Sabe do que mais me lembro da minha? perguntou Fermín. Do cheiro. Cheirava sempre a lavado, a pão doce. Tanto fazia que tivesse passado o dia a trabalhar no campo ou que trouxesse vestidos os mesmos andrajos de toda a semana. Cheirava sempre a tudo o que há de bom neste mundo. E olhe que era bruta. Praguejava como um carroceiro, mas cheirava como as princesas das histórias. Ou pelo menos assim me parecia. E o Daniel? De que mais se lembra da sua mãe? Hesitei um instante, arranhando as palavras que me fugiam da voz. Nada. Há já anos que não me consigo lembrar da minha mãe. Nem como era a cara dela, a voz, ou o cheiro. Perderamseme no dia em que descobri Julián Carax e nunca mais voltaram. Fermín observavame cautelosamente, medindo a resposta. Não tem nenhum retrato dela? Nunca quis vêlos disse eu. Porquê? Nunca tinha contado isto a ninguém, nem sequer ao meu pai ou ao Tomás. Porque tenho medo. Tenho medo de procurar um retrato da minha mãe e descobrir nela uma estranha. Isto háde parecerlhe uma tolice. Fermín abanou a cabeça. E por isso acha que se conseguir desvendar o mistério de Julián Carax e resgatálo do esquecimento, o rosto da sua mãe voltará para si? Olheio em silêncio. Não havia ironia nem julgamento no seu olhar. Por um instante, Fermín Romero de Torres pareceume o homem mais lúcido e sábio do universo. Talvez disse, sem pensar. Por volta do meiodia metemonos num autocarro de volta ao centro. Sentámonos à frente, mesmo atrás do condutor, circunstância que Fermín aproveitou para entabular um debate com ele acerca dos muitos progressos, técnicos e cosméticos, que notava nos transportes públicos de superfície em relação à última vez que os tinha utilizado, lá para 1940, particularmente no referente à sinalização, como demonstrava um cartaz que rezava: «É proibido cuspir e dizer palavrões.» Fermín examinou o