Caderno Emília Nº 0

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O humor absurdo ou como tirar umas férias mentais* marcela carranza  |  tradução thaís albieri

U

“[…] a pior aula de pomposidade é orgulhar-se monotonamente do humor, pois ele mesmo é o melhor antídoto contra o orgulho e foi, desde a época do Livro dos Provérbios, o martírio dos idiotas”. g. k. chesterton

m homem perde seu nariz na barbearia, e o nariz, transformado em funcionário do Czar, percorre as ruas de São Petersburgo até, finalmente, retornar ao rosto de seu dono. Este é o tema de O Nariz, de Gógol. O autor está brincando de “o que aconteceria se…” um nariz se tornasse independente do seu rosto e tivesse vida própria… e esse jogo humorístico pode ser visto com clareza nas reflexões finais do narrador que, em uma espécie de epílogo, se atreve, de forma vanguardista para um texto de 1835, a questionar o autor, reconhecendo abertamente não ter entendido nada do que acabara de contar.

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* A expressão “férias mentais” para se referir ao absurdo (especialmente à obra de Lewis Carroll) é de G. K.Chesterton no texto “Defesa do absurdo”. “Lewis Carroll levava uma vida na qual ele teria batido de frente contra qualquer um por pisar na grama, e outra na qual dizia alegremente que o sol era verde e a lua azul; estava dividido por natureza, comum em cada mundo na posição perfeita para o absurdo moderno. Seu País das Maravilhas é um país inventado por matemáticos loucos. Sentimos que o conjunto é uma válvula de escape de um mundo falso, intuímos que, se pudéssemos atravessar as suas máscaras, talvez descobríssemos que Humpty Dumpty e a Lebre de Março eram professores e doutores de Teologia desfrutando de umas “férias mentais”. Este sentido de escape é, certamente, menos enfático em Edward Lear, devido à sua completa cidadania no mundo sem razão. Em Correr tras el própio sombrero (y outros ensayos). Barcelona: Acantilado, 2006.


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