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A OBRIGAÇÃO
O estudo da verdade religiosa deveria ser empreendido e continuado com base no senso do dever, tendo como escopo o aprimoramento do coração. Uma vez aprendida, essa verdade não deveria ser guardada em uma estante, como se fosse um objeto de pesquisa; mas implantada profundamente no coração, onde o seu poder santificador pode ser sentido. Estudar teologia com o propósito de satisfazer à curiosidade ou de preparar-se para uma profissão seria um abuso, uma profanação daquilo que precisa ser considerado como extremamente santo. Aprender as realidades referentes a Deus meramente para efeito de diversão, ou buscando-se alguma vantagem secular, ou a fim de satisfazer o mero amor ao conhecimento é tratar o Altíssimo com desdém. Nossos interesses eternos estão envolvidos na questão religiosa, e deveríamos estudá-la dentro desses interesses. Um agricultor deveria estudar agronomia tendo em vista aumentar a sua produção; porém, se, em lugar disso, vier a esgotar suas energias, indagando como as plantas multiplicam as suas espécies ou como os diferentes tipos de solo foram originalmente formados, os seus campos ficarão repletos de espinheiros e abrolhos, e seu verdade religiosa celeiro, vazio. Igualmente sem proveito será aquele estudo das doutrinas religiosas que for efetuado com o mero propósito da especulação. Seria como se o alimento necessário para o sustento do corpo, em vez de ser ingerido e digerido, fosse preparado apenas para satisfazer a vista. Em tal caso, o corpo certamente pereceria de fome. Com idêntica certeza, a alma perecerá de inanição espiritual, se não for nutrida com a verdade de Deus.
Quando a doutrina religiosa é considerada meramente como objeto de especulação, a mente não se contenta com a verdade simples, conforme ela pode ser encontrada em Jesus, mas corre atrás de questões sem proveito e acaba se enredando em dificuldades das quais é incapaz de desvencilhar-se. Disso é que resulta o ceticismo de muitos. A verdade que poderia salvar e santificar as suas almas é por eles intencionalmente rejeitada, por não satisfazer a sua imensa curiosidade e, tampouco, solucionar todas as suas perplexidades. Estes agem à maneira de um lavrador qualquer que rejeita a ciência inteira da agricultura, recusando-se a cultivar o seu terreno, tão somente porque existem muitos mistérios no desenvolvimento das plantas, os quais ele se sente incapaz de explicar.
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Se dermos início à nossa inquirição pela verdade religiosa movidos pelo senso do dever e com o propósito de fazer o melhor uso possível dessa verdade, podemos estar certos do êxito. O Senhor abençoará os nossos esforços, porquanto ele mesmo prometeu: “Se alguém quiser fazer a vontade dele, conhecerá a respeito da doutrina” (Jo 7.17). À medida em que formos avançando, descobriremos tudo quanto se faz necessário para qualquer finalidade prática; o senso do dever, sob o qual haveremos de agir, não nos impulsionará para além desse limite.
O senso de obrigação religiosa que nos impele a buscar o conhecimento da verdade, embora desconsiderado por larga porção da humanidade, pertence à própria constituição da natureza humana. O homem foi originalmente criado para seguir a religião, assim como o olho foi formado com o propósito de ver. Será de grande vantagem considerarmos bem esse fato logo no início das nossas investigações. Então, sentiremos que estamos prosseguindo de conformidade com os melhores ditames da natureza humana.
As diversas partes que constituem o mundo no qual habitamos são admiravelmente adaptadas umas às outras. Muitas dessas adaptações tornam-se patentes diante de nossa mais descuidada observação; se as procurarmos com diligência, elas se multiplicarão quase infinitamente diante dos nossos olhos. A semente cai no solo como se fosse um grão de areia, mas, diferentemente da areia, ela encerra em suas minúsculas dimensões uma maravilhosa provisão para a produção de uma futura planta. Tal provisão, entretanto, seria destituída de finalidade, se não encontrasse um solo adaptado para a nutrição do gérmen. A umidade também é um fator necessário; o vapor, elevando-se de algum mar distante, é levado pelo vento, e, condensando-se na atmosfera, desce na forma de chuva fertilizadora. Todavia, todas essas adaptações seriam insuficientes, se não fosse suprido o calor. Assim, para completar o processo, a cerca de 140 milhões de quilômetros, o sol envia os seus raios vivificadores. Arranjos complicados como esses são abundantes em todas as obras da natureza.
Os propósitos realizados por essas adaptações, com frequência, são perfeitamente óbvios. No caso das plantas e dos animais, elas dão provisão para a vida de cada um e para a continuação das espécies. As plantas foram adaptadas de tal modo que se tornaram alimentos para os animais, e tanto plantas quanto animais prestam importantes benefícios ao homem. Entretanto, o próprio ser humano tem suas adaptações, e, com base em considerações como essas, o lugar que cabe ao homem pode ser compreendido dentro do imenso sistema do universo.
À semelhança de outras formas de vida, o homem foi constituído de tal maneira que há provisões para a continuação de sua vida, bem como da raça. Se não houvesse na constituição do homem sinais de qualidades mais elevadas, ele poderia comer e beber como qualquer animal; a satisfação dos seus apetites naturais e de suas propensões poderia ser considerada a mais elevada finalidade do seu ser. Todavia, quando os homens se brutalizam, isso é uma manifesta degradação da sua natureza. Os seres humanos possuem faculdades que os qualificam para propósitos muito mais nobres do que esses.
Os elevados poderes intelectuais do homem requerem um exercício apropriado e condigno. Seus conhecimentos não se limitam a objetos ao alcance de suas mãos nem àquelas relações e propriedades das coisas que são percebidas de imediato pelos sentidos. A sua razão percebe relações remotas, seguindo a cadeia de causas e efeitos através de longas sucessões. Partindo do momento presente, perscruta a história passada, vinculando acontecimentos na ordem própria de dependência uns dos outros. Mediante o seu conhecimento do passado, o homem é capaz de prever e de preparar-se para o futuro. Nas causas atualmente existentes, ele pode descobrir efeitos que se desenvolverão dentro de longo prazo. Tais faculdades humanas harmonizam-se bem com a opinião de que o homem é um ser imortal e que sua presente vida transitória é apenas a preparação para outra existência, a qual jamais terá fim; mas, de forma alguma, concordam com a opinião de que o homem morre como um bruto. Ninguém diz que o boi ou o asno preocupa-se com o problema de que, possivelmente, a imortalidade o aguarda ou que é importante que ele se prepare para a imortalidade. Todavia, a ideia de um estado futuro tem ocupado um lugar na mente dos homens de todos os séculos e sob todas as formas de expressão religiosa. A abelha e a formiga preparam-se para o inverno; e o inverno, para o qual os seus instintos as impelem a se prepararem, realmente lhes sobrevém. Se, porventura, nunca chegar a concretizar-se a vida futura, pela qual os homens têm esperado de uma maneira tão generalizada, pela qual suas mentes estão amoldadas a esperar e em face da qual eles se têm preparado laboriosamente, com cuidados incessantes, então, tal irrealização violaria toda a analogia, discordando com a harmonia da natureza universal. A mente humana está qualificada para um contínuo progresso no conhecimento e, assim sendo, para o estado da imortalidade. Essa adaptação inclui um insaciável desejo de obter conhecimento, bem como a capacidade de adquiri-lo. O pintinho, não muitas horas depois de haver abandonado a casca do ovo, onde começara a sua débil existência, já é capaz de selecionar o seu alimento, de andar à cata dele e de retornar à proteção das asas da galinha. O homem nasce neste mundo como o mais dependente de todos os seres. Semanas cansativas se escoam antes de começarem a aparecer os primeiros sinais de desenvolvimento de seus poderes intelectuais. O progresso é lento, e muitos meses de aprimoramento gradual se passam antes que ele possa equiparar-se, quanto à capacidade de autopreservação, a muitas outras criaturas que têm vivido apenas algumas horas. Os animais, entretanto, estacam em um ponto além do qual, segundo podemos asseverar, nunca progridem. As aves edificam os seus ninhos tais e quais já os construíam há cinco mil anos; as admiráveis organizações sociais que se verificam entre as abelhas e as formigas não estiveram sujeitas a qualquer processo de melhoramento. Não obstante, nenhum ponto, nenhuma linha são capazes de limitar o progresso da mente humana.
Embora estejamos bem familiarizados com os notáveis avanços que têm sido obtidos nos campos das artes e das ciências, contemplamos essas realizações com espanto e admiração; sentimos que uma carreira sem limites está aberta à frente do intelecto humano, convidando-o a fazer os esforços que ele internamente sente estar preparado para fazer. Porém, no que concerne a cada indivíduo, abrir-se-iam em vão os vastos campos do conhecimento, existiriam em vão as suas potencialidades para explorar esses campos e requeimariam em vão no seu peito os impulsos para explorá-los, se a vida presente, que voa ligeira como a lançadeira de um tecelão, fosse realmente a única oportunidade conferida ao homem, e se todas as suas esperanças e aspirações fossem sepultadas juntamente com ele, para sempre, no túmulo.
As faculdades morais com as quais o homem foi dotado adaptam-no para um estado de sujeição ao governo moral. Nossas mentes foram constituídas de tal maneira que somos capazes de perceber uma certa qualidade moral nas ações, podendo nós aprová-las ou desaprová-las. A consciência de termos feito o que é direito oferece-nos um de nossos mais elevados prazeres; a angústia do remorso, por causa de alguma maldade praticada, é tão intolerável como qualquer outro sofrimento ao qual o coração humano esteja suscetível. A nossa consciência exerce um certo governo moral, recompensando-nos ou castigando-nos pelas nossas ações, de acordo com o seu caráter moral. Grande parcela de nossa felicidade depende da aprovação daqueles com quem estamos associados. E, assim, encontramos o governo moral tanto fora como dentro de nós mesmos; a cada ponto, em nossas relações com outros seres inteligentes, sentimos as restrições desse império moral. Onde se acham os limites do governo moral? Eles precisam ser tão extensos quanto as nossas relações com outros seres morais e tão duradouros como a nossa própria existência.
São verdades fundamentais da religião os fatos de que o homem é imortal e de que está debaixo de um governo moral, mediante o qual o seu futuro estado será bem-aventurado ou miserável, em consonância com a sua conduta na vida presente. O homem é um ser religioso, e é por isso que a persuasão sobre a sua própria imortalidade e a expectação de alguma futura retribuição encontram guarida em sua mente. Ninguém imagina que pensamentos dessa ordem tenham sido entretidos, por um momento sequer, por qualquer dos inúmeros animais existentes sobre a face da terra. No caso da raça humana, esses pensamentos têm prevalecido em todas as nações e em todas as épocas. Tais pensamentos têm estado misturados com as cogitações de sábios e ignorantes, de letrados e analfabetos, por igual modo, mesclando a religião com a história da humanidade.
As considerações que acabamos de apresentar demonstram que a verdade religiosa merece nosso mais elevado respeito e nossa mais diligente investigação. Aquele que negligencia essas reivindicações da verdade religiosa está agindo contrariamente à sua própria natureza e está se degradando até ao nível dos animais. Todavia, que homens costumam degradar-se desse modo é um fato que um correto ponto de vista da verdade religiosa não pode ignorar: “O boi conhece o seu possuidor, e o jumento o dono da sua manjedoura; mas Israel não tem conhecimento, o meu povo não entende” (ls 1.3). Trata-se de uma glória peculiar e de uma excelente característica da revelação cristã o fato de que ela foi adaptada a essa condição decaída da humanidade e que tem o poder de efetuar a sua restauração. É medicamento para o enfermo, assim como alimento verdade religiosa para o indivíduo saudável. Um apetite saudável clama por alimento nutritivo, e o alimento, quando recebido, administra a nutrição que se faz necessária. Desse modo, a adaptação é recíproca. Entretanto, nos estados doentios, o estômago repele os alimentos e rejeita os medicamentos de que precisa para ser curado. Contudo, a adaptação do remédio para a condição do enfermo nunca deixa de ser um fato. Outro tanto sucede no caso do evangelho de Cristo. Embora rejeitado pelos homens, o evangelho é “digno de inteira aceitação”, porque ele é um medicamento admiravelmente adaptado à nossa condição de depravação. Milhares e milhares que têm experimentado o poder restaurador do evangelho se unem, recomendando sua eficácia às multidões que não se dispõem ao menos a examiná-lo. Ao considerarmos as verdades da religião, podemos apreciá-las de vários ângulos. Podemos considerá-las provenientes de Deus, ou demonstradas por provas abundantes, ou harmônicas entre si, ou tendentes à glória de Deus. É interessante e instrutivo ver tais verdades no seu contato imediato com o coração humano, e, à semelhança do Espírito de Deus pairando por sobre o caos original, produzindo ordem onde havia confusão, e infundindo luz e vida onde previamente reinavam as trevas e a morte. Ao exercer esse poder de criar vida nova, aparece a origem divina das verdades cristãs, e essa demonstração torna-se tanto mais satisfatória por ser prática, ao alcance da capacidade de todos os homens.
Na qualidade de seres religiosos, procuremos compreender as verdades da religião. Na qualidade de seres dotados de imortalidade, esforcemo-nos por nos familiarizar com a doutrina da qual depende a nossa felicidade eterna. Tenhamos o cuidado para não aceitar essa verdade com um frio entendimento, mas de tal maneira que o seu poder renovador jamais cesse de atuar em nossos corações.
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