dificuldade em imaginar o que poderia ter acontecido num lugar tão familiar, algo que justificasse me chamarem tão cedo. Mas quando perguntei a Flavio sobre isso, ele se contentou em balançar a cabeça e apertar o passo. Talvez seu pai tivesse sido chamado para pôr ordem em uma briga de vagabundos? Ao chegarmos à praça pela Via dei Burrò, compreendi que se tratava de algo muito mais sério. Cerca de trinta pessoas estavam reunidas em volta da coluna, a maioria em roupas de festa, com estranhas máscaras de animais penduradas na barriga. Algumas mulheres colocavam as mãos na cabeça, e os homens olhavam aturdidos para o céu. Guardas armados cercavam o monumento como se temessem que algo escapasse dali. O mais estranho era aquele silêncio que paralisava a todos. – Lá em cima – murmurou Flavio. Levantei a cabeça, crente de que veria, como sempre, a longa espiral de pedra cinza com desenhos das vitórias de Marco Aurélio contra os germanos e, no topo, a trinta metros de altura, a estátua do conquistador a cavalo. Mas, para minha grande surpresa, o imperador não estava sozinho em sua montaria: alguém estava na garupa, com os braços em volta de seu pescoço. Alguém ou, talvez devesse dizer, o que restava de alguém: um corpo nu, vermelho de sangue, horrivelmente decapitado. Uma espada curta estava enfiada em suas costas, como uma flecha no meio de um alvo. Àquela distância, não dava para distinguir se o corpo pertencia a um homem ou a uma mulher. – O que estão esperando? – eu disse. – Há uma escada nessa coluna, é preciso subir e tirar dali essa abominação. – Meu pai saiu em busca das chaves – respondeu Flavio. – Mas é preciso encontrar o oficial encarregado delas, e temo que, a esta hora... Além disso, se corri até sua casa é porque o mais interessante ainda está por vir: supõe-se que o autor desse... dessa coisa ainda esteja ali dentro. – Dentro? 10