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Carta aoS ProfeSSoreS

Prezados Professores,

este manual, criado especialmente para vocês, tem a intenção de lhes sugerir discussões e atividades em torno da novela Dia de São Nunca à Tarde, de roberto drummond, publicada postumamente. trata-se de uma colaboração com o que certamente costumam fazer, e depois da leitura, talvez já até tenham pensado em formas de explorá-la com seus alunos, que também já irão recebê-la.

se já leram o livro, possivelmente tenham visto, entre os paratextos, um estudo apresentado ao estudante, com o objetivo de ajudá-lo em uma segunda leitura desta obra, cujos temas são o protagonismo juvenil e a possibilidade de transformação do mundo pela arte.

no texto referido, insistimos na ideia de que fazemos análises e discussões do nosso ponto de vista, e que, na arte, os ângulos de interpretação de uma criação são muitos e fecundos. mas, mesmo adotando um olhar sobre a obra, estamos abrindo possibilidades para outras formas de vê-la, e não imaginando que existe um único foco certo — por acaso, o nosso. uma prova disso vem exatamente da proposta do meC, apresentada no edital de seleção de obras, de que os livros e manuais cheguem a professores de outras áreas, além dos de língua Portuguesa: há uma clara percepção de que, de lugares diferentes, lemos de modo diferente o que está à nossa volta, inclusive — e com mais razão — na obra de arte. É o mínimo que proporciona uma característica fundamental da arte: a plurissignificação.

Chegando a vários e diferentes públicos, entre professores e alunos, a obra terá enfoques distintos; mas, segundo entendemos, complementares, e não excludentes. esse não é um problema das manifestações artísticas: é a sua maior riqueza. Podemos dizer que a obra de arte é, mesmo sem saber, democrática e generosa: aceita e aplaude as suas leituras diferentes. Por isso mesmo, umberto eco, um de nossos maiores estudiosos e escritores, fala em “obra aberta”, com muitas entradas e muitas saídas, por onde entrem e saiam seus fruidores, conforme sua história de vida, seu envolvimento com artes e com a literatura.

dada essa complementaridade de enfoques, é fundamental que um bom planejamento da escola cuide não só da leitura da novela de que vamos tratar, mas também deste manual, de modo que os professores estejam à vontade quanto à organização

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dessa nova experiência de exploração da obra: que áreas a trabalharão, em que sequência, ou se uma só se incumbirá dela. desse modo se garantirá o melhor aproveitamento da obra pela turma, com muitos avanços, mas sem maiores redundâncias.

nesse sentido, sem conhecer os docentes nem o planejamento escolar, nas sugestões a cada grupo de professores, seguiremos a própria organização indicada no mesmo edital do meC/fnde, mas privilegiando, e não impedindo, o movimento dos professores por diferentes áreas: não podemos esquecer que a literatura, como todas as artes, abre possibilidades, e não as fecha.

Pedimos sua licença para voltarmos, já nesta conversa inicial, a alguns pontos tratados no estudo da obra, proposto aos alunos.

no reiterado convite ao estudante para a segunda leitura da obra, nossa intenção ia além de apresentar as razões e vantagens dela. Pretendíamos, sobretudo, garantir a eles o direito que todo leitor tem de uma primeira leitura “independente”, sem intermediários, um encontro aberto com o inesperado, assegurado aos próprios teóricos, especialistas e críticos: o diálogo desarmado entre autor e leitor.

muitas vezes, na ânsia de ganhar o aluno para determinada leitura, falamos dela muito mais do que é necessário para motivá-lo. ao contrário, apresentar informações indispensáveis e criar dúvidas e desafios a respeito da leitura funcionará sempre como motivação, mas nunca como a “sua” leitura da obra. têm toda razão os teóricos que insistem na posição de que, nesse primeiro encontro, é fundamental que chegue ao fruidor, não a voz de outros (nem mesmo a do professor), mas a do criador. essa voz pode soar difícil, prazerosa, polêmica, mas a “tradução” ou análise feita por qualquer outra dificultará as descobertas, questionamentos e opiniões pessoais do seu novo leitor.

Como veremos, a segunda leitura não retifica a primeira: abre horizontes, ilumina ângulos, mas, em princípio, nem sempre muda um dado fundamental: o gostar ou não da obra, elegê-la como uma de suas leituras de cabeceira.

Por isso, é tão fundamental a segunda leitura, propiciada quase exclusivamente pela escola, que tem (ou deveria ter) não somente o objetivo de desenvolver em cada aluno o gosto e a procura espontânea da literatura, mas também o de tornar a leitura do aluno mais qualificada, propiciando nele o desenvolvimento do senso estético, do espírito crítico, do imaginário e da criatividade. É uma das nossas oportunidades de ajudá-lo na percepção mais arguta e sensível não apenas do livro e da arte, mas também do mundo e da vida. esta obra, aliás, proporciona isso de maneira magistral.

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no grande leque de opções oferecidas neste manual, para esta segunda leitura e os desdobramentos dela, a experiência de vocês e os conhecimentos dos alunos é que vão poder definir aquelas que parecem mais adequadas à sua turma do momento, de modo a ajudar cada um a manter ou descobrir o prazer da leitura literária.

sabemos, como vocês, que esta não é, em geral, uma tarefa fácil. e, como em todo o processo educacional, as mudanças demoram a se evidenciar: afinal, o semear vem muito antes do colher. Por sorte, como disse muito bem roland Barthes, o professor se caracteriza pela teimosia, por não desistir facilmente. e sabemos conviver com as situações difíceis (e driblá-las) de alunos que não gostam de determinada obra lida, ou de literatura, preferindo outras experiências artísticas; ou de alunos que, pela história de vida, leem pouco, ou leem mal: vamos tentando novas estratégias, livros novos, experiências desafiadoras. sabemos perfeitamente que, se os alunos têm o direito de não gostar de ler, nós temos a obrigação de acenar-lhes com a literatura, de achar que será possível, sempre, que eles descubram a arte, autores e obras que valham a pena. e — felizmente! — isso acontece mais do que supomos: muitos depoimentos e pesquisas mostram que a arte — especialmente a literatura — pode ser descoberta tardiamente, por pessoas inimagináveis, por razões impensáveis. afinal, todos nós, humanos, estamos sempre procurando a transcendência. Como disse fernando Pessoa: “a vida não basta” — precisamos saber mais do que somos, onde estamos, para onde vamos, o que nos espera...

desejamos que a seus alunos, mas também a vocês, a leitura e as atividades sobre a obra Dia de São Nunca à Tarde proporcionem momentos de prazer e do melhor encontro com a arte.

equipe técnica da editora Geração

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