Estudo Desenvolvimento e Migrações – Contradições e Tendências | #CoerêncianaPresidência

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(Raty e Shilhav, 2020). Em alguns países africanos, a UE tem exercido pressões para aprovação de leis de criminalização de migrantes, o que pode ter reflexos no comércio e circulação transfronteiriça, prejudicando as prioridades africanas de aumento da mobilidade. No que respeita a África, a UE tem sugerido também a criação de “plataformas de desembarque” em solo africano, algo que tem sido rejeitado por esses países. Todas estas evidências apontam para uma afetação da ajuda ao desenvolvimento que não segue o princípio (formalmente proclamado) de se centrar nas comunidades e países que mais necessitam dessa ajuda68. Desde logo, a negociação de programas de ajuda ao desenvolvimento em troca de cooperação nas políticas migratórias envia o sinal de que a vida das pessoas dos países em desenvolvimento é menos importante do que os objetivos da UE no plano das migrações. Além disso, a condicionalidade de projetos ou programas de ajuda ao desenvolvimento coloca em risco os princípios de eficácia do desenvolvimento, aprovados a nível internacional, nomeadamente a necessidade de apropriação e de alinhamento com as prioridades dos países parceiros69. 2.3. VIOLAÇÕES DO DIREITO INTERNACIONAL, CRIMINALIZAÇÃO DOS MIGRANTES E DA AJUDA HUMANITÁRIA A União Europeia tem tolerado políticas e medidas discriminatórias e desproporcionadas por parte de alguns Estados membros, bem como sustentado várias dessas medidas através de incoerências das suas políticas migratórias, fazendo escolhas políticas que não estão alinhadas com os valores fundamentais europeus da solidariedade e dignidade humana, e com custos humanos graves70. Desde logo, as deportações forçadas de migrantes, quer os chamados “pushbacks” para países de trânsito (maioritariamente a Líbia, mas também a Turquia e o Líbano), quer o retorno para alguns países de origem (como o Afeganistão ou a Síria) constituem uma violação do direito internacional, nomeadamente do princípio de “não-repulsão”, ou seja, da garantia que as pessoas regressam a locais onde a sua segurança e proteção da sua vida estão asseguradas71. As Nações Unidas, nomeadamente através da OIM e UNHCR, têm condenado o retorno forçado de migrantes para a Líbia e o respeito por este princípio internacional. As violações de direitos humanos das pessoas migrantes e refugiadas no espaço europeu são variadas, desde casos de detenções de menores não acompanhados (o que é ilegal segundo o direito internacional), a contenção dos migrantes por tempo indeterminado, ou

Nomeadamente, várias reuniões de direção do Fundo Fiduciário de Emergência para África têm debatido a necessidade a afetar os fundos a regiões ou países específicos de acordo com as nacionalidades daqueles que chegam à UE por via do Mediterrâneo (Raty e Shilhav, 2020).

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Mais informação sobre os Princípios internacionais da Eficácia do Desenvolvimento em: https://www.effectivecooperation.org/landing-page/effectiveness-principles

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Em 2019, um conjunto de advogados interpôs uma ação no Tribunal Penal Internacional acusando a EU de crimes contra a Humanidade em resultado das suas políticas migratórias. Saber mais em “Between Human Rights and Border Control: the EU Migration Policies in the Mediterranean on Trial”, 21.10.2019.

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Em julho de 2021, o governo do Afeganistão solicitou que os países europeus suspendessem as deportações de migrantes para o país, que são usuais, devido ao aumento da violência. Em abril de 2021, o governo dinamarquês decidiu não renovar as autorizações de residência a alguns refugiados da Síria, por considerar que algumas regiões do país já tinham condições de paz para o seu regresso. Em junho, o governo greco declarou a Turquia como um local seguro para os refugiados.

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