CAPÍTULO 2 • ÁREAS PROTEGIDAS
Corredor de diversidade socioambiental do Xingu
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ocalizado na região central do Brasil, entre os estados de Mato Grosso e Pará, está um dos maiores mosaicos contínuos de áreas protegidas do planeta, onde uma extraordinária biodiversidade de espécies, paisagens e processos biológicos - que ocorre entre os biomas Cerrado e Amazônia - está intrinsicamente ligada a uma sociodiversidade peculiar. Estendendo-se por mais de 28 milhões de hectares e incidindo sobre 40 municípios, o corredor de diversidade socioambiental do Xingu é formado por 20 terras indígenas (TIs) e 10 unidades de conservação (UCs) de diferentes categorias. A formação deste corredor se deu ao longo dos últimos 50 anos, como resultado de atos governamentais fragmentados, tomados em diferentes momentos da história do processo de ocupação regional e baseados em diferentes legislações voltadas ao reconhecimento dos direitos territoriais de populações tradicionais que habitam a bacia do Xingu e à proteção da biodiversidade regional. Sua constituição se inicia com a criação do Parque Indígena do Xingu (PIX) em 1961, concebido na época como Parque Nacional do Xingu. Uma figura híbrida, com as finalidades de proteção ambiental e so-
brevivência social, política e cultural das populações indígenas que habitavam a região. Sua existência só foi possível devido ao grande empenho de personalidades brasileiras articuladas pelos irmãos Villas Bôas, em busca da delimitação de um espaço reservado para os povos do Xingu que estavam ameaçados. Na época, a legislação preconizava a integração dos povos indígenas à sociedade brasileira e seus direitos territoriais eram vistos como transitórios, baseado no entendimento de que os povos indígenas pertenciam ao passado e não ao futuro do Brasil. Embora o Parque tenha confinado índios de várias etnias em um território muito menor do que aquele que habitavam tradicionalmente, impondo perdas territoriais importantes para esses povos, sua criação significou uma ousadia política para época, vindo se constituir num espaço incontestável de proteção para as etnias que lá viviam e para aquelas também ameaçadas na sua circunvizinhança, se tornando uma referência para legislações futuras, que possibilitariam o reconhecimento e demarcação de outras terras indígenas. Na década de 1970, o Estatuto do Índio definiu um arcabouço jurídico que possibilitou avanços no reco-
nhecimento dos direitos territoriais dos povos indígenas, com mais clareza e agilidade dos ritos administrativos para reconhecimento desses territórios. A Constituição de 1988 veio mudar o paradigma herdado do período colonial, que preconizava a “integração” dos povos indígenas à comunhão nacional, vindo definitivamente reconhecer e proteger seus direitos territoriais e sua diversidade cultural, política e social.
SIGLÁRIO Funai: Fundação Nacional do Índio Snuc: Sistema Nacional de Unidades de Conservação Ibama: Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis ICMBio: Instituto Chico Mendes de Proteção à Biodiversidade
TERRA DO MEIO
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Terra do Meio é uma vasta região de florestas com baixa densidade populacional, localizada na bacia do rio Xingu no sudoeste do Pará, entre o rio Xingu e o rio Iriri, seu principal afluente da margem esquerda. Sua extensão representa aproximadamente 6% do território do estado. Ela abrange grande parte dos municípios de Altamira e São Félix do Xingu e uma pequena parte do município de Trairão. Sua colonização foi dificultada pela existência de um conjunto de terras indígenas situadas ao norte e pelas terras dos Kayapó, localizadas ao sul. Sua ocupação se intensificou no final da década de 1990, através da estrada Transiriri, aberta por interesses minerários e madeireiros, que passou a ligar a cidade de São Félix do Xingu ao rio Iriri, cortando o que hoje é a Área de Proteção Ambiental (APA) do Triunfo. Com isso, teve início um dos maiores processos contemporâneos de grilagem de terras públicas do Pará (ver Situação fundiária caótica, pág. 32). Em 2002, teve início o processo conduzido pelo Ministério do Meio Ambiente que resultou na transformação dessa região num mosaico de unidades de conservação.
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De Olho na Bacia do Xingu
© Cristina Adams/ISA. BARRA DO VENTO, RIOZINHO DO ANFRÍSIO, ALTAMIRA (PA), 2002.