Ibiraboys: Residência e Resistência!

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IbIra Boys RESIDÊNCIA E RESISTÊNCIA

IbIra Boys 1979

Da esquerda pra direita: Bolota, Anshowinhas, Edu Britto, Pastel, Kuge (sentado) e Danilo ARQUIVO PESSOAL

EDITOrIAL

O Parque Ibirapuera é indiscutivelmente um dos berços do skate paulistano e também brasileiro. Um marco e ponto de encontro de sessões há cinco décadas.

Do freestyle ao nascimento do street skate, passando por períodos de proibição e de luta pelo simples direito de ocupar o espaço, uma área desenhada e destinada para a prática do skate sempre foi um sonho, que finalmente, através de uma parceria entre a Urbia – que atualmente cuida da gestão do parque - e a Nike, se tornou realidade.

Para celebrar a inauguração da tão sonhada Ibira Skatepark, resolvemos montar esse fanzine, no melhor estilo faça-você-mesmo da década de 1980, resgatando de forma despretensiosa histórias, memórias e personagens pioneiros que ajudaram a escrever a história do skate brasileiro com marcas de uretano no asfalto das ladeiras do parque e no solo sagrado e nas paredes da Marquise do Ibirapuera.

Fabio Bolota, nosso editor convidado, foi um desses pioneiros a desbravar o Ibirapuera com seu skate ao lado de seu irmão Edu Britto, que também generosamente contribuiu com suas memórias. E a Cecília Mãe, que também viveu essa época de ouro do skate paulistano ao lado dos dois amigos, também compartilhou um pouco das suas lembranças com a gente.

Com A palavRA , oS IbIra Boys!

O s “C o u NT r y b O y S ” EM 1978: P A u l O aNS h O w I N h AS , E D u B r IT T o , S A L l a D a , Tom M y , J o R GE Kug E , F ABIO Bo L o T A , P A u l O F o L h a E E DDIE gralh A.
ARQUIVO PESSOAL
ThRoNN
FOTO POR JAIR BORELLI

LEmbRANDO oS IbIra Boys...

Se soubéssemos, lá atrás, que as visões e sensações daqueles momentos seriam importantes de ser resgatados 40, 50 anos depois, seríamos mais atentos a tudo que vivemos. Quem sabe até registrássemos tudo, da forma possível, com garranchos num caderno universitário...

Só que não sabíamos, não registramos – até porque, então, mesmo uma máquina Kodak Xereta não era acessível a todos. Então hoje, ficamos mes mo por conta desses neurônios que, dizem, desaparecem aos milhares a cada dia...

Em algum Domingo de 1978, como de praxe, indo de bike para o Ibirapuera, dei na marquise com uma movimentação incomum... Me aproximo e de cara vejo o Alexandre “Minhoca” dar um kickflip e cair em cima de outro Skate, e outro flip pra sair de cima daquele Skate. O que era aquilo meu Deus? Olho para lado e vejo Kao Tai dando um nosewheelie... Mais adian te Sidney Ishi com a marcante e estilosa camiseta da DM Pepsi saltando altura... Fiquei maravilhado com toda aquela cena, e creio que foi naquela manhã que eu abdiquei de andar de bike, e iniciei a cobiça de ter um skate para começar a praticar.

Vendo os caras mandando aquelas manobras no Ibira, ao som de “Dance, a little bit closer” (que rock que nada, o som do champ era discoteque mesmo! rsrs), aquilo fez a minha cabeça na hora!

Não sei quanto tempo se passou até que eu e o meu irmão Fabio Bolota convencêssemos um tio a comprar, a prazo, um skate da marca Gladson digno de ser chamado de skate, com umas rodonas verdes de um plástico emborrachado igualmente digno... comprado a prazo no Mappin (a Casas Bahia da época)... Estávamos minimamente equipados para adentrar a marquise do Ibira... Dois irmãos pra um skate, mas eu tinha prioridade, era mais velho... rsrs. Eu quinze anos, ele doze.

FABIO BoLoTA PAulO aNShOwINhAS

EDDIE gralhA

“Ibirapuera, minha segunda casa! Se existe um paraíso na Terra, esse lugar é aqui, no Ibira! Não tem como mudar isso!”

ARQUIVO THEO WERNECK

ARQUIVO PESSOAL

E assim durante os anos 1978, 1979 e 1980, o Skate esteve na minha vida com a intensidade que costuma estar para todos que o praticam: inten samente, diariamente. E isso foi no Ibirapuera.

Apesar de ser praticado de forma muito individual, o skate gera grupos de afinidade. Aliás, essas duas características, tão marcantes e ao mes mo tempo tão contraditórias, formam o jeito de ser do skatista: exibi cionista, com fortes doses de vaidade e individualismo cheio de estilo, e ao mesmo tempo gregário, se junta em tribos, maiores ou menores, os grupos de afinidade, de estilos afins...

Pensando em Ibira Boys... essa expressão é bem abrangente, e se poden do abranger até quem anda de Skate hoje, com assiduidade, no Parque Ibirapuera. Assim, se os Ibira Boys são um grande grupo que abrange quase 50 anos de existência no skate paulistano, é natural que surjam dentro dele subgrupos, que podem ter nome ou podem não ter, confor me tenha sido a decisão de cada subgrupo...

SALlaDa

O s grupO s NAQuElEs TEmpO s...

E assim surgiram os “Country Boys”, aqueles caras que, como eu, naquele momento, chegaram ao Ibira um dia, viram os “feras” andando, e quiseram fazer aquilo também. Simples assim. Pura imitação nas cida de uma admiração. Imitação dentro da limitação e da criatividade de cada um...

Tenho a lembrança de nós sentados sob a marquise, encostados na parede do MAM, e discutindo sobre o nome a dar para o grupo. Tenho a impressão que foi o Kuge quem indi cou Country Boys, mas não tenho certeza. A gente gostava um pouco desse ritmo musi cal, a Country Music americana... Comprávamos umas fivelas estilo country pra colocar no cinto e depois outros usavam um chapéu que lembrava um pouco o estilo. Eram fases pré-punk, pré new-wave, acho... rsrs.

Quem seriam aqueles Country Boys “legítimos” que depois se tornariam os IbiraBoys?

Vamos lá: Paulo Cocoa (depois Anshowinhas), Jorge Kuge, Danilo Gonçalves, Fabio Bolota, Wilson Sallada, Edu Britto, Pastel, Mosca, Batata, Zebra, Galo...

Qual era a afinidade desses caras? Chegávamos naquele momento ao templo do skate de São Paulo e já encontramos lá os skatistas que dominavam a arte de andar de skate.

E quem eram esses locais? Na verdade, eram aqueles que já faziam parte de uma equipe das marcas de skate da época (Cos ta Norte, DM, Luau, etc). Esse grupo se intitulavam de Pig City, como o Carlos DM, Vicente Costa Norte, Alexandre Xandy Minhoca, Wagner Bê, Rogério Anti go, Lumbra, Ricardo Barbero, Kao TaiI, Tchap Tchura... Tenho vagas lembranças desse grupo reunido, an- dando... Mas como eles já eram feras, diferenciados, claro que eles não ficavam muito tempo por lá. Iam pra Wave Park, iam pro Sumaré...

Mas como nós, uma nova geração chegando, tinham alguns outros como o Paulo Folha, Aladim, Ed Gralha, Hélio Greco, Berlim, Tommy, Ki-Suco...

KAO TAI

“Ibira é um parque muito importante para o skate paulista e brasileiro. Um ponto de encontro e de treinamento para um esporte novo nos anos 70... Trocas de ideias, novidades, fotos, revistas gringas, fofocas, manobras novas, moda e o mais importante: amizade eterna!”

“Parque Ibirapuera, saudável, verde, divertido, continua a iluminar o meu destino em cima de um carrinho encantado! Ibira Boys Skateboarders Unidos... Passado, presente e futuro!”

aNToNIO DOs PASsOs JuNIOr ‘ThRoNN’
“O Parque Ibiraquera é o solo sagrado do skate brasileiro!” “Point mais antigo do skate brasileiro e local que revelou diversos talentos no Skateboard... Ibira Boys!” PAulO FoLha TECo JumoNJI
ARQUIVO PESSOAL
JoRGE KugE
REPRODUÇÕES
“Ibira: residência e resistência do skate! TAITa I WAR w I CK

JAIr BoRELlI

“O Parque Ibirapuera foi um point fundamental pra me juntar aos Ibira Boys e assimilar o lifestyle, vanguarda e underground do Skate dos 80’s! Skate é esporte, estilo de vida e paixão!!! Ibira Boys 4 Ever!!”

A marquise do Ibirapuera foi ficando cada vez menor para tantos skatistas. Por exemplo, teve a chegada de uma leva de japoneses pra andar, eles chegavam em bandos de 10 a 15 skatistas e se auto-denominavam Panelas Wheels e gostavam de uma briga. Até o surgimento e rápido crescimento do street, o freestyle imperava no ibira. O povo praticava freestyle no final dos anos 1970 até o começo dos anos 1980. Depois ali germinou e cresceu o street como conhecemos hoje.

Quantos momentos legais naquele período... Começaram os namoros, as meninas bonitas seguindo com a gente...

Tudo vivido naqueles anos – virada dos anos 1970 para os anos 1980 - foi muito intenso e importante... E assim se passaram os anos, as décadas.

A maior contribuição dos Ibira Boys foi manter a chama sempre acesa, nos “ups and downs” que o esporte teve nesses 50 anos de vida, e por isso se inserem como parte concreta da história do skate no Brasil.

EDu BrITTo

Editor do livro Onda Dura 3 Décadas do Skate no Brasil

mÃO DE ObRA... DE arTE

PoR CECíLIa mÃE

Quando esse oásis no meio de São Paulo chamado Parque Ibirapuera foi fundado, em 1954, ele era um polo cultural que abrigava o Museu de Arte Contemporânea, o da Aeronáutica, o do Folclore, o Pavilhão da Bienal e o Museu de Arte Moderna, o único sobrevivente do proje to original. E era justamente em frente a ele o ponto de encontro dos lendários Ibira Boys.

Cercados pela flora concebida por Burle Marx e usando (muito bem) a arquitetura de Oscar Niemeyer, eles não tinham dinheiro pra andar na Wave Park ou simples mente não eram do vertical. Estes nômades continu aram sua trajetória em cima do skate, mesmo depois do boom passar. Eram eles: Aladim, Alexandre Minho ca, Ari Jumonji, Arroz, Batata, Bê, Bolota, Cocoa, Danilo, Edu Brito, Eddie, Feijão, Folha, Hatsuo Pop, Hélio Greco, Jair Borelli, Jorge Kuge, Kissuco, Leitão, Márcio Tanabe, Múmia, Paztel, Rogério Antigo, Salada, Tabosa, Teco Ju monji, Zebra, Zeca e alguns Wave Boys, como Kao Tai e Tchap Tchura.

Tristes tempos, aqueles, em que a maioria das pessoas trocava a moda de agora pela de ontem, geralmente ditada pela TV ou pelos títulos de Hollywood, que che gavam quase anualmente aos nossos cinemas. Estes filmes, as novelas e programas de auditório, eram os gurus que lançavam e enterravam febres, das roupas às músicas, passando pelas gírias e penteados. E o povo ia pastando onde a mídia mandasse, chifrando, pelo caminho, os desgarrados que seguissem seu pró prio instinto.

Era comum ouvir “Você ainda anda de skate”?

ARQUIVO PESSOAL

PARQuE IbIrapuERA 1982 Bolota, Anshowas, Pastel e Pardal

m á rCIO TANABE

“O Ibira é meu templo, o lugar que marcou minha adolescência no skate, minha carreira com a produção do meu primeiro evento e onde cuido da saúde física e mental até os dias de hoje.”

mão pRA C abEç A!

Ou era demodée ou era coisa de vagabundo, portanto claro que a polícia sempre encrencou com o skate. Sob ordens berradas e cuspidas, mochilas eram esvaziadas, moleques revistados e sopapos distribuídos. Desaforos deste tipo eram infelizmente comuns. Só não ficava pior, porque ninguém estava fazendo nada ilegal...

Até que o prefeito Jânio Quadros proibiu a prática no Ibira em 1988 e, para protestar, os skatistas e simpatizantes tomaram as ruas e chamaram a atenção da grande mídia e do público que, a essa hora, já tinha resolvido abraçar a causa de novo, pois já tinha voltado a ser moda...

Já que sou uma dama, digamos que o tal Jânio ficou fulo, chegando a apreender skates e prender skatistas em represália. Filho da fula...

REPRODUÇÕES

m ÃO N A R o DA

REPRODUÇÕES ARQUIVO PESSOAL

Tudo voltou ao normal durante o mandato de Luiza Erundina, que cumpriu sua promessa de campanha e liberou o skate logo que assumiu a prefeitura. A essa hora, o parque tinha centenas de praticantes e os próprios Ibira Boys já não eram aquelas duas dúzias de seres geniais. Vieram pra ficar: Chorão, Cláudio Higa, Daniel Kim, Flávio Loko, Folhinha, Kongão, Lance, Marcos Toshiro, Miltinho, Mishi, Oswald Ô, Per Canguru, Pois É, Shit, Skilo, Thronn e Zé Gonzales.

Todos freestylers com uma mão na roda e um pé no street.

O número dobrou! Não parece, mas é muito, pois poucos suportaram os rituais de iniciação do clã mais fechado do skate brasileiro...

Inclusive, o Chorão ganhou este apelido do Bolota justamente por que reclamava muito das pegadinhas e pequenos terrores que triavam os locais. Pra ser Ibira Boy, o cara tinha que ser um Frankenstein com nervos de aço, cara de pau e estômago de avestruz. Se sobrevivesse, além de poder ficar e aterrorizar outros novatos, estava credenciado a encarar a rua, as auto ridades incompetentes e os altos e baixos da vida em geral.

mão BoBA

O parque é dos Ibira Boys. Se alguém quiser confirmar, manda fazer uma perícia em todos os cantos. Tem muito suor e sangue (deles) e lágrimas (minhas) na marquise e na ladeira, cuspe, vômi- to, cerveja e bombeirinho nas imediações da lanchonete e, com certeza, outras amostras de DNA pelos arbustos e quebradas mal iluminadas, onde eles fizeram muitas meninas felizes. Deve ter um monte de Ibira Baby andando por aí e a gente nem sabe... Você pode ser um deles...

ACERVO PESSOAL FABIO BOLOTA

BoL oTA

PoIsÉ

P E R C ANGu ru

“O skateboard brasileiro tem na sua origem e em incontáveis páginas da sua história, o suor, dedicação, sonhos e amizades eternas que surgiram através dessa junção: Ibira + Boys + Skateboard.”

PER KANGuru

FOTOS JAIR BORELLI

IbIrapuERA: a mECA!

O skate brasileiro deve muito, diretamente, ao Parque Ibirapuera, berço das primeiras sessions de skate da cidade. E podemos dizer que indiretamente, o skate deve um agradecimento es pecial ao maior arquiteto do Brasil, o genial Oscar Niemeyer. Uma das suas mais importantes obras, realizada nos anos 50, foi a construção da Marquise do Parque Ibirapuera, uma arqui tetura moderna para os padrões da época (e até para os dias de hoje), que contribuiu direta mente para a prática de uma das modalidades mais populares do skate até então: o freestyle.

O freestyle é a mais antiga modalidade, que foi aprimorando a forma de realizar manobras dos anos 60 até o final dos anos 70, onde apenas um piso liso, de preferência um cimento queimado plano, era suficiente. E com essas características e ainda por cima com uma área coberta em enorme extensão, a marquise foi rapidamente adotada pelos skatistas da cidade, se tornando o maior reduto para o skate na capital paulista.

Enquanto algumas skateparks começavam a surgir na cidade por volta de 1977, a Marquise do Parque Ibirapuera já estava bombando com a nova onda do skate no país. O local abraçou a primeira geração dos melhores skatistas que englobavam a elite do skate brasileiro e se intitulavam “Pig City”. Isso fez com que o local se tornasse referência e a maneira mais rápida e fiel de aprender como se andar de skate em alto nível. Afinal, existiam basicamente duas modalidades no skate: freestyle e vertical.

Com o surgimento das pistas, muitos desses top skaters locais do Ibirapuera, começaram a migrar para as transições de concreto, principalmente para a famosa Wave Park, pista que ficava muito perto do parque, na famosa avenida Santo Amaro. O primeiro boom, a famosa popularidade, estava agitando o país, com skate na TV, nas praças, na novela... Mas no final dos anos 70, começo dos 80, o skate teve sua primeira “morte”, com o fechamento de pistas, marcas deixaram de existir e os poucos adeptos que continuaram a andar tinham o Ibira como o reduto acolhedor desses poucos sobreviventes.

ACERVO PESSOAL THEO WERNECK

O rENa sCImEN TO E a NOva MODa l I DaDE : o sTrEE T sKATE

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A segunda geração de skatistas que surgiram no Ibirapuera, ficou com a res ponsabilidade de carregar o skate nos pés, literalmente falando. Os poucos skatistas da primeira geração se juntaram a essa segunda surgindo, assim, os Ibira Boys. Novos, antigos e futuros skatistas que chegavam para andar no parque, ganhavam essa “chancela” (lógico, que com o aval dos Ibira Boys originais).

Durante esse período de vacas magras, os skatistas locais do parque, de ma neira descompromissada e com o real espírito “for fun”, se encontravam no Ibi ra pra manter o skate no pé e praticar uma nova maneira de andar de skate: o street. Mas, nesse começo da década de 1980, o street skate por aqui era descer ladeiras a milhão, executando slides e dominando a verdadeira sensação de vento na cara. Ainda não era o stre et moderno. O atual downhill slide era chamado de street skate e, no ano de 1982, dois campeonatos organizados pelo então garoto Márcio Tanabe mar caram aquele início de década, com um campeonato de freestyle na marquise do Ibirapuera e um outro na ladeira do Bosque do Morumbi.

FOTOS JAIR BORELLI

PAul O aNS h O w INhAS

“O Parque Ibirapuera é a matriz do skate paulistano e brasileiro, pelo seu pioneirismo histórico em fomentar novas gerações, criar tendências e pela luta pela liberdade de expressão, igualdade e direito de andar de skate nas cidades, além de gerar campeões e amizades que se tornaram referência internacional.”

O espírito DIY (faça você mesmo), ajudou a manter os poucos sobreviventes ativos. Pouco a pouco, esse espírito foi fomentando o skate novamente, com campeonatos modestos porém divertidos. Com o surgimento dos campeonatos brasileiros de Guara tinguetá, a chama volta a ficar mais aquecida. Esse período de depressão no skate, seguiu regado por um novo comportamento jovem paralelo ao skate, onde a atitude e o punk rock começaram a andar lado a lado e isso fez os praticantes interagirem cada vez mais com as bandas, com as baladas, com os novos espaços alternativos da cidade criando, as sim, um crossover entre noite e dia. O surgimento de zines circulando nos quatro cantos do mundo, ban das underground surgindo...

E a partir do ano de 1984, o street skate começou a se tornar a modalidade mais praticada de uma ma neira nova. Isso abriu espaço pro surgimento de um enorme contingente de praticantes, que começaram a explorar a nova maneira de andar de skate, explo rando todas os espaços que as grandes (e peque nas) cidades ofereciam. As metrópoles se tornavam enormes skateparks, mas novamente, o piso liso, co berto e com uma enorme área para a prática que o Ibirapuera proporcionava, foi propício para abraçar skatistas de todos os cantos da cidade pra conhecer a grande sensação. Por outro lado, os Ibira Boys fo ram os responsáveis pela busca constante de uma pista de skate no parque, frequentando reuniões da ASSUAPI (Associação dos Usuários e Amigos do Parque Ibirapuera), porém sem sucesso.

REPRODUÇÕES

JâN I o E A p Ro I b I ç ão DO sKATE

O street skate era uma realidade. Uma realidade nunca vista antes, com skatistas oriundos dos quatro cantos da cidade e lotando a marquise e ruas do parque. Esse enorme exército de praticantes que dominavam chegou com a atitude, impulsionado com o melhor espírito punk rock, e com isso, criou um atrito direto com a polícia metropolitana e o prefeito da cidade. Reles mortais não entendiam (e con tinuam não entendendo) o que faziam skatistas andarem pelas paredes, sobre os bancos, subindo guias e pulando quaisquer obstáculos que esti vessem no caminho.

Polêmico e inconformado, o então prefeito da cidade de São Paulo, o Jânio Quadros, resolveu proibir a prática do skate em todo o Ibirapuera, criando assim um capítulo à parte na história do skate nacional.

A sede da prefeitura era dentro do parque e, com isso, ele colocou toda a guarda municipal pra exercer essa lei. A indignação por parte de nós skatis tas era como se fôssemos expulsos do nosso próprio quintal... Foi quando alguns skatistas resolveram realizar uma manifestação pacífica para reivin dicar a liberação do local. Novamente, o Márcio Tanabe convocou centenas de skatistas que sairiam da estação Paraíso do metrô (local do encontro), pra irem até o portão principal do Ibirapuera pra pressionar o prefeito e re verter esse autoritarismo.

Essa iniciativa fez com que o prefeito ficasse ainda mais indignado e fos se pessoalmente até o portão fechado do parque e, sem o mínimo jogo de cintura, proibiu o skate também na cidade de São Paulo. Esse decreto criou uma verdadeira enxurrada de coberturas jornalísticas documentando o autoritarismo do polêmico governante sobre o skate. Afinal, skates eram apreendidos diariamente pela cidade, com skatistas fugindo da polícia em todas as ruas. Essa proibição foi revogada verbalmente apenas anos mais tarde, com a posse da nova prefeita, Luiza Erundina, que se aproveitou da visibilidade e posou sobre um skate.

hÉLIO grECO

“O Ibira foi meu quintal e minha maior escola. Aprendi o que era ser skatista, fiz amizades que trago ate hoje. Foi fundamental pra minha formaçao como skatista e pessoa e pro skate de SP. De verdade, o berço do skate. Tudo acontecia a partir daquele lugar. Viagens, baladas, tudo...”

Ib I rapuE RA sEM P rE!

Os Ibira Boys continuam na ativa, como skatistas, empre sários, jornalistas, organizadores de eventos etc. E a im portância do Ibirapuera pro skate é histórica e inestimável. Direta e indiretamente, são 5 décadas de espaço utilizado para o aprimoramento do esporte e fundamental para a evolução do skate nacional, colocando o Brasil no hall dos melhores praticantes do mundo.

Vale ressaltar que o primeiro campeão brasileiro de street skate em 1987, foi o Ibiraboy Antonio dos Passos “Thronn”! São mais de 40 títulos mundiais no skate e o país é hoje palco de importantes campeonatos e eventos do calendá rio mundial, fomentando o skate na cidade e no país.

SANDRo

“Se não fosse o Ibirapuera e, principalmente, os Ibira Boys não teria o Testinha e nem a ONG Social Skate!”
TESTINhA

F INALMENTE, A Tão sO NhADA Ib I ra SKaTEparK

Depois de mais de 50 anos de espaço democrático para o skate, finalmente no final de 2022 a pista se tornou uma realidade! Essa iniciativa só foi possível por dois motivos: a vontade e disponibilidade.

A vontade veio através da gigante dos calçados, a Nike, colocar em prática uma maneira de presentear os skatistas na meca do skate nacional. A disponibilidade veio através da con cessionária Urbia, que hoje é a administradora do Parque Ibirapuera, em designar uma es paço no pulmão da cidade. Mas quem imagina que isso é fácil, é sempre bom lembrar que o parque é tombado, ou seja, muitas condutas e restrições precisam ser respeitadas para conservar o local.

Pra colocar a cereja no bolo, a empresa de construção de pistas de skate, a PUG Ska teparks dos skatistas Caio e Murilo Peres, fi caram com a responsabilidade de desenhar a tão sonhada pista e traçaram as linhas de uma plaza moderna, como as pistas de stre et exigem nos dias de hoje. Parabéns a todos os envolvidos e basta agora, aos skatistas e frequentadores do parque, aproveitarem e usufruírem do tão sonhado espaço de skate no Ibirapuera... Os Ibira Boys e toda a comu nidade do skate agradecem e com certeza, essa pista vai revelar uma nova geração de skatistas para o Brasil e para o mundo.

Esse zine é dedicado a todos os skatistas que aju daram a pavimentar a história do skate brasileiro no solo do Parque Ibirapuera, em especial aos Ibira Boys que resistiram e lutaram pelo simples direito de poder andar de skate no parque e na cidade em um período que ficou marcado pelo autoritarismo e pela repressão.

Capa: Fabio Bolota por Jair Borelli Contra-capa: Kuge, Sallada, Makoto, Bolota, Danilo e Anshowinhas (arquivo pessoal)

Editor Convidado: Fabio Bolota Textos: Edu Britto, Cecília Mãe e Fabio Bolota Fotos: Acervo pessoal Fabio Bolota e Ação Concreta Projeto e Produção: Dabba.ag Tiragem: 1500 exemplares Distribuição Gratuita Novembro de 2022

Agradecimentos: Jair Borelli, Jorge Kuge, Marcos ET (Reproduções)

Agradecimento especial:

RENDER PROJETO IBIRA
SKATEPARK

IbIra Boys

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