Hoje Macau 20 JUL 2012 #2656

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sexta-feira 20.7.2012

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Arnaldo Gonçalves

opinião

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crepúsculo dos ídolos

Silly Season

P

ARECE uma verdade de La Palisse mas a política não se dá bem com o calor. Não sei se as altas temperaturas obnubilam as mentes e perturbam o raciocínio mas existe uma coincidência objectiva entre calor e os disparates que os actores políticos proferem nesta época. Uso “actores” não num sentido alegórico mas literal. É como se pondo-se em bicos dos pés e elevando a voz umas oitavas os políticos ganhassem maior auditório e aqueles cinco segundos que obtêm na abertura dos jornais os deixasse absolutamente extasiados. É como que um clímax depois de uma movimentada noite de copos. Os ingleses têm uma expressão bem apanhada para isto. Chamam-lhe a “silly season”, a época “tonta” numa tradução simpática, ou “idiota”, numa tradução mais próxima do sentido etimológico. Trocando por miúdos, uma época em que nada de definitivamente importante acontece, em que o centro noticioso se preenche com banalidades. Esta é uma verdade geral, independente das latitudes. Atravessa continentes e é comum a todas as raças, nacionalidades e preferências políticas. Em Portugal, a época da “silly season” começou com a licenciatura de um político, em funções de ministro. Segundo relatam as peças efervescentes de jornal que se preze ou canal que se afirme, foi conseguida com um séquito de equivalências à experiência do político em causa e com um diminuto número de exames. Ao caso uma Universidade privada rapidamente eleita pela turba (esse superlativo patológico da indignação) como traça de todos os escândalos, de todas as mistificações e perversões. Na voragem das notícias e da indignação, multiplicada até à exaustão por blogues, comunidades do Facebook e por esse espaço educadíssimo que se chama zona de comentários dos jornais on-line, parecia que o jovem político havia cometido o crime do século, a ofensa intolerável que merecia exemplar castigo. Explodia a turba “demita-se”!. Ora como tantas vezes acontece nesta feira parola que é o espaço público em Portugal, os mirones que há um ano e qualquer coisa se exasperaram com um ataque a um outro político, desta vez engenheiro e socialista, que havia obtido uma licenciatura em engenharia numa outra universidade privada com expedientes não menos “católicos”, não perderam um segundo para virem a terreiro denunciar o escândalo e o caso como um comportamento indigno do Ministro e uma violação ética incomportável.

Para ajudar à festa um eclesiástico, bispo das Forças Armadas, escolheria o momento do disparate nacional para vir a terreiro disparar um chorrilho de acusações vulgares de corrupção e má política como se a batina que enverga o ilibasse da fraqueza do insulto, da acusação torpe, do enxovalho ao Primeiro-Ministro. Esquecendo que a instituição a que pertence também deu várias parangonas jornalísticas com abusos de poder e crimes contra menores, ou com a gestão ruinosa e tráfico de influências no banco da Santa Sé. Em Portugal campeia a maledicência e a inveja, multiplica-se a calúnia e o julgamento apressado sobre quem tem visibilidade pública. Como se tudo fosse permitido, como se não houvesse que responder criminalmente por acusações torpes ao bom-nome das pessoas. Naquela forma tão cobarde de quem se indigna, levanta a voz e acusa mas quando confrontado foge cobardemente, dando o dito pelo não dito, refugiando-se nas cambiantes da retórica para disfarçar o seu “animus nocendi”. Entraremos no fim deste mês de Julho no “intermezzo” da política activa e não posso deixar de endereçar votos que esse descanso devolva a razão aos espíritos exaltados, modere o uso da palavra e do insulto, porque como diria o poeta aqui não há santos ou pelo menos nunca se revelaram. O país precisa de serenidade, de confiança, de trabalho e de menos discursos e julgamentos públicos. Teremos ao que tudo indica um ano difícil pela frente. A Europa não dá sinais que se liberta das grilhetas da crise financeira e orçamental que a tem coarctado. Depois da Grécia, a bola de neve da insolvabilidade passou para Espanha e para Portugal. A solidariedade europeia, essa muleta discursiva mil vezes acenada e mil vezes negada, espera melhores dias e uma renovação dos mandatos políticos. Depois da Grécia e da Espanha, a Alemanha, a Itália e a Holanda em eleições de carácter regional ou local. O próprio processo de integração europeia entrou num impasse como a última cimeira europeia o bem demonstrou. Importa equacionar um conjunto de questões decisivas para o futuro da Europa que têm de ser respondidas a 27 vozes. O que será Europa numa dúzia de anos? Será o Presidente da Europa eleito por sufrágio directo e universal? Evoluirá o Parlamento Europeu para uma estrutura bicamaral, com uma câmara eleita pelos eleitores e outra representando os Estados-membros? Haverá uma união fiscal? Os pontos estão em cima da mesa porque a crise financeira os empurrou para lá. Os europeus estão sozinhos perante o seu próprio destino.

Em Portugal, a época da “silly season” começou com a licenciatura de um político, em funções de ministro. Segundo relatam as peças efervescentes de jornal que se preze ou canal que se afirme, foi conseguida com um séquito de equivalências à experiência do político em causa e com um diminuto número de exames

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