SAMOS Magazine

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N 1 JUNHO/SETEMBRO

R$ 45,00

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SAME OLD SH*T

afeto afeto afeto afeto afeto afeto


o que te afeta?


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SU MÁ RIO

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o que te inspira?

RONY HERNANDES & ADEY

o que te inspira?

AS CORES DE CLEMENTINE KRUCZYNSKI

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o que te afeta?

MOONLIGHT

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o que te afeta?

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JEAN MICHEL BASQUIAT


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o que te afeta?

AMR LIVRE TIETA LIVRE

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o que te afeta?

O IMPÉRIO EFÊMERO PÁGINA 3

o que te afeta?

A SUTENTÁVEL LEVEZA DO SER

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o que te inspira?

FEITO A MÃO

SU MÁ


EXPEDIENTE Redator-Chefe: Tayná Santos Editores Executivos: GuAilherme Aquino Editores: Tayná Santos, Guilherme Aquino. Repórteres: Mono no Aware, Psicologia das Cores blog, Robin Batista, Renato Cunha, Tayná Santos, Katherine Brooks,Fashion Theory Núcleo de Revisão: Guilherme Aquino, Tayná Santos Foto de Capa: ADEY

Redação e Correspondência: Rua Pitu São Paulo, SP, Conj 111, CEP: 04567-060. Publicidade: São Paulo e informações sobre representantes de publicidade no Brasil e no Exterior: www.hestia.com.br Atendimento ao Assinante: Grande São Paulo: (11) 4556-6661 – Demais localidades: 0800152436 www.hestia.com Para assinar: Grande São Paulo: (11) 2568-9798 – Demais localidades: 0800-775 Assine Héstia: www.assinehestia.com Licenciamento de Conteúdo: Para adquirir os direitos de reprodução de textos e imagens de EXAME acesse: www.hestiastock.com


CARTA DO EDITOR

Algo que não é apenas ou puramente sentimento. Afeto, de “afetar”: pra filosofia - mais especificamente, pra Spinoza - um corpo afeta e é afetado por outro corpo. Uma existência afeta a outra, e por ela também pode ser afetada. Afeto é, logo, também, transformação. Conhecer alguém, sentar-se junto, conversar, almoçar, dormir lado a lado - con-viver - transforma os indivíduos. Toda ação compartilhada é uma espécie de ponte, de transição, entre um Eu antigo, e um novo Eu que surge. Transformações, afetos, encontros. Pra filosofia, um encontro pode ser negativo ou positivo. Nós, que temos em nós potência de vida, de ação, podemos ter essa potência aumentada ou diminuído por conta desses encontros, afetos, positivos ou negativos.

Com o tema central AFETO surgiu a idéia de dividir a revista em duas partes

O QUE TE AFETA?

O que te afeta? A pergunta é feita pois muitas vezes não vemos a forma que afetamos e somos afetados por decisões e atitudes coletivas, tudo o que te afeta é dito em forma de alerta - o que te afeta, afeta o mundo inteiro também, e por isso as mensagens positivas estão categorizadas como:

O QUE TE INSPIRA?

O espírito artístico anseia mudança e benevolência e devemos sempre nos inspirar no bom, buscando o crescer e florescer, sempre.


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06 RONY HERNANDES A fotografia se tornou parte da sua vida quando notou que podia transpassar o que sentem e o que sentia com tal objeto denominado câmera, em mãos. Se expressa por meio dos autorretratos e de retratos das histórias dos outros contadas junto às dele.


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ADEY Com uma formação em performance, coreografia e dança contemporânea, os trabalhos fotográficos de AdeY estudam temas como o equilíbrio, a força e a física do corpo humano. Aqui eles fotografam e retratam o corpo em sua forma mais pura - nu, despido e nu. O trabalho procura criar uma representação nãosexualizada e de mente aberta da humanidade, baseada num sonho de aceitação.


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10 AS CORES DE CLEMENTINE KRUCZYNSKI Como falar das cores de Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças e não se lembrar dos cabelos coloridos de Clementine Kruczynski? A paleta de cores do filme é, no geral, fria e monótona, o que faz a personagem sobressair naquele contexto. Além do cabelo, seu figurino faz uso de cores mais quentes do que seu parceiro Joel Barish. O filme em si traz um ar azulado, nos trazendo um aspecto frio para o filme. O “calor” das cores chega com a personagem Clementine, sempre usando mais de uma cor chamativa.

Sabendo que boa parte do filme se passa na cabeça de Joel, enquanto suas memórias com Clementine estão sendo apagadas e ele tenta conseguir uma maneira de guardar alguma coisa, o azul como atmosfera escolhida é perfeito. Assim como a água, o ar é transparente. Se colocar um pote de vidro vazio (com ar) ele é transparente, da mesma forma como um pote de vidro cheio de água. No entanto, quanto mais fundo o lago/oceano, mais azul ele parece ser. O azul é gerado pela reprodução infinita de qualquer material transparente, o que nos faz achar que o azul é grande. Além disso, quanto mais fria uma cor, mais distante ela parece ser. Todas as cores vão parecer mais tristes e azuladas se estiverem longe. Isso se dá devido a uma camada de ar na frente do objeto. Por conta desses aspectos, o azul nos traz uma ilusão do espaço, o fazendo parecer ser infinito. A primeira vez que Clementine aparece no filme seu cabelo é azul. Como


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inglês é derivada do nome da cor e significa triste e melancólico. Clementine está vivendo esse momento, mesmo sem se lembrar o motivo. Além do término do relacionamento, ter apagado dois anos com Joel de sua memória a torna sem esperança e completamente passiva com a vida. Inclusive, o nome da tinta azul, como ela mesma diz no filme é “ruína azul”, o que já dá para imaginar o tipo de vida que ela vem levando. O acorde da esperança é verde-azul-amarelo. Apesar do verde ser a cor mais intensa e reconhecida como esperança, existe azul ali. Isso se dá porque o verde é o resultado da mistura entre azul e amarelo. No fim do filme, quando Clementine e Joel resolvem ficar juntos, apesar de tudo, o cabelo azul responde a essa pitada de esperança. A diferença é que o verde é a esperança de um recomeço, a ansiedade e felicidade de dar certo. Nesse caso, os personagens já sabem que lá na frente vai dar errado, mas preferem arriscar por acreditar que os momentos bons valem à pena. Diferente de quando se conhecem pela primeira vez, quando o cabelo de Clementine é verde e eles não têm noção do que vai acontecer no

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sabemos que a história não é linear, essa não foi a primeira vez que os dois se viram. Quando Joel e Clementine se conheceram, seu cabelo era verde. Mas o filme começa a partir desse segundo encontro, sem saber que já se conheciam. Após o término do relacionamento, Clementine apagou Joel de sua memória e, em seguida, ele fez a mesma coisa. Nada mais frio do que isso, né? A frieza do azul nos remete quando sentimos frio, pois nossa pele e lábios ficam azulados. Além disso, a neve e o gelo possuem uma cintilação que é azul. O branco não transmite frieza porque o branco também é luz. Já o azul, é a sombra. Na pintura clássica, a sombra era pintada de marrom ou preto. No Impressionismo, o preto foi abolido e o marrom substituído por azul. As cores do cabelo de Clementine, mais do que falar sobre a personalidade dela, como ela mesma diz no filme, fala sobre o atual momento em que ela vive e ajuda o espectador a se localizar na cronologia do filme. Sempre que a razão tem que superar a paixão, o azul é a cor principal. O azul é uma cor cerebral, cor da ciência, inteligência, frieza e passividade. A expressão “blues” em


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futuro. Apesar de ser uma cor fria, o verde pode ser uma cor tranquilizadora. Ao lado do laranja é uma cor refrescante, agradável, divertido, aconchegante e amável. Não é à toa que Clementine veste essas cores quando conhece Joel pela primeira vez. O verde é a cor simbólica da natureza, por isso representa a relação e proximidade com a natureza, uma das razões pela qual o casal se encontra em uma praia. O verde não é uma cor passiva nem ativa, é a cor do meio: entre a passividade do azul e a impulsividade do vermelho. O verde é a cor da espera, mas da animação e da torcida para que as coisas aconteçam. Mesmo o verde e o azul sendo cores frias, não necessariamente seus significados são sempre ruins. O cabelo verde de Clementine se chamava “verde revolução”, não sabemos ao certo se ela já estava vivendo uma revolução ou se estava a espera de uma. De qualquer forma, o verde era algo bom, diferente da tinta “ruína azul”. Após se conhecerem na praia, o segundo encontro se deu quando Joel foi à procura de Clementine na loja.

A personagem já tinha mudado a cor do cabelo, que dessa vez era uma cor quente: vermelho, a depender da luz, um rosa-avermelhado. O rosa clássico é uma cor em que todos os sentimentos relacionados são positivos, é uma cor sensível, charmosa e gentil. O tom rosa-clássico não é o mesmo do cabelo de Clementine. A tinta “ameaça vermelha”, como o próprio nome diz, tem um pé no vermelho. Mas apesar do nome, a cor que vemos na tela flerta com o rosa e o vermelho. O acorde do amor é composto por duas cores, vermelho (em maior escala) e o rosa. O vermelho do amor, unido ao rosa, transmite inocência e sedução. Já o rosa, com um pouco de vermelho, transmite ternura, feminilidade e doçura. Além de todas as cores estarem de acordo com a personagem, o rosa forte é uma cor atraente.


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Após essa cor, Clementine migrou para o “laranja agente”, nome que ela mesmo inventou. Joel a chamava de Tangerina, devido a coloração do cabelo. Vale lembrar que o laranja é composto pela mistura do amarelo e do vermelho. O laranja ainda lembra um vermelho desbotado, como se todos os sentimentos da tintura anterior estivessem perdendo a intensidade. Por outro lado, o laranja é uma cor que não se leva a sério, por essa razão, não é uma cor recomendada para artigos caros pois a cor ridicularizaria o objeto em questão. Nesse momento o relacionamento de Joel e Clementine não andava muito bem. O laranja é a cor da comunicação, mas os dois não estavam se comunicando direito. Em determinado momento Joel diz à Clementine que falar sem parar não é o mesmo que se comunicar. O laranja é

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Eternal Sunshine of the Spotless Mind- Michel Gondry

cor da transformação. Essa transformação do relacionamento parte da própria transformação de cada personagem. O relacionamento se desestabiliza e traz à tona algumas desconfianças. O namoro termina na cor laranja. O laranja é a cor complementar ao azul. Segundo Van Gogh, não existe laranja sem azul. Enquanto o azul é silencioso, o laraja é radiante. Após o “laranja agente”, Clementine tinge o cabelo de “ruína azul”, como vemos no início do filme. Em sua primeira cena, veste o casaco laranja que compõe junto ao cabelo azul. Por serem cores complementares, o laranja atua de forma mais radiante com o azul. Apesar disso, seu humor fica azul pós-término e pós experimento de apagar Joel da memória em um experimento da Lacuna Inc.


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14 MOONLIGHT A humanidade do jovem negro. “Em certo momento você precisa decidir quem você quer ser! Você não pode deixar ninguém tomar essa decisão por você”. Essa é uma das frases mais marcantes de Moonlight, filme do diretor Barry Jenkins, que conta a história do jovem negro Chiron em 3 fases de sua vida – infância, adolescência e juventude.


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adolescência e na vida adulta. É a partir dessa fase que ele é obrigado a lidar com vários outros tipos de pressão e violência, ao mesmo tempo em que vê no seu amigo Kevin alguém em quem ele pode confiar, e é com ele que tem a oportunidade de explorar e tentar entender sua sexualidade pela primeira vez. Chiron é, desde a infância, ridicularizado por aparentar ser gay, mesmo que ele nem entendesse direito o que é ser gay. Na adolescência, é agredido frequentemente por outros jovens negros que não o aceitam por isso. Acuado, sem perspectivas, ele recorre também à violência como resposta e cai em uma vida de mais marginalidade por conta disso. Esse tipo de masculinidade rude, agressiva, que nos destrói por fora e por dentro, é imposta a todos nós pelo racismo (com machismo, homofobia e outras coisas que venham do mundo branco) e muitos dos nossos vão ser instrumentos dessa imposição. E tanto a violência que vem do mundo quanto aquela que desenvolvemos como resposta limitam nossas potencialidades como humanos. Homens negros não podem amar, não podem demonstrar sensibilidade, não podem compartilhar afeto. Homens negros tem que ser fortes, duros e insensíveis o tempo todo. Somos violentados física e psicologicamente desde que nascemos e essa violência acaba desabando nas famílias e mulheres pretas ao nosso redor. Nos fechamos, nos endurecemos, nos proibimos e reprimimos qualquer tipo de afetividade ou fragilidade que possa mostrar que somos sensíveis e, portanto, humanos. Sendo assim, um homem negro também não pode não ser hétero, por que isso afronta padrões de sexualidade, afetividade, cultura e comportamento que o racismo nos impôs. E o que Moonlight faz é mostrar como essa masculinidade deformada e imposta ao homem negro é moldada por um mundo racista que confina pessoas negras a viver em um ambiente de violência e miséria.

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Na infância, conturbada pela ausência do pai e pelos problemas enfrentados pela mãe, o tímido menino faz as primeiras perguntas através das quais ele começa a tentar entender quem ele é. E é já nessa primeira parte que o filme nos desafia a enxergar todos os temas que veremos a seguir para além de “recortes” que categorizam (e diminuem) pessoas negras. Um elenco negro faz com que o racismo nem apareça enquanto dilema, mas ele está ali: limitando a trajetória dos homens e mulheres do filme. Os dramas da comunidade negra não reduzem os personagens a estereótipos. Tudo está debaixo das lágrimas, eclode em um ou outro grito, em um ou outro diálogo mas permanece guardado. Moonlight não é um filme que fala apenas sobre sexualidade, como algumas resenhas tem classificado de forma rasa, mas sobre a humanidade de pessoas negras, particularmente de um jovem negro, com toda a complexidade que isso traz consigo. O filme mostra como um ambiente de violência, pobreza e de família desestruturada ajudam a construir um determinado tipo de masculinidade imposta aos meninos, jovens e homens negros. Não dá pra entender Moonlight sem esse olhar, sem entender que sobre aquele humano são forçados certos perfis por conta do contexto racial em que vive – e que mesmo assim ele continua humano. E é nessa situação em que Chiron vai se ver na


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sobre se reconhecer na negritude do outro De alguma forma, Moonlight mostra a desconexão entre as pessoas negras como uma fragilidade que nos torna mais vulneráveis como indivíduos e como comunidade. É quando não nos reconhecemos no outro e não enxergamos mais humanidade entre nós. Paula, mãe do protagonista, é uma mulher divorciada e viciada em drogas que não aceita que Chiron possa ser gay. Mas é uma mulher negra, abandonada e fragilizada, como muitas das nossas mães negras, que se vêem na missão impossível de proteger e cuidar da família, ao mesmo tempo em que não tem quem as proteja. E, nos conflitos com a mãe, Chiron acaba encontrando alguma referência positiva em Juan e Teresa, que se tornam como família para ele. Mas, apesar disso, a construção de Chiron como pessoa está sempre ligada a quem é sua mãe. Não é por acaso que a vida desse jovem volta a ter uma perspectiva positiva quando ele enxerga a humanidade de sua mãe, apesar dos erros que ela possa ter cometido, e se enxerga nela. Na ausência do pai, Chiron tem Juan como uma figura paterna que o guia em meio a todas as dúvidas

que ele começa a ter sobre quem ele é já no início do filme. Aqui Moonlight explicita a importância dessa figura na vida de um jovem negro – e o impacto de sua ausência. O momento mais simbólico disso é quando Juan ensina Chiron a nadar. Nos EUA, 70% das crianças negras não sabem (e/ou tem medo de) nadar e isso é um trauma histórico que vem da soma dos afogamentos de pessoas negras durante escravidão e segregação, e do fato de que até os anos 60 negros eram proibidos de frequentar piscinas ou praias públicas. Por isso, o mar se tornou símbolo de perigo e nadar virou um trauma para muitos afro-americanos. Juan, ensinando Chiron a nadar e se manter confiante no mar é um símbolo explícito da figura do homem negro guiando e protegendo seu filho em meio a um mundo racista que ameaça o afogar o tempo todo. O problema é que Juan é um vulto, ele não dura muito tempo na vida de Chiron – e isso também é muito simbólico. Muitos de nós não temos essa figura paterna e Moonlight mostra nessa cena como a construção da

Moonlight - Barry Jenkins

nossa masculinidade, como homens negros, muitas vezes é feita de restos, ausências e vácuos afetivos quase nunca preenchidos de verdade. Mas e se nós tentarmos preencher esses vazios entre nós, nos apoiando e compartilhando o que há de positivo em nós, mudando a imagem cristalizada pelo racismo que temos de nós mesmos? Nós, homens negros, somos diversos. E, para nos respeitar como humanos, é preciso respeitar nossa diversidade. O que significa também saber se enxergar no outro homem negro ou na mulher negra, mesmo com nossas diferenças. É nos permitir a liberdade de sermos quem quisermos ser, de extrapolar as fronteiras que o racismo nos impõe. Moonlight, ignorando estereótipos superficiais e humanizando seus personagens, nos lembra que quando nos reconhecemos em outras pessoas negras nós podemos redescobrir e recuperar a humanidade que nos foi negada. Parece simples, mas nós, homens negros, temos muito o que pensar sobre toda a complexidade disso: sim, nós somos humanos.


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18 JEAN MICHEL BASQUIAT Como Jean-Michel Basquiat ultrapassou o limite do que é ser um artista norte-americano.

Jean-Michel Basquiat, saudado como o primeiro artista negro famoso a abrir caminho no mundo predominantemente branco das galerias de arte de Nova York, fez história quando um quadro seu foi vendido pelo incrível valor de US$110,5 milhões.

Após a venda, que foi um recorde para a casa de leilões Sotheby’s, Basquiat (que morreu em agosto de 1988, aos 27 anos e no meio de uma carreira meteórica) tornou-se oficialmente o artista americano cujo trabalho alcançou opreço mais alto em um leilão de arte. Nascido no Brooklyn, Nova York, em 1960, Basquiat é descrito com frequência em termos do que foi e do que conseguiu se tornar, muito antes de ter “destronado” Andy Warhol para tornar-se o criador da arte que, de


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fato, tem a cara do que é a América. “Como um jovem grafiteiro rebelde passou de vender desenhos por 50 dólares em 1980 a ter uma pintura leiloada esta semana por impressionantes 60 milhões de dólares?”, indagou o New York Times antes do leilão em 18 de maio. Mesmo quando Basquiat ainda era vivo, críticos se surpreendiam com sua ascensão da condição de sem-teto e desempregado para o status de celebridade inacreditável, vendendo telas individuais por valores muito baixos

aos 24 anos. Basquiat falava abertamente de seu passado traumático, da violência doméstica que sofreu na infância por parte de seu pai, que era haitiano, e das crises de doença mental de sua mãe, porto-riquenha. Ele entrou em contato com a arte e com línguas estrangeiras quando ainda era criança (falava francês, espanhol e inglês com fluência) e demonstrava grande habilidade em ambas, mas na adolescência fugiu de casa e abandonou a escola secundária. Basquiat vendia camisetas e cartões postais na rua, pouco antes de ele e um amigo adotarem o pseudônimo artístico SAMO e espalharem seus grafites pelo SoHo, um bairro cheio de galerias de arte e galeristas cuja atenção queriam chamar, em Nova York. Desse modo, Basquiat se tornou conhecido: ele colocou sua arte em evidência, para que fosse impossível deixar de vê-la. Ele pintou sua tela de US$110,5 milhões quando tinha apenas 22 anos. Nessa época, já havia pichado “SAMO JÁ MORREU” numa parede da baixa Manhattan, anunciando o fim da colaboração que chamou a atenção de Nova York. Basquiat já havia passado a ter contato direto com artistas, escritores e outras celebridades da época ― Andy Warhol, o apresentador do programa de TV “TV Party” Glenn O’Brien, Blondie, David Bowie, o marchand Larry Gagosian. Ele já levara seus trabalhos explosivos a galerias em mostras solo aclamadas pela crítica – uma fusão punk de neo-expressionismo e primitivismo, com cores fortes, pinceladas maníacas e rostos e corpos esqueletais. Sua arte (milhares de pinturas e desenhos), suas palavras, seu corpo, até mesmo seu cabelo, em pouco tempo passaram a integrar os próprios alicerces da cultura pop da época. Glenn O’Brien, que escreveu o roteiro do filme Downtown 81, estrelado por Basquiat, colocou a popularidade do artista em perspectiva: “Basquiat tem tantos fãs quanto Bob Marley”.


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Sua ascensão ao estrelato artístico foi rápida, mas hoje, décadas após sua morte, seu legado é ainda maior; o impacto inegável que ele teve sobre o mundo das artes é muito mais impressionante que sua habilidade em infiltrar nesse mundo rapidamente. Em seus poucos anos de ação, Basquiat trabalhou incansavelmente, fazendo performances, networking e arte, para mostrar sua visão ao mundo –uma visão que incluía a condenação do passado racista dos EUA e a história de brutalidade policial do país, além da celebração de heróis negros e de eventos que, de outro modo, estariam ausentes das paredes de galerias. Basquiat utilizava materiais recuperados

Jean Michel Basquiat Art

e técnicas de grafitagem para inserir a política nesses espaços impecáveis. Um trabalho em particular, “Defacement (The Death of Michael Stewart)” (Desfiguramento [A morte de Michael Stewart]), registrou a morte de um grafiteiro negro espancado por policiais de Nova York até morrer. “Poderia ter sido eu”, disse Basquiat, em frase que reverbera hoje. “Poderia ter sido eu.” Antes de morrer de overdose de heroína, Basquiat manteve relações complicadas com o mundo artístico racialmente segregado, fato iluminado em seus obituários. “Basquiat seria o único artista negro a sobreviver ao rótulo de grafiteiro e a encontrar um lugar permanente como pintor negro no mundo artístico branco”, diz um obituário. Hoje seu lugar nesse mundo frequentementeé usado como o prisma através do qual podemos enxergar o establishment de arte contemporâneo – como ele mudou e como não mudou.


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“Não havia como não enxergar Basquiat”, Jordan Casteel disse ao Guardian.”Ele estava em toda parte e garantia que todos o vissem. Hoje será a mesma coisa, não haverá como não nos enxergar. Vocês vão nos enxergar. Nós, como artistas negros, vamos continuar a lutar por essa visibilidade, e podemos fazê-lo, mas isso também vai significar que o mundo da arte ‘mainstream’ precisa aceitar que há mais do que alguns poucos de nós e que há talentos reais lá fora.” Quase 30 anos após sua morte, a obra de Basquiat e sua ética de trabalho estão longe de esquecidas. Ele superou Andy Warhol, ultrapassando postumamente os preços obtidos em leilão pelos trabalhos de outros artistas “quintessencialmente americanos” (leia-se: brancos e homens) como Jackson Pollock, Mark Rothko e Robert Rauschenberg. Enquanto a pop art de Warhol abraçava o brilho do consumismo, permitindo que seus compradores

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ricos sentissem que estavam captando suas brincadeiras, as telas violentas de Basquiat faziam críticas fortes ao poder, colonialismo e conflito de classes, de modo que o espectador que realmente olhasse atentamente raramente podia passar adiante sem ficar marcado. O mercado de arte e as instituições que lhe dão suporte ainda têm um longo caminho a percorrer em matéria de inclusão – e, de muitas maneiras, funcionam como um reflexo mais divertido dos Estados Unidos e seu avanço lento em direção à mesma inclusão. Enquanto isso, porém, o mercado coroou Basquiat como o artista americano máximo, e somos gratos por isso.


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22 TIETA LIVRE AMR LIVRE As influências de um jovem negro na arte O Lambe-Lambe faz parte do cotidiano paulistano, são anúncios, mensagens e ilustrações que atualmente passaram a integrar a identidade visual de lojas e até mesmo o metrô. O fato é que: O lambe-lambe, com seu viés artístico faz parte da aleatoriedade urbana, trazendo cor e respiro ao nosso cotidiano. Partindo dessa premissa, trouxemos a história do Roni Evangelista @ron1son como forma de compreender e exaltar o trabalho de quem traz cor à cidade cinza.

Eu sou o Ronison Evangelista Da Silva todo mundo me chama de Roni ou de Ronilson, sou o caçula de 3 irmãos, tenho 22 anos e moro em um Brechó no extremo Oeste de São Paulo (Itapevi). E minha ligação com arte veio através da minha facilidade de aceitar a exclusão. pois quando eu era criança e não me encaixava no grupo de crianças do meu irmão mais velho por ser um pouco “viadinho” também não me encaixava no grupo de amigas da minha irmã por ser o caçula dedo-duro. Venho de uma família de não artistas, minha mãe que de todas as pessoas da minha família é a que mais tem ligação com arte por ser costureira, fora isso tive um tio que roubou um quadro do Candido Portinari em 2007 no MASP, e ele está preso até hoje por isso. Essa foi o mais perto que minha família esteve envolvida com arte até eu começar a falar.


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Tive um pequeno incentivo na moda, eu passei dos 12 aos 16 e 17 anos desenhando croquis mas sempre brisei nas artes de rua. No ano em que eu mais me aprofundei com a arte foi em 2017 quando minha mãe foi diagnosticada com câncer de mama, Minha mãe sempre foi a mais forte de todas as pessoas que conheci, ela nos criou sozinha sem a ajuda do meu pai que só voltou para minha vida após estarmos grandes. Ela não aceitou a doença e infelizmente buscou respostas no álcool. Eu via aquela super mulher forte perdendo o poder. O momento em que isso aconteceu eu não estava tão presente na vida dela, tinha saído de casa para me dedicar aos estudos e estava no período final do curso. Ela teve todo o apoio do meu padrasto, a que acompanhava ela nas

sessões de quimioterapia todos os dias. Eu passava o dia com a cabeça atoa pensando em formas de ajudar ela, foi ai que criei a Tiêta, a Tiêta era nada mais nada menos do que a figura de uma mulher ciclope com cara de brava e com peitos de fora que levava no peito a mesma cicatriz que minha tinha. Criei lambe-lambes com a imagem da Tiêta, eu pintava eles em qualquer papel que eu tinha... E sai então pra colar eles na rua e comecei a traçar o caminho que ela levava de casa ao hospital, ao longo do tratamento as Tiêtas não paravam de aparecer cada vez em mais lugares e iniciei esse projeto durante todo o período de tratamento dela. Ela via na Tiêta a força que ela sempre teve e por algum motivo estava apagada. Quando minha mãe teve alta eu dei um fim ao projeto, e me orgulho de dizer que ele acompanhou a trajetória dela no tratamento. Nos vandalismos da rua tive o prazer de conhecer muita gente que me influenciou a continuar a caminhada na rua e até hoje eu colo lambe-lambe só que não colo mais a Tiêta, agora é outras brisas.

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Foto por Iwintolá


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Foto por Margareth Burton


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25 O IMPÉRIO EFÊMERO A indústria do fast-fashion além das aparências

O fast-fashion tornou as roupas mais baratas, a produção ágil, a tendência mais curta e o descarte mais rápido do que nunca. O fato é: Essa forma de produção e consumo trás consequências socio-ambientais gigantescas.

Longe vão os dias em que as pessoas compram roupas e as usam por anos. Em um mundo de demanda acelerada por vestuário, os consumidores querem e podem pagar mais por roupas novas, depois de usar as roupas apenas algumas vezes. Modelos inteiros de negócios são construídos sob a premissa de fast fashion, fornecendo roupas de maneira barata e rápida aos consumidores por meio de ciclos de moda mais curtos. Esse modelo linear de compra, uso e descarte rápido de roupas afeta negativamente as pessoas e os recursos do planeta. Aqui está uma olhada nas implicações econômicas, sociais e ambientais:


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Foto por Solitary Center

Os impactos sociais

A produção de roupas ajudou a estimular o crescimento nas economias em desenvolvimento, mas um exame mais detalhado revela uma série de desafios sociais. Por exemplo: 75 milhões de pessoas estão fazendo nossas roupas ho je, e 80% das roupas são feitas por mulheres jovens com idades entre 18 e 24 anos. Trabalhadores de vestuário, principalmente mulheres, em Bangladesh fazem cerca de US $ 96 por mês. Um um trabalhador de vestuário precisa de 3,5 vezes esse valor para viver uma “vida decente

Mais de 80% das pessoas que trabalham com vestuário são do sexo feminino com instalações básicas”. Um relatório de 2018 do Departamento de Trabalho dos EUA encontrou evidências de trabalho forçado e infantil na indústria da moda na Argentina, Bangladesh,

Brasil, China, Índia, Indonésia, Filipinas, Turquia, Vietnã e outros países. O rápido consumo de roupas e a necessidade de entregar ciclos curtos de moda estressam os recursos de produção, geralmente resultando em cadeias de suprimentos que colocam os lucros à frente do bem-estar humano. Assumir recursos infinitos em um mundo finito não é um modelo de negócios sustentável. Além das preocupações ambientais, o consumo descontrolado prejudicará as metas econômicas e sociais do mundo. Algumas empresas de vestuário irão ignorar esses sinais


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A economia

Os impactos ambientais

A produção de vestuário também é intensiva em recursos e emissões. Considere isso: Roupas descartadas feitas de tecidos não biodegradáveis​​ podem permanecer em aterros por até 200 anos. São necessários 2.700 litros de água

para fazer uma camiseta de algodão, o suficiente para atender às necessidades de consumo de uma pessoa média por dois anos e meio. Até 2030, haverá 5,4 bilhões de pessoas na classe média global , acima dos 3 bilhões em 2015. Podemos esperar um aumento na demanda por roupas e outros bens que definem os estilos de vida de renda média. Se o consumo continuar na taxa atual, precisaremos de três vezes mais recursos naturais até 2050 em comparação com o que usamos em 2000.

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e continuar com os modelos de negócios tradicionais de produção de roupas descartáveis. Outras adotarão modelos inovadores que trabalham dentro dos limites planetários e são mais adequados para os mercados do futuro.

Segundo relatório da Fundação Ellen McArthur, a produção de roupas dobrou nos últimos 15 anos, impulsionada pela crescente população de classe média em todo o mundo e pelo aumento das vendas per capita nas economias desenvolvidas. Um aumento esperado de 400% no PIB mundial até 2050 significará uma demanda ainda maior por roupas. Esta poderia ser uma oportunidade para fazer melhor. O relatório descobriu que lidar com problemas ambientais e sociais criados pela indústria da moda proporcionaria um benef ício total de US $ 192 bilhões para a economia global até 2030. O valor anual de roupas descartadas prematuramente é de mais de US $ 400 bilhões. Então o que fazer? Vestuário é apenas um setor competindo por recursos naturais, mas é importante que os fabricantes de roupas comecem a transformar seus modelos de negócios agora, dada a forte trajetória de crescimento do setor. Muitas empresas estão cientes dos riscos ambientais e estão prontas para agir. O primeiro passo é que as empresas mensurem seus impactos ambientais e entendam as áreas em que podem melhorar. O Índice Higg da Sustainable Apparel Coalition permite que as empresas meçam os impactos ambientais, sociais e trabalhistas de seus produtos e serviços.


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20% da água poluída industrialmente vem do tratamento e coloração de tecidos O trabalho está sendo feito com base na orientação das Metas Baseadas na Ciência para a indústria do vestuário . Algumas empresas estão trabalhando para melhorar sua eficiência de recursos. A H & M e a Zara, as maiores rede de fast fashion do mundo, juntaram-se a outras 33 empresas de moda, prometendo aumentar sua reciclagem de roupas até 2020 e estão coletando e reciclando roupas usadas em muitas de suas lojas. O próximo passo é reconhecer que as empresas devem fazer mais do que melhorar a eficiência para atender de forma sustentável a demanda nos próximos anos. Hoje, segundo a Associação Brasileira da Indústria Têxtil, o Brasil é o único país no ocidente a executar a cadeia completa da moda, ou seja, sustenta, internamente, desde a plantação de algodão e produção de fios e fibras, até confecções, varejos e desfiles de moda internacionais. No país, o setor é o segundo maior empregador – perdendo apenas para alimentos e bebidas – e conta 1,479 milhão de trabalhadores diretos e 8 milhões

indiretos (dos quais 75% são mão de obra feminina).Fora do brasil, as empresas tercerizam mais e precisam produzir menos. Algumas empresas já reconheceram isso e estão testando novos modelos, embora esses exemplos ainda sejam a exceção e não a regra. O programa Worn Wear da Patagonia oferece um serviço para consertar roupas antigas em vez de apenas vender roupas novas. Empresas de slow-fashion estão surgindo e para manter a indústria de

vestuário viável no futuro, a questão do consumo deve ser trazida à tona e deve começar agora. Este é apenas o começo da transformação radical necessária. Para atender à demanda futura de roupas de maneiras inovadoras, as empresas precisarão fazer o que nunca fizeram antes: projetar, testar e investir em modelos de negócios que reutilizem roupas e maximizem sua vida útil. Para empresas de vestuário, é hora de interromper ou ser interrompido.


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A SUSTENTÁVEL LEVEZA DO SER Slow-Fashion, sociedade e ambiente O Slow Fashion quer que o usuário tenha uma maior consciência e permite também que os designers e estilistas façam produções mais lentas e em pequena escala, permitindo que a mão de obra envolvendo a produção das peças seja bem remunerada, sua criação seja consciente e o usuário possa a manter por mais tempo, para isso, algumas questões são levadas em conta

Valorização de recursos locais

Valorizar consumidores, produtores e recursos naturais locais, em contraposição à produção globalizada, é uma alternativa à padronização, à centralização e à produção de produtos idênticos. Isso dá origem a ideia de “sociedade multilocal” e uma “economia distribuída”, em que o global é composto por uma rede de sistemas locais. No slow fashion, tudo o que está disponível localmente é utilizado da melhor forma possível, e o que não pode ser produzido localmente é tro-

cado e compartilhado, dando origem a uma sociedade simultaneamente local e cosmopolita - onde o termo “cosmopolita” abrange a diversidade, em oposição à homogeneidade, implícita na globalização. No modelo slow fashion, a transparência procura informar a origem real dos produtos: em vez de omitir a origem da produção com nomes genéricos de um estilista ou marca, por exemplo, a referência é dada a empresas de menor escala: um modelo mais transparente. Além disso, ao diminuir intermediadores no processo de troca das mercadorias, o consumidor se aproxima do produtor. Com esse estreitamento de vínculo, os produtores sentem a responsabilidade de produzir​​com qualidade, pois os produtos serão consumidos por pessoas que eles conhecem, e os consumidores sentem uma responsabilidade em relação aos produtores, que são membros de sua comunidade. Além do mais, quando se evita intermediações nas trocas, o produto tende a encarecer menos e o produtor se valoriza mais.

Foto por Maria Romero Studio


FAST FASHION O Fast-Fashion cria uma produção infinita em um mundo finito. Os impactos ambientais são irreversíveis.

uma camiseta usa 2720 litros de agua para ser feita - o que uma pessoa consome em três anos-

20% da água poluída industrialmente vem da indústria têxtil

A produção e consumo dobraram nos últimos 18 anos

As pessoas que produzem essas roupas sofrem com cargas horárias excessivas, má infra-estrutura

por Tayná Santos

Mais de 300.000 toneladas de roupas usadas são jogadas no lixo anualmente


Materiais organicos são utilizados, diminuindo o uso de sintéticos e corantes

O impacto ambiental é reduzido, pois a proposta é que cada um possua o necessário para suas necessidades e gosto

O trabalhador têxtil local é valorizado, recebendo um valor justo por seus serviços

Valorizar e reformar as peças que já temos.

95% das roupas descartadas podem ser recicladas.

SLOW FASHION O movimento Slow-Fashion cria propostas mais conscientes de consumo, visando diminuir o impacto da indústria têxtil.


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Foto de Henry Matisse


33 FEITO À MÃO A história das manualidades e a forma que permanecem presentes na contemporaneidade

Antes da revolução industrial, o artesanato era um trabalho masculino, com o crescimento fabril o trabalho artesanal caiu em desuso. No mundo moderno, o artesanato tem tomado novas proporções e funções

Durante a Primeira Guerra Mundial as mulheres são inseridas no mercado de trabalho e com seu fim são retiradas novamente, ou seja, a liberdade e independência financeira foi dada e retirada em pouco tempo. Com a volta para casa, todas as manualidades - que muitas vezes faziam parte da educação dada às meninas - deixaram de ter o fim apenas decorativo e tornou-se produto. A decoração das casas permanecia, as manualidades eram aplicadas das mesmas formas com um diferencial; o trabalho artesanal passou a ser uma moeda de troca, permitindo que as mulheres possuíssem maior independência financeira e que seu dinheiro fizesse parte do orçamento familiar.


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Foto de Atelier Átomo

70% dos artesãos são do sexo feminino Uma das principais manualidades incubidas as mulheres foi o bordado, que além de forte valor estético possui raízes culturais gigantescas. Talvez você já tenha visto sua mãe, avó ou bisavó bordando. Talvez tenha visto aquela senhora vendendo panos de prato, almofadas e colchas bordadas e achado lindo.E existem roupas, quadros, sapatos, acessórios e uma vasta gama de produtos feitos atraves da tecnica e dentro do mundo

Foto de Atelier Átomo

contemporâneo não devemos esquecer da importância que o bordado e ofícios manuais tiveram no processo de emancipação feminina. O bordado possui uma função estritamente ornamental e é visto até hoje como uma atividade feminina, e por isso digo: você pode ter visto uma mulher próxima de ti realizando tal ofício. Atualmente existe uma vasta gama de pontos, e a enorme possibilidade de aprendermos pontos de outras culturas - e isso permite que o bordado entre em contato direto com a arte,servindo como suporte para construção de uma linguagem visual única e cheia de elementos culturais e sociais importantes. Todos nós deveríamos ter contato com atividades manuais, conhecer e


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Bordar é um ato solitário, longo e detalhado

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até mesmo experimentar-las; na infância elas auxiliam no desvolvimento da coordenação motora fina e durante toda nossa vida podem se tornar um refúgio, proporcionando momentos de concentração e calma, além da possibilidade de ser mais uma forma de se expressar artísticamente. O artesanato tem se reinventado e além de servir como fonte de renda para muitas pessoas tornou-se uma forma de expressão para diversos artistas, mostrando que conhecer o passado é importante para que construamos um futuro mais rico culturalmente

Bordar é arte?

“Bordar é uma arte”, declara Maria da Paz, passirense, bordadeira desde os 11 anos. “Bordar é uma coisa prazerosa, a gente se apaixona quando começa a fazer, porque você vê um negócio se transformando nas suas mãos. As pessoas que conhecem o bordado valorizam, quem não valoriza tanto somos nós mesmas, talvez. Porque é uma cultura tão tradicional, não tem em todo lugar.” Nas mãos de artistas mais novos, o bordado ganhou novas formas, se relacionou com outros movimentos e linguagens.

Foto de Clube do Bordado


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