Perspectiva Contábil: Informação, Ciência e Diálogo

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2 RESENHA

Regular para quê? A coerência do processo de criação das normas contábeis

3 PESQUISA EM DESTAQUE

Estágio docência e a pedagógica na área contábil

formação

3 ANÁLISE

Perspectiva Contábil Informação, Ciência e Diálogo

Contabilização das incertezas fiscais: o que diz a ICPC 22?

4 ENSINO EM QUESTÃO

A adoção de metodologias ativas, o ciclo de vida e a qualificação docente

4 MINHA BIBLIOTECA

Livro: “Revolucionando a sala de aula 2”

4 ENTREVISTA

8ª Edição | Dezembro 2020 REFLEXÃO

O Ebitda deixará de existir?

O

que é? O Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization (EBITDA) é uma métrica de desempenho alternativa aos Generally Accepted Accounting Principles (GAAP), utilizada para evidenciar o potencial de caixa operacional gerado por uma empresa1. O EBITDA se popularizou nos Estados Unidos a partir de 19802, atualmente é a métrica não GAAP com maior divulgação entre as companhias de capital aberto brasileiras3. Prós e contras? Dentre os argumentos favoráveis ao EBITDA estão a melhora na compreensão dos componentes apresentados na Demonstração de Resultados, avaliação do desempenho de executivos, medição da capacidade de solvência e, estimativa do valuation2. Pesam argumentos contrários à métrica de que o EBITDA pode ser utilizado oportunisticamente para desviar a atenção de eventos que afetaram negativamente os resultados4, principalmente em companhias que apresentam características singulares, por exemplo, àquelas que demonstram maior alavancagem financeira2. Divulgação oportunística? Em meio ao turbulento cenário de 2020 ocasionado pela pandemia de coronavírus, a empresa Marfrig (MRFG3) disseminou seu expressivo “EBITDA ajustado” de R$1,2 bilhões obtido no primeiro trimestre5, embora a empresa tenha incorrido em um prejuízo de R$138 milhões provocados pelo aumento de sua dívida contratada em dólar6, evidenciando assim a dualidade inerente à divulgação da métrica. Quem se preocupa? Diante da disseminação de métricas não GAAP, órgãos reguladores como a Comissão de Valores Mobiliários (CVM)7 e a Securities and Exchange Commission (SEC)8 passaram a emitir instruções a respeito da divulgação voluntária, além da inclusão do EBITDA às International Financial Reporting Standards (IFRS) estar na agenda de discussão do International Accounting Standards Board (IASB)9.

por Me. Gleison Pontes - Doutorando PPGCC/UFU

Como será demonstrado? Caso seja aprovado a proposta em discussão no IASB, que visa alterar a IAS 1 – Presentation of Financial Statements, haverá um componente na Demonstração de Resultados denominado “operating profit or loss before depreciation and amortization”, ou seja, lucros ou perdas operacionais antes da depreciação e amortização. Fim da linha? Difundida no mercado de capitais há pelo menos quatro décadas, o EBITDA ganhou tal repercussão que, num futuro próximo poderá integrar o seleto grupo de métricas GAAP. Contudo, todo o glamour de sua divulgação voluntária poderá ser ofuscado ao passar a competir com as demais linhas da Demonstração de Resultados. Cabe salientar que as empresas ainda poderão divulgar o EBITDA ajustado, porém, talvez fiquem menos “tentadas” diante da necessidade de oferecerem maiores explicações sobre os ajustes realizados. Assim, do mesmo modo que ansiamos por resultados positivos da vacina contra a covid-19, há no meio corporativo a ansiedade de que a incorporação da métrica aos GAAP possa cumprir o papel de conduzir à informatividade.  REFERÊNCIAS [1] Oliveira, L. M., Perez Junior, J. H. & Silva, C. A. S. (2015). Controladoria estratégica: textos e casos práticos com solução.11. ed. São Paulo: Atlas, 2015. [2] Bouwens, J., De Kok, T. & Verriest, A. (2019). The prevalence and validity of EBITDA as a performance measure. Comptabilité - Contrôle - Audit, 25 (1), 55105. [3] Andrade, G. V. & Murcia, F. D. R. (2019). Uma análise crítica sobre os ajustes adicionais considerados nas divulgações da medida não GAAP “EBITDA ajustado” em relatórios de companhias listadas brasileiras. REPEC – Revista de Educação e Pesquisa em Contabilidade, 13(4), 469-486, out./dez. [4] Cormier, D., Demaria, S. & Magnan, M. (2017). Beyond earnings: do EBITDA reporting and governance matter for market participants? Managerial Finance, 43(2), 193-211. [5] Disponível em: <https://g1.globo.com/economia/noticia/2020/05/18/lucrooperacional-da-marfrig-mais-que-dobra-no-1o-trimestre.ghtml>. Acesso em: 21 mai. 2020. [6] Disponível em: <https://www.moneytimes.com.br/a-pergunta-do-btg-pactualpara-o-marfrig-tudo-bem-mas-cade-o-dinheiro/>. Acesso em: 21 mai. 2020. [7] Disponível em: <http://www.cvm.gov.br/legislacao/instrucoes/inst527.html>. Acesso em 30 jul. 2020. [8] Disponível em: <https://www.sec.gov/rules/final/33-8176.htm>. Acesso em 30 jul. 2020. [9] Disponível em: <https://www.iasplus.com/en/news/2019/12/pfs>. Acesso em: 14 ago. 2020.

PPGCC/UFU em tempos de pandemia, com Prof. Dr. Gilberto José Miranda

INFORMAÇÕES INSTITUCIONAIS UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA FACULDADE DE CIÊNCIAS CONTÁBEIS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS CONTÁBEIS

Valder Steffen Júnior Reitor da UFU

Lucimar Antônio Cabral Ávila Diretor da FACIC

Gilberto José Miranda Coordenador do PPGCC

Av. João Naves de Ávila, 2121 - Bloco 1F - Sala 248 Campus Santa Mônica - Uberlândia/MG - CEP 38.400-902 Telefone: +55 (34) 3291-5904 E-mail: ppgcc@facic.ufu.br

Site: www.ppgcc.facic.ufu.br

EQUIPE EDITORIAL PROFESSORA

ORGANIZAÇÃO E EDIÇÃO - Dra. Marli Auxiliadora da Silva

PÓS- GRADUANDOS

- Me. Izael Santos - Me. Taís Duarte - Me. Eduardo Soares - Guilherme Belote - Mayky Souza

COLABORAÇÃO REVISÃO TÉCNICA - Dr. Gilberto José Miranda - Dra. Edvalda Araújo Leal

Caro leitor, Esperamos encontrá-lo bem! Apesar dos dias difíceis vividos durante o ano de 2020, não poderiámos encerrar esse desafiador ano sem uma nova versão do “Perspectiva Contábil: informação, ciência e diálogo”, o boletim informativo do PPGCC/UFU. Nesta 8ª edição apresentamos temas relacionados à regulação e normatização contábil, como a discussão da IAS 1 e o EBITDA, a contabilização de incertezas fiscais e o uso do framework na criação da IFRS 16, bem como temas voltados para o ensino como a adoção de metodologias ativas, o papel do estágio docência na pós-graduação, entre outros. Esperamos que aproveitem os textos e que a leitura do boletim possa propiciar reflexões e aprendizados sobre assuntos da área contábil. Boa leitura!

Equipe Editorial


RESENHA

Regular para quê? A coerência do processo de criação das normas contábeis

A

contabilidade, enquanto ciência social aplicada, se depara constantemente com diversas necessidades informacionais (às vezes conflitantes), mesmo tendo recursos (modelo de reconhecimento, mensuração e divulgação) limitados. O equacionamento deste binômio, interesses infinitos e recursos limitados, pode ser alcançado com a ideia de que os objetivos da contabilidade devem guardar relação com os elementos relevantes para o processo decisório – na perspectiva dos usuários ! O problema é que os usuários são plurais e seus interesses REGULAÇÃO se diferenciam na medida das relações que estabelecem com as entidades que reportam as informações contábeis. Assim, se assumirmos a contabilidade como mecanismo de redução (e não eliminação) da assimetria informacional, talvez fique mais nítido o seu real papel social na comunicação de informações econômico-financeiras de qualidade. Para que tal papel seja adequadamente exercido é preciso que os atores sociais compartilhem crenças e valores que constituam as práticas contábeis tidas como adequadas para retratar o patrimônio das entidades e suas variações qualitativas e quantitativas. Neste ponto, fica evidente a função da regulação da contabilidade, enquanto importante vetor para direcionamento da conduta técnica de profissionais da área e para o desenvolvimento de práticas que satisfação os interesses dos usuários. Se delimitarmos nossa reflexão sobre quais valores são utilizados pelas entidades na mediação entre o fato econômico e a norma contábil, podemos adotar como ponto de partida a existência de um framework cuja função é tratar os conceitos essenciais para elaboração e divulgação de relatórios contábil-financeiros e para a qualidade das informações reportadas. Kabir & Rahman (2018)* investigaram como o POLÍTICAS framework é utilizado pelo IASB para o desenvolvimento das normas contábeis internacionais, por meio do estudo da IFRS 16 que versa sobre o tratamento contábil de arrendamentos. Eles partem do pressuposto que o framework traz conceitos que fundamentam a preparação e apresentação de demonstrações financeiras, devendo ser usada para a criação de novas IFRSs e para revisão das existentes. Mas, admitem que a emissão das normas é um processo político, e que o estabelecimento de padrões contábeis sofre pressões de diversos segmentos, principalmente pelo fato de o IASB ser uma entidade privada que necessita do apoio de jurisdições e reguladores nacionais. A IFRS 16 é uma resposta às muitas críticas do tratamento dado ao fato econômico do arrendamento pela IAS 17, cujo escopo e classificação arbitrária do arrendamento na tipologia operacional NORMAS e financeiro acabou por deixar fora dos balanços vultuosos montantes de passivos, prejudicando a transparência das empresas. A nova norma contábil, observando os valores informacionais e o interesse público sobre os do arrendamento nas 2 efeitos entidades eliminou o conceito

por Me. Izael Santos - Doutorando PPGCC/UFU

de arrendamentos operacionais e financeiros para principiológico geral por requisitos de arrendatários, estabelecendo um único modelo contabilidade prescritiva. contábil, no qual os arrendatários reconhecem Kabir & Rahman (2018) destacaram que o IASB todos os arrendamentos no balanço como um “ativo desenvolveu o modelo de direito de uso na IFRS de direito de uso” e, em contrapartida, um “passivo 16 considerando os conceitos de ativo e passivo e de arrendamento”. São isentos deste tratamento o sustentou, argumentando que reflete fielmente os ativos de pequeno valor e os arrendamentos os direitos e obrigações decorrentes do contrato de de curto prazo. O objetivo do IASB com a IFRS 16 arrendamento e que mitigará as preocupações dos foi melhorar a transparência, a comparabilidade e usuários, colocando no balanço, todos os passivos a divulgação dos arrendamentos pelas empresas. antes fora, por serem tidos como arrendamentos Kabir & Rahman (2018) delimitaram seu estudo operacionais. Por outro lado, contrariando a lógica assumindo três questões de pesquisas: [1] que da estrutura conceitual, o IASB optou por: confiar na quadro conceitual e noções fora de seu arcabouço, consistência, e não na relevância para estabelecer se houver, o IASB usou para justificar os requisitos os requisitos contábeis (base mensuração) para o contábeis de arrendamentos da IFRS 16?; [2] tratamento do arrendamento; exigir que o prazo do quais regras, se alguma, o IASB incorporou na arrendamento inclua o período opcional se houver IFRS 16 e por quê?; [3] como o IASB aplicou os certeza razoável de que o arrendatário exercerá a conceitos ao desenvolver os requisitos da IFRS opção. Tais previsões violaram, respectivamente, 16? Para responder às questões de pesquisa, os a hierarquia das características qualitativas, e autores se basearam nos documentos originados a definição de passivo, visto que a expectativa futura de um pagamento em si não é do processo de produção de normas no suficiente para sua caracterização. IASB, nos comentários de stakeholders sobre eles e em documentos do IASB e Os autores concluem que o processo do FASB. de criação de normas contábeis é complexo, relaciona-se tanto com A discussão promovida pelos autores aspectos técnicos quanto políticos, tem como fundamentos: (a) as visões e que o fato de o IASB desviar contrastantes existentes sobre o REGRAS algumas decisões normativas do estabelecimento de padrões contábeis: técnica - é um exercício puramente técnico de núcleo conceitual estabelecido no framework, “mapeamento”; política - é um processo político como, por exemplo, quando optou por confiar na que influencia o comportamento dos constituintes consistência, e não na relevância para estabelecer e tem consequências econômicas; (b) o fato de os os requisitos contábeis (base mensuração) para o padrões contábeis serem baseados em regras ou tratamento do arrendamento violando, inclusive, a hierarquia das características qualitativas, e em princípios. A partir das análises efetuadas, Kabir & Rahman isso pode comprometer a coesão das IFRSs e, por conseguinte, a utilidade das informações (2018) entendem que o IASB: financeiras resultantes. I. pautou-se na utilidade para a decisão, nas definições de ativo e passivo, nas Por fim, a questão a que somos direcionados é: características qualitativas fundamentais será o framework um núcleo sagrado do sistema (relevância e representação fidedigna) e normativo do IASB? A resposta parece ser não, de melhoria (comparabilidade), na noção visto que quando os conceitos ali tratados entram de consistência e na restrição de custo em conflito com outras normas, estas últimas para justificar os requisitos contábeis do prevalecem. Assim, ele parece ser apenas um referencial para a criação das normas contábeis. arrendamento; II. começou com requisitos contábeis baseados O prisma de análise de Kabir & Rahman (2018) em princípios e limitou a extensão das parece ter ficado restrito as dicotomias das orientações de aplicação, contudo dadas visões técnica/política e de padrões baseados as exigências dos constituintes e a em regras/princípios. Isso pode ter gerado uma restrição de custos, incorporou isenções espécie de miopia teórica, pois ao desprezar os de reconhecimento e limites qualitativos e elementos inerentes à(s) teoria(s) da regulação, adotou o framework como o elemento central expandiu a orientação de aplicação; da normatização contábil pelo IASB. O que não III. utilizou as definições de ativo e passivo para é de todo verdade! No decorrer da análise, os especificar o requisito contábil para o ativo de autores demonstram que, em algumas medidas, direito de uso e o passivo de arrendamento, as decisões do IASB estão em sintonia com o desviou-se da definição de passivo ao framework, em outras não. Tal achado é consistente especificar o requisito para a opção de com a necessidade de, em determinadas situações prazo de arrendamento, invocou a noção concretas, haja sopesamento de consistência, em vez da relevância, para de princípios, deixando um justificar a base de mensuração inicial para conceito de ser aplicado em o ativo de direito de uso, e não se baseou detrimento de outro mais na relevância e na representação fiel para apropriado ao fato. especificar a mensuração inicial do passivo Reflexões sobre a regulação de arrendamento; no contexto da contabilidade, IV. inseriu regras para reconhecimento no como as que oferecem PRINCÍPIOS escopo da IFRS 16 relativas às isenções Kabir & Rahman (2018), (para arrendamentos de curto prazo e baixo principalmente aquelas que introduzam uma valor) e, ao fazer isso, contrariou a posição nova abordagem para o tratamento da regulação do framework, pois nele a materialidade é e da normatização no contexto da teoria contábil “um aspecto de relevância específico da são necessárias, pois, ao que parece, os por entidade”, enquanto que pela IFRS 16 a quês da regulação e a coerência no processo de isenção de reconhecimento é baseada em criação das normas não estão suficientemente um limite absoluto que não considera “o esclarecidos. tamanho, a natureza ou as circunstâncias do arrendatário”; e * Kabir, H., & Rahman, A. (2018). How Does the IASB Use the Conceptual Framework in Developing IFRSs? An Examination of the Development of V. na IFRS 16 sobrestou o aspecto IFRS 16 Leases. Journal of Financial Reporting, 3(1), 93-116.


PESQUISA EM DESTAQUE

Estágio Docência e a Formação Pedagógica na Área Contábil*

E

mbora a legislação estabeleça que a preparação para o exercício da docência deve ocorrer, prioritariamente, nos cursos de pós-graduação stricto sensu, estudos ligados à formação docente revelam o foco desses programas na formação de pesquisadores, em detrimento à qualificação pedagógica necessária para atuar como docente em nível de ensino superior. Dentre os poucos componentes didáticopedagógicos que são ofertados pelos cursos de pós-graduação (voltados para a formação docente), destaca-se o estágio docência, já que ele permite ao aluno associar o conhecimento teórico à prática da sala de aula. Esse contexto serviu de motivação para que eu desenvolvesse minha dissertação*, a qual teve como objetivo identificar e analisar, na percepção dos discentes dos programas de pós-graduação stricto sensu da área contábil (PPGCCs) no Brasil, quais competências são desenvolvidas no estágio docência para a qualificação docente. A Teoria da Aprendizagem Experiencial serviu como suporte para a análise proposta pelo estudo. A pesquisa, de abordagem qualiquanti, encontrou que há baixa oferta de disciplinas em caráter obrigatório voltadas para a formação docente. Ela também verificou que há diferentes nomenclaturas, cargas horárias e obrigatoriedade em torno do estágio docência e de seus componentes correlatos. Os principais

por Me. Layne Ferreira - PPGCC/UFU

achados dessa pesquisa também incluem a observação de que o estágio docência contribui de maneira relevante para a formação docente dos pós-graduandos com e sem experiência na docência, bem como para o desenvolvimento de competências docentes nos mesmos. O grupo de alunos sem experiência com a docência demonstrou maior aproveitamento em torno das oportunidades vivenciadas no estágio, em virtude daquele momento ser, para muitos, o primeiro contato com o processo de ensino. As experiências vivenciadas pelo grupo de alunos sem experiência com a docência proporcionaram o desenvolvimento de competências voltadas ao planejamento do processo de ensino-aprendizagem, a capacidade de comunicar-se e relacionar-se com os alunos, o manejo de tecnologias, avaliar, dentre outras. Enquanto isso, para o grupo de alunos com experiência na docência, o estágio docência serviu como um momento de reflexão e aprimoramento das práticas que eles já utilizavam em sala de aula, pois estimulou a autorreflexão e a autocrítica sobre suas posturas enquanto docentes, além de contribuir para o desenvolvimento de competências como o manejo de novas tecnologias, tutoria, elaboração e organização das atividades, e avaliar. Os resultados revelaram ainda que os alunos possuem experiências muito heterogêneas ao realizarem o estágio docência e isso é observável ao serem analisadas as experiências tanto em

programas de pós-graduação diferentes quanto em um mesmo programa. Dentre as principais críticas atribuídas ao estágio docência, a que mais se repetiu esteve ligada à falta de acompanhamento do professor durante a realização do estágio. O comportamento dos professores responsáveis pela supervisão do estágio sugere a possibilidade de eles estarem reproduzindo o tipo de formação que tiveram na pós-graduação. Ou seja, a falta de acompanhamento durante o estágio docência parece revelar a ausência de formação didáticopedagógica por parte dos docentes, a qual pode ser justificada em virtude da baixa oferta de disciplinas voltadas para a formação docente nos programas de pós-graduação. Em síntese, os achados da pesquisa evidenciaram a importância desse estágio para a formação docente dos pós-graduandos, à medida que ele não só associa a teoria à prática, mas proporciona experiências que favorecem tanto a aprendizagem quanto o desenvolvimento de competências docentes. No entanto, a preocupação em torno do referido componente curricular deve se concentrar na forma como ele está sendo conduzido pelos programas de pós-graduação. Os PPGCCs devem concentrar seus esforços no desenvolvimento de mecanismos que garantam que o estágio docência sirva de suporte para a formação docente, seja ela inicial ou continuada.

*Acesse a pesquisa completa em: https://repositorio.ufu.br/handle/123456789/24922

ANÁLISE

Contabilização das incertezas fiscais: o que diz a ICPC 22?

por Pedro Vieira - Pós-Graduando MBA/FACIC/UFU

A interpretação internacional IFRIC nº 23, editada em 2017, que versa sobre os métodos contábeis para reconhecimento de contingências quanto a incertezas em tratamentos tributários, é inserida no ordenamento contábil brasileiro visando propiciar maior transparência no reconhecimento e provisão de riscos.

O Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) aprovou a Interpretação Técnica ICPC 22, inserindo no ordenamento brasileiro as regras do IFRIC nº 23, que trata de incerteza sobre o tratamento de tributos sobre o lucro. Por sua vez, a Deliberação nº 804 de 2018 da Comissão de Valores Mobiliários (CMV) tornou a norma obrigatória para as companhias abertas. De acordo com a ICPC 22, a partir de janeiro de 2019, se a entidade concluir que não é provável que a autoridade fiscal aceite um tratamento fiscal incerto, a entidade deve refletir o efeito da incerteza na determinação do respectivo lucro tributável (prejuízo fiscal), base fiscal, prejuízos fiscais e créditos fiscais não utilizados e alíquotas fiscais. O termo “provável” não é definido pela norma, no entanto, geralmente é interpretado como “mais provável do que não”, refletindo uma probabilidade superior a 50%. Isso significa que a determinação de se uma posição tributária está ou não abaixo do limite de reconhecimento é relativamente subjetiva. Para determinar a probabilidade de uma TABELA 1. Mensuração do tratamento tributário incerto

potencial exposição tributária deve-se levar em conta precedentes similares ou específicos acerca da situação em análise, tais como enunciados da administração fiscal, soluções de consulta, atos declaratórios, pareceres, diretrizes publicadas, autuações, decisões administrativas e judiciais, além de opiniões legais, consultoria jurídica e resoluções legais sobre questões semelhantes. Além disso, a análise deve partir da premissa de que a autoridade fiscal examinará todos os valores e elementos dentro de sua esfera de autuação e terá pleno conhecimento de todas as informações relacionadas. Logo, se houver incerteza acerca de determinado tratamento fiscal e se for provável que esse tratamento não será aceito pela autoridade fiscal, a entidade deverá avaliar e quantificar a contingência, para fins de provisionar o risco envolvido. Uma vez identificada a incerteza em um tratamento fiscal, a entidade deverá refletir o efeito da incerteza usando um dos seguintes métodos: (i) valor mais provável (a quantidade mais provável em uma série de resultados possíveis); ou (ii) valor esperado (a soma dos valores ponderados por probabilidade em uma variedade de resultados possíveis). A título exemplificativo, considere que uma entidade reconheça uma incerteza sobre um valor de R$10.000,00 não adicionado na base de mensuração dos seus tributos sobre o lucro e calcule as probabilidades de valores que possam ser

adicionados ao seu lucro tributável, e a alíquota oficial do tributo é de 34%, como demonstrado na Tabela 1. Percebe-se que, geralmente, o método de valor mais provável é mais utilizado pelas entidades, pois reflete o resultado de um tratamento fiscal incerto binário, ou seja, concentrado em dois possíveis resultados: ou o tratamento será aceito integralmente ou será recusado integralmente, ao passo que o valor resultante da probabilidade ponderada tende a refletir o efeito de mais de dois resultados possíveis, registrando a somatória dessa probabilidade (IFRIC 23, par. 11). A entidade poderá escolher o método que espera fornecer a melhor previsão da resolução da incerteza. O fato é que os métodos desenvolvidos até agora pelas entidades para contabilizar o efeito de suas incertezas podem ser inconsistentes com as novas normas contábeis. Logo, é uma questão delicada para muitas entidades rever suas práticas e analisar o impacto em seus resultados contábeis e fiscais, especialmente aquelas com planejamentos tributários mais agressivos. Afinal, aplicar os métodos para refletir incertezas provavelmente atrairá a atenção da fiscalização para as práticas adotadas pelas entidades. Apesar disso, se a padronização for implementada com uma atenção cuidadosa e o correto cumprimento das normas, estas podem ser um dispositivo muito útil para mensurar e gerenciar riscos.

REFERÊNCIAS

Craike, E. & Zhang K. (2017). IFRIC 23 Uncertainty over income tax treatments; Straight Away – IFRS bulletin for PWC. Disponível em: <https://pwc.to/3r7Vgdz>. Delloitte (2018). Contingencies: Key differences between U.S. GAAP and IFRS. Disponível em: <https://bit.ly/3rfb6De>. Ernst & Young. (2017). Applying IFRS - Uncertainty over income tax treatments.. Disponível em: <https://go.ey.com/3nMPf3C>. IFRS Committee Decisions, IAS 12 Income Taxes, Expected manner of recovery of intangible assets with indefinite useful lives, November 2016. Disponível em: <https://bit.ly/38iIUXf>. Muhlemann, M., Muller G., Ernst & Young. (2017). AG: The IASB issues IFRIC 23 Uncertainty over Income Tax Treatments; Tax News. Disponível em: <https://bit. ly/3h4zdzG>.

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ENSINO EM QUESTÃO

A adoção de metodologias ativas, o ciclo de vida e a qualificação docente o intuito de construir o conhecimento e N desenvolver habilidades e atitudes nas salas de aula, surgiram as metodologias ativas.

Tais metodologias podem ser definidas como o conjunto de técnicas que transformam o ambiente escolar, ao mesmo tempo que o papel do docente e do discente é modificado na busca da maior autonomia do estudante na construção do conhecimento1. Nesse sentido, o professor assume o papel de direcionador, tutor e mediador do processo de ensino-aprendizagem. Huberman (2000)2 aponta que há um momento na carreira em que o docente é mais propenso a adotar novos métodos em sala de aula, pois passa a se sentir mais familiarizado com sua atividade. Pelas perspectivas apontadas em estudos anteriores3-4 a incorporação de novos métodos de ensino torna-se possível à medida que o professor busca conhecimento técnico e teórico. Além disso, para que haja maior assertividade na determinação de qual método ativo usar, faz-se importante concatenar os objetivos da técnica pretendida com os objetivos educacionais traçados ao perfil dos estudantes e, até mesmo, às perspectivas desenhadas pela instituição de ensino5-6. Em outras palavras, a adoção de metodologias ativas pode ser impactada pela fase profissional que o professor está vivendo (ciclo de vida docente) e pela qualificação do docente (acadêmica, profissional e pedagógica), e resultar de incentivos das instituições de ensino superior (IESs), que buscam desenvolver competências profissionais adequadas ao estudante, de acordo com seu perfil e com a demanda do mercado. Diante do contexto apresentado desenvolveu-se um estudo, com o objetivo de identificar e analisar a relação entre a adoção de metodologias ativas,

MINHA BIBLIOTECA Livro: “Revolucionando a sala de aula 2 ” Com a perspectiva de continuar incentivando o uso de métodos ativos no ensino superior, especialmente na área de negócios, os autores Daniel Ramos Nogueira, Edvalda Araújo Leal, Gilberto José Miranda e Silvia Pereira de Castro Casa Nova organizaram o segundo livro de metodologias ativas da série “Revolucionando”. No livro lançado nesse ano de 2020 são apresentadas metodologias que mostraramse ainda mais relevantes e contemporâneas perante aos desafios advindos da adoção do ensino on-line. Uma leitura ideal para docentes e pós-graduandos que buscam revolucionar suas aulas, propiciando um aprendizado mais dinâmico e com maior interação dos estudantes. .

por Me. Leonardo Nagib - Doutorando PPGCC/UFU | Profa. Denise Mendes PPGCC/UFU

o ciclo de vida docente e a qualificação docente no ensino de graduação em Ciências Contábeis, a partir da criação de uma ferramenta diagnóstica capaz de possibilitar avaliações a respeito do corpo docente das IESs. A primeira conclusão do estudo foi que a adoção de metodologias ativas está positivamente relacionada ao ciclo de vida docente, ou seja, à medida que o professor avança nas fases do ciclo de vida docente, maior é a adoção de metodologias ativas e menor é o uso do método tradicional. Essa conclusão vai ao encontro do que prega a literatura, uma vez que o método tradicional não é totalmente substituído, mas sim complementado pelo uso de métodos ativos. Logo, pode-se concluir, que as metodologias ativas são ferramentas complementares e não substituem, na totalidade, a aula expositiva tradicional. Em segundo lugar, concluiu-se que a qualificação acadêmica está relacionada negativamente com a adoção de metodologias ativas. Esse achado revela que o professor mais titulado ou com maior tempo para exercício da docência não é aquele que mais adota métodos ativos. Em terceiro lugar, sob a perspectiva da qualificação profissional, foi possível concluir que as experiências acadêmicas e profissionais do professor se relacionam positivamente com a adoção de metodologias ativas. Logo, professores com mais experiência em sala de aula e no mercado utilizam mais métodos ativos. Por fim, os resultados acerca da qualificação pedagógica revelaram a importância de o professor realizar cursos voltados para as práticas pedagógicas, ao passo que, se é desejo da IES investir na aplicação de métodos ativos em sala de aula, deve-se investir, primeiramente, na formação do professor. O docente com formação

pedagógica é capaz de entender como adotar as metodologias ativas e para que tipo de disciplina e/ou turmas é adequada a adoção, fazendo com que esse processo seja capaz de atingir os objetivos educacionais pretendidos pela IES e pelo docente. Além disso, a formação pedagógica possibilita que o professor entenda como as metodologias ativas são capazes de desenvolver as soft skills, ou seja, um conjunto de habilidades, atitudes e comportamentos demandado pela sociedade e pelo mercado de trabalho, além das competências técnicas (hard skills). Dessa forma, as relações investigadas nesta pesquisa pautaram-se no estudo do professor, sendo que o ciclo de vida docente e a qualificação docente se mostraram necessários para entender o comportamento de adoção das metodologias ativas dentro da amostra estudada, ou seja, os resultados não podem ser extrapolados para toda população de professores de graduação, em especial, os docentes de Ciências Contábeis. REFERÊNCIAS

[1] Silva, R. H. A., & Scapin, L. T. (2011). Utilização da avaliação formativa para a implementação da problematização como método ativo de ensinoaprendizagem. Estudos em Avaliação Educacional,22(50), 537-522. [2] Huberman, M. (2000). O ciclo de vida profissional dos professores. In A. Nóvoa (Org.), Vida de professores (Vol. 1, pp. 31-61). Lisboa: Porto. [3] Hernandes, D. C. R., Peleias, I. R., & Barbalho, V. F. (2006). O professor de contabilidade: habilidades e competências. In I. R. Peleias, Didática do ensino da contabilidade: aplicável a outros cursos superiores (pp. 61-119). São Paulo, SP: Saraiva. [4] Farias, C. M. L., & de Carvalho, R. B. (2016). Ensino Superior: a geração Y e os processos de aprendizagem. Revista Espaço Acadêmico, 15(179), 37-43. [5] Morán, J. (2015). Mudando a educação com metodologias ativas. In C. A. Souza, & O. E. T. Morales (orgs.), Convergências midiáticas, educação e cidadania: aproximações jovens (Vol. 4, pps. 15-33). Ponta Grossa, PR: UEPG/PROEX. [6] Nganga, C. S. N., Botinha, R. A., Miranda, G. J., & Leal, E. A. (2016). Mestres e doutores em contabilidade no Brasil: uma análise dos componentes pedagógicos de sua formação inicial. REICE: Revista Electrónica Iberoamericana sobre Calidad, Eficacia y Cambio en Educación, 14(1), 83-99.

ENTREVISTA

PPGCC/UFU em tempos de pandemia, com o Prof. Dr. Gilberto José Miranda Prof. Dr. Gilberto José Miranda é o coordenador do Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis da Universidade Federal de Uberlândia e tem lidado com os desafios decorrentes da pandemia da Covid-19 em sua atuação enquanto coordenador. Nessa entrevista ele relata alguns desses desafios e as perspectivas do PPGCC/UFU para o próximo semestre. B.P.C: Professor, a pandemia iniciou-se junto ao início do semestre letivo, quais foram as primeiras providências tomadas?

Prof. Gilberto: Na primeira semana havíamos tido nossa “II Semana de Integração” e na segunda-feira seguinte as aulas se iniciaram efetivamente, mas com a suspensão do calendário acadêmico em 18/03/2020 (terçafeira), na maior parte das disciplinas não foi possível nem o primeiro contato com os professores. Mas os alunos, inclusive ingressantes, já estavam matriculados, assim, muitos deles receberam os planos de aulas das disciplinas por e-mail e tiveram contatos de forma eletrônica com os docentes. Naquele momento tudo estava incerto, esperava-se que o retorno fosse breve. No entanto, as atividades administrativas permaneceram. Tivemos bancas de qualificação, bancas de defesas, atendimento a alunos e professores

de forma remota, desenvolvimento de projetos de pesquisa, avaliações científicas, atividades extensionistas, diversas lives realizadas pelos nossos grupos de pesquisa (NEPAC e NECIF), entre outras ações. Em todas estas atividades mantivemos comunicação por meio eletrônico com docentes e estudantes B.P.C: E quais foram os impactos da pandemia para o o PPGCC em relação ao planejamento, qualificações, defesas, consolidação dos cursos de mestrado e doutorado, e com relação à divulgação de editais para novos processos seletivos.

Prof. Gilberto: Além das alterações nos prazos de qualificação, tivemos prorrogações de algumas bolsas Capes e FAPEMIG, os processos de avaliação do Programa pela CAPES também sofreram alterações nos prazos. Penso que além dos aspectos negativos, a pandemia terá um legado positivo também. Novos caminhos estão sendo construídos, a tecnologia tem um protagonismo ainda maior, estamos nos qualificando, processos estão sendo acelerados... enfim, penso que ao final desse isolamento não encontraremos o mesmo PPGCC que deixamos em 18/03/2020. Esses novos “caminhos” deverão contribuir para a formação dos futuros profissionais da Contabilidade. 


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