Revista 80 Anos Fump

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Publicação comemorativa Maio de 2010


Hรก 80 anos criando novas oportunidades para os estudantes da UFMG. Conheรงa todos os programas no portal www.fump.ufmg.br


Editorial

Octogenária de espírito jovem Em seu discurso de posse em 1927, o primeiro reitor da

enfrentados pela assistência estudantil, como o financia-

Universidade de Minas Gerais (UMG), hoje UFMG, profes-

mento de suas atividades e a demanda proveniente das no-

sor Francisco Mendes Pimentel, defendia a assistência aos

vas políticas de acesso à universidade, que garantem maior

estudantes “em más condições de fortuna”. Sua retórica ga-

inclusão social.

nhou materialidade dois anos depois, com a criação da As-

Também poderão ser lidas histórias de alunos assistidos,

sociação Universitária Mineira (AUM). Estavam lançadas as

como as de Elivelto e Roger, figuras obstinadas que jamais

bases de um dos programas mais bem-sucedidos da UFMG:

desistiram de estudar na UFMG e hoje encontram nos pro-

o de assistência estudantil, executado pela Fundação Uni-

gramas da Fump um ponto de apoio para concretizar o so-

versitária Mendes Pimentel, cujo nome faz justa homena-

nho de uma vida melhor.

gem a nosso reitor, otimista e visionário, que, na longínqua

Por lidar com gerações de estudantes, que recorrem aos

década de 20 do século passado, já enxergava a educação

seus programas desde 1929 e cujas trajetórias de superação

como o caminho mais natural de superação das desigual-

e sucesso confirmam que Mendes Pimentel estava certo

dades sociais.

em apoiar a educação dos “sem-fortuna”, a Fump, apesar

A trajetória da Fump está – e sempre esteve – ligada ao per-

de octogenária, é ainda jovem e inovadora: é isso que leva a

curso da assistência estudantil no Brasil, como revela esta

UFMG a enfrentar os desafios da assistência estudantil no

edição comemorativa de 80 anos. Sem a pretensão de ras-

século 21, que, em sua essência, talvez não sejam tão dife-

trear com muitos detalhes os caminhos percorridos nesse

rentes daqueles com os quais Mendes Pimentel se deparou

período, a publicação mostra como a instituição evoluiu ao

há oito décadas.

longo dos tempos – do pacto de silêncio que preservava a honra daqueles que dependiam de auxílio financeiro para

Boa leitura.

estudar ao reconhecimento da assistência como um direito

Professor Seme Gebara Neto – presidente da Fundação

a ser reivindicado e exercido, chegando aos atuais desafios

Universitária Mendes Pimentel (Fump)

Expediente Fump 80 anos Publicação da Fundação Universitária Mendes Pimentel (Fump) Reitor: Clélio Campolina Diniz

Projeto gráfico e diagramação: Marcelo Lustosa/Cedecom

Vice-reitora: Rocksane de Carvalho Norton

Ilustrações: Ângela Bacon

Presidente da Fump: Seme Gebara Neto

Capa: Bruna Rodrigues/Fump Fotografias: Aurélio Fabiano Lopes Gomes, Diogo Domingues,

Superintendente: Paulo Roberto Manso

Felipe Zig e Foca Lisboa

Assessora de Comunicação: Maria do Rosário Rangel dos Santos

Impressão: Label Artes Gráficas Tiragem: 2 mil exemplares

Edição: Flávio de Almeida Reportagem e redação: Ana Maria Vieira, Ana Rita Araújo, Flávio de Almeida, Igor Lage, Itamar Rigueira Jr., Priscila Brito e Vicente Cardoso Júnior


Muito além

da filantropia

Trajetória da Fump no campo da assistência estudantil revela compromissos de várias gerações com mudanças sociais

Um pacto de honra encontra-se entre os fatos que mar-

cavalheiresca, até as disposições constitucionais sobre

caram os primórdios da assistência estudantil na Univer-

equidade, as experiências brasileiras no campo da assis-

sidade. Citado em textos que registram a formação da

tência se sucederam, repercutindo nas instituições de

entidade, o compromisso consistia em manter sob sigilo

ensino superior. Ainda hoje, impasses sobre quais bases

a identidade dos estudantes da Universidade de Minas

seguir orientam perguntas relacionadas à construção de

Gerais (UMG) beneficiários de empréstimos financeiros

políticas de oportunidades acadêmicas e de assistência

concedidos pela Caixa dos Estudantes Pobres da então

às necessidades básicas de jovens pobres que ingressam

Assistência Universitária Mendes Pimentel (Aump).

nas universidades públicas.

A atitude estava oficializada em cláusula dos estatutos de criação da entidade, em 1936. Silenciar-se diante da

Aos talentosos

identidade de alunos assistidos era uma maneira de

Até os anos 1950, a noção corrente era de que assistên-

protegê-los da vergonha pública a que estariam expos-

cia estudantil, “quando ocorresse, deveria se destinar

tos, por não conseguirem se erguer por conta própria.

aos ‘talentosos’, aos desvalidos da sorte que haviam

Ignorados pelo Estado, esses estudantes, antes presas

sido bem-sucedidos por conseguirem chegar ao ensino

de suas precárias condições econômicas, vão encontrar

superior”, observa Maria do Carmo de Lacerda Peixoto,

abrigo na Aump.

professora da Faculdade de Educação e Diretora de Ava-

Sete décadas depois, o silêncio deixou de ser o condutor

liação Institucional da UFMG. Sua afirmação pode ser

dessa história: o acesso aos benefícios tornou-se direi-

encontrada em texto sobre a assistência ao universitário

to reivindicado em voz alta, demonstrando o quanto as

na UFMG, apresentado em evento acadêmico no final

ideias e práticas relativas à justiça e assistência sociais

dos anos 1990.

mudaram no país e na própria Universidade.

De modo geral, o tema assistência estudantil ainda é

Da caridade religiosa, passando pela filantropia cívica ou

pouco estudado no país. Essa lacuna é atribuída a di-

Linha do Tempo 80 anos da fump Fundação da Universidade de Minas Gerais (UMG), que passa a reunir a Faculdade de Direito, a Faculdade de Medicina, a Escola de Engenharia e a Faculdade de Odontologia e Farmácia.

1927

1929

1930

1936 Um mês após tomar o poder, Getúlio Vargas promulga decreto que obriga a promoção automática dos estudantes. O Conselho Universitário decide não acatar a determinação, gerando tumulto que acabou em morte de um estudante e renúncia do então reitor Mendes Pimentel.

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José Baeta Vianna cria a Associação Universitária Mendes Pimentel (Aump), que assume as atividades de assistência na UMG.

Criação da Associação Universitária Mineira (AUM), primeira estrutura de assistência estudantil na UMG.


versos fatores. Maria do Carmo identifica pelo menos duas explicações: tendência dos pesquisadores a dirigirem o interesse para outras questões quando o foco recai sobre o corpo discente e presença restrita dessa modalidade de serviço na estrutura da maioria das universidades, constituídas para atender à formação de uma elite intelectual. “A UFMG, através da Fundação Universitária Mendes Pimentel, caracteriza-se como uma das poucas universidades brasileiras que têm se dedicado a desempenhar essas ações [assistenciais] de forma sistemática”, registra. Não por coincidência, boa parte dos estudos sobre a experiência da assistência universitária tem por referência a Fump – experiência ímpar no panorama nacional, também pela variedade de programas e longevidade da entidade. Seu percurso empresta novas cores à própria história da educação no país. E não se trata apenas de extrair sig-

ção de tensões sociais e instrução geral eram algumas

nificados do silêncio dos pioneiros em torno da pobreza

das chaves do pensamento do período.

dos colegas. De fato, o sigilo encerra um sentimento de

Foi nesse ambiente que o primeiro reitor da UMG, Fran-

época, mas não toda a concepção de assistência uni-

cisco Mendes Pimentel, forjou o modelo de universida-

versitária que circulava entre as vanguardas. Dentro da

de e da associação que originou a Fump. Segundo a his-

Universidade, observa-se que a assistência, já nos seus

toriadora Maria Efigênia Lage de Resende, para Mendes

primórdios, ia além da filantropia.

Pimentel, a prática da democracia era um problema in-

Para a pesquisadora da Faculdade de Educação, Minas

timamente associado à educação da população. Nesse

Gerais fez a diferença em decorrência de uma maior

aspecto, compreende-se como ele abrigou a bandeira de

consciência social de sua elite intelectual. Moderniza-

promoção social, por meio de assistência institucionaliza-

ção, desenvolvimento, humanismo, solidariedade, redu-

da aos universitários de baixa condição socioeconômica.

Criação do Fundo de Bolsas, que garante orçamento próprio para a assistência estudantil.

Instalação da ditadura militar no Brasil. Na UMG, Aluísio Pimenta assume a Reitoria e revitaliza a Aump, desestruturada na década anterior.

1949

1964

A UMG é federalizada, mas só incorpora Federal ao nome em 1965, passando a se chamar UFMG.

1968

1972 Lei 5.540 reduz a representação estudantil para um quinto dos membros de colegiados e comissões. No ano seguinte, a Aump adota essa proporção em seu Conselho Diretor.

1973 A Aump passa a se chamar Fundação Universitária Mendes Pimentel, o que lhe confere maior autonomia e viabiliza 3 a isenção de impostos e o estabelecimento de convênios.


social e solidariedade marcou as atividades da Caixa no período de 1932 a 1935. “A prática assistencial desenvolvida pela Caixa não estava vinculada ao Estado, não parte de uma iniciativa dele, mesmo que possa contribuir de alguma forma para a Essa visão se aprofunda nos anos 1930, quando o pro-

viabilização de suas ações, como por exemplo, oferecen-

fessor de Medicina José Baeta Vianna assume a direção

do matrículas gratuitas para que a Caixa as distribuísse”,

da então Associação Universitária Mineira (AUM) – de-

escreve Portes, em artigo publicado em 2003, pelos Ca-

nominação original da Fump e que, em 1936, é alterada

dernos de História da Educação.

para Assistência Universitária Mendes Pimentel (Aump). Integrava a entidade a Caixa dos Estudantes Pobres Ede-

Provincianismo solidário

lweiss Barcellos, responsável pela concessão dos benefí-

Segundo Écio Portes, grande parte dos beneficiários era

cios financeiros, e que acabou estabelecendo as linhas

do interior de Minas. Seus pais se dividiam em duas ca-

para as práticas de assistência na Universidade. A gestão

tegorias de ocupações: funcionários públicos e trabalha-

era dividida entre estudantes e professores. Conforme

dores manuais (lavradores e operários). Ainda de acordo

relata o professor Écio Portes, da Universidade Federal

com o professor da UFSJ, os documentos aos quais teve

de São João del-Rei (UFSJ), o entrelaçamento entre visão

acesso em sua pesquisa mostram um panorama em que,

Instalada Instalada a Comissão a Comissão Especial Especial sobre sobre Política Política de Assistência de Assistência da UFMG, da UFMG, cujocujo relatório relatório traztraz indicações indicações fundamentais fundamentais parapara os rumos os rumos da da Fump Fump nosnos anos anos seguintes. seguintes.

1984 1984

4

1991 1991

Estudantes Estudantes ocupam ocupam o prédio o prédio da Reitoria da Reitoria exigindo exigindo queque o Conselho o Conselho Diretor Diretor da Fump da Fump volte volte a ter a ter representação representação paritária paritária entre entre discentes discentes e docentes. e docentes. Após Após intensas intensas discussões, discussões, a reivindicação a reivindicação dosdos estudantes estudantes é atendida. é atendida.

UFMG UFMG institui institui o Programa o Programa PermaPermanente nente da Moradia da Moradia Universitária, Universitária, a a ser ser administrado administrado pelapela Fump. Fump.

1997 1997


ainda que próximas da filantropia, “as ações da Caixa

para, daí, extrair fundos”.

se distanciam de um discurso e se consubstanciam em

Anos depois, já na década de 1950, nova crise se instala

prática social”. E acrescenta: “Elas revelam um inconfor-

na entidade, quando a recém-federalizada UMG estabe-

mismo com a situação social de um grupo de colegas,

lece a gratuidade de ensino. Parte da missão da Aump

uma luta pela igualdade de oportunidades quando ainda

– distribuir vagas não pagas – se esvazia. Ainda assim, o

não se falava nisso e promovem, mesmo que de forma

modelo de assistência em voga nos anos iniciais, e espe-

restrita, mudança social ao auxiliar os sujeitos a sair da

cialmente praticado pela Caixa dos Estudantes Pobres,

situação na qual se encontravam. Efetuar um curso uni-

mantém suas raízes até a atualidade.

versitário no período era para poucos. Não podemos nos

A dominância dessa linha de assistência produziu suas

esquecer que nesse período a educação era um bem de

consequências, como pontua Maria do Carmo de Lacer-

luxo. (...). Talvez aqueles jovens fundadores da Caixa fos-

da. Ela lembra que o apoio e a abertura de oportunida-

sem portadores (...) de um provincianismo solidário, ou

des aos mais pobres de se integrarem à elite intelectual ocorreram “com base numa ideia de solidariedade in-

Minas Gerais fez a diferença em decorrência de uma maior consciência

dividual para com os desprovidos de fortuna, em detrimento de uma ação política associada ao processo de

social de sua elite intelectual

desenvolvimento econômico da nação”. A crise de 1953,

seja, tivessem a dimensão exata do que a ação solidária

cisão, espécie de causa da paralisia das atividades da

empreendida por eles significava para aquele momento

Aump, segundo avaliação da professora. Sem uma meta

histórico e não para outro, imaginário”, salienta.

educacional vinculada mais fortemente a contextos ex-

Logo à frente, contudo, as pressões pelo aumento da as-

ternos, a entidade por pouco não foi extinta.

logo após a instituição da gratuidade, encontra, nessa

sistência e questões gerenciais exigiram a reformulação da Aump. Para Portes, era necessário mais do que uma

Sob a égide da ‘Constituição cidadã’

“consciência de solidariedade” para manter a estrutu-

Na atualidade, o lugar ocupado pela assistência na

ra responsável por sua operacionalização. Era preciso

UFMG parece se associar, cada vez mais, a políticas de

profissionalizar a assistência, torná-la responsabilidade

ações afirmativas e de equidade de oportunidades. A di-

do Estado e “possuir um capital social capaz de abrir as

mensão de uma nova assistência tem sua origem na pro-

portas mais importantes da sociedade belo-horizontina

mulgação da Constituição de 1988, que instituiu enorme

Decisão Decisão do Supremo do Supremo Tribunal Tribunal Federal Federal proíbe proíbe a cobrança a cobrança de de qualquer qualquer taxataxa parapara a matrícula a matrícula em em universidades universidades públicas. públicas. A A decisão decisão afeta afeta negativamente negativamente a situação a situação financeira financeira da Fump, da Fump, queque tinha tinha a arrecadação a arrecadação desses desses valores valores como como principal principal fonte fonte de de recursos. recursos. ParaPara fazer fazer frente frente à perda à perda de arrecadação, de arrecadação, a Fump a Fump lançou, lançou, em em novembro, novembro, campanha campanha de contribuição de contribuição voluntária voluntária entre entre alunos. alunos.

2001 2001 Inaugurado Inaugurado o o complexo complexo Moradia Moradia Ouro Ouro Preto Preto I. OI. O segundo segundo complexo complexo abriu abriu as portas as portas cinco cinco anos anos depois. depois.

2008 2008

2009 2009

PelaPela primeira primeira vez,vez, a Fump a Fump recebe recebe recursos recursos do Programa do Programa Nacional Nacional de Assistência de Assistência Estudantil Estudantil (Pnaes). (Pnaes).

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leque de direitos sociais. No ensino superior público, contudo, a democratização do acesso recolocou em cena debate sobre a responsabilização do Estado no atendimento aos direitos de assistência, ao lado dos temas do mérito individual e dos resultados sociais, relativos a políticas diferenciadas. Parte das discussões ocorre via produção acadêmica com o aumento de dissertações sobre a questão e a realização de avaliações que procuram medir o impacto intergeracional da assistência prestada pela Fump. Investigação nessa linha na UFMG deverá ser concluída em 2010, com a análise de dados sobre egressos da Universidade desde o ano de 1980 – assistidos e não assistidos pela Fundação. Oriundos de uma condição socioeconômica definida como precária, os ex-bolsistas da

sigualdades e políticas de proteção social – para além do

entidade estão sendo encontrados em situação melhor

clientelismo de Estado ou das ações compensatórias de

que aquela de sua saída da UFMG, ou mesmo em posi-

renda –, ainda aguardam metodologias melhor estrutu-

ção social privilegiada.

radas. “Agora é que o mundo está avaliando a capacidade dessas políticas de quebrar a transmissão intergera-

Herança bendita

cional da pobreza”, diz Danielle Fernandes.

“A regra sociológica é que se transmite a herança socio-

Para as instituições de ensino, averiguar os impactos

cultural aos filhos”, diz a cientista social e professora da

dos benefícios socioeconômicos na vida acadêmica dos

UFMG Danielle Cireno Fernandes, lembrando que uma

assistidos e na qualidade de sua integração à vida na so-

segunda geração, filha desses egressos, já está entrando

ciedade é igualmente crucial num momento em que o

no mercado de trabalho – e muito provavelmente em

desafio da assistência continua não cabendo no Orça-

situação diferenciada da dos pais.

mento do Estado.

Integrante de comitê internacional responsável por pes-

Conforme destaca Maria do Carmo de Lacerda, a assis-

quisa comparativa sobre repercussões de políticas de

tência estudantil sofreu, ao longo de sua história, os

ações afirmativas no Brasil, na África do Sul e nos Esta-

efeitos do descuido e da falta de prioridade pelo Estado.

dos Unidos, Danielle Fernandes observa que essas ini-

“Porém, conforme defende Gramsci (filósofo e político

ciativas, ainda que não se destinem à eliminação de de-

italiano Antônio Gramsci), no Estado estão presentes a

sigualdades, produzem grande impacto na abertura de

sociedade civil e a sociedade política. E nesse campo a

oportunidades a populações excluídas da vida econômi-

sociedade civil pouco tem se manifestado, excetuando,

ca e cultural da sociedade. “Estudo de Paul Attel, publi-

talvez, o movimento estudantil”, diz Maria do Carmo de

cado em 2006, mostra que mulheres negras e hispânicas

Lacerda. Ela avalia, contudo, que, infelizmente, as rei-

que receberam apoio relativo a ações afirmativas – em

vindicações têm sido muitas vezes vinculadas a percepções

vagas de ensino – e de benefício socioeconômico mu-

paternalistas do Estado, que tudo deve prover, e excluem a

daram imensamente sua condição, nos Estados Unidos.

participação da sociedade nesses processos. “A assistência

O efeito é maior, sobretudo, sobre a segunda geração”,

sofre quando a solidariedade sai de cena”, reflete. u

relata a pesquisadora. No Brasil, análises dessa natureza, que dissequem a correlação entre autonomia dos cidadãos, redução das de6


Perfil

Sonho de

terno e gravata

tiva para entrar na Universidade, a Instituição passou

Quando criança, Deyvison Lopes de Siqueira, não can-

a oferecer na unidade de Montes Claros o tão sonhado

sava de repetir para os pais: “Quero ser administrador

a primeira experiência no vestibular mostrara que ele

quando crescer”. A imagem que o menino tinha da pro-

precisava estudar muito mais para conseguir uma vaga.

fissão, de um homem de terno e gravata, embalava o

Sem dinheiro para pagar um cursinho, a solução foi con-

seu sonho. Talvez porque ele apontava para um mundo

fiar na própria dedicação e na ajuda dos amigos, que

diferente daquele que conhecia. Em São João da Ponte,

lhe emprestaram apostilas nas quais estudaram em Belo

no Norte de Minas, onde Deyvison morava, a rotina era

Horizonte.

curso de Administração. Era a grande chance. Porém,

pegar na enxada e ir para a lavoura. Filho de agricultores, o garoto começou, aos 10 anos, a

Autoinvestimento

ajudar os pais na pequena plantação de milho e feijão

O empenho deu resultado: Deyvison foi aprovado para a

que garantia o sustento da família. Para reforçar os ga-

segunda etapa. O êxito trouxe ao mesmo tempo felicida-

nhos da casa, ele também utilizava o carro de boi do pai

de e preocupação. “As questões abertas da segunda eta-

para carregar lenha para os vizinhos. Tão dura quanto

pa me pareciam mais difíceis.” Dessa vez, ele pensava,

as tarefas da lavoura era a rotina de deslocamento até a

precisaria de aulas “de verdade”. Mas como pagar um

escola. Ele gastava 40 minutos de caminhada de casa até

pré-vestibular? Ele foi para casa nas férias, fez um pe-

o ponto de ônibus e mais uma hora e meia no interior do

queno trabalho para o pai e usou o dinheiro para pagar

veículo. O mesmo se repetia na volta.

um mês de cursinho. “Fiz o que o meu pai sempre me

A vida de Deyvison continuou assim até os 18 anos. E o

ensinou: investir em mim mesmo.”

desejo de ser administrador, também: “Vontade eu tinha,

O retorno desse investimento foi a aprovação no vesti-

mas esperança não. O dinheiro que meus pais ganha-

bular: “Eu estava na moradia assistindo televisão e meus

vam era para sobreviver”. As coisas começaram a mudar

colegas entraram, jogando ovos. Minha reação foi ligar

quando um de seus tios voltou de Montes Claros com a

para os meus pais e agradecer a Deus”.

notícia de que o Instituto de Ciências Agrárias da UFMG

Como assistido da Fump, Deyvison reside na Moradia

estava com inscrições abertas para o curso técnico em

Universitária e tem acesso a alimentação subsidiada e

Agropecuária. Deyvison fez os testes, foi aprovado e se

assistência à saúde. Mesmo com praticamente o curso

mudou para a cidade, conseguindo uma vaga na mora-

inteiro pela frente, ele planeja novos voos: “Meu sonho é

dia. Foi quando, segundo ele, “as portas se abriram”.

o mestrado”. O menino que queria ser como os homens

Convivendo com os estudantes do curso técnico e de

que usam terno e gravata pensa em ir mais longe ainda

graduação da Universidade, ele viu que era possível che-

e virar “doutor” de verdade: “Quem sabe um dia eu faço

gar a um curso superior. Já no primeiro ano em Montes

doutorado?”u

Claros, em 2007, decidiu tentar o vestibular para o curso de Agronomia. Sem sucesso. Justamente em 2008, quando faria sua segunda tenta7


Ficar

é que são elas Universidade pública depende da assistência estudantil para se democratizar

Nas universidades federais, pública é só a entrada,

cesso muito disputado e ingressaram em um curso su-

não a permanência. Quem afirma é o pesquisador Écio

perior, as universidades estão também cumprindo sua

Antônio Portes, com a experiência de quem dependeu

missão de socializar o saber e diminuir as desigualda-

da assistência da Fundação Universitária Mendes Pi-

des sociais”, destaca a pesquisadora.

mentel (Fump) para concluir a graduação e ter acesso

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à pós-graduação. Docente da Universidade Federal de

Reversão de um ciclo

São João del-Rei (UFSJ), ele dedicou sua trajetória aca-

Em dissertação defendida em 2008, Michely Vargas

dêmica como aluno da Faculdade de Educação (FAE) da

buscou compreender a relação entre ensino superior,

UFMG a estudar, sob a orientação da professora Maria

assistência estudantil e mercado de trabalho, com o

Alice Nogueira, os temas da inclusão e da permanência

intuito de verificar se, e de que forma, a assistência re-

de alunos pobres no ensino superior.

cebida durante a graduação se reflete na inserção pro-

Em sua opinião, é a assistência estudantil que demo-

fissional dos beneficiados. Sua pesquisa conclui que a

cratiza as instituições de ensino, já que, para grande

assistência é “fundamental e relevante”, uma vez que

número de estudantes, a aprovação no vestibular vem

os alunos que se evadem do ensino superior têm ren-

aliada à necessidade de apoio financeiro, imprescindí-

das inferiores no mercado de trabalho em comparação

vel até a conclusão do curso. Foi o caso de Leandro

aos que concluem o curso. Pesquisas recentes, como a

Henrique Batista, que cursou ensino médio no Cefet-

do educador Cláudio Moura Castro (Educação básica no

MG e ingressou na graduação em Engenharia Elétri-

Brasil - construindo o país do futuro, editora Campus),

ca na UFMG. Segundo ele, seria difícil permanecer na

confirmam que graduados ganham 3,5 vezes mais do

Universidade sem o auxílio da Fump. “Embora o curso

que aqueles que completaram apenas ensino médio.

superior seja a chave para a melhoria da qualidade de

“Há forte conexão entre assistência estudantil e inser-

vida, para os estudantes pobres a aprovação no vesti-

ção profissional”, reitera Michely Vargas, que destaca

bular é apenas o início do desafio”, garante Leandro.

a relevância da assistência também como meio de mo-

Ex-bolsista nível I (o nível de classificação socieconômi-

bilidade social. Ela faz referência ao grande número de

ca em que estão enquadrados os assistidos de condição

indivíduos que, por meio do diploma, revertem o cír-

mais desfavorável) e atualmente professora substituta

culo de pobreza em que eles e suas famílias estavam

da FAE, Michely de Lima Ferreira Vargas conta que per-

inseridos.

cebeu, por experiência própria, que “democratização

O estudo de Michely Vargas também contribui para ne-

do acesso e garantia de permanência andam juntas”.

gar o pressuposto segundo o qual o diploma não equa-

Segundo ela, o apoio socioeconômico aos estudantes

lizaria oportunidades no mercado de trabalho, uma vez

das classes populares beneficia não apenas os indiví-

que a origem social se manteria como influência pre-

duos diretamente alcançados, possibilitando acesso a

dominante na trajetória profissional dos indivíduos. “A

uma formação de qualidade, mas também contribui

análise mostrou que a posse do diploma amenizou o

para tornar a sociedade menos desigual. “Ao garantir

peso da origem social”, conclui Michely.

assistência a estudantes que, a despeito de condições

Para a assistente social Marisnei Souza Dourado, que

sociais e econômicas adversas, passaram por um pro-

coordena o trabalho dos profissionais do Serviço Social


da Fump, a educação permite que o indivíduo busque a sua manutenção com as próprias capacidades. “Provavelmente os filhos de um aluno assistido pela Fump não precisarão de nenhuma forma de assistência social, já que o ensino superior é uma oportunidade que transforma a história de cada um”, opina. Isso ocorre, segundo ela, devido à possibilidade de mobilidade na pirâmide social. “Muitas vezes, o estudante vem de família com pouca escolaridade, pais analfabetos e profissões de baixo prestígio social. Embora essa mobilidade não ocorra na família da qual se originou, ele vai mudar a sua constituição familiar, e seus filhos terão mais oportunidades”, explica. Institucionalização Apesar das evidências que demonstram o valor da assistência estudantil, a falta de institucionalização do tema no país ainda leva a questionamentos sobre o fu-

o tema Evasão e evadidos nos cursos de graduação da

turo desse tipo de prática, adotada com sucesso pela

UFMG. Ao analisar o êxodo em cinco cursos da Univer-

Fump há oito décadas. Para Écio Portes, as atuais con-

sidade no período de 2000 a 2007, a autora diz que ser

dições econômicas brasileiras, diferentes daquelas de

aprovado no vestibular “não garante o êxito de concluir

meados do século 20, já permitem que o país adote po-

a graduação”. No entanto, o maior índice de evasão

líticas de Estado para a manutenção e a permanência

acontece entre os estudantes não atendidos pela Fump,

de estudantes de camadas populares nas instituições

já que os alunos de classificação socioeconômica mais

públicas de ensino superior. Funcionário da Fundação

baixa que recebem assistência estudantil apresentam

de 1988 a 1996, Écio Portes destaca que a Fump trei-

elevados índices de conclusão.

nou, ao longo dos anos, assistentes sociais de outras

Os principais aspectos detectados no estudo, que jus-

instituições, tendo servido de modelo para a realização

tificam o desligamento do aluno antes do término do

desse tipo de trabalho em várias universidades. “A cul-

curso, são problemas de desempenho entre estudantes

tura institucionalizada de atendimento ao estudante

trabalhadores e a escolarização cumprida fora de Belo

pobre é conquista de todos, uma construção coletiva.

Horizonte. A pesquisa mostra que, “em 80% dos casos

Só o desconhecimento dessa história leva à luta pelo

de evasão, os estudantes trabalhavam concomitante-

fim da assistência”, afirma Portes, que é professor do

mente com a realização de seus estudos superiores”.

Departamento de Ciências da Educação e coordenador

Revela também que o perfil socioeconômico do evadi-

do mestrado em Educação da UFSJ.

do é mais baixo que o do estudante que consegue se formar.

Antídoto para a evasão

A importância da Fump para que o aluno cumpra a tra-

A opinião de Portes é reforçada por estudos como o

vessia entre a Universidade e o mercado de trabalho

de Ana Amélia Chaves Teixeira Adachi, que defendeu

é atestada pela engenheira civil recém-formada Kelia-

dissertação de mestrado em janeiro de 2009, junto ao

ne Sirlene Ferreira. “Sem a Fump, alunos como eu não

Programa de Pós-Graduação em Educação da FAE, com

teriam a mínima condição de permanecer na escola”, 9


de ter a assistência da Mendes Pimentel significou proteção e tranquilidade para dedicar-me ao meu curso”, lembra o professor, que hoje pesquisa a produção de esferas cerâmicas que atuam como filtro e capturam moléculas de gás carbônico nos sistemas de exaustão das indústrias. “Tive bolsa de alimentação e de manutenção durante os quatro anos de minha graduação. Sem essa assistência seria impossível permanecer distante de casa, pois meus recursos financeiros eram extremamente escassos”, relata.

10

diz. Ela conta que usufruiu de diversos serviços ofere-

Com relação à sustentação financeira das atividades da

cidos pela Fundação, como alimentação subsidiada, as-

Fump, Magela comenta que, quando a justiça proibiu

sistência médica, odontológica e psicológica, compra

as universidades públicas de cobrar taxas de matrícula,

de livros com descontos e a Bolsa de Manutenção, que

viu uma ameaça real de a Fump cessar suas atividades.

começará a reembolsar à Fump dois anos depois de for-

“Lamentei mais ainda porque a motivação veio da ação

mada. “Embora a UFMG seja uma instituição pública,

de alguns estudantes, que ignoraram as consequências

alguns alunos precisam de suporte, especialmente nos

devastadoras que isso poderia acarretar aos seus cole-

cursos que exigem dedicação integral, como o meu”,

gas menos favorecidos. Mas certamente a Fump ainda

avalia. “Hoje estou empregada e com um futuro muito

cumprirá sua missão por muito tempo e muitas gera-

bom pela frente”, completa a engenheira, que conquis-

ções de estudantes serão ainda beneficiadas nos anos

tou medalha como melhor aluna do curso.

vindouros”, espera.

A exemplo de Keliane, o professor Geraldo Magela de

Coordenadora do programa Ações Afirmativas na

Lima, do Departamento de Química do Instituto de

UFMG, a professora Nilma Lino Gomes também res-

Ciências Exatas da UFMG, também afirma que a Fump

salta o importante papel da assistência prestada pela

foi fundamental na sua trajetória como aluno da Uni-

Fump na permanência de jovens pobres. “Sem ela, es-

versidade. “Vim do interior de Minas Gerais em 1984,

ses alunos não conseguiriam estar na Universidade”,

de uma família bastante pobre, e, desde o início, o fato

assegura.


De dentro da máquina

Investimento no futuro

Concluir a graduação não encerra todas as expectativas

O jornalista Vinícius da Silva Luiz, que concluiu o cur-

dos estudantes em relação à Universidade. Boa parte se-

so no primeiro semestre de 2009, reforça a opinião de

gue carreira acadêmica, por meio dos cursos de mestrado

Marisnei Dourado, ao ressaltar a importância da Bolsa

e doutorado. Aí há interferência da origem sociocultural

de Formação Profissional Complementar em determi-

do aluno. Segundo Écio Portes, famílias cujos integrantes

nado período de sua trajetória e da Bolsa Socioeduca-

já têm curso superior conhecem o funcionamento do sis-

cional em outro. “Sem contar a Moradia Universitária,

tema escolar e conseguem empreender estratégias que

que, para mim, foi a principal contribuição da Fump”,

possibilitam a seus filhos obter mais sucesso na compe-

afirma. Nascido em Padre Paraíso, a cerca de 600 quilô-

titividade social. “Até mesmo por estarem dentro da ‘má-

metros de Belo Horizonte, Vinícius morava havia alguns

quina’ conhecem seu funcionamento”, diz Portes.

anos na capital mineira com uma tia, que retornou para

Em estudo realizado em 2008, Mariana Gadoni Canaan, então estudante do curso de graduação em Ciências So-

“A cultura institucionalizada de

ciais da Fafich, demonstrou que os alunos que não têm

atendimento ao estudante pobre é

necessidade da assistência da Fump chegam em maior

conquista de todos” (Écio Portes)

quantidade e em menor tempo à pós-graduação stricto sensu. Para entender por que isso acontece, a autora

o interior. Antes de conseguir vaga na moradia, morou

recorreu ao marco teórico de Pierre Bourdieu, segundo

de favor em dois lugares. “Foi importantíssimo ter um

o qual estudantes vindos de famílias mais escolarizadas

espaço só para mim, especialmente em um ambiente

adquirem mais capital cultural, o que facilita a aprendi-

de excelente qualidade, que oferece privacidade”, avalia.

zagem de conteúdos e códigos valorizados pelas institui-

Quanto ao suporte financeiro, Vinícius experimentou,

ções de ensino.

como quase todos os assistidos pela Fump, a inseguran-

Com base em estudos que demonstram a importância

ça de pensar que a qualquer momento seria forçado a

das experiências de iniciação científica para a carreira

abandonar o curso para trabalhar. “A Bolsa Socioeduca-

acadêmica – maior contato do estudante com o cor-

cional veio em um momento muito bom, pois eu sem-

po docente, aprendizado na elaboração de projetos de

pre quis trabalhar na Rádio UFMG Educativa, mas não

pesquisa e na apresentação de trabalhos –, Mariana

podia fazer estágio como voluntário, porque precisava

Canaan defende a adoção, pela Fump, de políticas nos

de recursos para me manter. A bolsa contribuiu para que

moldes das bolsas de iniciação científica. “É necessário

eu pudesse tomar uma decisão profissional”, conta. O

investir mais na Bolsa Socioeducacional que já é ofere-

jornalista, que participou do Conselho Diretor da Fump

cida ou integrar a Bolsa de Manutenção a uma experi-

como representante dos alunos indicados pelo Diretório

ência de iniciação científica”, opina.

Central dos Estudantes e integrou o Conselho da Mora-

A assistente social Marisnei Souza Dourado explica que

dia Universitária, ressalta que a Fump não pode ser vista

cada um dos diferentes serviços da Fundação atende a

pela sociedade sob o aspecto assistencialista. “Ela inves-

demandas específicas, em momentos diferentes da tra-

te no futuro do país, oferecendo aos estudantes oportuni-

jetória do estudante. Enquanto a Bolsa Socioeducacional

dades que já deveriam ter sido dadas em outros momen-

oferece oportunidades de desenvolver atividades na área

tos”, avalia. Para Vinícius, as ações realizadas pela Fump

de estudo do aluno, a de Manutenção, reembolsável, é

são um investimento para tentar oferecer a determinado

solicitada quase sempre nos primeiros períodos do cur-

grupo social “as mesmas condições que já possuem aque-

so, quando o mercado ainda não oferece estágios, para

les que seguem outra história”. E conclui: “Por isso, seus

evitar que o aluno precise trabalhar fora de sua área

serviços devem ser encarados como um direito e nunca

para se manter.

como uma relação de favor”.u 11


Perfil

Em busca

de uma identidade

Ela sempre transitou com desenvoltura entre livros, números e palavras. Tanto que seu desempenho chamava a atenção nas escolas por onde passava. Teve dificuldade na escolha do curso superior, justamente porque

Logo Juliana descobriu que o vestibular não era passa-

era “boa em tudo” – de química a história. A única ame-

porte com visto permanente nesse universo do conhe-

aça ao seu futuro acadêmico parecia ser a baixa condi-

cimento. E, a exemplo de outros estudantes de baixa

ção econômica familiar. E aí a Fump entrou no caminho

renda, custou a se sentir aceita “em um ambiente tão

da hoje mestranda em Ciência da Informação Juliana de

diferente”. A primeira reação foi buscar identidade e

Assis. “Recebi Bolsa de Manutenção, tratamento odon-

apoio. “É por isso que a assistência é tão importante.

tológico, assistência médica e psicológica, financiamen-

A Fump viabiliza a permanência desse tipo de aluno, eu

to para curso de língua estrangeira e para a compra de

não diria em condições de igualdade, mas em situação

óculos”, relata.

mais favorável”, explica a mestranda.

Com trajetória semelhante às de vários estudantes de

Outro suporte que Juliana considera decisivo para sua

origem humilde, Juliana de Assis nasceu em Belo Ho-

permanência na Universidade foi o projeto Ações Afir-

rizonte e cresceu em uma comunidade pobre de Santa

mativas, que mantém parceria com a Fump por meio

Luzia. Foi criada por um casal idoso, sem filhos, tios de

do Programa de Bolsa Socioeducacional oferecido aos

sua mãe biológica, já que esta não tinha condições de

alunos. “Na minha busca por identidade, participei do

sustentá-la. “Minha mãe é analfabeta e meu pai fez até

programa Conexões de Saberes, onde convivi com mui-

a quarta série. Mas buscaram, através de amigos e do

tos alunos em condições semelhantes às minhas. Saber

contato com a igreja, me manter na escola”, conta.

da presença deles aqui foi muito estimulante”, relata. O programa tem como objetivo melhorar as condições de

12

Entre ímpares

permanência de estudantes de origem popular nas uni-

Durante o ensino médio, na Escola Estadual Pascoal Co-

versidades federais.

manducci, no bairro Jaqueline, na região de Venda Nova,

Sobre suas perspectivas profissionais, Juliana de Assis

ela manteve contato maior com os professores e com

afirma que já atua onde sempre mirou: a organização

a direção da escola. “Eles apostavam que eu chegaria à

e uso da informação. Ela lida com indicadores de qua-

faculdade e me estimulavam”, relembra Juliana. Nesse

lidade em ambientes colaborativos de organização do

período, participou do processo de avaliação seriada da

conhecimento, incluindo a web, para representar e sis-

Universidade Federal de Ouro Preto, em que se submetia

tematizar conteúdos. “Uma das questões que têm cha-

a provas ao final de cada ano. Na “hora h”, porém, optou

mado a atenção é o papel das redes sociais digitais na

pela UFMG. “Meu interesse foi maior por Bibliotecono-

promoção dessa organização de conteúdos”, comenta

mia, curso com perfil generalista e que vem mudando

a pesquisadora, que não faz muitos planos. “Ainda sou

devido ao imperativo tecnológico. Pretendo trabalhar

nova na carreira acadêmica e muitas visões ainda serão

com a organização da informação em contextos digi-

construídas e desconstruídas”, diz ela.u

tais”, explica.


Mudança de cenário

Fump busca se ajustar a nova realidade imposta pelo fim da Contribuição ao Fundo de Bolsas (CFB) vinculada à matrícula

Oito décadas de história – que se confunde com a da própria UFMG –, marcada pelo constante aprimoramento da gestão, com métodos e resultados reconhecidos não apenas pelos estudantes beneficiados, mas por gestores de universidades de todo o Brasil. Esta seria uma

começou a faltar pessoal. Os críticos da criação de pró-

boa forma de resumir o argumento central dos defen-

reitorias dedicadas à assistência alegam que as institui-

sores do modelo de assistência estudantil representa-

ções teriam de terceirizar esses serviços, o que ficaria

do pela Fundação Universitária Mendes Pimentel. Ele

muito mais caro.

contribui de forma decisiva para que a UFMG detenha

A agilidade para administrar pessoas e compras é exal-

as menores taxas de evasão do país – na verdade, parte

tada também pelo presidente da Fump, professor Seme

significativa dos casos de abandono, segundo pesquisas

Gebara Neto. Para ele, essa é uma das provas de que o

realizadas na Universidade, se deve mais a fatores liga-

formato em vigor na UFMG é muito bem resolvido. “O

dos, por exemplo, a problemas com a escolha do curso e

que importa sempre, em primeiro lugar, é que a política

menos a falta de recursos financeiros.

seja boa e executada com eficiência. A história da Fump

Ao longo de sua trajetória, a Fump consolidou meto-

foi construída ao longo de muitos anos, e a contestação

dologias eficientes para aspectos como a classificação

que ela enfrenta é muito mais ideológica”, observa Seme.

socioeconômica dos estudantes e a operação de serviços como a moradia universitária, segundo análise da

Prestação de contas

ex-presidente da instituição, professora Rocksane de

À crítica recorrente de que as fundações constituem for-

Carvalho Norton, vice-reitora da UFMG. Ela destaca ain-

ma de privatização das universidades, Rocksane Norton

da como vantagem comparativa o fato de a assistência

contrapõe que as entidades viabilizam uma série de pro-

ser operada por uma fundação de direito privado, o que

cessos. E ressalta que a Fump passa por auditorias da

garante mais agilidade para a aplicação de recursos e

UFMG e de empresa independente, e presta contas ao

compra de insumos. “Nossas licitações são mais simples

Conselho Universitário, à Promotoria Especial de Tutela

e rápidas que aquelas feitas com recursos do Tesouro,

e Fundações (ligada ao Ministério Público) e ao Minis-

o que é fundamental, por exemplo, quando se trata de

tério da Educação. Além disso, seu Conselho Diretor é

comprar alimentos todos os dias para abastecer os res-

composto por estudantes em situação de paridade com

taurantes universitários”, diz Rocksane.

o restante da representação.

Flexibilidade

O MEC começou a acompanhar diretamente as ativida-

O modelo de fundação privada encontra mais um argu-

des da Fump com a implantação do Programa Nacional

mento de defesa quando é associado ao gerenciamen-

de Assistência Estudantil (Pnaes), em 2009. As universi-

to de unidades como restaurantes e moradias. Com a

dades federais passaram a receber recursos destinados

extinção pelo Ministério da Educação de cargos como

a melhorar as condições de permanência dos estudan-

os de copeiro, cozinheiro e caldeireiro, as universidades

tes de condição socioeconômica desfavorável. A inicia-

não têm mais como contratar para essas funções, e já

tiva está intimamente ligada à projeção de crescimen13


to significativo do número de vagas no ensino superior

assistência estudantil. A gerente de Programas de Assis-

público geradas pelo Programa de Apoio aos Planos de

tência da Fump, Solange Braz, responsável por parte do

Reestruturação e Expansão das Universidades Federais

atendimento a essa classe de visitantes, conta que, entre

(Reuni) e de sistemas de cotas e bônus de caráter social

os principais atrativos da Fundação, estão a metodolo-

nos processos de seleção.

gia de classificação socioeconômica dos estudantes e a

Os recursos do Pnaes, no caso da UFMG e de outras

gestão dos restaurantes e das moradias. “Nossa estrutu-

universidades, têm servido para compensar em parte

ra de habitação se destaca pela localização privilegiada,

uma mudança importante no que se refere à arrecada-

pela privacidade desfrutada pelos moradores e pela con-

ção de recursos para assistência estudantil. Em 13 de

servação”, enfatiza Solange.

agosto de 2008, o Supremo Tribunal Federal (STF) de-

No caso dos restaurantes, os administradores de outras

cidiu pela inconstitucionalidade da cobrança de taxas

universidades se impressionam, entre outros aspectos,

de matrícula para os cursos de graduação, que a UFMG

com a disposição física – alguns chegam a pedir os proje-

revertia integralmente para esse fim. Sempre houve

tos para servir de modelo, o que acontece também com

contestações isoladas à contribuição para o Fundo de

relação às moradias –, o trabalho dos nutricionistas e

Bolsas, mas a partir de 2003, o protesto tornou-se or-

a capacidade de manter custos baixos. De acordo com

ganizado e gerou ações judiciais que, em muitos casos,

Solange Braz, isso se deve em grande parte a uma equipe

culminaram na liberação de grupos de estudantes do

de funcionários próprios. E ela dá um exemplo. “Nosso

pagamento da taxa.

pessoal descasca e corta os ingredientes para as saladas,

A decisão do STF resultou do julgamento de recurso in-

enquanto outros restaurantes compram de terceiros a

terposto pela Universidade Federal de Goiás (UFG) con-

salada processada. Essa e outras despesas podem ele-

tra decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região,

var o custo da refeição em até três vezes”, ela explica. E

favorável a sete alunos que pleiteavam a suspensão da

acrescenta que a equipe própria possibilita manter está-

cobrança.

vel a produção, junto com a facilidade de gerir a reposição de equipamentos, à medida que vão se deteriorando.

14

Visitantes curiosos

O funcionamento do serviço de alimentação da UFMG

Com a instituição do Pnaes intensificou-se um movi-

tem atraído até prefeituras do interior de Minas Gerais,

mento que já não era estranho à Fump. Seus gestores e

interessadas em implantar restaurantes populares. Elas

técnicos passaram a recepcionar ainda mais represen-

querem aprender, entre outras, a fórmula para reduzir

tantes de universidades federais de todo o Brasil, ani-

o preço de custo por refeição que, em 2009, girou em

mados com a implantação de uma política nacional de

torno de R$ 3,10.


Em outros campi A Fump não está sozinha quando oferece subsídios na alimentação também para não assistidos. Na Universidade Federal de Goiás (UFG), um aumento recente no custo da refeição não foi repassado aos alunos que pagam pela alimentação. Cerca de 2.800 estudantes de baixa renda, em Goiânia e no interior, recebem Bolsa Alimentação integral – os habitantes da moradia almoçam e jantam todos os dias e os outros fazem uma refeição por dia útil. Impossibilitada de contratar mão de obra para essa área, a instituição terceirizou sua estrutura de restaurantes em 2004. Com relação à moradia universitária, a UFG vive situação sui generis. Seus estudantes dividem o espaço com os de outras universidades, resultado de antigas reivindicações do movimento estudantil. Uma das quatro casas chega a ser gerida por outra instituição, a Universidade

de matrícula, cuja cobrança foi proibida pelo STF em 2008.

Católica de Goiás (UCG). Mas uma resolução do Con-

“Vivemos hoje uma situação relativamente confortável”,

selho Universitário já determinou que a prioridade seja

diz Ernando Filizzola, que considera justo o pleito dos estu-

devolvida aos estudantes da UFG, e a intenção é tornar o

dantes contra a taxa. “Não extinguimos antes o pagamento

espaço exclusivo, sobretudo com o aumento da deman-

de matrícula porque não teríamos como sustentar a assis-

da gerado pelo sistema de cotas recentemente implan-

tência aos alunos carentes”, revela o pró-reitor, que é pro-

tado. “A convivência entre alunos de instituições dife-

fessor da Faculdade de Odontologia da UFG. Um dos responsáveis pela administração da assistên-

“Nossa estrutura de habitação se destaca

cia estudantil na Universidade Federal do Espírito Santo

pela localização privilegiada”

(Ufes), o professor Antonio Carlos Moraes, ex-aluno da

(Solange Braz)

cial contra a contribuição ao Fundo de Bolsas “interferiu

UFMG assistido pela Fump, entende que a decisão judiem um sistema que funcionava muito bem para algu-

rentes gera problemas de gestão, já que não pode haver

mas universidades e ajudava de forma significativa o es-

sanções em determinados casos”, justifica o pró-reitor

tudante de origem popular”. A Ufes nunca contou com

de Assuntos da Comunidade Universitária da UFG, pro-

qualquer forma de contribuição financeira por parte dos

fessor Ernando Melo Filizzola.

estudantes. As diretrizes do Plano Nacional são o ponto

A Universidade oferece também a Bolsa Permanência

de partida de uma tarefa dividida entre as secretarias de

destinada a custear despesas de transporte, lanche e

Assuntos Comunitários e de Inclusão Social, esta última

vestuário. O auxílio prevê contrapartida em atividades

dirigida por Antonio Carlos Moraes. Além do subsídio

– são 550 bolsas de R$ 300. A UFG oferece ainda cursos

para os itens básicos, a assistência inclui atendimento

de línguas, kits de material para alunos de odontologia e

psicológico e odontológico, empréstimo de livros por se-

creche para filhos de estudantes. Alguns dos projetos foram

mestre e bolsas de estudo para idiomas.

viabilizados com o advento do fundo do Pnaes, que substi-

Admirador do sistema de moradia universitária da

tui os recursos próprios auferidos anteriormente pela taxa

UFMG, Antonio Carlos diz guardar ótima lembrança de 15


sua relação com a Fump. “Sou de um tempo em que a Fundação administrava até as cantinas da Universidade. O serviço não tinha conotação comercial, o alimento era de qualidade e acessível. Psicólogas e assistentes sociais nos atendiam com carinho, elas apostavam em nós e queriam que fôssemos até o fim”, ele recorda. Modelos próprios Assim como a Ufes, a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) contava, antes do Pnaes, com orçamento próprio para assistência a seus estudantes – 27% de seu orçamento eram dedicados a essa finalidade. Mas, dife-rentemente da instituição capixaba, na UFSM a assistên-cia tem status de pró-reitoria. Segundo o pró-reitor de Assuntos Estudantis, José Francisco Silva Dias, essa si-tuação tende a garantir maior autonomia para a gestão da assistência e costuma representar “uma visão mais ampla do que seja o apoio a estudantes com menos re-cursos, que deve ir muito além de casa e comida”. José Francisco, mais conhecido como professor Juca, opina com o conhecimento de quem já coordenou o Fórum Nacional de Pró-Reitores de Assuntos Comunitá-rios e Estudantis, o Fonaprace, entidade criada em 1987 no âmbito da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes). De

gentes dessas instituições. “Se estamos, em última ins-

seu contato com outros dirigentes do setor, ele extrai

tância, trabalhando pelos estudantes, é adequado que

a convicção de que as universidades não devem seguir

conversemos para tratar de sua permanência na univer-

cegamente fórmulas que venham de outros estados ou

sidade.”

do exterior. “Não acredito muito em modelos, sobretudo

16

em um país continental. As melhores referências para

Aposta no Pnaes

boas propostas de assistência estudantil são as caracte-

Com o fim da possibilidade de contar com taxas de ma-

rísticas de cada região e da cultura de cada instituição”,

trícula e o aumento da demanda em função de medidas

afirma o pró-reitor.

de inclusão e do crescimento do número de vagas, as

Mas ele mostra posição flexível quanto a soluções que

universidades federais apoiam-se na nova realidade cria-

envolvem doações de empresas e pessoas físicas. “Se o

da pelo governo, por meio do Pnaes. Em Goiás, o objeti-

objetivo for o investimento e oportunidades, liberdades

vo é ampliar os benefícios, oferecendo material de estu-

e perspectivas de boa formação cidadã, não vejo razão

do para áreas como veterinária e artes, além de livros na

para rejeitar essa alternativa”, diz o professor Juca. Ele

forma de doação e empréstimo.

revela ainda, mirando o futuro, a disposição dos órgãos

Na Universidade Federal do Espírito Santo, de acordo

de assistência das universidades de intensificar o inter-

com o professor Antonio Carlos Moraes, estão sendo

câmbio e a colaboração com os outros fóruns de diri-

costurados convênios com a Prefeitura de Vitória e com


ministérios para a concretização de projetos que proporcionem aos estudantes assistidos oportunidade de praticar esportes e desfrutar de mais opções de lazer, além de exercer monitoria em escolas públicas de educação

O recurso a financiamentos é defendido também pelo

básica.

professor Jacques Schwartzman, diretor do Centro de

No caso da UFMG, uma das bases do trabalho da Fump

Estudos sobre Ensino Superior e Políticas Públicas para

para fazer frente ao fim da vinculação do Fundo de Bol-

a Educação da UFMG (Cespe). Segundo ele, os emprésti-

sas à matricula é a campanha de contribuição voluntá-

mos são a melhor forma de financiar os estudantes, que

ria, iniciada em 2008. Essa fonte se soma aos recursos do

devem repor esses recursos depois de formados, sempre

Pnaes. Juntos, no entanto, ainda são insuficientes para

de acordo com as possibilidades de cada um.

cobrir o valor que se arrecadava com o Fundo de Bolsas.

Schwartzman discorda da decisão de proibir a contribui-

Especialistas em educação superior também têm reco-

ção para o Fundo de Bolsas, mecanismo que ajudou a

mendações quando se fala em soluções para a assistên-

Fump a tornar-se “exemplo para as outras universida-

cia estudantil. Países como Estados Unidos, Austrália,

des”, e afirma que agora é preciso intensificar a campa-

Canadá e Chile, que utilizam o financiamento de estu-

nha pelas doações e melhorar o sistema de cobrança dos

dantes, foram citados por Roberto Leal Lobo, ex-reitor

recursos liberados na forma de empréstimos. Na mesma

da USP, e Oscar Hipólito, ex-diretor do Instituto de Física

linha de raciocínio, ele considera “discutível” o subsídio

da USP-São Carlos, em artigo publicado pela Folha de S.

nos restaurantes universitários a estudantes não assis-

Paulo em 9 de abril de 2009. Eles lembram que nos Esta-

tidos pela Fundação e a usuários estranhos à Universi-

dos Unidos 95% dos estudantes recebem alguma forma

dade.

de financiamento ou auxílio para sua formação, e que

Seme Gebara é otimista em relação às perspectivas da as-

mais da metade desses recursos têm origem em emprés-

sistência no país. Ele acredita na longevidade do Pnaes, in-

timos federais. Esses empréstimos abrangem graduação

dependentemente dos resultados das próximas eleições

e pós-graduação, são feitos por meio da instituição ou

presidenciais, e lembra que o plano do governo federal

de agentes financeiros e podem ser subsidiados, depen-

ajudou a conferir mais peso político à questão da assis-

dendo da renda do beneficiado.

tência estudantil e aos dirigentes do setor. “Isso deve

“Os agentes financeiros privados têm pouco risco no

resultar em maior organização e políticas globais cada

empréstimo aos estudantes porque o governo federal

vez mais bem definidas”, conclui. u

garante 98% desses empréstimos”, informa o artigo, que Lobo e Hipólito concluem com a pergunta: “Por que não adotamos solução semelhante no Brasil?” 17


Perfil

E o Oscar foi para...

A história poderia virar roteiro de filme: o garoto pobre chega à capital em busca dos seus sonhos. Não é filme, e o protagonista dessa narrativa é Herbert Glauco de Souza. Estudante do 8º período de Pedagogia, Her-

associando cinema e educação, e o convidou para de-

bert tirou o primeiro lugar no vestibular do seu curso em

senvolverem um projeto. Surgia o Olhares do Cinema

2006 e, dois anos mais tarde, recebeu o prêmio de Honra

para os Professores, com o objetivo de analisar o enfo-

ao Mérito na XVII Semana do Conhecimento e Cultura

que dado por filmes de diversas nacionalidades à atua-

da UFMG por seu projeto Olhares do Cinema para os

ção e inserção social dos educadores. “Eu e a professora

Professores.

Inês selecionamos os filmes, assistimos, categorizamos

Nascido em Caeté, na Região Metropolitana de Belo Ho-

e depois fazemos as análises”, explica Herbert.

rizonte, Herbert sempre apresentou desempenho acima

No começo de seus estudos, a maior dificuldade de Her-

da média entre os estudantes da Escola Estadual José

bert era assistir aos filmes, pois não possuía um apare-

Brandão. Após concluir o ensino médio, passou em um

lho de DVD na moradia. A solução veio com o Programa

concurso público na prefeitura de sua cidade, onde tra-

Meu Primeiro Computador: Herbert foi beneficiado com

balhou durante um ano e meio no setor administrativo.

um computador financiado pela Fump. Assim, passou

Logo se entediou: “Queria algo mais ‘vivo’, como o cine-

a ter condições de assistir aos filmes e analisá-los com

ma e a educação”.

maior tranquilidade.

Depois de passar no vestibular, Herbert passou a mo-

Surpresa

rar com uma tia em Belo Horizonte. Para deslocar-se

O projeto Olhares do Cinema para os Professores ainda

da casa de sua tia até o campus Pampulha, pegava três

engatinhava quando Herbert e a professora Inês decidi-

conduções. “A viagem era longa e cansativa”, conta. Em

ram inscrevê-lo na Semana do Conhecimento e Cultura

2006, conseguiu vaga na moradia universitária. Herbert,

da UFMG, em 2008. Acabou sendo um dos quatro sele-

que acabara de ser contemplado com a Bolsa de Manu-

cionados da Faculdade de Educação para concorrer ao

tenção, recebeu a notícia com um misto de entusiasmo

prêmio principal. A cerimônia de premiação ocorreu no

e preocupação. “Achava que seria aquela bagunça de

prédio da Reitoria, e os vencedores foram anunciados na

república”, conta. Mas se surpreendeu com o clima de

hora. “Foi igual ao Oscar”, lembra Herbert.

estudo que encontrou e com as próprias instalações dos

Herbert pretende agora aprofundar a análise dos fil-

apartamentos.

mes. “Também temos planos de montar uma hemero-

Morando perto do campus, Herbert começou a se inte-

teca com recortes de jornais com textos sobre filmes”,

ressar pelo trabalho que alguns professores da Faculda-

conta ele, que também planeja disponibilizar no mesmo

de de Educação desenvolviam na área de cinema. Deci-

ambiente o acervo cinematográfico para a comunidade

diu se aprofundar e passou a escrever análises de filmes

acadêmica, além de construir um site com obras cata-

baseando seus comentários em referências bibliográfi-

logadas que possam servir de referência para aulas de

cas do curso de Pedagogia.

história e literatura.u

Seus esforços chamaram a atenção da professora Inês 18

Teixeira, que já trabalhava com uma linha de pesquisa


Aliadas

da permanência Bolsas para complementar a formação acadêmica; alimentação barata e saudável; assistência médica, odontológica e psicológica; moradia de qualidade. Em torno desses quatro eixos, estruturam-se os programas gerenciados pela Fundação Universitária Mendes Pimentel (Fump), os principais aliados da permanência de estudantes pobres na Universidade. Para ter acesso aos benefícios, os estudantes matriculados devem preencher o questionário socioeconômico disponível no portal www.fump.ufmg.br. O resultado da avaliação preliminar do questionário é divulgado por e-mail em, no máximo, dois dias juntamente com a listagem de documentos necessários para comprovação das informações. De posse dos documentos e da ficha cadastral do estudante, a equipe de assistentes sociais da Fump realiza a análise socioeconômica a partir de uma série de indicadores. Com base nessa análise, o estudante é classificado em três níveis – I, II e III – e pode requerer o acesso aos programas gerenciados pela instituição. Conheça a seguir o funcionamento dos programas da Fump e o impacto deles na vida acadêmica de milhares de estudantes da UFMG.

Universo

de oportunidades Bolsas de Apoio Pedagógico complementam formação acadêmica de estudantes assistidos

Além de manter-se na Universidade – desfrutando de condições adequadas de moradia, alimentação e saúde –, é preciso que o estudante tenha acesso a recursos materiais e pedagógicos que lhe possibilitem aproveitar de forma plena a formação que a UFMG oferece. Essa é a

de 2009, foram registrados mais de 2.500 acessos aos

convicção que orienta a gestão dos programas de Apoio

programas de Apoio Pedagógico.

Pedagógico da Fump. Suas iniciativas oferecem oportunidades de bolsas, estágio remunerado, aquisição de li-

Projetos e bolsas

vros e material escolar, acesso a cursos de língua estran-

A Bolsa Socioeducacional é concedida a estudantes se-

geira e intercâmbio, entre outros benefícios.

lecionados para atuação em projetos da UFMG em sua

“Esses programas proporcionam complementação edu-

área de formação. A bolsa é de R$ 450, para 20 horas de

cacional e financeira, desenvolvimento pessoal e profis-

dedicação semanal. A Bolsa de Complementação Educa-

sional, além de oportunidades para que o estudante se

cional, por sua vez, aproveita oportunidades oferecidas

prepare para a inserção no mercado de trabalho”, expli-

por parceiros externos, como empresas privadas e órgãos

ca a coordenadora de Apoio Pedagógico da Fundação,

públicos, regulamentadas pela legislação de estágio.

Jacqueline Caldeira Guerra. Nos primeiros nove meses

Outra modalidade do Programa de Bolsas é a de For19


fotocópias, por exemplo, ele afirma que seria impossível estudar sem a assistência. “Foi uma luta para entrar na UFMG, mas a gente percebe depois que ficar é ainda mais difícil”, diz o aluno do 4º período. O Centro de Extensão da Faculdade de Letras da UFMG é o parceiro de mais um programa nessa área: o de acesso a cursos de línguas estrangeiras. Alguns alunos têm mensalidades financiadas e outros chegam a fazer o curso sem qualquer custo. E os futuros dentistas dispõem de uma modalidade só para eles: o Material Odontológico Básico pode ser adquirido com ajuda da Fump, que mação Profissional Complementar, da Pró-Reitoria de

libera até R$ 3 mil (parte gratuita/parte financiada) ao

Recursos Humanos, operacionalizada pela Fump com

longo do curso. Os estudantes ganham descontos das

recursos financeiros da Universidade. De caráter social,

empresas parceiras e facilidades como parcelamento e

cultural e profissional, as atividades são desenvolvidas

gratuidade proporcionados pela Fundação.

nas unidades da UFMG. Os estudantes recebem R$ 364 por mês, para carga de 20 horas semanais, mais R$ 132

Intercâmbio e festival

como forma de auxílio ao deslocamento.

Os estudantes que frequentam a Universidade à noite e trabalham durante o dia nem sempre conseguem ti-

20

Livros e idiomas

rar proveito dos recursos acadêmicos que extrapolam as

Os programas de acesso começam pelo material escolar:

atividades regulares. Por isso, a Fump mantém parce-

os estudantes classificados recebem por ano até R$ 200,

ria com o Pró-Noturno – Programa Especial de Bolsas

que não precisam ser reembolsados. O Programa de Aces-

Acadêmicas para Estudantes dos Cursos Noturnos de

so ao Livro lança mão de parcerias com livrarias. Além de

Graduação da UFMG. “A iniciativa viabiliza que alguns

descontos oferecidos pelas empresas, os estudantes são

alunos possam deixar seus empregos em troca de uma

beneficiados por percentuais de gratuidade e financia-

bolsa que tem como contrapartida a participação em

mento dos valores pela Fundação.

projeto da Universidade”, explica a coordenadora Jac-

Com 39 anos e dois filhos, o operador de telemarketing

queline Guerra.

e estudante de Letras Denílson Pereira da Silva é benefi-

Na área de programas de apoio, os alunos assistidos pela

ciado pelo Programa de Acesso a Material Escolar, além

Fump contam ainda com a possibilidade de bolsa de R$ 400

de ter um dos meninos na creche e receber a Bolsa de

para participação no Festival de Inverno e de R$ 80 para

Manutenção. Pressionado por despesas com ônibus e

o Festival de Verão da UFMG. E todos aqueles potencial-


mente beneficiados podem sonhar com subsídios finan-

A coordenadora dos programas de Apoio Pedagógico

ceiros ao candidatar-se a um dos vários programas de

anuncia que a Fundação estuda apoiar o acesso a ma-

intercâmbio mantidos pela Diretoria de Relações Inter-

terial escolar de alto custo em todas as áreas e uma

nacionais (DRI). Os valores são estabelecidos de acordo

preparação mais intensiva dos estudantes para o mer-

com as condições prévias dos estudantes e as despesas

cado de trabalho. “Temos muitas ideias”, diz Jacqueline

previstas nos países de destino.

Guerra, com certeza dos bons resultados. “Os estudantes que passam pela Fump se sentem mais confortáveis

“Entrar é uma luta; ficar é ainda

e seguros, o que permite que melhorem seu rendimento

mais difícil” (Denilson Pereira)

queles com melhores condições socioeconômicas”, ela

e desenvolvam suas competências no mesmo nível dacompleta.u

Lucas Silva Gomes, que está perto de concluir o curso de Comunicação Social, teve viabilizada dessa forma uma temporada de seis meses na Universidade do Minho, em Portugal. Ele revela que conta com a assistência da Fump desde o início de sua vida acadêmica. “Comprei um computador e livros que têm sido fundamentais para a produção de minha monografia de fim de curso”, ele diz.

Bandeja

farta e barata Refeições de qualidade a preços subsidiados são marca registrada do Programa de Alimentação da Fump

Um milhão e duzentos mil. É esse o número aproximado de refeições servidas por ano nos quatro restaurantes universitários do Programa de Alimentação da Fump, o que faz desse o serviço mais utilizado pelos alunos. Só no Restaurante Universitário Setorial II, o popular “Bandejão” do campus Pampulha, são servidas diariamente seis mil refeições, entre café da manhã, almoço e jantar. O Programa de Alimentação também conta com unidades no campus Saúde e na Faculdade de Direito, em Belo Horizonte, e no Instituto de Ciências 21


Agrárias, em Montes Claros.

solucionados com a reforma em andamento. Com as

Para a estudante do 8º período do curso de Letras da

obras, a cozinha será aumentada assim como o núme-

UFMG Paula Francioli de Souza, o maior atrativo dos

ro de mesas e caixas de atendimento.

restaurantes universitários é o preço. “Chego a economizar de R$ 200 a R$ 300 por mês”, calcula. Como

Torresmo de soja

beneficiária da Fump, Paula paga R$ 0,75 por refeição,

Além de preço e agilidade, a qualidade da refeição

exceto pelo café da manhã, que é gratuito. Os demais

é outro ponto que atrai os usuários. “Os pratos são

estudantes desembolsam R$ 2,50 por refeição, servido-

sempre diversificados”, elogia Túlio Bicalho. Segun-

res da UFMG, R$ 2,85 e pessoas não vinculadas à Uni-

do Helvécia Mikiko, investir na variedade dos pratos

versidade, R$ 3,50. O custo médio da refeição indivi-

é uma estratégia fundamental para cativar o público

dual é de R$ 3,10. “É muito barato até para quem não

dos restaurantes. “Do tempero às opções vegetaria-

é beneficiado da Fump”, afirma Paula, que almoçava

nas, nós sempre tentamos oferecer um cardápio que

nos bandejões antes mesmo de receber a classificação

agrade ao maior número possível de pessoas”, afirma.

socioeconômica em 2007, um ano após ter ingressado

Para experimentações gastronômicas, Helvécia e sua

na Universidade.

equipe valem-se do período de férias. “O torresmo de

Sem filas Túlio Viegas Bicalho, aluno do 8º período de Engenharia Química, iniciou sua vida acadêmica na mesma época em que Paula e se lembra que, nos primeiros períodos, almoçar no Setorial II era uma batalha. “As

“Chego a economizar de R$ 200 a R$ 300 por mês” (Paula Francioli)

filas eram gigantescas e a gente perdia muito tempo da hora do almoço”, recorda. Hoje, no entanto, as fi-

soja foi nossa última experiência bem-sucedida”, con-

las foram praticamente extintas graças a uma reforma

ta, orgulhosa.

realizada em 2006. “Chegamos a registrar um tempo

Outra preocupação básica no Programa de Alimen-

de espera de 42 minutos. Atualmente, é muito difícil

tação da Fump é proporcionar refeições saudáveis à

o aluno esperar por mais de três”, compara o coorde-

comunidade universitária. “Além de pratos gostosos,

nador do Restaurante Universitário Setorial II, Marco

temos como meta ajudar a formar bons hábitos ali-

Antônio Schaefer.

mentares”, relata Helvécia. Três tipos de salada, arroz

O restaurante do campus Saúde também passou por

comum ou integral, dois tipos de carne e opções para

reforma com a mesma finalidade em 2007, quando

vegetarianos: a variedade do cardápio segue à risca as

ampliou o número de caixas de pagamento e de bal-

recomendações da equipe de nutricionistas do Progra-

cões onde a comida é servida. As mudanças também

ma para uma alimentação balanceada e saudável.

representaram grande alívio nas filas. “Hoje alcança-

Para garantir a qualidade da refeição, os restaurantes

mos a agilidade no atendimento que consideramos

também investem em segurança alimentar. “Ficamos

adequada”, afirma Helvécia Mikiko, coordenadora dos

atentos às condições do produto em todas as etapas:

restaurantes do campus Saúde e da Faculdade de Di-

na compra, no recebimento, no armazenamento e na

reito. Reforma similar está prevista para o restauran-

produção”, explica Helvécia. “Temos até mesmo a pre-

te de Montes Claros. Inaugurado em agosto de 2005,

ocupação em orientar o usuário, para que ele tome

ele atende aproximadamente 400 pessoas por dia, mas

certos cuidados na hora de servir o alimento.”

ainda apresenta problemas de espera, que devem ser 22


Reativação do Setorial I

no mesmo local onde funcionou inicialmente – entre

Com a implantação do Programa de Apoio aos Planos

a Faculdade de Educação e a Escola de Engenharia.

de Reestruturação e Expansão das Universidades Fe-

Estima-se que servirá por volta de duas mil refeições

derais (Reuni), lançado pelo Governo Federal, a UFMG

por dia. “A previsão é que o Setorial I volte a funcionar

prevê aumento de 36% no número de alunos até 2011.

com os mesmos padrões de qualidade dos outros res-

Para atender essa demanda crescente, a Fump iniciou

taurantes universitários”, afirma Marco.u

o processo de reabertura do Restaurante Setorial I no campus Pampulha, onde ficava a Central de Salgados. Segundo Marco Antônio Schaefer, o Setorial I atenderá

Benefício

tamanho família Sete mil alunos e dependentes utilizam a Assistência à Saúde da Fump

Na casa da estudante do curso de Letras da UFMG

da saúde, prevenção de doenças e ações curativas são

Pollyanna Maria Francisco Gomes, oito pessoas se be-

complementares”, explica o coordenador do Programa

neficiam da Assistência à Saúde oferecida pela Funda-

de Saúde, Ivan Ramos Júnior. Têm acesso gratuito ao

ção Universitária Mendes Pimentel (Fump). Ela própria,

serviço os alunos regularmente matriculados na UFMG

que recebe atendimento gratuito por ser classificada no

e classificados socioeconomicamente nos níveis I, II e

nível II, sua mãe e os seis irmãos. “Eu pego uma guia

III. E mesmo os não assistidos, incluindo os seus depen-

de encaminhamento e eles pagam a metade, ou menos,

dentes diretos (pais, irmãos, cônjuge e filhos), podem

do valor de uma consulta particular. Para minha família,

recorrer à rede conveniada pagando valores abaixo dos

que não possui plano de saúde, é muito bom dispor des-

de mercado.

se serviço”, avalia a estudante.

Segundo Ivan Ramos Júnior, os estudantes também

Cerca de sete mil pessoas – estudantes e dependentes

têm acesso a consultas, exames auxiliares de diagnós-

– utilizam anualmente o atendimento médico, odonto-

tico, fisioterapia, fonoaudiologia, raios X odontológicos

lógico e psicológico, que tem como foco a atenção bási-

e psicoterapia. O estudante Júlio Cezar Peixoto Junior,

ca. Para prestar esse serviço, a Fump mantém estrutura

do Coltec, classificado no nível I da Fump, conta que já

própria, além de convênio com profissionais, laborató-

realizou diversos exames e consultas: “O atendimento

rios e clínicas. Em Montes Claros, a assistência médi-

é muito bom, só não gosto de certa burocracia, como

ca, odontológica e psicológica é integralmente realizada

no retorno das consultas”. Ivan Ramos pondera: “O

por meio de rede conveniada. “A Fundação não pretende

que alguns classificam como burocracia é apenas um

substituir a rede pública. Suas atividades de promoção

controle maior, pois precisamos zelar pelos recursos 23


bucal. Já a rede conveniada possui mais de 120 profissionais em 27 especialidades médicas. Todo o atendimento é gratuito para os estudantes dos três níveis socioeconômicos. Para os não classificados socioeconomicamente pela aplicados no serviço”.

Fump, as consultas custam R$ 42 (preço de dezembro

Em 2009, o Programa de Assistência à Saúde ampliou seu

de 2009, em Belo Horizonte), e os exames auxiliares de

alcance ao estender a gratuidade da assistência à saúde

diagnóstico também têm custo abaixo de mercado. O

a todos os alunos classificados nos níveis II e III. Antes a

preço da sessão com um dos dez psicólogos da rede con-

gratuidade era concedida somente aos estudantes enqua-

veniada é de R$ 26,65. É necessário levar guia de encami-

drados no nível I. Também foram intensificadas as ativi-

nhamento da Fump na primeira consulta.

dades de acompanhamento e atendimento psicológico

A rede conveniada também inclui clínicas odontológicas

aos alunos em processo de cancelamento do registro

especializadas em clínica geral, periodontia, endodon-

acadêmico.

tia, cirurgia, prótese e laboratórios de raios X. Com a

“Em 2010, a Fump pretende ampliar suas ações coletivas

guia emitida pela Fump, o estudante ou dependente tem

de prevenção, educação e promoção da saúde”, afirma

acesso a consulta de orçamento ao preço de R$ 24.

Ivan Ramos Júnior. Apoio psicológico

24

Odontologia

A Fump oferece acesso gratuito à psicoterapia individual

Desde abril de 2009, a equipe de dentistas e técnicos da

de curta duração e atividades em grupo realizadas em

Fump vinculada ao serviço de atendimento odontológi-

sua sede para alunos com classificação socioeconômica.

co atende em clínica da Faculdade de Odontologia, no

Se necessário, o estudante é encaminhado ao SUS ou a

campus Pampulha, facilitando, aos alunos assistidos, o

clínicas sociais. Já o acesso à rede conveniada de assis-

acesso aos serviços oferecidos. De acordo com Ivan Ra-

tência psicológica utiliza exclusivamente o sistema de

mos Júnior, a parceria envolve os alunos da Faculdade.

pagamento direto tanto para alunos assistidos pela Fun-

“Assim, os estudantes podem vivenciar, na própria esco-

dação como para os demais estudantes da UFMG e seus

la, a experiência de um atendimento odontológico orga-

dependentes diretos.

nizado, abrangente e singular de assistência”, justifica.

Credenciado pela Fump há cerca de 20 anos, o psicólogo

A equipe de profissionais de saúde é composta por médi-

Frederico Zeymer de Carvalho explica que podem aconte-

cos, psicólogos, dentistas, técnicos e auxiliares de saúde

cer crises no decorrer da formação universitária, por ra-


zões diversas. “Há casos de dificuldade de convívio, uns

caminhado formalmente pela coordenação do curso ao

se sentem muito exigidos, outros percebem limites em

serviço de psicologia, que avalia se o desempenho aca-

situações que antes eram muito idealizadas. Na maioria

dêmico foi impactado por problemas psicológicos. Após

das vezes, é possível reverter o quadro, com ou sem aju-

acompanhamento, os psicólogos da Fump enviam rela-

da de medicamentos”, comenta o psicólogo.

tório ao colegiado. Esse trabalho é realizado em parceria

A assistência psicológica prestada pela Fump tem tam-

com a Pró-reitoria de Graduação. u

bém outro público: os alunos em vias de terem seu registro acadêmico cancelado. Nesse caso, independentemente da classificação socieconômica, o estudante com baixo rendimento semestral global ou infrequente é en-

Diversidade sob o mesmo teto Moradia Universitária é uma espécie de microcosmo da academia

Abrigo de alunos, professores, funcionários técnicos e administrativos e visitantes oriundos de diversas partes do país e do exterior, e de diferentes condições de vida e perfis culturais, a Moradia Universitária é espécie de microcosmo da própria Universidade. Criada em 1997, pelo Conselho Universitário, como programa da Instituição, ela oferece 632 vagas nas duas unidades, no bairro Ouro

como professores, servidores técnicos e administrati-

Preto, em Belo Horizonte, e 108 em Montes Claros, onde

vos e visitantes (10%).

fica o Instituto de Ciências Agrárias (ICA).

Essa distribuição reflete o conceito adotado pela

Sua ocupação destina-se prioritariamente a estudan-

UFMG para o espaço: além de facilitar a permanência

tes de graduação e pós-graduação de baixa renda e

de parcela de seus alunos na Instituição, garantindo

que vieram de outras cidades para realizar seu curso

que se desenvolvam academicamente, a moradia uni-

na UFMG. De acordo com os critérios de ocupação,

versitária é recurso importante no apoio à realização

definidos pelo Conselho Universitário, 60% das vagas

de projetos de pesquisa e extensão, recebendo visi-

são reservadas a esse grupo. O restante destina-se

tantes beneficiários de políticas de intercâmbio com

a estudantes não carentes (30%) e demais usuários,

instituições brasileiras e estrangeiras. 25


Entrevista/Seme Gebara Neto Diálogo com estudantes fortalece modelo de gestão Discussão política

Nesta entrevista, o presidente da Fump, professor Seme

“O diferencial do programa de moradia da UFMG não

Gebara Neto, analisa os rumos da assistência estudantil na

reside apenas na estrutura física existente, nem no cui-

UFMG e a importância do programa de moradia para garan-

dado destinado ao espaço, mas na discussão política en-

tir a permanência do estudante na Instituição.

tre os estudantes e os gestores”, observa o presidente da Fump, Seme Gebara Neto. Conforme avalia, a presença

Moradia no contexto acadêmico

periódica dos dirigentes da Universidade no local, de-

Dentro do eixo de políticas de assistência estudantil direcio-

batendo o programa, é indicativo do peso que a UFMG

nadas à permanência, que inclui alimentação, transporte e

lhe destina. “Melhoria do transporte entre a moradia

saúde, a moradia é um programa de apoio fundamental. Na

e o campus Pampulha e clareza sobre regras de hospe-

UFMG, outro eixo é a equalização das oportunidades – con-

dagem são algumas das reivindicações em discussão”,

cretizada em bolsas e em outros programas da Fump. É o

exemplifica.

conjunto desses eixos que produz impacto na permanência

Essa também tem sido a regra para gerenciar o cotidiano

do estudante. Não é possível aferir o peso de apenas um pro-

do espaço, como acrescenta Vera Maria Pereira Coelho,

grama nesse processo.

diretora das duas unidades de Belo Horizonte. Segundo ela, é por meio do diálogo que os moradores aprendem

Participação estudantil na gestão

a utilizar o espaço público – e isso inclui o conjunto

Realizamos reuniões com alunos e decisões foram tomadas

de conflitos comuns em qualquer condomínio: uso de

em conjunto. Isso fortalece o relacionamento e o modelo de

equipamentos coletivos, volume de música, respeito a

gestão. Claro que não é possível atender todas as reivindica-

regras de limpeza, acesso a correspondência. Como re-

ções e que tensões sempre podem ocorrer. Mas é natural e

solvê-los? Apenas por meio de compromisso coletivo de

importante que seja assim, pois aprendemos, com os estu-

atendimento às regras, além da criação de projetos de

dantes, a sermos gestores melhores.

convivência bastante especiais. Lançado em agosto de 2007, o CineMoradia foi o passo

Expansão do programa

inicial do programa de convivência, em Belo Horizonte.

Há carência de vagas na UFMG. Em algum momento será

A ideia era oferecer aos condôminos a exibição de fil-

necessário expandir a estrutura física. Mas por enquanto

mes, seguida de debate. Coordenado por alunos, o pro-

isso não é possível, ainda que tenhamos espaço para cons-

grama de convivência se expandiu, agregando os proje-

truir um terceiro bloco em BH, o que nos daria cerca de 300

tos Dança na Moradia, Moradia Futebol Clube e a oficina

novas vagas. O projeto é idêntico à Moradia I. Enquanto isso

de teatro Na Morada do Teatro.

o jeito é resolver com bolsas Auxílio Moradia.

“Esses projetos promovem integração dos moradores e permite que valores culturais e humanos se desen-

Financiamento

volvam entre eles”, diz a diretora. Conforme ressalta,

A Fump possui um saldo que será usado, até onde for pre-

o trabalho que ali se desenrola, por meio do reconheci-

ciso, para assistência estudantil. Temos, desde 2009, o fi-

mento desses valores e, portanto, da diversidade, per-

nanciamento do governo federal, o Pnaes, porém ele é in-

mite a convivência das diferenças em outro patamar,

suficiente. A contribuição voluntária ao Fundo de Bolsas por

que não o conflito. “As atividades culturais potencia-

enquanto não é significativa, mas ajuda. Assim, em 2010 se-

lizaram a criação de um ambiente mais propício ao

rão mantidos todos os programas da Fump. Mas a perspec-

desenvolvimento, que vai além da esfera acadêmica”,

tiva é de ampliá-los, pois o Pnaes deverá ter continuidade e o

reforça Seme Gebara. u

valor repassado tem sido crescente. Apesar disso, o recurso ainda não é suficiente para construção de novo bloco para a moradia. É preciso verba específica. u

26


Perfil

Um coração

do tamanho da arca de noé

ção, que complementa o salário do marido Jorge, que é

A estudante de Medicina Veterinária Shemina Ro-

carteiro, e por duas vezes foi contemplada com o Programa de Acesso ao Livro.

mano Diniz, acredita em destino e costuma prestar atenção nos sinais que ele emite. O aviso que mudou o

Fraco por felinos

rumo de sua vida chegou no final de 2003, em uma casa

A casa de Shemina em Venda Nova é uma autêntica arca

de rações em Venda Nova. Lá de dentro, ela viu um cão

de Noé. Lá ela mantém 25 animais: 13 gatos, seis cães,

da raça poodle sendo atropelado. Meteu-se entre os

três canários e três camundongos. Estes foram encontra-

carros que ameaçavam esmagar o animal e conseguiu

dos por Jorge em uma ninhada no terreno da residência

resgatá-lo ainda vivo, mas gravemente ferido. Quando

onde moram. “E quem disse que alguém teve coragem

pegou o cão, sentiu a força de seus dentes no braço. Foi

de matá-los?”, recorda-se. Tratados como hamsters, os

parar num pronto-atendimento onde tomou uma dose

camundongos são mantidos em segurança, bem longe

da vacina antirrábica. O cão não sobreviveu. Da tragé-

das vistas da tropa de choque felina. “Se pudesse teria

dia nasceu a certeza: o amor pelos bichos comandaria

um zoológico só com animais de companhia”, comenta.

a sua vida.

Jorge foi contaminado pelo fervor da esposa. Na mochila

Na época, faltava pouco para Shemina se formar em Bi-

em que carrega as correspondências, reserva um espaço

blioteconomia. Ela já trabalhava na área, organizando

para a ração que distribui aos bichinhos desamparados

arquivos físicos e digitais para uma empresa de consul-

encontrados pelo caminho.

toria. “Já era uma profissional respeitada”, conta. Mas

Shemina ama os animais, mas não se pode dizer que esse

faltava o essencial. “Vivia adoecendo, tinha enxaquecas

amor é igualitário. Seus preferidos são os felinos. Tanto

horríveis, ficava deprimida. Meu corpo somatizava essa

que pretende montar uma clínica especializada em ga-

infelicidade”, detalha.

tos, nicho de mercado que ainda não é explorado em Belo

Em 2004, Shemina decidiu que trocaria o computador,

Horizonte. “Gato é um animal diferenciado, com hábitos

os arquivos e o manuseio de livros em estantes de bi-

mais noturnos que diurnos, que precisa de iluminação es-

bliotecas pelas rações, vacinas, medicamentos e pelos.

pecial, que não pode ser importunado com os latidos dos

Sem dizer nada à mãe, Sheila, e ao marido, Jorge, ela

cães”, justifica.

protocolou o pedido de reopção de curso para Veteriná-

Além de dispensar todos os cuidados clínicos aos gatos,

ria e cruzou os dedos. Só contou que mudaria de profis-

Shemina recolhe os que são abandonados na porta do

são quando saiu o improvável resultado.

Hospital Veterinário e procura interessados em adotá-los.

Sua trajetória na Universidade já dura quase nove anos.

“Chamo os candidatos, faço entrevista com eles e investi-

A primeira parte foi tomada com o curso de Biblioteco-

go se querem mesmo ficar com o animal”, garante.

nomia e a segunda com a sua paixão, a Medicina Ve-

Shemina espera ter três filhos para dedicar-lhes o mesmo

terinária. Durante a maior parte desse tempo, contou

afeto que reserva aos animais. “Eles virão na hora certa”,

com a assistência da Fump. “Sem ela não teria chegado

garante ela, que não faz planos para os herdeiros. Espera

até aqui”, reconhece. Ela recebe a Bolsa de Manuten-

apenas que não neguem a raça.u 27


Perfil

Roger

não desiste Quando Roger Lopes Souza se mudou para Contagem, depois de passar os primeiros 18 anos de sua vida em Nanuque, no Vale do Mucuri, a primeira diferença que notou entre a cidade grande e o interior foi o longo

fez a família mudar-se para Contagem, “para tentar a

trajeto que era obrigado a percorrer para chegar a algum

sorte”. Primeiro veio o pai, que logo conseguiu um

lugar. Tudo parecia mais longe. Mal sabia ele que longo

emprego como porteiro. Depois chegaram Roger, a

também seria o caminho para aprovação no vestibular

irmã mais nova e a mãe, que trabalha como costureira.

para Medicina.

Porém, pouco mudou além do novo endereço. “Às vezes,

O primeiro passo foi entrar em um pré-vestibular. Ele

a gente fica devendo algumas contas. Tem que se virar

sabia que um reforço nos estudos era mais do que

para pagar, pedir dinheiro emprestado.”

necessário. Porém, sem poder contar com a ajuda dos pais para pagar o curso, teve que trabalhar para

Religiosidade

arcar com as despesas. Primeiro em um escritório de

O que também não mudou foi a rotina do estudante.

contabilidade, depois em uma distribuidora de produtos

Assim como em Nanuque, Roger segue dividindo o

farmacêuticos.

tempo entre as aulas, os encontros com os amigos e

Até a aprovação, foram quatro tentativas. Da primeira

a igreja. Adventista do Sétimo Dia, Roger frequenta os

vez, ele acertou pouco mais de 70 questões na primeira

cultos uma ou duas vezes por semana e canta em alguns

etapa, quando a prova ainda tinha 120 questões,

deles, junto com a irmã.

pontuação distante da nota de corte para Medicina, que

Mas muito ainda vai mudar na trajetória de Roger,

ultrapassa 90 pontos. Da segunda vez, ele chegou perto

conforme o futuro médico espera. Para ele, concretizar

dos 90 acertos, ainda insuficiente para passar para a

o sonho de infância vai trazer a possibilidade de

etapa seguinte. Da terceira, ele chegou aos 97 pontos

proporcionar uma vida melhor para si e para sua família.

e foi aprovado para a segunda etapa, mas não passou

Por sinal, falta pouco para que a caminhada se encerre.

dela. Da quarta vez, ele cravou os mesmos 97 pontos, foi

Ele está no décimo período do curso, tendo chegado

mais uma vez para a segunda etapa e, finalmente, veio

até aqui, em parte, com o apoio da Fump. Ele recebe

a aprovação.

Bolsa de Manutenção no valor de R$ 300, auxílio para a

A felicidade foi tanta que ele quase não acreditou. A

compra de material escolar, além de assistência médica

notícia chegou pelo telefone, na voz de uma amiga. Só

e odontológica. Foi também com a ajuda da Fump que

se convenceu de que era verdade quando foi a uma lan

ele comprou um computador.

house, acessou o site da UFMG, e viu seu nome na lista.

A especialização Roger já escolheu: cirurgia. O

Durante os quatro anos dessa caminhada rumo à

motivo? “É uma área de atendimento mais dinâmica,

Universidade, Roger ficou cansado algumas vezes, mas

você tem que agir rápido.” Depois da longa jornada,

nunca pensou em ficar pelo caminho. “Acima de tudo,

Roger tem pressa. u

fui teimoso e persistente” afirma. Roger conta que, desde os tempos em que morava em Nanuque, a família passava por dificuldades. A cidade 28

não oferecia muitas oportunidades de emprego, o que


Um tempo

de desafios e realizações Os últimos quatro anos foram de mudanças e desafios para a assistência estudantil. Sua principal fonte de financiamento, a Contribuição ao Fundo de Bolsas vinculada à matrícula, foi proibida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2008, provocando forte impacto sobre os programas gerenciados pela Fundação Universitária Mendes Pimentel (Fump). Embora não compense integralmente a ausência dos recursos do Fundo de Bolsas,

econômica baseada em revisão de alguns indicadores.

a Fump passou a receber, no ano seguinte, verbas do

Variáveis antes mensuradas, como situação de moradia

Programa Nacional de Assistência Estudantil (Pnaes),

do grupo familiar, passam a compor o questionário ape-

o marco inaugural de uma política governamental de

nas para análise de dados, e outras, como rendimento

atenção ao estudante universitário.

familiar, tiveram sua estrutura e peso modificados. Já na

Apesar desse cenário de dificuldades, a Fundação man-

variável situação de trabalho dos pais, apenas o prove-

teve, aprimorou e criou programas, confirmando a sua

dor será mensurado.

capacidade de se ajustar aos novos tempos. Confira a seguir uma síntese das ações no período de 2006-2010 e

Novos programas de bolsas

daquelas que serão implantadas em um futuro próximo.

• Uma ação adotada nos últimos anos foi a transformação de alguns financiamentos em programas efetivos

Avaliação Socioeconômica

com liberação de recursos não reembolsáveis, percen-

• A análise socioeconômica utilizada pela Fump para

tual de gratuidade e desconto de parceiros. São os ca-

acesso aos programas de assistência estudantil passou

sos dos programas de Acesso a Material Odontológico

também a ser aplicada para atender à demanda da Dire-

Básico, Apoio ao Festival de Inverno, Acesso a Material

toria de Relações Internacionais (DRI). O objetivo é sub-

Escolar, Acesso ao Livro e Acesso a Cursos de Línguas

sidiar o processo de seleção das bolsas de Intercâmbio

Estrangeiras.

Internacional Santos Dumont e Escala Estudantil. Outra finalidade é atender às coordenações dos cursos de mes-

• Programas criados no período: Acesso ao Meu Primei-

trado e doutorado, subsidiando o processo de isenção da

ro Computador, Apoio ao Pró-Noturno, Inserção Social

taxa de inscrição e liberação de bolsas.

e Apoio ao Intercâmbio Internacional, além de Bolsas Especiais: Bolsa Auxílio Moradia, Bolsa de Apoio à Edu-

• A Fump elaborou e implantou a Metodologia de Análi-

cação e Cidadania, Bolsa de Acesso ao Livro Bernardo Ál-

se Socioeconômica, versão simplificada, que atende aos

vares e Bolsa de Manutenção Bernardo Álvares. As duas

alunos do programa Estudantes Conveniados de Gradua-

últimas foram viabilizadas por meio de doação da famí-

ção (PEC-G) e dos cursos de Licenciatura do Campo e de

lia do homenageado, que beneficia os alunos com bolsas

Formação Intercultural. E ainda atende aos candidatos

entre R$ 150 e R$ 300.

que pretendem concorrer às bolsas dos cursos de extensão.

• Implantação do Programa de Línguas Estrangeiras no Instituto de Ciências Agrárias, em Montes Claros, a par-

• A Fump começou a adotar, no primeiro semestre letivo

tir do primeiro semestre de 2010.

de 2010, nova versão da metodologia de avaliação socio29


• Número de vagas nas moradias Ouro Preto I e II aumentou de 614 para 632. Alimentação

• Construção do novo módulo de moradia em Montes Claros, com 108 vagas, sendo quatro adaptadas para ca-

• A Fump realizou estudo para a reabertura do Restau-

deirantes. Os recursos vieram da venda das antigas mo-

rante Universitário Setorial I com o objetivo de fazer

radias universitárias Dona Clara e Santa Rosa, em Belo

frente à demanda crescente no campus Pampulha. To-

Horizonte, e de recursos da UFMG.

dos os projetos necessários à sua operação – frigorífico, elétrico, hidráulico, acústico e de exaustão – já foram

Saúde

comprados. A reabertura aumentará em 50% a capaci-

• A Faculdade de Odontologia passou a abrigar o serviço

dade de atendimento no campus Pampulha.

próprio de odontologia da Fump, que conta com suporte

• Alunos da UFMG assistidos pela Fump passaram a con-

dos estudantes da Unidade.

tar com café da manhã gratuito nos restaurantes universitários Setorial II, do campus Saúde e no de Montes

• Gratuidade estendida a alunos de todos os níveis de

Claros.

classificação socioeconômica (I, II e III).

• Ampliação e melhoria das condições de atendimento dos restaurantes universitários dos campi Pampulha e

• Implantado o Projeto Blitz da Saúde, com ações coleti-

Saúde.

vas de prevenção, educação e promoção da saúde.

Moradia

• Ampliado o Programa de Saúde Psicológica.

• Melhoria do sistema de segurança, com contratação de empresa de vigilância e instalação de circuito fecha-

• Programa de Saúde é implantado em Montes Claros

do de TV nas moradias Ouro Preto I e II.

com os mesmos serviços oferecidos em Belo Horizonte: clínica com especialidades odontológicas, clínica com

30

• Implantação do transporte coletivo para ligar as mora-

especialidades médicas, fonoaudiologia, fisioterapia,

dias ao campus Pampulha.

psicologia, exames de imagem e contrato com óticas.


Complementação educacional

logia), um posto avançado de atendimento (ao lado do

• Conselho Diretor da Fump aprovou a criação do Pro-

Setorial II) e um Núcleo de Escuta.

grama de Acesso a Material Escolar de Alto Custo, a ser implantado no segundo semestre de 2010. Agora, além

Recursos

dos alunos de Odontologia, estudantes de outros cursos

Durante 79 anos, a Fump desenvolveu os seus progra-

que demandam materiais de valor elevado serão subsi-

mas por meio da Contribuição ao Fundo de Bolsas, paga

diados pela Fump.

no período de matrícula. Com base nessa arrecadação (cerca de R$ 10,7 milhões, em 2008), os programas exis-

• Bolsa Socioeducacional teve seu valor aumentado em

tentes eram mantidos e novos programas implantados.

50% no segundo semestre de 2009.

Com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de proibir a cobrança de taxas vinculadas à matrícula, a

Avaliação de impacto dos programas

Fump criou uma campanha de contribuição voluntária

Atenta às inovações metodológicas, a Fump implantará

ao Fundo de Bolsas para estimular alunos, ex-alunos,

uma ferramenta de avaliação de impacto econômico dos

professores e funcionários da UFMG a ajudarem a man-

seus programas. O objetivo é aprimorar o atendimento

ter os programas de assistência. Em 2009 e no início de

às necessidades da assistência estudantil, contribuindo

2010, a iniciativa gerou R$ 850 mil de arrecadação.

para a redução dos índices de retenção e evasão acadê-

Outra fonte de recursos vem do Programa Nacional de

mica. Até então, essa análise era feita com base apenas

Assistência Estudantil (Pnaes), que destinou, em 2009,

no número de pessoas beneficiadas. A nova metodologia

cerca de R$ 3,2 milhões. Para 2010, serão liberados R$

considera também o impacto real dos projetos na vida

7,2 milhões.

do aluno assistido e das pessoas em seu entorno. Com isso, a entidade dá um passo decisivo para profissionali-

Comunicação

zar ainda mais a gestão dos seus programas.

O site da Fump passará por completa reformulação de layout e conteúdo. Seu design seguirá a nova identidade

Interação com as Ifes

visual da Fundação, permitindo aos usuários acessarem,

• Fump confirma sua posição de instituição de referên-

de forma mais prática e rápida, as informações dispo-

cia na área de assistência estudantil no Brasil. Em outu-

níveis. Uma das novidades será o link para o Twitter da

bro de 2009, a UFMG sediou a 46ª Reunião Ordinária do

Fump, mais um canal de comunicação com a comunida-

Fórum Nacional de Pró-reitores de Assuntos Comunitá-

de acadêmica.u

rios e Estudantis (Fonaprace). • Em conjunto com as demais Ifes, a UFMG, por meio da Fump, trabalha na proposta de tipificação dos serviços de assistência estudantil seguindo resolução do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS). Mudança para o campus A UFMG planeja construir, no campus Pampulha, em área nas imediações do Setorial I, a nova sede da Fump. O local passaria a concentrar toda a estrutura de atendimento da Fundação. Na Pampulha, já funcionam o Ser Serviço de Odontologia (no prédio da Faculdade de Odonto31


Perfil

Pelo futuro de Milena

As coisas pareciam sob controle. Ela tinha engrenado no curso de Enfermagem – já estava no quarto período –, havia superado a fase de adaptação em Belo Horizonte, conseguira uma vaga na Moradia Universitária e rece-

estuda ou trabalha em Belo Horizonte. Para ajudar nas

bia Bolsa de Manutenção da Fump. Mas, em 2008, um

despesas que passou a ter com Milena, Daniele, que

fato abalou a tranquilidade de Daniele Luiz Andrade: ela

planeja se formar no final de 2010, conta com a Bolsa

descobriu-se grávida de gêmeos.

Creche.

“Foi um susto. Mas nunca pensei em desistir”, afirma.

Daniele se dedicou aos estudos como forma de melho-

Desde o princípio da gravidez, Daniele fez uso da assis-

rar suas condições de vida. Sempre frequentou escolas

tência médica oferecida pela Fump, o que possibilitou o

públicas e, após o ensino médio, fez o curso técnico

diagnóstico de uma complicação na gravidez. “A médica

de enfermagem em sua cidade, concluído em 2003. Em

percebeu uma situação anormal de pressão alta logo no

2004, foi aprovada para o curso de Biblioteconomia da

início, o que evitou consequências sérias à minha saú-

UFMG e, dois anos depois, conseguiu transferência

de”, diz. Daniele teve uma doença hipertensiva típica

para Enfermagem.

da gestação, que resultou no nascimento prematuro de

A mudança para Belo Horizonte resultou em despesas

suas filhas, aos seis meses de gravidez.

que Daniele não tinha condições de assumir. No início,

As crianças nasceram com a saúde fragilizada e, uma

contou com o apoio financeiro do avô. “Ele me ajuda-

semana após o parto, uma delas faleceu. A outra, Mi-

va bastante, mas passava muito aperto. No começo do

lena, continuou internada por algum tempo, teve alta

curso, morava na casa de um amigo em um bairro longe

e seguiu sua vida normalmente. “Ela não ficou com ne-

do campus e gastava muito dinheiro com ônibus”, rela-

nhuma sequela decorrente do nascimento prematuro”,

ta. Com a morte do avô, ainda nos primeiros meses do

conta a mãe.

curso, a Fump entrou em sua vida. “Eu procurei a Fundação primeiro por causa da Moradia, mas logo comecei a

A retomada

acessar os demais benefícios”, conta.

Passada essa turbulência, Daniele precisou reorganizar a

Após tantas dificuldades superadas, Daniele acredita

vida para conciliar os estudos, o estágio e as obrigações

que se transformou em uma pessoa mais madura, o que

de mãe. A primeira decisão – nada fácil – foi sair da Mo-

se refletirá em sua atuação profissional: “Levarei esse

radia Universitária. Segundo o regulamento, os estudan-

amadurecimento para minha profissão de enfermeira,

tes não podem morar com filhos no local. “Eu poderia

cuidando daqueles que necessitam, com o mesmo ca-

continuar lá, mas ficaria difícil ver minha filha nos dias

rinho que recebi aqui na Universidade”. Isso já é um

de semana”, explica.

juramento.u

A estudante optou por retornar a Sete Lagoas, sua cidade natal, onde mora com a mãe e com uma irmã. Ela enfrenta 140 quilômetros de estrada ida e volta todos os dias. Os cuidados com a filha são divididos principalmente com a mãe do noivo de Daniele. É a sogra quem 32

toma conta de Milena durante o tempo em que a moça


Perfil

Tem um

lugar para mim

Era início de 2007, quando Elivelto Aparecido Guima-

grupo de jovens da Igreja Católica. “Encontrei ícones no

rães, retornando para casa, parou na Estação Venda

hip hop: eram uns caras imensos, negros, parecidos co-

Nova e se dirigiu a um ponto de internet para consultar

migo, que falavam em black is beautiful”, recorda-se. A

o resultado da segunda etapa do vestibular da UFMG.

temática racial que perpassava o hip hop o ajudou: “Eu

O nome dele estava lá. “Foi uma loucura! Saí pulando e

me via ali”.

gritando dentro da Estação.”

Um belo dia, a vocação se descortinou. O professor de

A comemoração explosiva tinha razões especiais para

História pediu à turma que apresentasse os trabalhos

esse estudante do curso de História. Ao conseguir sua

oralmente. Elivelto deu sua primeira aula. Um show. Ele

aprovação, Elivelto fechava um ciclo de busca quase ob-

continuou sonhando com a UFMG, mas levou baldes de

sessiva por duas de suas escolhas: estudar na UFMG e

água de fria. Não passou no vestibular por diversas ve-

ser professor de História.

zes. Precisou trabalhar e tudo ficou mais difícil. Decidiu

Durante sua vida, a UFMG esteve sempre lá, no meio do

tentar uma vaga na Uemg para Educação Artística. Apro-

caminho. “Mas no meio do caminho que o ônibus per-

vado, seguiu os estudos até o sexto período. Mas...“Ia à

corria entre a casa e o centro da cidade”, ri. Foi entrando

biblioteca e se tinha uma hora para as pesquisas, dedi-

como pode. Aos 14 anos, como lavador de carros na Fa-

cava 40 minutos aos livros de História.” Em 2005 che-

culdade de Letras. Ali, às vezes, comprava um salgado na

gou a ser aprovado para a segunda etapa na UFMG. Mas

cantina e ficava abismado com a quantidade de frutas e

não levou. Em 2007, estudando sozinho foi surpreendido

folhas que os “ricos” comiam.

pela aprovação.

Os pais, ainda que com formação incompleta no nível

Ao ingressar na Universidade, no entanto, suas notas fo-

fundamental, queriam que ele estudasse, “que fosse al-

ram ao chão. Após tanto esforço, como diz, não queria

guém na vida”. Foi essa determinação que o manteve

realizar o curso de qualquer maneira. Trabalhava 12 ho-

nos bancos da escola. Por quê? “Fui aluno-problema,

ras por dia. E via novas oportunidades dentro da UFMG:

desses que jogam papel no professor, são ameaçados de

iniciação científica, mestrado, doutorado. Pediu as con-

expulsão várias vezes e cujas mães são chamadas à dire-

tas. Bateu às portas da Fump e obteve apoio por meio

toria constantemente”. Com o professor de História, o

do Pró-Noturno. Recebe ainda outros benefícios: preços

relacionamento era particularmente tenso. “Cheguei a

reduzidos nos restaurantes, livro didático, tratamento

chamá-lo para briga”, recorda.

odontológico: “Com esse apoio, meu estudo ganhou em qualidade e as notas melhoraram bastante”. Integrado a

Black is beautiful

um projeto de pesquisa, Elivelto já projeta novidade para

Os motivos estavam lá na base: problemas de autoima-

2016: o primeiro filho, tão logo conclua o doutorado e a

gem, autoconfiança, exclusão, preconceito. “Como ne-

esposa termine a graduação em Música. Depois de tan-

gro no Brasil, você não se vê”, reflete. A virada foi acon-

tas experiências, pergunte a ele o que será: “professor de

tecendo. Entrou para o movimento hip hop e para um

História”. E o olhar não desmente.u 33



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