Revista Cidade Verde 189

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CIDADE


Índice 05. Editorial 08. Páginas Verdes Guilherme Lopes concede entrevista à jornalista Cláudia Brandão 18. Política A matemática da eleição 30. Polícia Segurança ao alcance da mão 52. Geral Mais tempo de cadeia

Páginas Verdes Guilherme Lopes

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Justiça em dois turnos

61. Geral A mão do Exército nas obras do Piauí 68. Geral Abençoada Notícia 70. Saúde Grávidas e vaidosas 76. Comportamento Armadilha virtual para a saúde

Cineas Santos

Uma gripe da pesada

13. Cidadeverde.com Yala Sena 28. Ponto de Vista Elivaldo Barbosa

58. Economia e Negócios Jordana Cury 79. Tecnologia Marcos Sávio 82. Playlist Rayldo Pereira 86. Perfil Péricles Mendel

Articulistas 65

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Fonseca Neto

COLUNAS

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O pequeno reizinho

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Tony Batista


foto Manuel Soares

Imperadores de fralda O comportamento social, por vezes, muda de um extremo a outro sem que a sociedade sequer se dê conta do exato momento em que houve a ruptura de determinado costume. Durante um bom tempo, a autoridade paterna era inquestionável dentro de casa. Os pais mandavam, os filhos obedeciam. Depois, vieram os anos de contestação, quando a ordem era questionar toda forma de autoridade. Em algum momento da história, no entanto, perdeu-se o limite da linha que separa o questionamento salutar que pode e deve existir dentro da família e o desrespeito com relação ao pai e à mãe. Pressionados pelo consumismo voraz dos tempos modernos, os pais se obrigam a uma carga de trabalho excessiva, a fim de suprir todas as necessidades que o mercado não cansa de impor à família. E a culpa por passar a maior parte do dia ausente de casa transforma-se em uma tentativa exagerada de agradar os filhos a qualquer custo. Isso inclui o temor de dizer não às crianças, mesmo que o capricho solicitado seja absurdo. O resultado da criação sem limites, sem frustrações ou sem repreensões são filhos autoritários, que passam a agir como pequenos tiranos, impondo sua vontade e transformando os pais em cordeirinhos que se submetem à autoridade infantil, em uma total inversão dos papéis familiares.

Este é o tema de capa abordado nesta edição da Revista Cidade Verde, que foi buscar junto aos profissionais de saúde mental a resposta para o fenômeno da nova era dos ‘reizinhos’ que ditam as regras dentro de casa e não admitem a menor contrariedade, sob pena de armarem um escândalo de proporção desconcertante. A tendência dessas crianças é de tornarem-se adultos imaturos, que não saberão lidar com as frustrações naturais da vida. Um problema que os pais, sem saber, estão criando para o futuro dos filhos. Em outra reportagem, nossa equipe mostra o avanço, embora tardio, alcançado com a extensão do horário de funcionamento do Tribunal de Justiça do Piauí, que passará a ser feito nos dois turnos. Apesar de o Relatório Justiça em Números 2017 colocar a produtividade do referido tribunal como a terceira pior do país, o TJ piauiense só funcionava em um expediente, comprometendo a rapidez esperada pelos jurisdicionados. Outro assunto que merece destaque é o avanço da gripe H1N1, que já havia registrado mais de trinta casos em Teresina até o dia 8 de maio, com o registro de uma morte. Uma doença que se torna mais forte a cada ano e que precisa ser combatida com a vacina, que é oferecida gratuitamente para o público alvo. Cláudia Brandão Editora-chefe

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Entrevista POR CLÁUDIA BRANDÃO

Guilherme Lopes

claudiabrandao@cidadeverde.com

Um doutor exemplo foto Gabriel Paulino

A história de um jovem estudante do interior do Piauí que concluiu o doutorado aos 26 anos, tornando-se o doutor mais novo do Brasil

A história de Guilherme Antônio Lopes de Oliveira é inspiradora. Filho de um pedreiro e de uma costureira, em Piripiri, estudou durante todo o ensino fundamental e médio na escola pública. Mas, desde pequeno, cultivava o sonho de levar uma vida melhor que a dos pais e, para 8 | 13 DE MAIO, 2018 | REVISTA CIDADE VERDE

isso, descobriu, ainda cedo, que o caminho para essa mudança era a educação. A paixão pela área que viria a abraçar no futuro - a biomedicina - veio, literalmente, do coração. Ao deparar com o coração de um boi, duran-

te uma aula de ciências, Guilherme ficou fascinado e, ali, descobriu que queria dedicar-se à pesquisa na área de saúde. Com essa determinação, superou desafios, venceu adversidades e, aos 26 anos, estava defendendo a tese de doutorado na prospecção de novos fármacos para tratar a


retocolite, uma doença do intestino. Atualmente, é professor de uma faculdade particular na sua cidade natal, onde leciona para a própria irmã, e desenvolve uma pesquisa no laboratório do campus da Universidade Federal de Parnaíba. Além disso, faz um trabalho de extensão com comunidades quilombolas na área de educação em saúde. Guilherme já chegou aonde seus pais jamais sonharam chegar um dia, mas ele quer mais. Para este jovem que fez da educação a ferramenta de transformação da sua vida, o futuro está apenas começando, e ele tem muito mais a oferecer.

RCV – Em que momento da vida você tomou conhecimento de que a educação poderia mudar a sua história? GL – Desde muito novo. Aos dez anos de idade, eu já começava a ajudar minha mãe em casa e, a partir daí, eu já tinha a noção do que eu precisava fazer para mudar a minha realidade e não ter a mesma vida dos meus pais. Meu pai é pedreiro e minha mãe é costureira. Eu sempre fui bastante interessado pelos estudos. Na adolescência, eu já sabia o que queria. Eu acredito que eu amadureci muito novo com relação a isso, aprendi a ter responsabilidade muito cedo.

RCV – Você sempre foi bom aluno na escola? GL – Sim, desde sempre. Meu pai

conta que, nos primeiros dias de aula, eu não queria ficar na escola, mas, uma semana depois, eu já tomei gosto e foi assim até hoje.

Eu sempre tive a consciência de que a educação pode mudar a vida, pode mudar uma família, a sociedade toda. Eu acredito nisso. RCV – Houve algum professor em especial que marcou a sua formação? GL – Vários. Principalmente os pro-

fessores de ciência e de biologia. Graças a Deus, eles foram bastante motivadores para mim, porque, muitas vezes, a gente encontra professores com os quais a gente cria até mesmo repúdio, mas os meus professores de biologia foram sensacionais. Eu tive uma professora na quinta série, lá em Piripiri, de apelido ‘Neguinha’, que incentivava muito a pesquisa na área de ciências. Certa vez, ela levou o coração de um boi para a sala de aula e aquilo me deixou fascinado. Quando ela começou a explicar a anatomia do coração, eu fiquei impressionado, de boca aberta. Isso me marcou bastante.

RCV – Em casa, seus pais o estimulavam a estudar para ter uma vida melhor? GL – Sim, eles não tinham condi-

ções de investir financeiramente em uma boa escola, mas sempre me incentivavam a ir para a escola,

a estudar, fazer tarefas. Eles sempre me deram muito apoio.

RCV – Você teve que abdicar do seu horário de lazer e do encontro com os amigos no fim de semana para se dedicar aos estudos? GL – Na graduação e, também, no

doutorado eu abri mão várias vezes. Agora, eu vejo tudo e não me arrependo, mas, naquele momento, às vezes, dava vontade de jogar tudo pra cima e sair. Mas eu tinha que manter o foco para que algo de melhor pudesse acontecer depois. Eu sempre tive a consciência de que a educação pode mudar a vida, pode mudar uma família, a sociedade toda. Eu acredito nisso. Eu nem conto as vezes em que tive de abdicar dos meus finais de semana. Eu lembro de um 24 de dezembro em que eu estava dentro de um laboratório, fazendo experimentos. Quantas vezes meus amigos chamavam para sair, pra tomar um sorvete, e eu dispensava!

RCV – Você enfrentou muitas dificuldades pelo fato de estudar em uma escola pública do interior do Piauí? GL – Eu estudei em três escolas em

Piripiri. A do ensino fundamental até que tinha um suporte bem legal para o público dela. No ensino médio, na Escola José Narciso, havia um incentivo muito grande em relação ao vestibular. Nós tínhamos grupo de estudo e um bom aporte da escola, mesmo sendo escola pública. Havia simulados para o ENEM ( Exame Nacional do Ensino Médio) e muita coisa boa. Eu não tenho nada a falar da minha REVISTA CIDADE VERDE | 13 DE MAIO, 2018 | 9


formação, graças a Deus eu tive uma boa educação na escola pública.

RCV – Independente do conteúdo didático da sua área, você é uma pessoa que gosta de ler? GL – Sim. Eu gosto de leituras que

nos levam a pensar sobre como mudar a nós mesmos para mudar outras pessoas. Inclusive, eu tenho no celular alguns livros que eu já peguei para ler depois. Gosto também de ficção científica. Depois do doutorado, eu dei uma pausa, mas estou retornando agora e já estou com uma pilha de livros para por a leitura em dia.

RCV – O que levou você a escolher a área de biomedicina? GL – O interesse que eu sempre tive

por essa área de ciências, biologia e saúde. Quando eu conheci a biomedicina, foi algo que me proporcionou a perspectiva de aliar o trabalho em um laboratório à pesquisa na área da saúde. Antes de conhecer a biomedicina, eu pensei em fazer biologia ou medicina veterinária, para atuar na pesquisa. Quando eu conheci o curso de biomedicina, no entanto, foi paixão à primeira vista, porque eu sabia que ali eu poderia pesquisar, que é o que eu amo fazer, aliando isso à saúde. Meu doutorado foi sobre uma pesquisa de bioprospecção em novos fármacos aplicados à doença de retocolite, que é uma inflamação no intestino que afeta várias pessoas e, até hoje, não há um tratamento de cura, apenas paliativos. Essa substância que a gente investigou, futuramente, pode tornar-se um medicamento para ajudar milhares de pessoas que sofrem com essa doença. 10 | 13 DE MAIO, 2018 | REVISTA CIDADE VERDE

É necessário o poder público entender que o investimento na pesquisa pode mudar a economia de um país.

RCV – A pesquisa é uma área que, apesar da sua importância, recebe pouco incentivo financeiro no Brasil. Como você pretende superar essa barreira para realizar o seu sonho de se tornar um pesquisador? GL – A maioria das pesquisas no

Brasil acontece nas universidades e, infelizmente, não temos recursos suficientes para concluir uma pesquisa da molécula até o medicamento. O investimento, além de pouco, é pulverizado, ou seja, ele é aplicado em vários projetos e acaba não dando para fazer muita coisa em nenhum deles. É necessário o poder público entender que o investimento na pesquisa pode mudar a economia de um país. Se a gente olhar para os países mais ricos, como China, Estados Unidos, Alemanha, um dos investimentos mais importantes é em pesquisa e desenvolvimento tecnológico. Isso muda completamente a economia de um país.

RCV – Agora que você já é um doutor em biomedicina, você já pensou na possibilidade de trabalhar em uma grande

indústria farmacêutica, uma multinacional? GL – Sim. Eu estou totalmente dis-

ponível a receber o convite de uma empresa e a enviar meu currículo a elas. Aqui no Piauí, infelizmente, nós não temos indústrias nessa área. Temos uma em Floriano, mas apenas de manipulação de fármacos. Mas há laboratórios grandes que trabalham com análises clínicas, que também é uma área da biomedicina, e que eu me interesso bastante.

RCV – Como surgiu a oportunidade para você passar um ano estudando na Espanha? GL – Logo que ingressei no douto-

rado, veio a oportunidade do Programa Ciências Sem Fronteiras. E o meu orientador disse para os orientandos dele que todos deveriam ingressar no programa para aproveitar essa oportunidade. No segundo ano do doutorado, a gente submeteu o projeto, foi aprovado e eu fui, junto com vários colegas.

RCV – E qual foi a experiência que você trouxe de lá? GL – Ah! Foi uma experiência

profissional, pessoal, cultural, um crescimento extraordinário. Eu fui aprender novas técnicas para trazer para nossa universidade, com estudos em vivo, eu passei um ano me aperfeiçoando nessa área. Também estive imerso em outra cultura, outra língua, e isso me proporcionou um crescimento até como pessoa.

RCV – Essa experiência abriu a perspectiva de você poder vir a morar no exterior?


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