Os Sentidos da Democracia e da Participação

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gemonia coloca ênfase nas maneiras em que opera o poder para formar nossa compreensão cotidiana das relações sociais, e para orquestrar as maneiras em que consentimos (e reproduzimos) essas relações tácitas e dissimuladas do poder. (...) a transformação social ocorre simplesmente por uma concentração maciça a favor de uma causa, sem precisamente, por meio das formas em que as relações sociais cotidianas são rearticuladas e novos horizontes conceituais são abertos por práticas anômalas e subversivas” (2003, p. 20). Essa visão da hegemonia definida por Butler é um dos campos do debate entre os diversos atores. Parece claro que a participação não se reduz a uma reunião ao redor de uma mesa ou uma coalização de atores a partir da negociação de agendas. A participação é uma forma de viver a democracia e ela abarca as práticas anômalas e subversivas que vivem no plano subjetivo e pessoal, aquelas coisas que fazem as formas de sentir e amar, a formas de viver e criar comunidade. Nesse sentido, a participação democrática abarca a sociedade em seu conjunto, as meninas e os meninos nos centros educativos, em seus domicílios e na sociedade, os adolescentes e os jovens, as mulheres, os gays, as lésbicas, os transsexuais, os transgêneros, os atores políticos e sociais, mas também a quem constrói cultura, poesia e arte. Nesse sentido não existe “uma agenda unificada de lutas”, senão múltiplos atores políticos que legitimam a multiplicidade de agendas das pessoas e coletivos, como sujeitos políticos das mudanças. A partir dessa percepção da participação é que valorizamos o Fórum Social Mundial como um espaço de prática do diálogo e encontro entre as diversas visões, estratégias e agendas. Romper as dicotomias entre economia, sociedade e natureza, reinventar um mapa emancipatório que se construa a partir das lutas e identidades particulares, não contra elas, reinventar um imaginário social pleno, capaz de competir com o consenso neoliberal (BUTLER,LACLAU, ZIZEC, 2003, p. 306) e o pensamento único, convocando a diversidade e a pluralidade de sujeit@s e ator@s, parece o caminho mais difícil e sem dúvida mais desafiante. A democracia representativa, a democracia eleitoral, tal como existe, é incapaz de sustentar a democracia como sistema, senão articulada com uma forte participação cidadã e, portanto, com uma democracia participativa que amplie o debate sobre as prioridades e urgências da agenda social e econômica dos cidadãos e cidadãs. Entre os diferentes movimentos sociais e entre diferentes atores políticos, existe ainda baixo reconhecimento mútuo. O reconhecimento do outro/outra como ator da construção de um espaço democrático não está fora de relações hierárquicas de poder construídas socialmente, nem da tensão inerente à definição de nós-outros. A criação de identidades políticas com os cidadãos depende de uma forma coletiva de identificação entre as exigências democráticas que se encontra em uma variedade de movimentos: mulheres, negros, trabalhadores, identidades


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