PREFÁCIO
A
primeira lembrança do Rio do Peixe tinha
Tempos depois, vimos o Rio do Peixe associar aos
à sua confluência. Associando-se ao Canoas,
a ver com sua grandeza. Banhava cidades
resíduos da mortandade uma espuma química, que
forma o Rio Uruguai, seu sucessor internacional.
lhe deu aspecto fantasmagórico de crise iminente.
O selvagem córrego de montanhas banha o
importantes do vale de mesmo nome e sobre ele adejavam pontes e passarelas. A mais famosa, a maior viga reta de concreto do mundo, o próprio Rio a levou na enchente de 1983.
Ao mesmo tempo, as florestas que o margeavam foram desaparecendo, as cidades surgindo, crescendo, e o homem, por não suportar o
A primeira imagem do Rio é a de um indígena
defunto de corpo presente, passou a emitir leis e
armado de arco e flecha, em pé sobre a canoa
a cuidar do Rio.
rústica feita de um tronco escavado. Homem, arco, flecha, canoa e rio faziam composição única, pousando para a eternidade. Essa visão e a legenda no livro de geografia diziam tratar-se de um pescador de dourados, peixe abundante que cedeu o nome ao corpo de água.
Durante as cheias, o Rio do Peixe derrotou seus detratores, limpou o calado e a mata ciliar com a violência de um matador e acabou notável na mídia internacional. De quebra, destruiu bens e valores, vidas, haveres e afazeres. Valente, fez-se
que restou das matas da serra geral, saudoso das araucárias centenárias que os serrotes transformaram em canoa, casa e bens aos nativos e aos imigrados. Jamais domado, serviu de rumo e de leito para a estrada de ferro instalada em seu dorso e trajeto. Viu tombar a mata, sumirem os animais. Acompanhou a chegança dos homens e sentiu em seu corpo a morte lenta dos peixes e da biodiversidade. Tremeu ao epíteto de Rio sem Peixe.
respeitar. Hidrelétricas ao longo de seu curso,
Enfim, e a tempo, o homem reconheceu a
A outra imagem que ficou foi a de um lençol
da água para a agricultura e para as indústrias;
impossibilidade de viver sem água e descobriu
d’água tinto de sangue das carcaças de animais
agente da vida e da riqueza.
o Rio como seu precioso caudal de vida. Para
mortos no frigorífico que lhe eram jogadas, ainda quentes, e atraíam esquadrilhas de corvos em macabras revoadas. O cheiro dos restos mortais de bovinos e suínos em dias quentes e secos era insuportável. O Rio parecia um lodo nauseabundo, agonizante. O pobre caudal sentia vergonha de ser rio.
É assim que o temos hoje. O Rio do Peixe é o integrador do Meio-Oeste de Santa Catarina. Nascido de uma eclosão de água de uma fratura do basalto milenar no Município de Calmon, quase no Paraná, lá vem o Peixe por mais de trezentos quilômetros descendo em direção
conjurar a própria morte, tratou de cuidar do Rio. Agora sim, volta a ser dos peixes, da mata ciliar, do esplendor das auroras, do perfume das flores, dos insondáveis crepúsculos, do som das corredeiras, da água límpida para todos e para sempre, da paz e da vida. Eis o Rio, o do Peixe. Adgar Zeferino Bittencourt Presidente do Comitê Rio do Peixe Gestão 2004-2006 Prof. Aristides Cimadon Presidente do Comitê Rio do Peixe Gestão 2002-2004