Estudo Desenvolvimento, Comércio e Finanças | Desigualdades e Incongruências

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remotas, onde não existem instituições financeiras, ou mesmo para as populações mais pobres e marginalizadas nas zonas urbanas, que têm grandes dificuldades de acesso a crédito, por exemplo, o fácil acesso a telemóveis e as inovações nos serviços financeiros digitais têm contribuído grandemente para a sua inclusão financeira. A África e a Ásia, regiões do mundo onde se registam maiores dificuldades de inclusão financeira e de cobertura da internet, são também as regiões onde o uso de telemóveis e das transações financeiras digitais mais têm crescido, pelo seu baixo custo e facilidade de acesso. Estima-se que o alargamento das finanças digitais possa, até 2025, disponibilizar acesso a serviços financeiros a 1,6 mil milhões de pessoas, gerar 95 milhões de novos postos de trabalho em vários setores, e contribuir para a coleta de impostos e a mobilização de recursos financeiros internos, os quais poderão ser afetados a prioridades essenciais para o desenvolvimento humano, como a saúde e a educação22. 1.1. IMPACTO DA PANDEMIA DE COVID-19 A pandemia de COVID-19, sendo uma crise de saúde a nível global, tem causado danos profundos e, em grande medida, irreversíveis nos sistemas económicos mundiais, sendo que alguns desses danos correspondem à aceleração de tendências já existentes. Em geral, os efeitos da pandemia têm-se manifestado num retrocesso dos progressos de desenvolvimento alcançados a nível global (estimando-se uma regressão de até três décadas em alguns indicadores, com o desenvolvimento humano a registar a primeira descida desde 1990), num aumento das bolsas de pobreza em todo o mundo e da pobreza extrema23, bem como das desigualdades, num conjunto de efeitos que poderão ser sentidos por mais de uma década (PNUD, 2020). Os impactos são mais alargados, profundos e persistentes nas pessoas que já viviam em situação de maior vulnerabilidade e nos países com menor resiliência a choques externos, onde os sistemas orçamentais, tributários e de proteção social já eram mais frágeis. Os efeitos da pandemia realçam a tendência geral de financeirização da economia mundial, ou seja, a forma como a indústria financeira se tornou dominante nas decisões políticas e económicas, alimentando um crescimento insustentável. As lições da crise de 2008-9 não foram aprendidas, pois a retórica de mudança não correspondeu a novas regras e práticas de distribuição de rendimento e poder económico, continuando a tendência de aumento das desigualdades (CNUCED, 2020a). Os graves custos de um sistema fiscal internacional programado para priorizar os interesses das empresas e indivíduos mais ricos ficaram mais expostos com a pandemia, de tal forma que, embora a riqueza mundial tenha diminuído logo a partir dos primeiros meses de 2020 (Crédit Suisse, 2020b), a riqueza dos chamados ultrarricos aumentou 3,9 biliões USD entre 18 de março e 31 de dezembro de 2020 (Oxfam, 2021)24 – sendo a sua riqueza total (quase 12 biliões USD) agora equivalente ao que o

Para uma análise aprofundada das questões da digitalização das economias e a inclusão financeira em África, ver por exemplo Africa’s Development Dynamics: Digital Transformation for Quality Jobs, OCDE/União Africana, janeiro de 2021, disponível em https://bit. ly/3aFDfNu

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Em dezembro de 2020, o PNUD estimava que o número de pessoas em situação de pobreza extrema (menos de 1,90 USD/dia) possa aumentar 200 milhões esta década, totalizando quase mil milhões de pessoas até 2030.

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Por comparação, na crise de 2008-9, a riqueza dos multimilionários demorou 5 anos a recuperar para níveis pré-crise (Oxfam, 2021).

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