SALVADOR E SUAS COMEMORAÇÕES: MEMÓRIA E IDENTIDADE EM NARRATIVAS OFICIAIS

Page 46

46

Daniela Abreu Matos

colocando definitivamente a interação deste com o campo cultural e consolidando a indústria cultural como lógica de produção da contemporaneidade. Assim, a Bahia passa a viver uma dinâmica de ver o mundo e ver a si mesma submetida à lógica da indústria cultural a da proliferação dos produtos midiáticos. Ao lado dessa expansão, ainda nos anos setenta, a Bahia local, aquela que não aparecia na TV, mostra a sua força com manifestações culturais locais. O surgimento do Ilê Aiyê torna-se uma referência nesse sentido e assim como os Filhos de Gandhy, em 1949, essa expressão cultural traz novas cores para a cena baiana. Uma analogia entre esses dois momentos pode ser feita, observando que, enquanto os Filhos de Gandhy mostraram para a sociedade baiana dos anos quarenta que a sua produção cultural vai além dos versos parnasianos e das letras da cultura oficial, o Ilê Aiyê mostra para a Bahia da década setenta que a cultura vai além do que transmitiam as TVs Itapoã e Aratu. Esta manifestação, porém, já revela uma complexidade, ao demonstrar que aqueles sujeitos culturais, homens negros e mulheres negras, que não aparecem na TV da época se alimentam das informações trazidas por ela. O pesquisador Milton Moura (1998) concorda com essa percepção ao defender a tese de que Salvador entra no circuito da produção e consumo midiático mesclando a força do passado e o interesse pela novidade. No Carnaval de 1975 aconteceu o Ilê Aiyê, primeiro bloco afro a fazer sucesso. Formado por operários negros do Pólo Petroquímico recém-instalado, trazia na bagagem, junto a presença forte da televisão, informações sobre o processo de independentização de países africanos, o sucesso de artistas como James Brown ou o conjunto Jackson Five e a onda do reggae de origem jamaicana (MOURA, 1998, p 26).

Neste contexto afirma-se a expressão negra na cultura baiana, ou pode-se dizer, percebe-se uma maior visibilidade para aquele conjunto de expressões e manifestações culturais que seria identificado como uma cultura afro-baiana. Segundo a pesquisadora Agnes Mariano (2001, p.70), “Salvador vai assumindo progressivamente, ao menos no discurso, a sua porção afro”. Com a crescente metropolização da cidade de Salvador, e a abertura de um mercado de trabalho


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.