Jornal do 71.º Congresso Nacional da SPORL-CCP - 26 abril

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Hipoacusia moderada/ /severa – soluções implantáveis Rinossinusite crónica com polipose nasal – o paradigma mudou?

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Rinosseptoplastia: princípios básicos da primeira à última fotografia!

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www.justnews.pt Publicações ospital p úblico H A PARTILHA DE BOAS PRÁTICAS Diretor: José Alberto Soares Publicação híbrida CONGRESSO Andrés soto VArelA Una estrecha relación entre portugueses PUB 26 abril 28 Abril 1.ª EDiÇÃO C M Y CM MY CY CMY K Widex_SPORL_Imprensa264x45.pdf 2 22/04/2024 10:16 º PUB PUB PUB 2024 maio 2023 pre S idente de Honr A do 71.º CongreSSo dA SporL-CCp M01155 r1.0 medel.com With two microphones focused on speech in front, three types of enhanced noise reduction and Adaptive Intelligence, RONDO 3 automatically adapts so users can have conversations with confidence in any environment—without changing settings. That’s not all. Audiologists can adjust RONDO 3 for optimal hearing with any hearing aid, and it even comes pre-charged and ready to use straight out of the box. Want to hear more? Go to go.medel.pro/RONDO3
Cecília Almeida e Sousa Uma das primeiras médicas a ingressar na especialidade
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Cecília Almeida e Sousa Uma das primeiras médicas a ingressar na especialidade Victor correiA dA silVA luísA AzeVedo tiAgo Órfão

Bem-vindos a Braga!

Luís dias

Diretor do Serviço de Otorrinolaringologia da ULS de Braga

Caros Colegas, A cidade de Braga e o Serviço de Otorrinolaringologia do respetivo Hospital, por convite da Sociedade Portuguesa de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço, têm a honra de receber o evento anual mais importante da SPORL-CCP, neste caso, do seu 71.º Congresso. Que este ano também conta com a presença dos estimados colegas es-

panhóis com a realização, em simultâneo, do X Congresso Luso-Galaico de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeço e Pescoço.

O Serviço de ORL da Unidade Local de Saúde de Braga, focado na prestação de cuidados de saúde cada vez mais diferenciados à população que assiste, tem tido um crescimento sustentado, possui uma equipa jovem e procura diferenciar-se nas várias áreas da especialidade.

Graças ao avanço tecnológico, a Otorrinolaringologia tem evoluído muito no diagnóstico e tratamento das patologias auditiva, vestibular, nasossinusal, orofaríngea e do pescoço.

As novas tecnologias e a colaboração cada vez mais estreita entre as várias especialidades permitem tratar com sucesso patologias graves, sobretudo em zonas anatómicas de fronteira.

O Serviço de ORL da ULS de Braga tem tido um crescimento sustentado, procurando diferenciar-se nas várias áreas da especialidade.

toda a patologia inflamatória/tumoral e reabilitação auditiva. Na aquisição de novas técnicas cirúrgicas – cirurgia endoscópica do ouvido – até à colocação de implante coclear.

Ao nível do aparelho vestibular, a evolução científica e tecnológica tem permitido um melhor entendimento das doenças, com diagnósticos mais precisos das várias patologias e tratamentos mais adequados para cada situação.

O crescimento e a aquisição de novos conhecimentos faz-se através da partilha dos mesmos, seja na formação pré-graduada e pós-graduada, seja através da participação em estudos científicos, ensaios clínicos ou reuniões científicas.

O Congresso da SPORL-CCP é o local ideal para essa partilha, onde os médicos da especialidade podem aprender, trocar experiências e dar início a novos contactos, para aprimorar a sua formação, rever e estreitar amizades.

A patologia oncológica da cabeça e pescoço é muito exigente a nível do tratamento dos pacientes, havendo necessidade de realizar grandes cirurgias muitas vezes mutilantes, sendo a sua reconstrução/reabilitação um grande desafio que muitas vezes implica a colaboração de outras especialidades.

O tratamento da patologia auditiva e a sua reabilitação têm sofrido uma tremenda evolução nas últimas décadas. O Serviço tem tido um importante papel no tratamento destes doentes, no rastreio auditivo neonatal, passando pelo tratamento de

A nível da patologia nasossinusal (infeciosa, tumoral e estética), o desenvolvimento tem sido significativo, desde o estudo e tratamento da patologia da trompa de Eustáquio, cirurgia de base do crânio com utilização de neuronavegador, até ao tratamento de doentes com rinossinusite crónica com e sem pólipos, com terapia biológica, assim como técnicas mais aprimoradas para a realização de cirurgia estética e funcional do nariz.

O uso de tecnologia, nomeadamente com cirurgia robótica, é já uma realidade em Portugal, pelo que temos de nos preparar e adaptar aos novos tempos.

Una estrecha relación entre portugueses y gallegos

Andrés Soto Varela Presidente de la Sociedad Gallega de Otorrinolaringología y Patología Cérvico-Facial

Ha pasado ya más de medio siglo desde que en marzo de 1973 se celebró en Santiago de Compostela el I Congreso

Hispano-Luso de Otorrinolaringología, organizado por la entonces casi recién nacida (se fundó en 1971) Sociedad Gallega de Otorrinolaringología. Fue ese el punto de partida de una estrecha relación entre los otorrinolaringólogos portugueses y gallegos, que se ha mantenido hasta nuestros días. Relación institucional (los otorrinolaringólogos portugueses forman parte de la Junta Directiva de la Sociedad Gallega de Otorrinolaringología y una parte de los socios de esta Sociedad son portugueses), relación científica (con la participación de unos y otros en los congresos respectivos) y, por encima de todo, relación de amistad y fraternidad. Son muchos los lazos creados a lo largo de todos estos años por varias generaciones de colegas gallegos y portugueses, algunos ya fallecidos. Lazos que se

mantienen y se proyectan hacia el futuro, a través de los otorrinolaringólogos más jóvenes de ambos lados del río Miño.

Ejemplo de esta relación son las reuniones Luso-Galaicas, que se celebran de forma periódica desde el año 1990 (esa II Reunión tuvo lugar en Porto) y que han alcanzado, con la actual, la décima edición. Invito a que se consulte la historia de estas reuniones en la web de la Sociedad Gallega de Otorrinolaringología (www.sgorl.org), en el apartado de Historia. Un rápido vistazo a los programas y actividades de las mismas traen a nuestra memoria el recuerdo de otorrinolaringólogos ilustres, que con su saber hacer y su generosidad en la enseñanza contribuyeron a construir la Otorrinolaringología que hoy conocemos.

Es nuestra responsabilidad y la de las generaciones que nos siguen

En el fondo, las fronteras no dejan de ser artificiales. Los pacientes y sus dolencias son esencialmente iguales en Portugal y en Galicia.

conservar y aumentar el tesoro de esta relación entre la Otorrinolaringología portuguesa y gallega. No solo

Braga é uma cidade acolhedora, com mais de 2000 anos de história, com uma enorme riqueza patrimonial, que conjuga a tradição com os tempos atuais de modernidade, pelo que vale a pena ser visitada.

O Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital de Braga, em conjunto com a Comissão Organizadora do 71.º Congresso da SPORL-CCP, dá-vos as boas-vindas, esperando que este evento seja um sucesso e corresponda às expectativas de todos os interessados.

manteniendo la celebración de los congresos Luso-Galaicos, sino promoviendo y facilitando la presencia de especialistas y residentes en hospitales del país vecino. Es en el día a día como se forjan las amistades que perduran.

En el fondo, las fronteras no dejan de ser artificiales. Los pacientes y sus dolencias son esencialmente iguales en Portugal y en Galicia. Las dificultades para el desarrollo de nuestra actividad profesional probablemente sean parecidas. Es bueno que el aprendizaje y la enseñanza sean también comunes. Con ello, ofreceremos una mejor atención a nuestros pacientes. Y daremos cumplida satisfacción a los deseos de aquellos otorrinolaringólogos que, hace 51 años, iniciaron este hermoso camino fraternal, que se puede resumir en dos palabras: ciencia y amistad.

2 ■ Hospital Público 26 de abril 2024 HospitalPúblicoCongresso Diretor: José Alberto Soares Redação: Miguel Anes Soares, raquel braz Oliveira Fotografia: Nuno branco, Nuno Cruz Publicidade: Ana Mota, Diogo Varela Diretor de Produção Gráfica: José Manuel Soares Diretor de Multimédia: luís Soares Morada: Alameda dos Oceanos, Nº 25, E 2, 1990-196 lisboa Esta edição do Hospital Público Congresso é distribuida aos participantes no evento e enviada, em formato digital (e-paper), a todos os sócios da SPOrl Notas: 1. A reprodução total ou parcial de textos ou fotografias é possível, desde que devidamente autorizada e com referência à Just News 2. Qualquer texto de origem comercial eventualmente publicado neste jornal estará identificado como “ nformação”. Publicações geral@justnews.pt • agenda@justnews.pt Tel. 21 893 80 30 • www.justnews.pt Publicidade JLT PUBLICIDADE E MARKETING geral@jlt.pt Tel. 21 893 80 31

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Cirurgia reconstrutiva do pavilhão e região auricular

“A

face identifica-nos, diz ao mundo quem somos e materialmente influencia no que nos podemos tornar.”

Como primeira forma de reconhecimento do ser humano, a face é

única e o seu desfiguramento contribui para a desestruturação da nossa identidade. Nos EUA, 71% dos doentes com deformidades auriculares referem uma redução da autoconfiança que afeta a sua vida social e de lazer, 73% revelam insatisfação com a aparência e 85 a 88% referem ser vítimas de atitudes discriminatórias. Após a reconstrução auricular, 74% dos adultos e 91% das crianças reportam uma melhoria na sua autoconfiança em relação à sua vida social e de lazer.

Os números de procedimentos cirúrgicos associados a deformidades auriculares têm vindo a aumentar nas últimas décadas, representando uma das áreas de maior complexidade e desafio da cirurgia plástica e reconstrutiva da face, sobretudo no que concerne à reconstrução total do pavilhão auricular em casos de anotia e microtia, com ou sem atresia aural

e nos defeitos por trauma ou doença oncológica.

O objetivo da conferência que vou proferir neste 71.º Congresso Nacional da SPORL-CCP é apresentar, de forma sistematizada para um otorrinolaringologista cirurgião de cabeça e pescoço, uma abordagem exequível e pragmática de como proceder na reconstrução/reconstituição dos defeitos do pavilhão auricular e da região auricular, com enfoque nos seus princípios e técnicas de reconstrução, seja na cirurgia oncológica, seja em situações de natureza congénita, traumática, iatrogénica ou mesmo cicatricial.

A abordagem será teórico-prática, com recurso a casos clínicos para descrição das diferentes técnicas, desde a mais simples cicatrização por segunda intenção até à reconstrução total do pavilhão auricular com cartilagem costal ou da região auricular

com recurso a retalho supraclavicular.

Se habitualmente é a especialidade de Otorrinolaringologia a tratar cirurgicamente a atresia au-

A cirurgia reconstrutiva do pavilhão e região auricular é uma realidade atual na ULSTMAD.

ral, a corrigir defeitos de ouvido médio e de regiões periauriculares tão diversas como a mastoide, fossa infra temporal, pescoço, glândula

parótida e, inclusive, base do crânio em abordagem combinada, por que não alargar a especialidade a áreas de diferenciação acima descritas, com vista a melhorar a integração de todos os procedimentos numa região anatómica de domínio da especialidade.

A cirurgia reconstrutiva do pavilhão e região auricular é uma realidade atual no Serviço de Otorrinolaringologia da Unidade Local de Saúde de Trás-os-Montes e Alto Douro, realidade esta que tem sido materializada ao longo dos últimos 14 anos e que tem acompanhado o desenvolvimento técnico e científico do nosso Serviço.

A prática regular nesta área de diferenciação tem-se revelado uma mais-valia na prestação de cuidados de saúde altamente diferenciados à nossa população abrangida pela ULSTMAD.

dos que vão para os que ficam! LASer Co2 em oncologia

Épor todos reconhecido que o recurso ao LASER CO2 permite remover de forma segura, oncológica e funcionalmente eficaz tumores malignos faringolaríngeos em estádios diversos.

A precisão da técnica, a capacidade de com o acoplamento ao microscópio direcionar o feixe luz para os locais alvo e a possibilidade de utilizar intensidades de energia variáveis permitem não apenas classificar a técnica como minimamente invasiva, mas remover apenas as áreas tumorais, preservando os tecidos saudáveis circundantes da área afetada, minorando de forma significativa os déficits funcionais.

A sua capacidade de coagular vasos sanguíneos de pequeno calibre reduz de forma significativa o grau de hemorragia e a menor agressão e preservação de tecidos, facilita uma mais rápida recuperação dos doentes e tempos de internamento mais curtos, sem prejudicar a observação pelos anatomopatologistas.

Pelo atrás exposto, e desde que cumpridos alguns requisitos, com esta técnica e em articulação com a Anatomia Patológica, é possível efetuar não apenas todos os tipos de cordectomias propostas pela European Laryngological Society bem como cirurgias de maior ou menor extensão dirigidas a tumores em outras localizações, como na supraglote/base da língua e na oro e hipofaringe.

À semelhança do que se passou noutros países, também entre nós, e desde 1983, a microcirurgia transoral laser passou por diversas fases e o seu caminho não foi, igualmente, feito sem percalços e críticas.

Assisti à implementação do conceito, à data, já com todos os recursos técnicos, mas faltavam fundamentos científicos. Ainda não havia histórico de resultados e era a época do impacto da “nova arma” na opinião pública.

Diversos colegas otorrinolaringologistas aderiram ao LASER CO2 com

finalidades diversas, mas quando por alguns foi aplicado a patologias oncológicas vieram os problemas.

A generalização excessiva e mal fundamentada da técnica deu lugar à contestação e, por que não dizê-lo, ao descrédito. O que falhou então? O conceito e a aplicabilidade rigorosa de princípios não apenas técnicos mas também oncológicos.

E, de então para cá, que realidade temos? Quantos centros entre nós fazem com regularidade cirurgia LASER em tumores faringolaríngeos? Quantos implementam de forma adequada a metodologia de excisão, da preparação das amostras para interpretação anatomopatológica, as cirurgias de revisão quando necessário e a avaliação e publicação de resultados, como desde sempre o Serviço de ORL do IPOFG do Porto tem vindo a fazer?

Decorrido este tempo, tenho a sensação de que o LASER CO2 já é passado. Está a chegar à praia uma terceira vaga! Sim digo, uma terceira vaga, pois, quando iniciei a minha prática oncológica, estavam estabilizadas as técnicas da cirurgia total e parcial da laringe por via externa. E o que nós, enquanto interessados pela área, corríamos para as aprender, compreender e implementar... Algumas até já caíram!

Vem aí, e talvez para durante al-

gum tempo ficar, a robótica, igualmente apelativa pelo perfil tecnológico apropriado ao momento, mas, e como é próprio, com os inerentes e proporcionais custos.

E assim, de repente, num País pobre como o nosso, estamos a assistir à transição entre o que considerávamos ser uma miragem para a generalização deste novo recurso. Veja-se o que se está a passar com a aquisição de unidades robotizadas pelas diversas unidades hospitalares. Receio que o que se passou com o LASER CO2 se venha a repetir com a cirurgia robótica. Não sendo detrator da técnica, mesmo tal como hoje nos é apresentada, vejo com apreensão que, de novo, venham a ser subestimados os conceitos básicos da cirurgia oncológica, quer na sua vertente macro, quer na micro, para serem substituídos pelo retocado conceito de cirurgia transoral, em que os cirurgiões vão ser desafiados a remover por esta via todo o órgão ou partes deste. É claro que agora com vantagens acrescidas, como a ausência de incisões externas (o que fazer com os esvaziamentos cervicais?), mas, e mais uma vez, pondo de lado aspetos tão relevantes como a funcionalidade, a qualidade vocal e, por que não dizê-lo, a qualidade de vida.

Estaremos dispostos a isso, ou será lícito fazer com que os doentes

prescindam dos aspetos funcionais que a cirurgia LASER permite obter sem comprometer os fundamentos oncológicos, em detrimento de desafios técnicos que implicam cirurgias com maior grau de disfuncionalidade?

E os custos inerentes ao procedimento devem ou não ser tidos em consideração?

E a experiência como e à custa de quê vai ser conseguida e replicada? Estamos abertos a esta discussão ou, como até aqui tem sido feito, e perdoem-me o desabafo, “tudo ao molho e fé em Deus...”

Continuará a haver seguidores para a microcirurgia LASER? Mesmo que os robôs se venham a aproximar, e o caminho está traçado, continuarão sempre presentes o conceito, a necessidade da prática continuada, a exigência, a persistência e o rigor, aspetos sem os quais a “habilidade” cirúrgica morre solitária.

Continuarão a ser estas as exigências futuras. Estou convicto de que a técnica continuará a ter seguidores, mas também sei que só uma forte convicção e persistência serão o suporte para a sua continuidade.

Os instrumentos e a habilidade técnica não sobreviverão se não forem acompanhados pelos princípios atrás enunciados.

Assistirei como paciente espetador, na bancada...

4 ■ Hospital Público 26 de abril 2024
eurico Monteiro Diretor do Serviço de ORL do IPO Porto António
Diretor
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Castanheira do Serviço de ORL da ULS de Trás-os-Montes e Alto Douro

Intent

O primeiro aparelho auditivo do mundo com tecnologia BrainHearingTM acionada por sensores

“O primeiro desa o para pessoas com perda auditiva é compreender a fala em ambientes acústicos complexos e dinâmicos. O novo Oticon Intent conta com a mais recente tecnologia de sensores 4D e foi desenvolvido exatamente com o foco na resolução desta di culdade. Esta nova tecnologia foi criada com um novo microchip que proporciona soluções com base em evidências e recursos audiológicos, desenvolvidos para apoiar o cérebro nos ambientes mais desa antes.

Aliada à loso a da Oticon BrainHearing™, a nova tecnologia revelou nos estudos efetuados com EEG, numa viagem ao longo do sistema auditivo, que, enquanto a tecnologia anterior só pode oferecer um nível xo de apoio num determinado ambiente sonoro, o Oticon Intent pode oferecer mais 35% de acesso aos sinais da fala. Esta adaptação do nível de apoio baseada na intenção demonstrou ser re etida no cérebro num primeiro estudo clínico. Os resultados deste estudo de imagem cerebral mostraram que a tecnologia de sensores 4D ajuda o utilizador a equilibrar a sua atenção em relação à fonte sonora que pretende ouvir. Além disso, a compreensão da fala foi avaliada num cenário simulado de cocktail party, com quatro oradores concorrentes colocados em diferentes locais, à volta do utilizador.

A ativação da tecnologia de sensores 4D no Oticon Intent representou uma melhoria de 15% na compreensão da fala. A compreensão da fala foi também medida durante uma conversa de grupo e con rmou que o Oticon Intent, com esta tecnologia, proporciona uma compreensão igualmente boa da fala proveniente da frente e dos lados do utilizador. Por último, a qualidade do som e o conforto foram avaliados e mostraram que os utilizadores preferiram o Oticon Intent com a nova DNN 2.0 (Deep Neural Network 2.0) à tecnologia anterior da Oticon, num vasto leque de situações auditivas do dia a dia.

A tecnologia de sensores 4D é a primeira tecnologia de sensores do mundo a combinar informações do movimento da cabeça, do movimento do corpo, da atividade de conversação e do ambiente acústico, de forma a captar as intenções auditivas do utilizador. O Oticon Intent reconhece quando a intenção de escuta do utilizador muda e adapta-se imediatamente em ambientes acústicos complexos ou mais simples. Receber apoio personalizado em cada momento permite que o utilizador consiga participar de uma forma mais fácil e ativamente nas conversas.

O microprocessador Sirius inclui também melhorias no sistema adaptativo de ampli cação e na supressão de ruído, e uma largura de frequências de 80 a 10.000 Hz, proporcionando assim uma paisagem sonora mais completa, com uma respresentação do ambiente sonoro mais rica.

Esta tecnologia inovadora apresenta-se com um novo design, num modelo retroauricular mini RITE, recarregável, signi cativamente mais pequeno do que a tecnologia anterior, adequado para acompanhar hipoacusia de grau ligeiro a severo.

Com o Oticon Intent, o som ganha uma nova dimensão.

Referência:

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informação

Alfa-manosidose, uma doença genética rara

– Em que consiste e como é que as pessoas adquirem a alfa-manosidose?

A alfa-manosidose consiste numa doença genética rara causada por mutações no gene MAN2B1, localizado no cromossoma 19 (19 p13.2-q12). Este gene é responsável pela produção da enzima alfa-D-manosidase lisossomal, que tem como função a degradação das glicoproteínas. No caso de défice desta enzima, há uma acumulação progressiva de oligossacarídeos ricos em manose em todos os tecidos, o que prejudica a função celular e leva à apoptose. A doença é herdada de forma autossómica recessiva e pode manifestar-se de forma ligeira e de evolução lenta (tipo 1), moderada (tipo 2) ou grave e rapidamente progressiva (tipo 3).

– Quais são os sinais de alerta para a suspeita desta doença?

A alfa-manosidose é uma doença progressiva, que se manifesta de várias formas ao longo do tempo, sendo necessário um elevado grau de suspeição para a reconhecer. Os sinais e sintomas são variáveis e podem surgir desde o nascimento até à idade adulta. No entanto, a presença de hipoacusia neurossensorial moderada a grave, de dismorfias faciais como macrocefalia, protuberância frontal, sobrancelhas arredondadas, dorso nasal achatado, macroglossia e prognatismo, bem como de anomalias esqueléticas, nomeadamente, disostoses, escoliose e deformidade esternal, deve alertar-nos para essa entidade.

Outros sinais são a existência de imunodeficiências, manifestada por infeções recorrentes, especialmente

na primeira década de vida, de distúrbios da função motora, que incluem fraqueza muscular, anomalias articulares e ataxia, de problemas comportamentais ou psiquiátricos, que podem apresentar-se como episódios de confusão, às vezes com ansiedade, depressão ou alucinações e de comprometimento gradual das funções cognitivas e da fala. No entanto, é importante ter a noção de que a criança pode nascer sem qualquer anomalia identificada e progressivamente ir apresentando manifestações multissistémicas da doença. O diagnóstico diferencial com as doenças lisossomais de sobrecarga, como a mucopolissacaridose (MPS), é um desafio, dado que os principais sintomas da alfa-manosidose, como características dismórficas, disostose e deficiência intelectual, são partilhados.

– Qual a importância da abordagem multidisciplinar no diagnóstico da alfa-manosidose?

É uma doença rara que permanece subdiagnosticada e o seu diagnóstico atempado tem potencial para influenciar os resultados dos pacientes, uma vez que as terapêuticas podem ser iniciadas numa fase precoce. Dado o atingimento de vários sistemas e de forma a ser facultada ao paciente uma terapêutica o mais personalizada possível, para melhorar a sua condição ou retardar a progressão da doença, uma abordagem multidisciplinar é crucial para o diagnóstico e gestão da patologia.

É uma doença rara que permanece subdiagnosticada e o seu diagnóstico atempado tem potencial para influenciar os resultados dos pacientes, uma vez que as terapêuticas podem ser iniciadas numa fase precoce.

Causa metabólica de surdez, alfa-manosidose tem tratamento enzimático

Aalfa-manosidose é uma doença genética multissistémica e progressiva que atinge precocemente o sistema auditivo. Tem por base a deficiência de alfa-manosidase, que leva à acumulação de oligossacáridos ricos em manose nos tecidos. Esta doença metabólica tem hereditariedade autossómica recessiva e é causada por variantes deletérias no gene MAN2B1.

As manifestações clínicas da alfa-manosidose são múltiplas e variáveis consoante a forma e a idade, podendo ser assintomática no período neonatal, passando a infeções recorrentes do trato respiratório superior e otites que recidivam durante a infância, com hipoacusia neurossensorial concomitante e atraso do desenvolvimento psicomotor, com alterações esqueléticas e faciais que se vão acentuando.

A hipoacusia, um dos sinais cardinais desta doença, é habitualmente pré-lingual, mista e de grau moderado a severo não-progressivo.

O tratamento da alfa-manosidose era sintomático até à disponibilização de terapêutica enzimática de substituição com velmanase alfa, uma enzima recombinante humana que visa travar a acumulação dos oligossacáridos, embora não transponha a barreira hematoencefálica. O diagnóstico muito precoce permite também, alternativamente, a opção por transplante de medula óssea.

A abordagem multidisciplinar no diagnóstico e acompanhamento de doentes com alfa-manosidose é essencial devido à sua complexidade, à heterogeneidade de sinais e sintomas, às possibilidades terapêuticas de âmbito hospitalar e ao seu caráter

O tratamento da alfa-manosidose era sintomático até à disponibilização de terapêutica enzimática de substituição com velmanase alfa, uma enzima recombinante humana que visa travar a acumulação dos oligossacáridos, embora não transponha a barreira hematoencefálica. Dado a perda auditiva ser uma situação relativamente comum em idade pediátrica, torna-se importante investigar otites de repetição com componente de hipoacusia neurossensorial associado.

juntando estudo imunológico sumário ao de coagulação de rotina em pré-operatório, uma vez que há comprometimento imunológico e diminuição das imunoglobulinas na alfa-manosidose.

Por outro lado, a hipotonia, o espessamento de feições que ocorre com a idade, e o atraso de desenvolvimento psicomotor apontam para uma condição sindrómica que poderá ser esclarecida em consultas próprias: de Genética, de Pediatria ou de Neurologia, que disponibilizam estudos abrangentes por haver diagnósticos diferenciais, como, por exemplo, as mucopolissacaridoses.

A alfa-manosidose diagnostica-se por estudo molecular do gene MAN2B1 e por estudo enzimático da alfa-manosidase em amostra de sangue. Um doseamento aumentado de oligoassacáridos na urina sugere, igualmente, o diagnóstico.

hereditário. As especialidades envolvidas são habitualmente a Pediatria, a Medicina Interna), a Neuropediatria, a Neurologia, a Otorrinolaringologia, a Genética, a Ortopedia, a Fisiatria e a Oftalmologia. Uma vez que a alfa-manosidose é uma doença familiar, é importante sensibilizar os doentes e familiares para a mais-valia de obter aconselhamento genético e estudos em cascata que possam identificar outras crianças afetadas na família que careçam, igualmente, de instituição de terapêutica e seguimento diferenciado. A consulta de Genética pode também disponibilizar opções reprodutivas específicas para planeamento familiar de indivíduos com risco acrescido para a descendência.

Como em qualquer condição genética e progressiva com novo tratamento disponível, é fundamental sensibilizar a comunidade médica para a suspeita de alfa-manosidose perante os primeiros sinais/sintomas da doença. Dado a perda auditiva ser uma situação relativamente comum em idade pediátrica, torna-se importante investigar otites de repetição com componente de hipoacusia neurossensorial associado,

Simpósio Chiesi 26 ABRIL | 12.00 | SALA 1

Pela sua relativa raridade, a visibilidade da alfa-manosidose é ainda limitada dentro da comunidade médica, estando provavelmente subdiagnosticada. Pretende-se, com esta sessão, aumentar a consciencialização entre otorrinolaringologistas para as manifestações clínicas da alfa-manosidose, potenciando a sua contribuição para o diagnóstico precoce e para o atempado tratamento destes doentes, que muito beneficiam de acompanhamento multidisciplinar.

6 ■ Hospital Público 26 de abril 2024 26 a 28 abril 2024 CONGRESSO NACIONAL DA SOCIEDADE PORTU GUESA D OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA DE CABEÇA E PESCOÇO X CONGRESSO Altice Fórum Braga LUSO-GALAICO de ORL www.sporl.pt rganizers rinasampaio@veranatura.pt SPORL-CCP �♦Chiesi global rare diseases O Alfa-manosidose: a importância do otorrinolaringologista no diagnóstico
de Gaia e Espinho
de Santo
Moderadora: Sandra Alves ULS
Palestrante: Cláudia Falcão Reis ULS
António
Cláudia Falcão reis Médica geneticista, ULS de Santo António Sandra Alves Otorrinolaringologista, ULS de Gaia e Espinho

CeCíLi

dA SporL-CCp :

“Caminhamos para uma

era em que a tecnologia eficazes no avanço da prevenção, do diagnóstico

Com quatro déCadas de dediCação à orL, CeCíLia aLmeida e sousa foi uma das primeiras médiCas a ingressar numa espeCiaLidade que era marCada peLo género masCuLino. testemunhou a evoLução teCnoLógiCa assoCiada à espeCiaLidade e o seu CresCente protagonismo. aos dias de hoje, aCredita que, aLém do impaCto que as novas teCnoLogias têm a níveL Curativo, nomeadamente Com a Cirurgia robótiCa, demonstram, também, Cada vez mais efiCáCia no âmbito preventivo. a Conversa Com a justnews deCorreu no seu ConsuLtório privado de sempre, LoCaLizado bem perto da Casa da músiCa, um espaço que Lhe agrada partiCuLarmente.

Just News (JN) – Nunca se arrependeu de ter escolhido Otorrinolaringologia?

Cecília Almeida e Sousa (CS) –A pergunta é interessante porque, na altura, estava orientada para seguir Anestesiologia. Era uma especialidade que, de certo modo, me fascinava. Por outro lado, em Vila do Conde, onde residia, havia muita carência de anestesiologistas. Os colegas com quem convivia, de outras especialidades, pressionavam-me a dar esse passo. Comecei a encarar essa ideia durante o Internato Geral e o Serviço Médico à Periferia.

Entretanto, quando concorri para a especialidade, em 1983, abriram muito poucas vagas para Anestesiologia, para além de que a única vaga que abriu no Hospital de São João, em que estava interessada, foi ocupada por outro colega. Acabei por escolher ORL, que seria a minha 2.ª opção, no Hospital de Santo António. Penso que fiz muitíssimo bem e que se tivesse ido para Anestesiologia talvez não me tivesse realizado tanto quanto sinto que me realizei na ORL.

JN – Na altura, já conhecia o Hospital de Santo António?

CS – Não. O meu trajeto processou-se ligado ao Hospital de S. João – seis anos a frequentar a Faculdade de Medicina da Universidade do Porto mais dois de Internato Geral –, a que se seguiu um ano no cumprimento do Serviço Médico à Periferia, após o qual regressei e fui colocada no Serviço de Cirurgia IV, aguardando a candidatura ao exame de ingresso na especialidade.

JN – Como era o Serviço de ORL do Santo António quando ali chegou, em 1983?

CS – Fui encontrar um Serviço de referência no país, dirigido pelo Prof. Gameiro dos Santos. Nessa altura, mé-

dicas especialistas em ORL eram raríssimas, mas fui muito bem recebida e acarinhada pelos colegas. Acabei por me ir entusiasmando e considerar a especialidade fascinante. Hoje em dia, acho que me realizou completamente.

JN – Era muito diferente daquele que deixou recentemente, 38 anos depois?

CS – O Serviço era mais pequeno e não existiam tantas áreas de diferenciação/setorização como há agora. Também o quadro médico era menor. Contudo, era dos mais prestigiados, senão o mais prestigiado Serviço de ORL do país.

JN – O que o explica?

CS – O Prof. Gameiro dos Santos tinha estado em Londres, o que lhe deu um know-how e uma visão da

“Em 1983, no Hospital de Santo António, médicas especialistas em ORL eram raríssimas, mas fui muito bem recebida e acarinhada pelos colegas. Acabei por me ir entusiasmando e considerar a especialidade fascinante.”

especialidade diferentes. Chegou a Portugal e impulsionou o Serviço de maneira a acompanhar os grandes da Europa, e acho que conseguiu!

JN – Tornou-se especialista em 1988 e manteve-se no Hospital de Santo António...

CS – Sim! Depois, concorri a uma bolsa da JNICT, que, na altura, era muito prestigiada, e me foi concedida. Em agosto, sete meses após ter-me tornado especialista, fui para Bordéus e regressei em março do ano seguinte. Não imagina o enriquecimento que essa experiência me providenciou! Em primeiro lugar, confrontei-me com um Serviço − dirigido pelo Prof. Michel Portman, a quem presto a minha homenagem −, que, para além de ser de topo a nível mundial, era verdadeiramente multicultural. Viver essa realidade deu-me uma perspetiva do que é ser um Serviço de topo nas suas várias valências e a possibilidade de conviver com colegas de toda a parte, desde a China ao Egito, à Colômbia, à Argentina, além dos países francófonos de África.

Os meus horizontes alargaram-se muito, não só do ponto de vista profissional, mas também humano e sociocultural.

JN – Durante esse estágio, diferenciou-se nalguma área mais específica?

CS – O concurso à bolsa implicava inovação. Dediquei-me principalmente à área de Foniatria, que, em Portugal, ainda não estava desenvolvida. Estudei

essencialmente a patologia vocal, embora também acabasse por frequentar outras áreas da especialidade, para perceber como funcionavam. Transportei comigo essa bagagem e estou convencida de que me esforcei no sentido de lutar para que, entre nós, essa vertente se desenvolvesse. Logo que cheguei de Bordéus, o Prof. Gameiro dos Santos integrou a área de Foniatria no Serviço, à qual me fui dedicando sempre.

JN – Durante esses sete meses, veio a Portugal? CS – Vim apenas passar o Natal com a família. Acompanhou-me na minha presença, em Bordéus, a minha filha, que tinha seis anos. Ela integrou-se lindamente no novo ambiente! Foi para uma escola francesa e, ao fim de um mês, falava corretamente o francês com o sotaque de Bordéus. Atualmente, tenho dois netos na Escola Francesa do Porto. A paixão foi total, e permanece!

Contudo, ao tempo, a experiência foi exigente, mas tive a felicidade de encontrar colegas portugueses que frequentavam estágios em outras áreas da especialidade, que me apoiaram, pelo que foi também uma mais-valia muito interessante! Aproveito para lhes deixar um eterno agradecimento.

UMA VIAGEM ATÉ AO TOPO DA CARREIRA MÉDICA E ACADÉMICA

JN – Em 2005, assumiu a direção do Serviço! Como encarou esse desafio?

CS – Com a saída do Prof. Gameiro dos Santos, o Dr. Alcides Lima sucedeu-lhe no cargo, mas acabou por ser uma passagem muito breve. Foi então que fui confrontada com o pedido do Conselho de Administração para abraçar esse projeto. Na altura, fiquei sem palavras, porque nunca me tinha passado pela cabeça vir a assumir uma responsabilidade dessas e pedi algum tempo para pensar.

Não viram na minha atitude muito entusiasmo, de maneira que, ao sair, me disseram: “É uma das pessoas que está há mais tempo no Serviço. Não acha que tem obrigação de fazer qualquer coisa pela instituição?” Nunca me esqueci dessa frase. Refleti e achei que, na realidade, estando eu há tanto tempo no Serviço, tinha, de facto, a obrigação de fazer algo mais pela instituição!

JN – O que a levou a hesitar?

CS – No primeiro instante, hesitei porque fui surpreendida com o convite e, depois, porque era um projeto muito desafiante, que ia destabilizar de certo modo a vida familiar. Contudo, penso que, profissionalmente, temos de marcar o local onde estamos, se pudermos ser úteis. Acabei por assumir a direção do Serviço em novembro de 2005.

JN – Seria sua diretora durante 16 anos, até 2021. O que foi mais difícil, durante esse período?

CS – A maior dificuldade prendeu-se com a gestão de recursos humanos, nomeadamente na área médica. Estu-

8 ■ Hospital Público 26 de abril 2024
A ALMeidA e SoUSA, preSidente de HonrA do 71.º CongreSSo nACionAL Cecília Almeida e Sousa: "Sempre adorei lecionar! Comecei a dar aulas de Saúde no Liceu da póvoa de Varzim, enquanto

tecnologia será dos instrumentos mais diagnóstico e do tratamento da doença”

dei, aprendi, li muito sobre liderança, mas trata-se de uma tarefa que, como todos sabemos, não é fácil de agilizar.

JN – A criação do Centro Hospitalar do Porto, em 2007, trouxe alguma alteração ao funcionamento do Serviço?

CS – Desde 2016 que este CH tinha um espaço dirigido à Pediatria – o Centro Materno-Infantil do Norte. Contudo, anteriormente, com a criação do CHPorto, herdámos o Hospital Central Especializado de Crianças Maria Pia, que, no nosso entender, não tinha condições físicas para receber as crianças.

Eu fui uma das profissionais que se manifestaram contra a ideia de nos deslocarmos ao Hospital Maria Pia para seguir as crianças, defendendo que elas deviam ser integradas no Serviço. Acabaram por vir e nós recebemo-las de braços abertos e fomos dando o nosso melhor.

Quando o edifício do CMIN foi inaugurado, procedemos à transição da atividade clínica e dos meios complementares de diagnóstico, à medida que íamos conseguindo os meios financeiros necessários. Criou-se, então, um polo de ORL Pediátrica no CMIN, sob a dependência do Serviço. Até novembro de 2021, deslocávamo-nos até lá, de acordo com o que fosse melhor para as crianças e para a equipa médica. Se havia colegas mais diferenciados na área de Pediatria, eram esses que se deslocavam, acompanhados dos internos a frequentarem a valência pe-

CeCíLi A ALMeidA e SoUSA:

“Aprendi a ser muito disciplinada na vida”

Cecília Almeida e Sousa nasceu a 20 de novembro de 1951, em Castelo de Paiva, mas aos nove anos foi viver para a Póvoa de Varzim. Sendo a mais nova de três irmãs, os pais entenderam que o melhor seria que a filha fosse para o Colégio do Sagrado Coração de Jesus, o Colégio das Doroteias, que funcionava em regime de internato.

A experiência foi, para si, muito positiva: “Foi excelente! Não era um regime de frieza, mas de educação em todas as vertentes – cívica, moral, de disciplina e de hábitos de estudo. Aprendi a ser muito disciplinada na vida, a praticar o bem e a cumprir com os deveres. Diziam-nos sempre: ‘Em 1.º lugar o dever e depois a devoção!’ O Colégio era vocacionado para o estudo e para a educação das raparigas, com liberalidade.”

Influenciada pelo cunhado, médico de profissão, que, na altura, era namorado da irmã mais velha,

diátrica. A resposta a casos urgentes era assegurada pela equipa de urgência.

JN – É favorável à criação da subespecialidade de ORL Pediátrica?

CS – Sou, porque entendo que quanto mais os especialistas se diferenciarem numa área melhor a vão conhecer e investir em conhecimentos e práticas que beneficiarão os doentes. A nível mundial, esse processo está a acontecer e os profissionais estão a tornar-se experts em certas áreas. Na minha direção de Serviço, aproveitei o know-how dos colegas que tinham vindo do Hospital Maria Pia para os alocar mais à área pediátrica.

JN – Acabou por permanecer no Santo António durante praticamente quatro décadas! Que recordações guarda desse trajeto?

CS – Há duas grandes etapas que marcaram a minha passagem pelo Serviço. A primeira foi a implementação e organização do setor da Foniatria, a que se seguiu a chamada para a Direção. A primeira estava imbuída de um espírito de juventude e idealismo por algo que era novo. Vivi com entusiasmo e com muita alegria sempre que se consumava um avanço. A segunda foi desafiante. O avanço científico e tecnológico, a mudança de comportamentos e mentalidades, a evolução e reformulação dos recursos humanos e logísticos, o desenrolar das políticas de saúde e assistência, etc. acarretaram, como se costuma dizer, algumas “dores de cabeça”. Paulatinamente, modificaram-se rotinas, foi-se criando um espírito de corpo. A motiva-

também ela licenciada em Medicina, Cecília Almeida e Sousa começou a sentir um fascínio pela área. “Eu e a minha irmã íamos com ele às garraiadas e festas de estudantes e eu gostava daquele ambiente académico. No verão, nas férias grandes, também acabava por ir com eles para o hospital e o gosto por aquele ambiente foi crescendo”, conta. Ao mesmo tempo, a passagem pelo Colégio das Doroteias também contribuiu para a decisão, uma vez que “era muito incutida a ideia da importância de fazer o bem e ter gestos de caridade”.

Questionada sobre se é feliz, não hesita: “Sou! Tive vicissitudes na vida, como toda a gente, mas acho que o caminho é andar para a frente. Nem as outras pessoas gostariam que andássemos para trás!”. Construiu uma bonita vida pessoal e profissional. É mãe de três filhas e avó de duas netas e três netos.

ção instalou-se, o que do meu ponto de vista é fundamental para que se cumpram objetivos. Os últimos cinco anos foram os melhores anos da minha direção de Serviço, o que até acabou por me deixar alguma nostalgia. Quando lá vou, sinto essa nostalgia!

JN – Teve pena de deixar o hospital?

CS – Cada passo novo na vida implica mudança de paradigma, a que temos de dar resposta. Sentia-me, física e intelectualmente, com capacidades para continuar. Por outro lado, tinha consciência de que chega o tempo em que se deve permitir que outros colegas vivam este tipo de experiências. Tive de sair por ter atingido o limite de idade. Mas também sinto que foi bom porque, agora, tenho uma vida preenchida, saudável, sem stress, muito mais tranquila. Faço clínica privada durante as tardes e opero no Hospital da Lapa. Durante as manhãs, posso levantar-me, despreocupada, e até ler um bocadinho do ponto de vista científico e lúdico. Pratico com regularidade o meu desporto preferido, o golfe. É agradável!

JN – De vez em quando, ainda vai ao Santo António?

CS – Como defensora acérrima do SNS, sou utente, tenho acompanhamento clínico e frequento as consultas para as quais sou orientada ou que, por livre iniciativa, procuro. Realizo ali os exames de rotina ou complementares porque conheço bem o seu alto grau de competência. Nesses momentos, não deixo de passar no Serviço para cumprimentar os colegas. Gosto de lá ir!

JN – Em paralelo com a atividade clínica, desenvolveu uma carreira académica. Quando iniciou esse percurso?

CS – Quando era interna, dava aulas de ORL na Escola Superior de Enfermagem D. Ana Guedes e aí acabei por me manter durante 20 anos.

Já enquanto diretora de Serviço, o então diretor do ICBAS, Prof. António Sousa Pereira, falou-me na possibilidade de eu ficar com a direção da disciplina de ORL. Nessa altura, entendi que seria bom para o Serviço e para a Faculdade se eu a liderasse. Acabei por concorrer e ser selecionada. Desenvolvi o meu percurso na docência até chegar a professora catedrática.

JN – Sente falta dessa componente das aulas?

CS – Sempre adorei lecionar! Comecei a dar aulas de Saúde no Liceu da Póvoa de Varzim, enquanto cursava Medicina na FMUP. Além de adorar dar aulas, gostava muito do convívio com a juventude, de forma especial ao nível do Ensino Superior e do Ensino Universitário, em que os alunos já têm mais idade e outra motivação. Tive a sorte, a nível da Faculdade, de o fazer numa altura em que só vinham para Medicina os melhores entre os melhores. Por isso, penso que acabei o meu percurso em beleza. Os meus últimos anos no SNS foram bons, no Serviço e no ensino. Sim, deixou-me saudades!

O CRESCENTE PROTAGONISMO DA ORL

JN – A ORL, hoje em dia, é muito diferente do que era há 40 anos?

CS – Completamente diferente! Em muitas especialidades, e também na ORL, existiu um avanço brutal ao nível da tecnologia, o que veio facilitar a prática clínica, nomeadamente através da rapidez de acesso à informação e de articulação com o resto do mundo.

Por sua vez, o aparecimento do laser e de novas tecnologias a nível dos implantes cocleares e das cirurgias nasossinusais, e outras, representou uma evolução incrível, que veio modificar completamente a ORL.

Neste momento, acho que a ORL que se pratica em Portugal é praticamente equivalente à do resto do mundo, marcada por áreas de expertise e pelo constante avanço das tecnologias. Já é um facto adquirido a cirurgia robótica e também o uso da Inteligência Artificial. Caminhamos para uma era em que a tecnologia será dos instrumentos mais eficazes no avanço da prevenção, do diagnóstico e do tratamento da doença.

JN – Considera que, ao longo da sua carreira, a especialidade de ORL ganhou protagonismo?

CS – Quando escolhi ORL, em 1983, eu era das poucas médicas nes-

ta especialidade. Julgo que seríamos três ou quatro a nível nacional, sendo que a maior parte estava no Santo António. Estive 20 anos num Serviço em que a única otorrinolaringologista era eu.

Ao longo do tempo, a ORL foi sendo valorizada. Já quando ingressei na especialidade, era das primeiras a ser escolhida, a par com Oftalmologia. Na fase final da minha direção de Serviço, a ORL chegou a ser a primeira ou segunda a ser escolhida em alguns anos. É uma especialidade com muito protagonismo, talvez por ter muitas vertentes e envolver as áreas médica e cirúrgica, em que muitos colegas se reveem e realizam.

“O aparecimento do laser e de novas tecnologias a nível dos implantes cocleares e das cirurgias nasossinusais, e outras, representou uma evolução incrível, que veio modificar completamente a ORL.”

JN – Qual tem sido a sua relação com a SPORL-CCP ao longo destes anos?

CS – Pertenci aos Corpos Sociais da SPORL-CCP entre 2013 e 2022 (2013-2016 como vogal da Direção; 2016-2019 e 2019-2022 enquanto secretária da Assembleia-Geral). Para mim, assumir essas funções representou uma experiência maravilhosa e um enriquecimento muito grande, não só do ponto de vista profissional, mas também de relações humanas. Éramos um ótimo grupo, o que também se devia à existência de uma boa Direção. Tive a sorte de ter presidentes fantásticos, primeiro o Dr. Carlos Ribeiro, depois o Dr. Ezequiel Barros, e ainda o Prof. Jorge Spratley.

JN – Qual tem sido o seu grau de participação nas reuniões científicas?

CS – Fui sempre muito participativa! Acho que os congressos nacionais e internacionais são uma ótima oportunidade para nos atualizarmos. Regressamos sempre enriquecidos do ponto de vista científico. Aprende-se sempre, conseguimos rever colegas, reforçar e fazer novas amizades. No último congresso internacional, que foi no Dubai, encontrei colegas de Bordéus e relembrei memórias muito boas, o que é gratificante.

Hospital Público ■ 9 26 de abril 2024
cursava Medicina na FMUp"
impacto da perda auditiva no desempenho cognitivo

Aperda auditiva é uma condição que afeta milhões de pessoas em todo o mundo, sendo mais prevalente na população mais envelhecida. Além dos desafios óbvios na comunicação e no impacto que tem na qualidade de vida, há cada vez mais evidência científica que

associa este défice sensorial a um pior desempenho cognitivo.

Vários mecanismos biológicos foram propostos para explicar esta associação. Um dos principais envolve a sobrecarga cognitiva imposta pela perda auditiva: quando os indivíduos têm dificuldade em ouvir e compreender o discurso, o cérebro tenta compensar os efeitos da privação sensorial através do recrutamento de redes cerebrais alternativas, o que resulta numa carga cognitiva adicional, ficando disponíveis menos recursos para outras funções cognitivas como a memória e a atenção.

Além disso, a perda auditiva parece estar associada a mudanças na estrutura e função cerebral. Estudos de neuroimagem mostraram que indivíduos com perda auditiva tendem a apresentar alterações na atividade cerebral em áreas associadas à audição e à cognição, como o córtex auditivo e o córtex pré-frontal. Essas alterações podem resultar de uma diminuição na estimulação auditiva

ao longo do tempo, levando a uma realocação e reorganização neuronal mal adaptativa.

Outro mecanismo proposto é a ligação entre perda auditiva, isolamento social e depressão. A perda auditiva leva a dificuldades de comunicação e participação em atividades sociais, o que, por sua vez, pode levar ao isolamento social e à diminuição da estimulação cognitiva. O isolamento social tem sido consistentemente associado a um maior risco de declínio cognitivo e demência, sugerindo que os efeitos indiretos da perda auditiva na saúde mental também podem contribuir para o declínio cognitivo.

Atualmente, as terapêuticas farmacológicas para a demência oferecem benefícios limitados, verificando-se recentemente uma mudança do paradigma terapêutico para uma estratégia preventiva, de intervenção na população em geral, de forma a prevenir ou atenuar esta síndrome de declínio cognitivo crónico e progressivo.

Nos últimos anos, a perda auditiva foi identificada como um dos maiores fatores de risco potencialmente modificáveis para a demência.

Nos últimos anos, a perda auditiva foi identificada como um dos maiores fatores de risco potencialmente modificáveis para a demência, destacando-se assim a importância do seu tratamento como estratégia preventiva contra esta condição.

No estudo conduzido pelo Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Pedro Hispano, em estreita

Hipoacusia moderada/severa – soluções implantáveis

Aatitude de um otorrinolaringologista é, sempre que confrontado com uma situação de hipoacusia, procurar restabelecer a função quer por meios médicos, quer cirúrgicos. Contudo, quando a anatomia do ouvido já está muito alterada e as probabilidades de reconstrução cirúrgica são escassas, somos forçados a recorrer a soluções protéticas. Casos há em que foi executada com sucesso uma cirurgia de erradicação de uma patologia infeciosa ou tumoral, mas persiste uma perda auditiva que limita a actividade do nosso doente.

Sabemos que as próteses auditivas convencionais têm evoluído

imenso e são capazes de proporcionar ao seu utilizador quer um ganho auditivo, quer um conjunto de funcionalidades que lhe permitem um resultado bastante confortável. No entanto, quando em presença de patologia no ouvido externo ou por razões cosméticas, essas próteses poderão não corresponder às expectativas criadas e somos forçados a procurar alternativas que procurem ultrapassar esses constrangimentos.

Nos últimos 40 anos, milhões de dólares foram investidos na concepção e desenvolvimento de implantes auditivos, não tendo muitos deles chegado sequer à fase de aprovação

pelas entidades competentes e muito menos a uma fabricação em série. Outros, que se revelaram como excelentes alternativas, acabaram por ser retirados do mercado, em virtude de o número de unidades vendidas não proporcionar aos fabricantes o retorno necessário para manter a sua produção.

Foram assim criadas soluções que utilizam a via óssea ou a via aérea, procurando ultrapassar perdas auditivas de transmissão, sensorioneurais e mistas, sendo certo que o ganho obtido é diferente conforme o implante utilizado, pelo que a sua escolha deverá ser criteriosa.

colaboração com o ISPUP (Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto), foi analisada uma amostra de 167 indivíduos com risco aumentado de demência, participantes num ensaio clínico de base comunitária destinado a prevenir o declínio cognitivo através de estratégias não farmacológicas (MIND-Matosinhos: Múltiplas Intervenções para Prevenir o Declínio Cognitivo).

Todos os participantes foram submetidos inicialmente a uma avaliação cognitiva, através da aplicação do questionário MoCA (Montreal Cognitive Assessment) validado para a população portuguesa (Simões et al., 2008). Em seguida, foram avaliados em consulta de Otorrinolaringologia. Por fim, todos foram submetidos a uma avaliação auditiva, realizando-se audiometria tonal e vocal numa cabina insonorizada. Este estudo procurou avaliar uma associação entre perda auditiva e défice cognitivo numa população com risco aumentado de demência.

Nesta conferência proferida pela Dr.ª Conceição Peixoto e por mim, procuraremos fazer uma revisão das soluções implantáveis para doentes com hipoacusia moderada e severa, que, portanto, ainda não têm uma perda auditiva que justifique um implante coclear. Serão assim abordados os implantes de condução óssea passivos, percutâneos e transcutâneos, de condução óssea activos e implantes activos de ouvido médio. Vários casos clínicos serão apresentados para ilustrar a utilização destes dispositivos.

Nota: O autor utiliza a ortografia antiga.

paragangliomas temporais: desafios e experiência cirúrgica

Os paragangliomas, também conhecidos na literatura como quimiodectomas ou tumores glómicos, são tumores neuroendócrinos que têm origem nas

células neuroectodérmicas da crista neural. Podem estar associados ao sistema simpático ou parassimpático, sendo que na região da cabeça e pescoço se dividem em temporais e cervicais.

Os paragangliomas temporais são de especial interesse para os otologistas, uma vez que os timpanomastoideus são as neoplasias mais comuns do ouvido médio e os jugulo-timpânicos o segundo tumor mais frequente do osso temporal.

Mais prevalentes em mulheres entre os 40 e os 70 anos, os paragangliomas temporais manifestam-se frequentemente por acufeno pulsátil, acompanhados ou não de surdez. O diagnóstico começa pela otoscopia, que revela uma massa vermelha ou violácea pulsátil preenchendo a caixa do tímpano, sincronizada com a frequência cardíaca. Mesmo assintomáticos, estes tumores, de crescimento

lento, demonstram um comportamento localmente agressivo e invasivo, caracterizando-se pela sua alta vascularização.

O diagnóstico complementar requer uma abordagem extensa, incluindo tomografia computorizada e ressonância magnética para confirmação diagnóstica e planeamento cirúrgico, além de métodos de Medicina Nuclear para exclusão de doença metastática. Todos os doentes, mesmo os assintomáticos, devem ser submetidos a estudo analítico para avaliar a possível produção de catecolaminas pelo tumor.

Os paragangliomas temporais são classificados em quatro classes no osso temporal, de A a D (Fisch modificada por Sanna), com as classes A e B reservadas para os paragangliomas timpanomastoideus e as classes C e D para os jugulo-timpânicos.

Neste contexto, partilhamos a

nossa casuística e experiência cirúrgica dos últimos três anos (2021-2023) com paragangliomas timpanomastoideus. Durante este período, realizámos cirurgias em sete pacientes, sendo cinco mulheres (71%), com idades entre os 22 e os 72 anos. Três casos foram classificados como Classe A, puramente timpânicos, enquanto quatro foram classificados como Classe B, devido à extensão ao hipotímpano e/ou mastoide. O tratamento definitivo para estes tumores em estádio inicial é a excisão cirúrgica, com preservação anatómica e funcional do ouvido, objetivo mais fácil de alcançar em tumores de menores dimensões. Todas as cirurgias foram realizadas por timpanotomia exploratória e por via retroauricular, permitindo uma máxima exposição da caixa do tímpano. No entanto, a dissecção entre o tumor e a membrana timpânica representa

um desafio significativo, uma vez que qualquer lesão pode resultar em imediata hemorragia.

Após a timpanotomia, a identificação e a dissecção completa da cadeia ossicular são essenciais, seguidas pela remoção do tumor, com especial atenção à região do vaso nutritivo principal. Em casos associados ao nervo de Jacobson, a proximidade com a segunda porção do nervo facial requer cautela, pois, a lesão térmica pode resultar em paralisia facial.

Embora não seja uma patologia comum, qualquer serviço dedicado à Otologia e Neurotologia pode enfrentar a necessidade de realizar cirurgias complexas em pacientes com paragangliomas temporais. Partilhar experiências e vídeos cirúrgicos poderá permitir o diagnóstico mais rápido destes tumores, melhorando o outcome.

10 ■ Hospital Público 26 de abril 2024
pedro Marques gomes Médico interno do 4.º ano de ORL, H. Pedro Hispano, ULS de Matosinhos tiago Fuzeta eça Assistente hospitalar, Serviço de ORL da ULS de Santa Maria Victor Correia da Silva Coordenador do Centro de ORL e da Unidade de Implantes Auditivos do Hospital CUF Porto
projeto Mind

informação

Atlasderino-septoplastia: a resposta ao crescente interesse pela cirurgia nasal

Vai ser oficialmente lançado amanhã, 27 de abril, segundo dia do 71.º Congresso da SPORL-CCP, o Atlas de Rino-septoplastia. Os seus coordenadores, os otorrinolaringologistas José Esteves Marcos e Rui Gonçalves Pratas, participarão numa sessão de autógrafos marcada para as 10h30.

Editado pelo Círculo Médico, este projeto resulta, segundo aqueles especialistas, de uma ideia que já tinha há alguns anos, “mas que só agora foi possível concretizar”, em grande parte devido ao “apoio fundamental” da Minisom, uma marca amplifon, em cujo stand, aliás, se realizará a referida sessão.

Contando com o contributo de mais de uma dezena de médicos “com experiência demonstrada no âmbito da rinoplastia funcional e estética”, o Atlas inclui ilustrações científicas de Fernando Vilhena de Mendonça, também otorrinolaringologista.

Coordenada por José Esteves Marcos e Rui Gonçalves Pratas, a obra tem ilustrações de Fernando Vilhena de Mendonça.

“O progressivo interesse das novas gerações de otorrinolaringologistas e de outras especialidades pela cirurgia nasal foi mais um estímulo para a elaboração desta obra”, reconhecem os autores no texto do Prefácio, afirmando ainda: “O cirurgião plástico nasal deve manter-se atualizado, num processo de melhoria contínua e de partilha com os seus pares.”

O Atlas de Rino-septoplastia tem o patrocínio científico da Sociedade Portuguesa de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço. Aliás, o seu presidente assina o texto do Prólogo, considerando que esta “traduz a experiência e o saber dos seus editores, tornando-

-se relevante na aprendizagem e orientação para uma prática cirúrgica bem-sucedida”.

J. Marques dos Santos sublinha o facto de, nos últimos anos, se ter observado em Portugal “um progresso avassalador na área da cirurgia plástica facial”, reforçando que “a evolução

O projeto tem o patrocínio científico da SPORL-CCP.

é enorme, quer na execução das técnicas cirúrgicas e nos seus respetivos resultados, quer no interesse cada vez maior por estes temas”. E acrescenta ser na rinoplastia “onde é mais evidente o desenvolvimento técnico, tanto com o propósito da estética como funcional”.

“Temos massa crítica de nível internacional”, garante ainda o presidente da SPORL-CCP, referindo a “presença assídua” de especialistas portugueses em grandes eventos internacionais da área, bem como a publicação de artigos científicos em revistas de renome.

Hospital Público ■ 11 26 de abril 2024

A inteligência artificial na apneia obstrutiva do sono rinossinusite

Cristina Caroça

Otorrinolaringologista, Hospital

CUF Tejo. NOVA Medical School | Universidade Nova de Lisboa

Aapneia do sono é caracterizada por episódios repetidos de interrupção completa (apneia) ou parcial (hipopneia) da respiração durante o sono. Existem dois mecanismos de apneia do sono – apneia obstrutiva do sono (AOS), que é caracterizada por bloqueio das vias aéreas superiores durante o sono com esforço respiratório contínuo, e apneia central do sono, na qual tanto o fluxo de ar quanto o esforço inspiratório estão ausentes ou reduzidos. A apneia do sono é um problema de saúde importante, podendo ser responsável pelo desenvolvimento de diferentes patologias, nomeadamente doenças cardiovasculares, incluindo hipertensão (HTA), doença arterial co-

ronária e acidente vascular cerebral (AVC).

Atualmente, o diagnóstico da apneia do sono é um processo demorado e complicado, frequentemente exigindo uma estadia durante a noite no laboratório do sono. A polissonografia (PSG) continua a ser o método gold standard para o diagnóstico e avaliação da gravidade da apneia do sono, durante o qual os clínicos podem obter informações importantes referentes ao estado fisiológico do paciente. A principal limitação deste método é a interrupção do sono dos pacientes causada pelos múltiplos sensores e pelo ambiente hospitalar. Embora os testes em ambulatório para apneia do sono sejam amplamente utilizados, a precisão do diagnóstico ou estimativa da gravidade da AOS com esses dispositivos é reduzida.

Para suprir as limitações no diagnóstico da AOS, há uma necessidade imperativa de novas tecnologias para triagem de pacientes sintomáticos e, mais importante ainda, para pacientes assintomáticos de AOS, a fim de reduzir o risco de várias comorbidades potencialmente fatais associadas.

A inteligência artificial (IA) é um ramo da ciência da computação que se concentra no desenvolvimento de máquinas inteligentes capazes de executar tarefas que normalmente exigem inteligência humana. Os sistemas de IA podem

aprender com os dados, identificar padrões, tomar decisões e adaptar o seu comportamento ao longo do tempo sem programação explícita. Na saúde, a IA tem um enorme potencial para transformar vários aspetos da prática médica, da pesquisa e da prestação de cuidados de saúde.

Na AOS, a IA poderá ter impacto no diagnóstico e na terapêutica, assim como na otimização de fluxos de trabalho.

Atualmente a IA tem sido amplamente divulgada como uma ferramenta para o futuro da medicina, no entanto, à medida que estas tecnologias continuam a evoluir e integrar-se na prática clínica prometem enfrentar alguns desafios mais urgentes na saúde e avançar na qualidade, eficiência e acessibilidade aos cuidados médicos.

Na AOS, a IA poderá ter impacto no diagnóstico e na terapêutica, assim como na otimização de fluxos de trabalho. Esta ferramenta tem revelado o potencial de revolucionar os planos de tratamento personalizados para quem tem apneia obstrutiva do sono (AOS) ao utilizar dados específicos dos pacientes, análises preditivas e sistemas de suporte à decisão. Muitos têm sido os dispositivos e aplicações em AOS que têm surgido no nosso quotidiano e que de alguma forma impactam a vida dos pacientes.

Apesar do grande potencial da IA para avançar na área da saúde, incluindo o diagnóstico e tratamento da AOS, é essencial abordar também as preocupações éticas e de privacidade para garantir o uso responsável e ético destas tecnologias de IA.

Concluindo, ao aproveitar o poder das tecnologias de IA, os prestadores de cuidados de saúde podem oferecer cuidados mais personalizados, proativos e eficazes às pessoas afetadas pela apneia obstrutiva do sono, melhorando, em última análise, os resultados de saúde e a qualidade de vida. Salienta-se a importância da pesquisa e desenvolvimento contínuos na medicina do sono impulsionada pela IA para enfrentar desafios clínicos, promover inovação e avançar na governança ética no campo.

Luísa Azevedo

Diretora do Serviço de ORL da ULS da Região de Aveiro

Arinossinusite crónica com polipose nasal (RSCcPN) afeta cerca de 1 a 2% da população, com elevado impacto negativo na qualidade de vida destes doentes. A obstrução nasal e a hiposmia/anosmia são os sintomas predominantes desta doença, contribuindo assim para a sua elevada carga, principalmente na doença severa e não controlada. A carga desta doença não deve ser encarada apenas do ponto de vista clínico, mas também humanístico e económico (custos diretos e indiretos). O tratamento dos doentes com RSCcPN severa e não controlada foi sujeito a uma revolução nas duas últimas décadas, graças a um maior conhecimento da fisiopatologia subjacente, à avaliação de biomarca-

implantes sinusais de libertação prolongada de medicamentos informação

ezequiel

Arinossinusite crónica com e sem pólipos é um processo inflamatório que afeta a mucosa nasal e dos seios perinasais e que constitui um peso significativo na saúde pública, com custos elevados no seu tratamento.

A qualidade de vida destes doentes está significativamente deteriorada nas suas atividades diárias, devido à severidade dos sintomas nasossinusais de todos conhecidos, como perda do olfato, congestão nasal, rinorreia, corrimento nasal posterior, pressão ou mesmo dor facial. Podem apresentar comorbilidades como asma, doença respiratória exacerbada pela Aspirina e anti-inflamatórios não esteroides, e também subtipos de rinossinusite cró-

nica como a rinossinusite fúngica alérgica. Secundariamente, estes doentes podem apresentar perturbações do sono, ansiedade e depressão.

Os protocolos de tratamento médico e as indicações cirúrgicas estão bem estabelecidos. Quando estas se colocam, o cirurgião tem de ter sempre em conta a cicatrização da área operada, em especial no recesso frontal (RF), dadas as suas características anatómicas peculiares, a proximidade da órbita e base anterior do crânio, área muito estreita que facilmente pode ocluir por sinéquia cicatricial ou recidivas dos pólipos devido ao processo inflamatório da mucosa, o qual está sempre subjacente nestas patologias. Mesmo com uma correta técnica cirúrgica, pode ocorrer uma instabilidade do corneto médio, com deslocação do mesmo e encerramento do RF.

Estes fatores têm de ser equacionados durante a cirurgia para minimizar os seus efeitos adversos. A utilização de stents de diversos tipos, com ou sem medicamentos locais, tem sido empregue de um modo empírico, como tentativa para garantir uma cicatrização correta, que assegure assim uma patência do RF, mas sem resultados válidos duradouros, pelo que foram abandonados, em parte, também devido às complicações que originavam. Havia, portanto, a necessidade de se encontrar um dispositivo que servisse de stent/suporte e, simultanea-

mente, libertasse medicamentos que permitissem a redução da inflamação da mucosa na área operada no pós-operatório imediato.

Foram recentemente lançados no mercado português, embora existentes há mais de 7 anos na Europa e EUA, os implantes sinusais PROPELTM, que são concebidos para manter a permeabilidade e administrar corticoides localmente na mucosa sinusal em doentes com idade ≥ 18 anos após cirurgia sinusal: PROPELTM para o seio etmoidal, PROPELTM Mini para o seio etmoidal/ostium do seio frontal e PROPELTM

Os implantes sinusais PROPELTM são concebidos para manter a permeabilidade e administrar corticoides localmente na mucosa sinusal em doentes com idade ≥ 18 anos após cirurgia sinusal.

Contour para os ostia do seio frontal e maxilar em doentes com rinossinusite crónica, embora a sua utilidade no seio maxilar possa ser discutida.

Os implantes PROPELTM dispõem de um inovador mecanismo dois-em-um: quando inseridos, estes implantes autoexpansíveis ajustam-se ao seio ou à sua abertura, ampliada cirurgicamente, e mantêm-no aberto, ao mesmo tempo que libertam diretamente na mucosa do seio um corticoide anti-inflamatório, furoato de mometasona (FM), durante um período de 30 dias. O implante dissolve-se e é bioabsorvido gradualmente ao longo de um período de aproximadamente 30 a 45 dias, ou poderá ser removido antecipadamente a critério do médico em ambulatório.

O dispositivo de aplicação do implante é descartável e de utilização individual e permite aceder ao local desejado de colocação do implante, com este comprimido dentro do aplicador de forma a facilitar a colocação do implante in situ

O implante sinusal PROPELTM separa/dilata os tecidos mucosos, previne obstruções causadas por aderências/ /cicatrizes e reduz o edema e inflamação, controlando a cicatrização concêntrica da abertura do seio frontal e mantendo patenticidade do seio maxilar. O implante reduz a necessidade de intervenções pós-operatórias, como a lise de aderências e/ou a utilização de esteroides orais.

Uma análise da relação custo-eficácia realizada no Reino Unido, em 2020, demonstrou que o recurso a CENS com PROPELTM ao longo de 6 meses é uma opção economicamente viável no sistema de saúde deste país, uma vez que demonstrou ser menos dispendioso e mais eficaz do que a alternativa (CENS sem PROPELTM). A redução de custos dos procedimentos assentou principalmente sobre a redução de polipectomias pós-intervenção devido a recorrências precoces da polipose e à diminuição de reintervenção para lise de sinéquias/aderências e bloqueios devido à hiperplasia da neomucosa, que são a génese das complicações da CENS no pós-operatório imediato, e à falência da intervenção no médio e longo prazos.

Em conclusão, as evidências disponíveis permitem estimar o potencial impacto que a colocação de implantes PROPELTM poderá ter na recuperação dos doentes com patologia inflamatória nasossinusal e, consequentemente, no sistema de saúde de Portugal, ou seja, uma possível redução de custos através de um menor consumo de recursos de cuidados de saúde, como foi demonstrado noutros países por estudos clínicos credíveis.

A introdução destes implantes sinusais no armamentário cirúrgico seria, pelas razões atrás apresentadas, uma mais-valia enorme como

12 ■ Hospital Público 26 de abril 2024
Barros Otorrinolaringologista, Hospital da Luz Lisboa

crónica com polipose nasal – o paradigma mudou?

dores disponíveis e uma maior consciencialização das comorbilidades.

A RSCcPN tem subjacente uma reação inflamatória tipo 2 em mais de 80% dos doentes (Ocidente) e está associada a comorbilidades como a asma, a rinite alérgica e a doença respiratória exacerbada por anti-inflamatórios não esteroides, pelo que a abordagem multidisciplinar, centrada no doente, é fundamental, quer no diagnóstico, quer na decisão terapêutica.

O objetivo de qualquer tratamento de uma doença crónica é obter o seu controlo, sendo que, normalmente, a cura não é frequente. No entanto, com o advento dos anticorpos monoclonais dirigidos à inflamação tipo 2, com potencial efeito modificador da doença, há uma necessidade de redefinir os objetivos do tratamento da RSCcPN.

À semelhança do que aconteceu no passado com a terapêutica biológica no tratamento de outras doenças inflamatórias crónicas, nomeadamente a psoríase, a artrite reumatoide e a doença inflamatória intestinal, os biológicos aprovados na RSCcPN com a estratégia treat-to-target levantam a possibilidade de atingir e manter a remissão da doença.

Quem imaginava, há 15 anos, que nós iríamos discutir a possibilidade de atingir a remissão ou até a cura para a RSCcPN? Quem diria que o sentimento de frustração comum nos otorrinolaringologistas, quando lidavam com um doente com doença severa e não controlada, seria substi-

tuído por uma perspetiva mais ambiciosa e um futuro bem mais risonho? A verdade é que estas novas terapêuticas entraram na nossa esfera numa das fases de maior sucesso cirúrgico da história dos doentes com RSCcPN, pelo que devemos considerar uma combinação de estratégias numa abordagem multifacetada, centrada no doente, de acordo com as guidelines recomendadas pela EUFOREA/EPOS.

Devemos estar familiarizados com os critérios, os outcomes, as contraindicações e as considerações dos cinco pilares terapêuticos principais atualmente disponíveis, de forma a oferecermos ao nosso doente com RSCcPN a opção de diferentes estratégias de tratamento, de uma forma individualizada, no sentido da personalização dos cuidados em saúde.

Apesar de toda a investigação à

volta da RSCcPN, ainda há muito espaço para a evolução científica, sem declarações definitivas ou sentimentos cegos, defendendo um tratamento em detrimento do outro.

Esta discussão pode tornar-se mais interessante à medida que mais marcadores se tornarem disponíveis, permitindo a identificação de endotipos que respondam às diferentes opções terapêuticas ou combinação delas.

É toda esta evolução resultante da imensa investigação em torno da RSCcPN que permite elevar a fasquia em relação às expectativas dos clínicos e dos seus doentes. É para nós um privilégio estar a viver um período em que a existência de maior conhecimento, novas alternativas terapêuticas e novas perspetivas permitam que estejamos perante uma mudança de paradigma e claramente numa nova era da RSCcPN.

As evidências disponíveis permitem estimar o potencial impacto que a colocação de implantes

PROPELTM poderá ter na recuperação dos doentes com patologia inflamatória nasossinusal.

coadjuvante no tratamento cirúrgico dos doentes com patologia inflamatória nasossinusal, ou com outras patologias do recesso frontal submetidas a cirurgia nasossinusal e onde a patência do recesso frontal é um dos objetivos da cirurgia, com vista a uma cicatrização mais rápida, sem complicações, permitindo a funcionalidade do seio frontal. Deverão ser utilizados em doentes bem selecionados.

Hospital Público ■ 13 26 de abril 2024
implantação coclear: lições de 17 anos de experiência de um Centro de referência

/DGS (Agencia de Calidad Sanitaria de Andalucía / Direção-Geral da Saúde) em 2023, com a classificação de Bom. Por definição, um Centro de Referência é um serviço que é reconhecido como o expoente mais elevado de competências na prestação de cuidados de saúde de elevada qualidade em situações de diagnóstico ou tratamento particularmente complexos.

OServiço de Otorrinolaringologia do Hospital de Egas Moniz é um Centro de Referência do Ministério da Saúde na área dos Implantes Cocleares desde 2017 e obteve a certificação ACSA/

O propósito deste curso é o de partilhar a experiência do nosso Centro ao longo de um percurso de 17 anos, que foi possível graças à tradição do Serviço no tratamento especializado e multidisciplinar de doentes adultos e de idade pediátrica com hipoacusia na Consulta de Surdez e à competência na cirurgia otológica avançada de alguns dos seus cirurgiões. A implantação coclear era uma atividade lógica e necessária. pois é uma opção terapêutica que deve fazer parte da carteira

de serviços de um centro otológico que se quer abrangente e de fim de linha para as patologias otológicas e a surdez.

A primeira implantação coclear que realizámos teve a ajuda de uma figura de referência, o Prof. Manuel Manrique. Rapidamente o Serviço obteve autonomia técnica para iniciar o seu programa, também com uma ajuda forte das companhias ligadas aos implantes, sobretudo na formação. A nossa experiência foi-se consolidando com os casos que realizámos nos primeiros anos, tendo havido mais tarde um impulso grande na nossa atividade, mercê de um maior reconhecimento do assunto devido ao aparecimento das Normas de Orientação Clínica dos Implantes Cocleares (a norma dos doentes de idade pediátrica e a norma do adulto) e, finalmente, com o reconhecimento dos centros de referência do Ministério da Saúde nesta área.

tratamento da SAHoS pediátrica: para além da adeno-amigdalectomia

NFoi também importante a possibilidade, mais recente, impulsionada pelo nosso Centro junto do Ministério da Saúde em defesa dos doentes, de permitir que os candidatos à implantação coclear operados no Serviço Nacional de Saúde pudessem receber os dispositivos mais recentes e tecnicamente mais evoluídos, como acontece atualmente.

Com todas estas circunstâncias vimos crescer exponencialmente o nosso movimento assistencial e cirúrgico, operar doentes de todas as idades, etiologias e geografias, ultrapassando as 100 cirurgias de implantação coclear por ano em 2022 e depois também em 2023.

Os centros de referência têm a obrigação de divulgar pública e periodicamente as suas práticas e os seus resultados. Devem também ser os centros de referência, a par de um alinhamento exigente com as melhores práticas, a explorar as

indicações ainda consideradas off-the-label, ajudando, em colaboração com outros centros, a atualizar as indicações e a fazer evoluir o conhecimento sobre esta opção de tratamento da surdez.

O Curso que vamos realizar no 71.º Congresso, apresentado pelos elementos mais jovens do Centro de Referência, pretende descrever as pessoas, o processo assistencial dos candidatos à implantação coclear, apresentar resultados, descrever as complicações e discutir casos exemplares. Em suma, o Curso procura explicar como trabalhamos, prestar contas do nosso trabalho aos otorrinolaringologistas portugueses e ajudar que os colegas nos considerem como um Centro para onde podem referenciar os doentes com hipoacusias acentuadas que possam ser candidatos à implantação coclear e que desejam que sejam bem tratados, de acordo com as práticas mais atualizadas e exigentes.

as vésperas do 71.º Congresso Nacional de SPORL, levantamos um pouco o véu do que será o curso que este ano o Serviço de ORL do Hospital Professor Doutor Fernando Fonseca (HFF) propõe: “Tratamento da SAHOS pediátrica – Para além da adeno-amigdalectomia”. Este curso surge com naturalidade face à experiência que temos coligido ao longo de anos, servindo uma população pediátrica muito numerosa e desafiante, apoiados por um Departamento de Pediatria do HFF muito empenhado nesta área específica do sono. Com efeito, temos o privilégio de poder contar com o apoio de um Serviço que executa cerca de 350 polissonografias noturnas pediátricas por ano.

De facto, a SAHOS, sendo muito prevalente na idade pediátrica, tem reconhecidamente nesta população um tratamento que passa, na sua maioria, pela cirurgia das amígdalas e adenoides. Contudo, cerca de 25 a 30% das crianças que são submetidas a adeno-amigdalectomia por este motivo apresentam persistência de sintomas obstrutivos durante o sono, entendida como SAHOS refratária ou persistente.

A abordagem terapêutica destas crianças exige experiência, podendo ter uma dimensão médica e/ou cirúrgica.

cirúrgica, e constitui um desafio à capacidade de trabalho em equipa, sendo essencial um entendimento aprofundado e multidisciplinar. Na vertente do tratamento cirúrgico de resgate, destacamos técnicas como as turbinoplastias, supraglotoplastias, epiglototomias ou pexias, assim como as amigdalectomias linguais, entre outras, que, quando aplicadas criteriosamente, produzem os resultados esperados.

Os autores deste Curso – Diogo Raposo, Marco Peres, Gustavo Rocha, Cristina Adónis e eu próprio – pretendem partilhar, com recurso a casos práticos, a forma de abordar as crianças com SAHOS cujo tratamento é mais exigente e obriga a ir para além da adeno-amigdalectomia. Filipe Freire

Nestes casos, a DISE pediátrica assume uma importância relevante no esclarecimento e identificação das causas do insucesso cirúrgico, constituindo, quanto a nós, uma ferramenta incontornável no algoritmo de avaliação destes doentes, embora devamos ter presente que não serão

exclusivamente anatómicas as causas para que tal aconteça. A abordagem terapêutica destas crianças exige experiência, podendo ter uma dimensão médica e/ou

Qual a prótese passiva a escolher na cirurgia do ouvido médio?

pedro Santos

Wullstein inicia a era moderna da cirurgia reconstrutiva do OM com a publicação, na década de 50, de várias técnicas

j. Marques dos Santos

de timpanoplastia, cujo objetivo cirúrgico seria gerar um diferencial de pressão entre a janela oval e a janela redonda. À semelhança dos tempos

atuais, a cirurgia era adaptada ao status da cadeia ossicular.

No início da década de 60, as próteses em materiais aloplásticos, dos quais é exemplo o polietileno, permitiam ganhos auditivos promissores, mas estavam associados a taxas de extrusão elevadas. Por este motivo, os materiais autólogos (bigorna moldada ou cortical óssea) foram usados por apresentarem uma taxa de extrusão menor, não obstante obrigarem a um tempo de preparação perioperatório superior ao de outros materiais.

A hidroxiapatite é um mineral bioativo que permite a integração óssea com a sua vizinhança, reduzindo a taxa de extrusão. Este material permite uma boa transmissão acústica e, a partir da década de 80, foi utilizado como matéria-prima preferencial nas próteses ossiculares do OM. No entan-

to, o seu peso significativo tornava a sua manipulação cirúrgica desafiante.

O titânio apresenta biocompatibilidade semelhante à hidroxiapatite, com uma densidade significativamente menor, tratando-se de um metal não magnético e moldável. Permite a elaboração de próteses dos mais variados formatos, aumentando a sua versatilidade. Esta última característica permite que a maioria das próteses de titânio apresentem um design mais fino, com um topo ou plataforma abertos, possibilitando uma visualização ampla do campo operatório.

Desde a sua primeira utilização na década de 90, as próteses de titânio têm adquirido uma popularidade crescente na prática cirúrgica.

A seleção dos doentes e dos procedimentos para a reconstrução da cadeia ossicular depende em larga medi-

da da patologia em causa. Seguem-se algumas situações frequentes.

Quando o estribo se apresenta móvel (com supraestrutura viável), com martelo móvel, mas bigorna ausente, as próteses PORP (partial ossicular replacement prosthesis) tipo Bell ou Clip apresentam-se como uma boa solução.

Em casos em que o estribo permanece móvel, mas o martelo se encontra fixo e a bigorna ausente, o entalhe que as PORP Malleus Notch Partial Bell apresentam permite conectar o cabo do martelo e a membrana timpânica ao estribo, após amputação da cabeça do martelo.

Outra situação frequente é a necrose da longa apófise da bigorna, com integridade da restante cadeia ossicular. A gestão desta situação depende da distância entre o remanescente da bigorna e do capítulo do estribo. Se esta for diminuta, a utilização

14 ■ Hospital Público 26 de abril 2024
pedro escada Diretor do Serviço de ORL da ULS de Lisboa Ocidental Assistente hospitalar, Serviço de ORL do Hospital CUF Viseu Coordenador do Serviço de ORL do Hospital CUF Viseu
Diretor do Serviço de
do HFF, ULS de Amadora-Sintra
ORL
rinosseptoplastia:

Tiago Órfão

Na mesa-redonda sobre rinossep toplastia pretendemos discutir e trocar ideias sobre os diversos passos que compõem este procedimen to. Para completar com sucesso todo o processo cirúrgico que envolve uma rinosseptoplastia, não é suficiente ter competência técnica durante o ato ci rúrgico. Também é necessário realizar uma preparação prévia muito rigorosa, que engloba aspetos tão diversificados como o registo fotográfico, a análise das expectativas do doente, incluindo o seu perfil psicológico, ou a averiguação das questões funcionais, que podem estar ou não presentes, entre muitos outros. Numa época em que são realizados cada vez mais preenchimentos com áci do hialurónico, serão também discuti das as suas vantagens e desvantagens, bem como os cuidados especiais que os narizes com rinomodelação pré via encerram. Como cirurgiões, não

Pretendemos transmitir ensinamentos acerca de todo o processo que envolve um doente que irá realizar, ou já realizou, uma rinosseptoplastia. de cimento ósseo poderá ser eficaz. Quando a distância ultrapassa 2 milímetros, uma prótese do tipo Angular Clip afigura-se como uma boa opção.

As próteses TORP (total ossicular replacement prosthesis), usadas na ausência de supraestrutura do estribo, são colocadas diretamente sobre a platina. Para maior estabilidade, podem ser fixadas num pequeno orifício previamente feito no pericôndrio ou cartilagem, utilizado para recobrir a platina.

Concluindo, a prótese ideal deverá ser constituída por um material biocompatível, leve e rígido, apresentar um design funcional e boa condução acústica. As próteses de titânio são as que mais se aproximam desta definição, no entanto, a experiência e a técnica do cirurgião, bem como fatores inerentes ao doente, mantêm-se como as principais condicionantes para um bom resultado cirúrgico.

princípios básicos da primeira à última fotografia!

deixaremos de analisar alguns casos clínicos e de discutir as diversas opções cirúrgicas que nos podem conduzir ao melhor resultado possível. No entanto, não queremos estar centrados exclusivamente nas diversas técnicas cirúrgicas que podem ser utili

sos, passando pela medicação prescrita para o domicílio, o período das consultas pós-operatórias, como lidar com o doente insatisfeito e em que situações e quando realizar uma revisão cirúrgica. Com esta mesa-redonda, pretendemos transmitir ensinamentos acerca

um público menos focado apenas na Cirurgia Plástica da Face, tentaremos transmitir as “ferramentas” para que, no final da sessão, a audiência tenha contactado com os passos por que passa um doente desde que entra na porta do consultório até ao momento da última consulta.

Helena Silveira e da Dr.ª Raquel Bento. Com este leque de colegas, de diferentes gerações, mas todos com um gosto particular por esta área da Otorrinolaringologia, estamos certos de que será um espaço do Congresso em que os interessados em cirurgia estética e fun

Hospital Público ■ 15 26 de abril 2024
Assistente hospitalar de ORL, ULS de São João. FMUP
C M Y CM MY CY CMY K AF Widex_SPORL_Imprensa264x340.pdf 1 22/04/2024 10:30 º
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