o livro negro do cristianismo

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posses e até expoentes das famílias patrícias.24 Por coerência com a própria fé, não adoravam ou ofereciam sacrifícios às divindades romanas. Os primeiros cristãos se consideravam cidadãos do Reino dos Céus e "estrangeiros" nesta Terra.25 Tão estrangeiros, que muitos consideravam pecado exercer funções públicas. "Pergunte-se sobre o trabalho dos catecúmenos", escrevia, por exemplo, São Hipólito de Roma, "se algum é desfrutador de mulheres, ou sacerdote de ídolos, ou gladiador, ou magistrado com gládio e manto, que deixe a profissão ou seja afastado [da Igreja] ".26 Vale notar que a profissão de magistrado é colocada no mesmo patamar que a dos que desfrutam da prostituição ou dos combates lúdicos. É impossível estabelecer com exatidão o percentual de cristãos entre os súditos do Império, mas certamente devia se tratar de um fenômeno de grandes proporções. Tertuliano, um dos primeiros escritores latinos do século II, assim reprovava os magistrados romanos: "Poderíamos ter lutado sem armas contra vocês, sem nos rebelarmos, mas apenas com nosso dissenso, com a hostilidade de uma secessão. Se, de fato, nos separássemos em grande número de vocês para nos refugiarmos em algum canto remoto da Terra, a perda de tantos cidadãos minaria sua dominação, punindo-a com a ruína total. Então teriam terror de sua solidão, do silêncio da natureza e do estupor de um mundo já morto, procurariam quem manda, mas teriam mais inimigos do que cidadãos."27 Um exagero, é claro, mas com um fundo de verdade. As autoridades romanas reputavam subversivo qualquer movimento que agregasse longe de seu controle grupos populares e expoentes da aristocracia.28 Além disso, consideravam a manutenção dos cultos tradicionais um elemento de estabilidade indispensável à própria vida do Estado, tanto que o sacrilégio e a não-observância dos ritos constituíam um crime comparável à traição. Enfim, temiam de forma extrema os perigos da secessão: "Roma nunca conseguiu se recuperar do susto da secessão dos plebeus no período republicano. O terror da secessão em Roma é uma constante psicológica que desempenha um papel


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