 da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) e eu queria saber o que você acha do fato de a PEC tirar da responsabilidade do Estado a garantia dos direitos das religiões e passar para as Associações Religiosas. O senhor acha que essas Associações Religiosas zelariam pelos direitos das religiões e das igrejas de uma maneira melhor que o estado? JOÃO CAMPOS - O aspecto é criar uma ferramenta de proteção das religiões e da crença do culto das garantias constitucionais relacionadas ao exercício da fé. O constituinte elencou instituições, entidades e autoridades que podem ir ao Supremo Tribunal quando alguma garantia constitucional for violada, mas não o fez em relação aos municípios e as religiões. Então, nós

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religiosos não temos um ente próprio que possa ir reivindicar uma garantia violada. Por exemplo, a assistência religiosa em estabelecimentos de internação coletiva está no artigo 5 da constituição. São direitos constitucionais mas que estão relacionados aos religiosos desses país. Se em algum momento alguma lei violar ainda que parcialmente essas garantias, quem irá ao STF? Partidos? O Procurador Geral da República? Terá que ser uma entidade religiosa de caráter nacional. ISABELA PALHARES – Tendo em vista que a religião está muito envol-

vida com a política, o senhor não acha que interesses políticos dentro dessas associações religiosas podem acabar atrapalhando a aplicação da ADI? JOÃO CAMPOS – Não. Não vejo isso, porque se eu fosse considerar isso eu teria que tirar da Constituição Federal as confederações de âmbito religioso, pois lá tem muito mais política que nas igrejas. Você pega a CUT, é só política partidária, não de trabalhador. Não por isso o exercício de uma ADI junto ao STF pela CUT ficaria prejudicada. Não há nenhum risco nesse sentido. É um instrumento de proteção. ISABELA PALHARES – Tendo em vista que as organizações religiosas mais preponderantes são algumas selecionada, o senhor ainda acha que elas não interfeririam em nada? JOÃO CAMPOS – Não, porque estamos usando o mesmo critério que o constituinte adotou para as confederações que são entidades sindicais e para as de classe. Uma entidade religiosa de âmbito nacional não poderia ir ao STF por qualquer tema. Tem que seguir a pertinência temática. ISABELA PALHARES – O senhor não acha esse termo vago, tendo em vista que as igrejas seguem dogmas e condutas morais e, por exemplo, o tema do aborto fere algum desses dogmas? JOÃO CAMPOS – A igreja pode até dizer, mas quem decide é o Supremo e, por isso, não vejo problema. ISABELA PALHARES – A PEC passou no CCJ, na Comissão Especial e agora está no Plenário. O senhor acha que nessa transição da CCJ para

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a Comissão, a entrada do Eduardo Cunha na presidência da Câmara facilitou alguma coisa? JOÃO CAMPOS – Não necessariamente, assim como não temos ele como presidente e essa PEC será pautada. ISABELA PALHARES – Os deputados que têm mandatos e que têm apoio

da cúpula da igreja muitas vezes têm uma facilidade maior de atingir esses eleitores fiéis como servos de Deus na política para ajudá-los. E os deputados, a princípio, querem sempre respeitar a opinião do povo. Eu entendo que o senhor é a favor do impeachment. Creio que o senhor compreende que a presidente Dilma foi eleita pela opinião do povo com a maioria dos votos. O senhor não vê uma contradição nisso? JOÃO CAMPOS – Consulte o povo e veja se querem que ela continue ou não. E mais, ninguém votou na Dilma sozinha, os 54 milhões de brasileiros também votaram no Michel Temer e o povo pode mudar de opinião. O povo não quer que ela permaneça, as pesquisas indicam isso. De outro lado, a sua pergunta induz a dizer que o impeachment é golpe, que é a tese do PT. Golpe? É um instrumento constitucional. Não há contradição, ao contrário.

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ANEXO III ENTREVISTA COM BENTO GUERREIRO JÚNIOR

ser a presença do espírito santo, mas isso não devia ser usado de forma midiática, na minha opinião. O que a Universal faz é uma heresia. Eles dizem que são Deus. Eles não crêem que Ele vai voltar, pregam no culto, mas não acreditam. O cristão tinha que ter prazer em morrer por Jesus, mas agora eles querem viver e ter shoppings centers.

Ateu até os 40 anos, agora líder de célula da Igreja neopentecostal Videira, da Rede Vinha Internacional de Goiás, em entrevista em abril, em São Paulo.

ISABELA PALHARES – Fale um pouco sobre sua igreja. BENTO JÚNIOR – Minha igreja é nova, de 1997. Com 3 mil células,

nos reunimos em Goiânia toda quarta à noite. Conseguimos reunir 60 mil em um estádio se quisermos. Minha família também está inserida. Minha filha tem uma célula de jovens, mudou de escola e logo montou uma. Todo final de semana fazemos encontros com 200 pessoas, falamos com 1000 todas as semanas. ISABELA PALHARES – Vocês praticam o televangelismo? BENTO JÚNIOR - Nós não praticamos o televangelismo, havíamos co-

meçado mas paramo, pois é necessário um verdadeiro show, não é? Ele precisa ser retro-alimentado, precisa de um espetáculo, uma polêmica. Por mais que sejamos neopentecostais e que uma característica principal da vertente no geral seja esse uso da mídia, da TV e do teatro no culto.

ISABELA PALHARES – E a relação com a política? BENTO JÚNIOR - A minha igreja não se metia com política até o meio

do ano passado, mas começou a frequentar o Global Kingdom, que é uma reunião das maiores igrejas neopentecostais do mundo. E começou com conversas conservadoras. Eu tento combater a relação da minha igreja com a política, não acho saudável, Jesus não fez isso. ISABELA PALHARES – O que acha da atuação da IURD na mídia? BENTO JÚNIOR - Os avivamentos que ocorrem nos cultos podem sim

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ANEXO IV

ENTREVISTA COM PAULO AYRES MATTOS

Professor da Universidade Metodista de São Paulo (UMESP), mestre em Teologia pelo Christian Theological Seminary dos EUA e doutor em Filosofia pela Drew University do mesmo país. Tem trabalhos sobre a IURD. Em entrevista por telefone, em novembro, em São Paulo.

ISABELA PALHARES – Em quais pontos o neopentecostalismo se relaciona com o neoliberalismo no Brasil? PAULO AYRES - O neopentecostalismo só foi possível devido à hegemonia das políticas neoliberais que se fizeram presente no mundo com as eleições de Ronald Reagan nos EUA, em 1981 e Margareth Thatcher na Inglaterra, em 1979 e também pelo o que aconteceu no Brasil. Devemos levar em consideração que o neopentecostalismo vai atender nos seus primeiros anos uma demanda religiosa dos setores pobres da população brasileira que estavam sofrendo com as conseqüências da inflação especialmente no final do Governo Militar e na Nova República, tanto com o Sarney e o Collor, até o Plano Real. Então, nesse contexto dos 15 anos do fim da ditadura passando pelos dois primeiros governos do processo de democratização, foi que as populações mais pobres sentiram o impacto da crise dos anos 1970 e 1980. Com o presidente Collor, vão se intensificar as políticas neoliberais que também passaram pelo governo Fernando Henrique Cardoso em 1995 e que foram mantidas no governo Lula em 2003. Essa relação do neopentecostalismo com o neoliberalismo é em função de que os fenômenos se deram na mesma época e também por causa do contexto brasileiro mencionado acima. ISABELA PALHARES – Você acha que essa relação dos dois se torna

conveniente para o neoliberalismo? A partir do momento que a igreja estimula o mercado de bens e o que é estimulado não é a necessida-

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de e sim o desejo, o que pode fazer com que as pessoas comprem em quantidade o que não precisam. PAULO AYRES – Do ponto de vista religioso, sim. De uma certa maneira o neoliberalismo vai incentivar o que se chama de empreendedorismo, o self made man, o homem que se faz por si próprio, o que tem coragem e iniciativa, aquele que tem ousadia e que são palavras usadas frequentemente nas pregações neopentecostais principalmente na IURD. Creio que o neopentecostalismo é uma resposta ideológica às necessidades do neoliberalismo como ideologia, que tem que ser inculcada na cabeça das pessoas, nos seus corações e mentes. Aí, o neoliberalismo é um tipo de sistema que incentiva exatamente a questão do desejo, tendo em vista toda a propaganda que é feita em função da vida, que é vivida de maneira regada a uma série de vantagens materiais, roupas, etc. ISABELA PALHARES – A promessa de felicidade do neopentecostalismo acaba sendo a mesma promessa de felicidade do neoliberalismo? PAULO AYRES – Exatamente. Isso é importante no sentido de que um casa com o outro. O neoliberalismo como uma questão de política econômica e o neopentecostalismo como uma proposta religiosa nesse contexto neoliberal. ISABELA PALHARES – Acha que essa semelhança com o neoliberalismo pode ser um dos fatores que ajudaram no crescimento da IURD? PAULO AYRES – Evidentemente que sim. O próprio bispo Edir Macedo se apresenta como uma pessoa que prosperou, que melhorou de vida, que teve coragem, que teve fé, a fé que move montanhas. Então eu acho que isso é muito próprio do neopentecostalismo e essa visão do neoliberalismo, de certa maneira, criou as condições para que o neopentecostalismo e a IURD em específico pudessem se beneficiar. ISABELA PALHARES – A alienação dos adeptos da IURD, segundo as ideias de Marx, também se dá pela TV? O que você acha da eficácia desse meio? PAULO AYRES – Essa é outra coincidência importante. O consumismo

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precisa dos meios midiáticos, especialmente da TV, para vender a imagem da pessoa bem sucedida. Se você perceber, as propagandas não tem gente mal sucedida, não tem gente maltrapilha, pobre. Vai ter sempre gente feliz, artistas, de sucesso, como Neymar, Messi, Cristiano Ronaldo, que são pessoas que estão presentes nessa propaganda televisiva. Então a TV hoje ela vende aquilo que é importante para a economia neoliberal. Vemos que não existe neopentecostalismo sem televisão. Não há qualquer pregador bem sucedido do ponto de vista do neopentecostalismo que não tenha um programa de televisão. Começa no rádio, que também é muito importante. Isso é muito próprio pois a TV se impôs como meio de comunicação do consumismo dos anos 80 para cá, antes não havia isso. Hoje, além do comercial que se faz nos intervalos dos blocos, elas estão mesmo dentro dos programas. ISABELA PALHARES – Hoje a TV está inserida em 98% dos lares brasileiros. Você relacionaria essa inserção da TV na sociedade como um reflexo neoliberal e, portanto, benéfico para esse sistema? PAULO AYRES – Olha, eu acho que é um mecanismo, um instrumento fundamental para o neoliberalism, porque é a questão da massificação cultural. ISABELA PALHARES – O que você acha desse ciclo interminável de

trabalhar, sacrificar, pagar o dízimo, ganhar e consumir, que acaba sendo estabelecido? PAULO AYRES – É um ciclo vicioso, viciado. É como uma espiral que sempre volta ao mesmo ponto, sem fim. O Macedo diz que se deve sempre estar disposto a aceitar novos desafios para que você faça novos sacrifícios para que então você possa estar prosperando cada vez mais. Então, isso é parte da ideologia. ISABELA PALHARES – Você concorda que a própria fé se transforma em mercadoria, a partir do momento que se apresenta como uma chave para abrir a porta da esfera do consumo de mercadorias e deixa de ser uma devoção incondicional a Deus? PAULO AYRES – É claro, porque a fé racional do Macedo não é uma fé

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como tradicionalmente a religião cristã fazia que era a salvação após a morte. A salvação é aqui e agora, segundo ele. Então nesse sentido a fé é um elemento muito importante nessa cadeia de comoditização dos bens simbólicos, a própria fé vira uma mercadoria. ISABELA PALHARES – Faça uma análise breve da eleição vitoriosa

para prefeito do Marcelo Crivella (PRB/RJ) no Rio de Janeiro. PAULO AYRES – A eleição do Crivella é o resultado de uma proposta do bispo Macedo, que ele fez já há mais de seis anos atrás em seu livro Plano de Poder. No livro ele expõe o programa político da IURD e diz claramente que “já temos diversos representantes no Congresso na Câmara e no Senado. Temos muitos deputados nas Assembléias Legislativas, temos vários Vereadores. É chegado o momento de nós começarmos a disputar os cargos do poder executivo. Nós já temos uma massa crítica suficiente para aspirar a conquista de cargos mais altos. E ele vem tentando isso há algum tempo. Dominam a política no RJ, especialmente com o Sérgio Cabral e depois com o Eduardo Paes. Esse vazio político que foi criado o Crivella se apropriou e, na minha opinião, foi para o segundo turno e conseguiu fazer alianças. Ele consegue recuperar uma aliança que aconteceu com o Cabral. Nesse momento, me parece que a eleição do Crivella é simplesmente a concretização de uma proposta do Macedo. Então, o equívoco do PRB em São Paulo, foi não ter um candidato como Crivella. O Russomano não tem a estatura do Crivella. A verdade é que a IURD poderia ter eleito os dois prefeitos das duas maiores cidades, mas em SP, o João Dória (PSDB/SP) saiu atropelando. Mas o bispo vai continuar seguindo nessa direção. A eleição do Crivella foi a concretização de um plano que o Macedo já traçou há alguns anos atrás e, se vai dar certo ou não, temos que esperar para ver o que vai acontecer. Eles prometeram o céu na Terra, mas está difícil de conceber essa visão.

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ANEXO V 00:00 - 00:30 00:30 - 01:00 01:00 - 01:30 01:30 - 02:00 02:00 - 02:30 02:30 - 03:00

2a.f - 6a. f

Rede Record Sábado Domingo

2a.f - 6a. f

Rede TV! Sábado

Domingo

2a.f - 6a. f

TV Gazeta Sábado

Band Domingo 2a.f - 6a. f Sábado

Fala que Eu Te Escuto

Fala que Eu Te Escuto

Programação Universal

IURD

Universal Bíblia em Foco

17:30 - 18:00 18:00 - 18:30 18:30 - 19:00 19:00 - 19:30

IURD

IURD

Escola do Amor Responde Programa do Templo

09:30 - 10:00

17:00 - 17:30

21:30 - 22:00 22:00 - 22:30 22:30 - 23:00 23:00 - 23:30 23:30 - 00:00

70

2a.f - 6a. f

Record News Sábado Domingo

2a.f - 6a. f

Rede 21 Sábado

Domingo

Congresso para o Sucesso

Congresso para o A Última Pedra Sucesso Pontos de Luz Pontos de Luz Congresso para o Terapia do Amor Sucesso

Nosso Tempo

Nosso Tempo

Escola do Amor Responde

Nosso Tempo

Pontos de Luz

Congresso para o Congresso Sucesso para o Sucesso

Congresso para o Sucesso Nosso Tempo Pontos de Luz

IURD

Programação da IURD 24 horas com intervalos comerciais

Retratos de Família

IURD The Love School

Nosso Tempo

IURD

Escola do Amor Responde Escola do Amor Responde

A Última Pedra Terapia do Amor Nosso Tempo Congresso para o Sucesso Congresso para o Sucesso

IURD

Pontos de Luz

Escola do Amor Responde

A Última Pedra Nosso Tempo Escola do Pontos de Luz Amor Pontos de Luz Responde

19:30 - 20:00 20:00 - 20:30 20:30 - 21:00 21:00 - 21:30

Rede Família Sábado

Nosso Tempo

IURD

Santo Culto em Seu Lar

06:00 - 06:30

10:00 - 10:30 10:30 - 11:00 11:00 - 11:30 11:30 - 12:00 12:00 - 12:30 12:30 - 13:00 13:00 - 13:30 13:30 - 14:00 14:00 - 14:30 14:30 - 15:00 15:30 - 15:30 15:30 - 16:00 16:00 - 16:30 16:30 - 17:00

Domingo

Pontos de Luz

Programação Universal

05:00 - 05:30 00:00 - 06:00 06:30 - 07:00 07:00 - 07:30 07:30 - 08:00 08:00 - 08:30 08:30 - 09:00 09:00 - 09:30

CNT Sábado

Nosso Tempo

03:00 - 03:30 03:30 - 04:00 04:00 - 04:30 04:30 - 05:00

Domingo

Nosso Tempo IURD

Escola do Amor Responde

Congresso para o Sucesso

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