deveria "agüentar o tranco" das minhas depressões e manias e de que minha alma iria definhar se eu optasse por amortecer a intensidade e a dor das minhas experiências através da medicação. A combinação
das
suas
melancolias cada vez piores com as minhas, associada à perigosa sedução das suas opiniões sobre a medicação, tornou muito difícil para mim a manutenção de um relacionamento com ela. Uma noite, há muitos anos, ela me passou um sermão por "capitular diante da Medicina Organizada" ao "fazer desaparecer meus sentimentos com o uso do lítio". Disse ela que minha personalidade estava árida, que o fogo se extinguia e que eu não passava de uma sombra do que havia sido. Isso tocou fundo em mim, como imagino que ela soubesse que tocaria, mas simplesmente deixou furioso o homem com quem eu estava saindo na época. Ele me havia visto muito mal mesmo e não via nenhum valor a preservar naquela insanidade. Ele procurou ser espirituoso para esvaziar a situação: "Sua irmã pode ser apenas uma sombra do que foi, mas essa sombra é o que eu consigo manejar, ou mais do que consigo" — mas minha irmã voou para cima dele, deixando-me revoltada por dentro e mais uma vez cheia de dúvidas quanto a minha decisão de tomar lítio. Eu não tinha condições de ficar perto demais de alguém que representava, como minha irmã, as tentações que ocupavam minha mente não medicada: os ecos da criação a dizer que cada um deveria ser capaz de resolver tudo sozinho; a atração extrema de reconquistar êxtases e entusiasmos perdidos. Eu estava começando, apenas começando, a entender que o que estava em jogo não era só minha mente mas minha vida. No entanto, eu não havia sido criada para me submeter sem lutar. Eu realmente acreditava em todas aquelas coisas que me haviam ensinado sobre agüentar o tranco, sobre a autoconfiança e sobre não atrapalhar os outros com nossos problemas. Ao olhar em retrospectiva para a destruição causada por esse tipo de orgulho e estupidez cega, porém, eu me pergunto agora no que é que eu poderia estar pensando. Também me havia sido ensinado a pensar por mim mesma. Por que, então, eu não questionava essas noções rígidas e inaplicáveis de autoconfiança? Por que eu não percebia como