Revista Justiça & Cidadania

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função à do Vale-Transporte. Em São Paulo, o BU pode ser usado durante três horas, e aqui no Rio este período é de duas horas. A grande diferença é que o BU fluminense beneficia 20 municípios, enquanto em São Paulo abrange apenas a capital. JC – Quanto ao tempo de duas horas para utilização do BU, como vê as sugestões de aumento desse intervalo para 3 horas? LMT – As pesquisas demonstram que a maior parte dos passageiros, embora se pense o contrário, gasta pouco mais de uma hora em seus deslocamentos casa-trabalho e vice-versa . Segundo o PDTU (Plano de Desenvolvimento do Transporte Urbano), o tempo de viagem médio na Região Metropolitana do Rio é de 68 minutos. Duas pesquisas mais recentes, realizadas pelo Instituto Insider e pelo Ibope, respectivamente em 2008 e em 2009, mostraram que 98% da população da RMRJ realizam seus deslocamentos em até 2 horas. Por ora, temos que acompanhar o funcionamento do Bilhete Único, que ainda se encontra apenas no início de sua utilização, verificar os dados obtidos, ouvir os usuários. Caso fique comprovada a necessidade de estender esse período para 3 horas, e o governo assim o decidir, contará com a colaboração do corpo técnico da Fetranspor, assim como da equipe da RioCard, como aconteceu para a implantação do BU. JC – Na sua visão, o Bilhete Único é bom para o transportador? LMT – Considero que tudo o que é bom para o nosso cliente — o passageiro — é igualmente bom para o transportador. Como em qualquer outro negócio, só se alcança bons resultados se a clientela está satisfeita. No caso do transporte coletivo, que é um serviço essencial, esta satisfação é mais do que se sentir atendido nas expectativas quanto a um produto que se adquire pois, como disse anteriormente, ele influencia na própria qualidade de vida do cidadão. As horas que se consomem num engarrafamento, ou num terminal ou estação, enquanto se aguarda a condução, são percebidas de uma forma bastante negativa, pois envolvem tensão. Como chamou a atenção o poeta francês Lamartine, a percepção do tempo varia de acordo com o nosso estado de espírito. Se estamos felizes, ele corre, mas se estamos tristes, parece se arrastar. A espera, ou o transporte sem segurança ou conforto, faz com que a passagem do tempo seja potencializada, e que o trabalhador chegue ao trabalho irritado, cansado, menos disposto para as atividades que o aguardam. A repetição desse tipo de situação leva ao estresse constante. Isso não interessa ao transportador, que vem defendendo soluções que não estão ao seu alcance, que envolvem planejamento urbano, que envolvem planejamento urbano e políticas governamentais, como forma de poder aprimorar os serviços prestados e diminuir o tempo das viagens. O Bilhete Único é bom para o transportador — assim como o será a adoção de corredores exclusivos, de sistemas de BRT (Bus Rapid Transit) e de outras soluções que o ajudem a o transporte coletivo a funcionar cada vez melhor e que

satisfaçam o seu cliente. Os deslocamentos diários nos ônibus devem ser experiências agradáveis. JC – E os empregadores do Estado, que vantagens podem ter com o Bilhete Único? LMT – Teremos um impacto econômico muito positivo com o Bilhete Único, pois, com a diminuição dos recursos investidos no Vale-Transporte dos funcionários, os empregadores poderão fazer investimentos para aumentarem sua linha produtiva ou seus serviços. Vejamos os empregadores do município de Duque de Caxias, por exemplo. Pelas suas características geográficas, mesmo em deslocamentos cujos pontos de partida e de chegada estão dentro de Caxias, as linhas utilizadas, muitas vezes, passam por outros municípios, sendo, portanto, intermunicipais. Aqueles que utilizem duas conduções poderão se beneficiar do Bilhete Único. Se a economia é significativa para um trabalhador, ao fim do mês, imaginemos para muitos trabalhadores. Quanto maior o número de funcionários que façam integrações dentro do perfil englobado pelo BU, maior a economia gerada. A maior vantagem que o Bilhete Único trará, porém, na minha opinião, será a inclusão social. Voltando aos dados do Ipea e aos milhões de pessoas que passam a se tornar cativas da localidade em que moram, por não terem dinheiro para o transporte. Existem trabalhadores que passam a semana no local de trabalho ou até nas ruas, porque o deslocamento para outros municípios lhes é muito dispendioso, e é muito gratificante saber que muitos deles poderão voltar a ter acesso ao transporte coletivo, com os descontos proporcionados pelo Bilhete. Outros deixarão de ser discriminados nas oportunidades de emprego, por morarem longe e os possíveis patrões preferirem contratar pessoas que representem menores investimentos com ValeTransporte. O tamanho desse alcance social, no entanto, só poderemos conhecer daqui a mais um tempo, através de estudos e pesquisas específicos. JC – Há mais algum ponto que gostaria de ressaltar? LMT – Quero reforçar um ponto, pois acho que é menos conhecido e é de grande importância para todos: empresários, transportadores, população e governo. Trata-se da transparência do processo, que conta com auditoria, contratada por iniciativa da RioCard, de duas empresas, uma que acompanha o fluxo financeiro, a Fernando Motta, e outra que verifica a própria tecnologia, a Ernest Young. A Coppe/UFRJ também faz auditoria desse processo, para o governo estadual. Como já disse, o sistema, por si só, já permite que o governo do Estado, por meio de sua Secretaria de Transportes, verifique, em tempo real, a utilização de cada viagem feita com utilização do Bilhete Único. Podem ser verificados dados como linha e até horário. Por isso, podemos dizer que o subsídio está sendo concedido ao cidadão, pois o poder público sabe exatamente quem está sendo beneficiado. Tudo é feito dentro da maior transparência possível, favorecendo a quem precisa: o cidadão comum, que depende de deslocamentos intermunicipais para cumprir suas tarefas diárias, e que vai poder fazer economia, ter maiores chances de emprego e sair da faixa de exclusão social. 2010 FEVEREIRO | JUSTIÇA & CIDADANIA 29


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