Escola Informação Digital Nº29, novembro/dezembro 2020

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Cidadania

Direita democrática em Portugal: um oximoro Joaquim Jorge Veiguinha

ESCOLA

Informação

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acordo entre o PSD e o Chega que viabilizou o governo de coligação entre este partido o CDS/PP e o PPM nos Açores, também com o apoio da Iniciativa Liberal, constitui provavelmente o primeiro passo para a entrada do partido de André Ventura num governo de direita a nível nacional ou então para a sua viabilização. O Chega não é apenas um partido xenófobo e racista, mas um adversário visceral da Constituição de 1976 (CRP) que substituiu a de 1933, a do chamado “Estado Novo”, defendendo a eliminação do artigo que estabelece os limites materiais da sua revisão que asseguram os direitos individuais, políticos, sociais e culturais dos cidadãos e os direitos dos trabalhadores, bem como a separação de poderes e a independência dos tribunais. Este partido defende também o fim da presunção de inocência, a prisão perpétua e, a nível socioeconómico, o fim dos impostos progressivos, que é também

uma reivindicação dos neoliberais da Iniciativa Liberal, a privatização e desmantelamento do Serviço Nacional de Saúde e da Educação Pública, todo um programa de supressão dos principais direitos económicos, sociais e culturais da CRP. Poder-se-á perguntar: o Chega, partido de extrema-direita, é um fenómeno isolado, circunstancial, ou integra-se numa vaga de fundo da direita portuguesa que ressurge em determinados períodos como se fosse a ponta de um icebergue que permanece na maior parte do tempo submerso? E se não é um fenómeno circunstancial, existirá ou não uma direita democrática em Portugal?

As lições da História Consultemos a História portuguesa do pós-25 de Abril. O PSD de Sá Carneiro, apesar de ter votado a favor da CRP num período em que todos os partidos, com a exceção do CDS, proclamavam a intenção de construir o socialismo, em 1979-80, quando go-

vernava em coligação com o CDS-PP e o PPM, apresentou como candidato às eleições presidenciais de 1981 o general Soares Carneiro, um opositor dessa mesma Constituição e do regime democrático instituído pela Revolução de 25 de Abril de 1974. Mais recentemente, Passos Coelho quando era primeiro-ministro manifestou a sua hostilidade aos direitos económicos e sociais da CRP, o que o aproxima nesta questão do partido de André Ventura que não por acaso proveio do PSD e não foi desautorizado por ter manifestado o seu racismo xenófobo relativamente à comunidade cigana, ao contrário do que aconteceu com o CDS/PP de Assunção Cristas que se retirou da coligação eleitoral com o PSD em Loures. Retornemos ao passado, aos governos de maioria absoluta do PSD de Cavaco Silva (1986-1995). Poderemos destacar três medidas que expressam a sua natureza política: - abolição da Comissão sobre o Livro Negro do fascismo, documento fundamental para se poder fazer uma


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