Boletim Pastoral Familiar - outubro 2015

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Ano VIII CNBB – REGIONAL SUL 2

Dom Orlando Brandes Arcebispo de Londrina e Bispo Referencial da Pastoral Familiar do Regional Sul 2/ CNBB

 Nesta Edição  01 – Vencer as crises familiares 03 – Catequeses 21 a 23 do Papa João Paulo II – Teologia do Corpo 10 – Nulidade matrimonial – Entenda as alterações 14 – Casais em Segunda União são acolhidos pela Diocese de São José dos Pinhais 16 – Promessas de Nossa Senhora a quem reza o Rosário 17 – João Paulo II e o Santo Rosário 19 – Princípio e argumento do mal menor

1. A monotonia. O cotidiano não pode virar chatice, mesmice, vida sem graça. Isso gera fugas de casa. Vencemos a monotonia pelo agradecimento e pelo pensamento positivo. Viver com amor o instante que nos é dado e os privilégios que temos em relação a outras pessoas que sofrem mais, ajuda a valorizar o que somos e temos. Saber amar também as coisas que temos, traz a vida ao cotidiano. Deus faz novas todas as coisas. Bom humor, lazer, espiritu-

alidade são bons remédios para vencer a monotonia. Cada dia é novo, é sempre um glorioso dia. Cada minuto é um milagre da vida. 2. A separação. O divórcio emocional começa cedo com o distanciamento, a agressividade e a indiferença. Há casos onde a separação é o último remédio, mas precisamos defender e lutar pelo matrimónio. Aqui o remédio é o perdão de todo coração e o diálogo constante. Buscar mais a Deus e a

espiritualidade, dá solidez à vida familiar.

3. A balbúrdia sexual. Sexo requer respeito, intimidade, comunicação no amor. Ciúme, infidelidade, falta de pudor são feridas mortais. A internet está separando casais. É preciso pedir ajuda a amigos competentes e a profissionais, fazer parte de movimentos de casais. Sinceridade e humildade podem curar os relacionamentos feridos. A união sexual é tam-


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bém o abraço dos corações, dos sentimentos, das almas, dos projetos do casal. A carne em si não pode saciar nossa fome de amor, de acolhimento, de valorização.

vida do casal. Boas amizades são bons anjos e podem salvar casamentos. Muito discernimento neste assunto é ainda pouco.

4. Os maus conselhos. Quanta gente vai ao fracasso por ouvir conselhos errados de pessoas frustradas, imaturas, despreparadas. Nossos amigos podem se tornar nossos inimigos pêlos maus conselhos. Haja discernimento diante do que ouvimos na TV, nas revistas de moda, nos bares, nos centros de macumba, nas fábricas ou de profissionais despreparados. Aconselhar-se na Palavra de Deus, na oração, nos encontros de casais e com profissionais de confiança, pode salvar o casamento do fracasso.

8. A mentira. No inicio elas são pequenas, mas se avolumam protegendo atos ilegais, escondendo roubos, traições, drogas, homicídios. Toda mentira é perversa e acaba com a confiança mútua. Não podemos ocultar e defender coisas erradas. Deus conhece o coração e a consciência. É preciso banir com a mentira, colocar Deus no coração, confessar os erros e mudar de vida. Mudar hoje, agora. Com a mentira não se negocia, ela destrói o casamento.

5. O desrespeito. São as agressões, as mentiras, as acusações, as humilhações, as zombarias, etc. O outro não é nosso lixeiro. Haja pois humanismo, sensibilidade e compaixão. A missão do cônjuge é fazer o outro crescer e realizar-se. Pedir perdão pelo desrespeito e praticar uma ação contrária a aquela desrespeitosa é uma boa reparação. A regra de ouro é: faças aos outros o que queres que façam a ti. Recomeçar sempre e com esperança de melhorar, ajuda a renovar diariamente o consenso matrimonial. 6. A desatenção. Vencemos este mal com o elogio, com o toque, com o olhar amoroso, o abraço. Falar com quem mora em sua casa é gesto de sabedoria na convivência. A pior experiência humana é a rejeição. Não basta amar uma pessoa, ela precisa saber que é amada. A ternura, os pequenos gestos, a presença atenta são bênçãos contra a desatenção. É melhor um bate-boca que a indiferença. Não fazer de nossa casa um inferno frio, mas um céu florido e iluminado. 7. As amizades duvidosas. Elas não merecem ser cultivadas. São um perigo mortal. Os amigos têm muito poder sobre nós. Casamentos naufragaram por amizades duvidosas, influências de fora, intromissão na

9. Os gastos financeiros. Todos devem colaborar com os gastos da casa. Não esbanjar dinheiro com compras exageradas, negócios mal feitos, exibição e inveja dos outros. É preciso saber poupar. Mas quem é mão fechada, seguro demais, apegado à matéria também cria problema. Neste assunto o diálogo, a avaliação, a correção das atitudes erradas é o melhor que podemos fazer. Não dar tudo o que os filhos querem. Que eles ajudem em casa, não sejam apenas consumidores. Isso os valoriza e educa. 10. A omissão na oração. Rezar é um ato natural e de justiça com nossa alma e nosso Deus. A preguiça, o comodismo, o relaxamento, a apatia levam ao afastamento de Deus e das coisas espirituais. Quem já foi religioso, abandonou a religião, só irá recuperar-se se voltar a pratica religiosa. Deus, a alma e a eternidade são valores imperecíveis, inegociáveis. Boas leituras, bons diálogos, oração, retiros, a Palavra de Deus, os sacramentos têm salvado as famílias nas tempestades da vida. A oração nos torna humanos, humildes, fortes. Oração também é terapia e têm o poder de abrir portas para grandes soluções.

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21ª. Catequese 12 de Março de 1980 O mistério da mulher revela-se na maternidade

Na meditação precedente analisamos a frase de Gênesis 4, 1, e em particular o termo ―conheceu‖, usado no texto original para definir a união conjugal. Fizemos também notar que este ―conhecimento‖ bíblico estabelece uma espécie de arquétipo1 pessoal da corporeidade e sexualidade humanas. Parece isto absolutamente fundamental para compreender o homem, que desde ―o princípio‖ anda à busca do significado do próprio corpo. Este significado está na base da teologia mesma do corpo. O termo ―conheceu‖ = ―uniu-se‖i sintetiza toda a densidade do texto bíblico até agora analisado. O ―homem‖ que, segundo o Gênesis 4, 1, pela primeira vez conhece a mulher, sua esposa, no ato da união conjugal, é de fato aquele mesmo que, impondo os nomes, isto é, “conhecendo‖ também, se ―diferenciou‖ de todo o mundo dos seres vivos ou animalia, afirmando-se a si mesmo como pessoa e sujeito. O ―conhecimento‖, de que fala Gênesis 4, 1, não o afasta nem pode afastar do nível daquele primordial e fundamental autoconhecimento. Portanto — qualquer coisa que dele afirmasse uma mentalidade unilateralmente ―naturalista‖ — em Gênesis 4, 1, não pode tratar-se de uma aceitação passiva da própria determinação por parte do corpo e do sexo, exatamente porque se trata de ―conhecimento‖. É, pelo contrário nova descoberta do significado do próprio corpo, descoberta comum e recíproca, assim como comum e recíproca é desde o princípio a existência do homem que ―Deus criou varão e mulher‖. O conhecimento, que estava na base da solidão original do homem, está agora na base desta unidade do homem e da mulher, cuja clara perspectiva foi encerrada pelo Criador no mistério mesmo da criaçãoii. Neste ―conhecimento‖, o homem confirma o significado do nome ―Eva‖, dado à sua esposa, porque ela seria mãe de todos os vivosiii. Segundo Gênesis 4, 1, quem conhece é o homem e quem é conhecido é a mulher-esposa, como se a especí-

fica determinação da mulher, através do próprio corpo e sexo, escondesse aquilo que forma a profundidade mesma da sua feminilidade. O varão, porém, é aquele que — depois do pecado — foi o primeiro a sentir a vergonha da nudez e o primeiro que disse: Cheio de medo, porque estou nu, escondi-meiv. Será necessário voltar ainda separadamente ao estado de espírito de ambos, depois da perda da inocência original. Já desde agora, porém, é preciso verificar que, no ―conhecimento‖, de que fala Gênesis 4, 1, o mistério da feminilidade se manifesta e revela até ao fundo mediante a maternidade como diz o texto: “concebeu e deu à luz”. A mulher apresenta-se diante do homem como mãe, sujeito da nova vida humana, que nela é concebida e se desenvolve, e dela nasce para o mundo. Assim se revela também até ao fundo o mistério da masculinidade do homem, isto é, o significado gerador e ―paterno‖ do seu corpo2. A teologia do corpo, encerrada no Livro do Gênesis, é concisa e sóbria de palavras. Ao mesmo tempo, encontram nessa expressão conteúdos fundamentais, em certo sentido primários e definitivos. Todos se encontram a seu modo naquele ―conhecimento‖ bíblico. Diferente da do varão é a constituição da mulher; mais, sabemos hoje que é diferente até às determinantes biofisiológicas mais profundas. Manifesta-se exteriormente só em certa medida, na construção e na forma do corpo. A maternidade manifesta tal constituição dentro de si, como particular potencialidade do organismo feminino, que devido à capacidade criadora serve para a concepção e geração do ser humano, com o concurso do varão. O ―conhecimento‖ condiciona a geração. A geração é perspectiva, que o varão e a mulher inserem no ―conhecimento‖ recíproco dos dois. Por isso ultrapassa ele os limites de sujeito-objeto, quais o varão e a mulher parecem ser reciprocamente, dado indicar o ―conhecimento‖, por um lado, aquele que ―conhece‖ e, por outro, aquela que é ―conhecida‖ (ou vice-versa). Neste ―conhecimento‖ está também a consumação do matrimônio, o consummatum específico; assim se obtém a consecução da ―objetividade‖ do corpo, escondida nas potencialidades somáticas do varão e da mulher, e ao mesmo tempo a consecução da objetividade do homem

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BOLETIM ON LINE – PASTORAL FAMILIAR – CNBB/REGIONAL SUL 2 que ―é‖ este corpo. Mediante o corpo, a pessoa humana seu marido, pois diz: ―Gerei um homem com auxílio do é ―marido‖ e é ―esposa‖; ao mesmo tempo, neste ato Senhor‖. particular de ―conhecimento‖, por meio da feminilidade Não pode haver nenhuma confusão entre as esferas de e masculinidade pessoais, parece obter-se também a ação das causas. Os primeiros progenitores transmitem a descoberta da ―pura‖ subjetividade do dom: isto é, a todos os pais humanos — mesmo depois do pecado, mútua realização de si no dom. juntamente com o fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, e quase no limiar de todas as experiências A procriação faz que ―o varão e a mulher (sua esposa)‖ ―históricas‖ — a verdade fundamental acerca do nascise conheçam reciprocamente no “terceiro”, originado mento do homem à imagem de Deus, segundo as leis de ambos. Por isso, este ―conhecimento‖ torna-se des- naturais. Neste novo homem — nascido da mulher-mãe coberta, em certo sentido revelação do novo homem, no por obra do homem-pai — reproduz-se cada vez a qual ambos, varão e mulher, ainda se reconhecem a si mesma ―imagem de Deus‖, daquele Deus que formou a o homem à mesmos e no qual reconhecem a humanidade de ambos, humanidade do primeiro homem: Deus criou viii Sua imagem;… Ele os criou homem e mulher . a imagem viva de ambos. Em tudo isto, que é determinação de ambos por meio dos corpos e dos sexos, o ―conhecimento‖ inscreve um conteúdo vivo e real. PorEmbora existam profundas diferenças entre o estado de tanto, o ―conhecimento‖, em sentido bíblico, significa inocência original e o estado de pecado hereditário do que a determinação ―biológica‖ do homem, por parte do homem, aquela ―imagem de Deus‖ constitui uma base seu corpo e sexo, deixa de ser alguma coisa de passivo, de continuidade e de unidade. O ―conhecimento‖, de e atinge nível e conteúdo específicos, próprios de pessoque fala Gênesis 4, 1, é o ato que origina o ser, isto é, as autoconscientes e autodeterminantes; portanto, esse em união com o Criador, estabelece um novo homem na conhecimento comporta especial consciência do signifisua existência. O primeiro homem, na sua solidão transcado do corpo humano, ligado à paternidade e à matercendental, tomou posse do mundo visível, criado para nidade. ele, conhecendo e impondo os nomes aos seres vivos (animalia). O mesmo ―homem‖, como varão e mulher Toda a constituição exterior do corpo da mulher, o seu — conhecendo-se reciprocamente nesta específica coaspecto particular e as qualidades que, juntas à força de munidade-comunhão de pessoas, na qual o homem e a um perene atrativo, estão na origem do ―conhecimento‖, mulher se unem tão estreitamente entre si que se tornam de que fala Gênesis 4, 1-2 (―Adão uniu-se a Eva sua ―uma só carne‖ — constitui a humanidade, isto é, conmulher‖), encontram-se em união íntima com a mater- firma e renova a existência do homem como imagem de nidade. A Bíblia (e em seguida a liturgia), com a sim- Deus. Cada vez, por assim dizer, retomam ambos, hoplicidade que lhe é própria, honra e louva através dos mem e mulher, esta imagem indo buscá-la ao mistério séculos as entranhas que te trouxeram e os seios que te da criação e transmitem-na ―com a ajuda de Deus-Javé‖. amamentaramv. Constituem estas palavras elogio da As palavras do Livro do Gênesis, que são testemunho maternidade, da feminilidade e do corpo feminino na do primeiro nascimento do homem na terra, encerram sua expressão típica do amor criador. E são palavras ao mesmo tempo, em si, tudo o que se pode e deve dizer referidas no Evangelho à Mãe de Cristo, Maria, segunda da dignidade da geração humana. Eva. A primeira mulher, por sua vez, no momento em ________________ que primeiro se revelou a maturidade maternal do seu corpo, quando ―concebeu e deu à luz‖, disse: Gerei um 1 Quanto aos arquétipos, C. G. Jung descreve-os como formas ―a priori‖ de várias funções da alma: percepção de relações, homem com o auxílio do Senhorvi. fantasia criadora. As formas enchem-se de conteúdo com Estas palavras exprimem toda a profundidade teológica da função de gerar-procriar. O corpo da mulher torna-se lugar da concepção do novo homem3. No seu seio, o homem concebido assume o aspecto humano próprio, antes de ser dado ao mundo. A homogeneidade somática do homem e da mulher, que encontrou a sua primeira expressão das palavras: É o osso dos meus ossos e a carne da minha carnevii é confirmada, por sua vez, pelas palavras da primeira mulher-mãe: ―Gerei um homem‖. A primeira mulher que deu à luz tem consciência plena do mistério da criação que se renova na geração humana. E tem ainda plena consciência da participação criadora que Deus exerce na geração humana, obra sua e do

materiais da experiência. São elas como inertes, embora se encontrem carregadas de sentimento e de tendência (veja-se sobretudo: ―Die psychologischen Aspekte des Mutterarchetypus‖, Eranos 6, 1938, pp. 405-409). Segundo esta concepção, pode-se encontrar um arquétipo na mútua relação varão-mulher, relação que se baseia na realização binária e complementar do ser humano em dois sexos. O arquétipo encher-se-á de conteúdo mediante a experiência individual e coletiva, e pode movimentar a fantasia, criadora de imagens. Seria necessário precisar que o arquétipo: a) não se limita nem se exalta na relação física, mas inclui a relação do ―conhecer‖; b) está carregado de tendência: desejo-temor, dom-posse; c) o arquétipo, como proto-imagem (―Urbild‖) é gerador de imagens (―Bilder‖). O terceiro aspecto permite-nos passar à hermenêutica; em concreto, à dos textos da Escritura e da Tradição. A lin-

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BOLETIM ON LINE – PASTORAL FAMILIAR – CNBB/REGIONAL SUL 2 guagem religiosa primária é simbólica (cfr. W. Stählin, Symbolon, 1958; I. Macquarrie, God Talk, 1968; T. Fawcett, The Symbolic Language of Religion, 1970). Entre os símbolos, ela prefere alguns radicais ou exemplares, que podemos chamar arquetipais. Ora, entre estes a Bíblia usa o da relação conjugal, concretamente ao nível do ―conhecer‖ descrito.

gue logo ao nascer, desde o seio materno sois o meu Deus‖ (Sl 22, 10.11; cfr. Sl 139, 13-15).

Um dos primeiros poemas bíblicos, que aplica o arquétipo conjugal às ralações de Deus com o Seu povo, culmina no verbo comentado: ―Conhecerás o Senhor‖ (Os 2, 22: weyadaeta ‗et Yhwh; atenuado em ―Conhecerás que eu sou o Senhor‖ = wydct ky ‗ny Yhwh: Is 49, 23; 60, 16; Ez 16, 62, que são os três poemas ―conjugais‖). Daqui parte uma tradição literária, que virá a culminar na aplicação paulina de Ef 5, a Cristo e à Igreja; depois passará à tradição patrística e à dos grandes místicos (por exemplo, ―Llama de amor viva‖, de São João da Cruz).

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No tratado ―Grundzuge der Literaturund Sprachwissenschaft‖, vol. I, Munique 1976, 4ª ed., p. 462, assim se definem os arquétipos: ―Imagens e motivos arcaicos, que segundo Jung formam o conteúdo do incônscio coletivo, comum a todos os homens; apresentam símbolos, que em todos os tempos e entre todos os povos tornam vivo, de maneira imaginosa, o que para a humanidade é decisivo quanto a ideias, representações e instintos‖. Freud, quanto parece, não utiliza o conceito de arquétipo. Estabelece uma simbólica ou código de correspondências fixas entre imagens presentes-patentes e pensamentos latentes. O sentido dos símbolos é fixo, embora não único; podem ser redutíveis a um pensamento último irredutível por sua vez, que é habitualmente alguma experiência da infância. Estes são primários e de caráter sexual (mas não lhes chama arquétipos). Veja-se T. Todorov, Théories du symbole, Paris, 1977, pp. 317 s.; além disso, J. Jacoby, Komplex, Archetyp in der Psychologie C. G. Jungs, Zurique, 1957. 2 A paternidade é um dos aspectos da humanidade mais salientes na Sagrada Escritura. O texto de Gn 5, 3: ―Adão gerou um filho à sua imagem e semelhança‖ relaciona-se explicitamente com a narrativa da criação do homem (Gn 1, 27; 5, 1) e parece atribuir ao pai terrestre a participação na obra divina de transmitir a vida, e talvez mesmo naquela alegria presente na afirmação: ―Deus, vendo toda a Sua obra, considerou-a muito boa‖ (Gn 1, 31). 3 Segundo o texto de Gn 1, 26, a ―chamada‖ à existência é ao mesmo tempo transmissão da imagem e da semelhança divina. O homem deve transmitir esta imagem, continuando assim a obra de Deus. A narrativa da geração de Set sublinha este aspecto: ―Com 130 anos Adão gerou um filho à sua imagem e semelhança‖ (Gn 5, 3). Uma vez que Adão e Eva eram imagem de Deus, Set herda dos pais esta semelhança para a transmitir aos outros. Na Sagrada Escritura, porém, cada vocação está unida a uma missão; portanto a chamada à existência é já predestinação à obra de Deus: ―Antes que fosses formado no ventre de tua mãe, Eu já te conhecia; antes que saísses do seio materno, Eu te consagrei‖ (Jr 1, 5; cfr. Is 44, 1; 49, 1.5). Deus é aquele que não só chama à existência, mas sustenta e desenvolve a vida desde o primeiro momento da concepção. ―Sim, fostes Vós que me tirastes do seio materno, sois Vós o meu defensor desde o regaço da minha mãe. A Vós fui entre-

A atenção do autor bíblico centra-se no fato mesmo do dom da vida. O interesse pelo modo como isto se dá é bastante secundário e aparece só nos livros posteriores (cfr. Jó 10, 8.11; 2Mac 7, 22-23; Sb 7, 1-3).

i ii iii iv v vi vii viii

Gn 4, 1-2. Gn 1, 27; 2, 23. Gn 3, 20. Gn 3, 10. Lc 11, 27. Gn 4, 1. Gn 2, 23. Gn 1, 27.

22ª. Catequese 26 de Março de 1980

O ciclo do conhecimento-geração e a perspectiva da morte

Aproxima-se do fim o ciclo de reflexões com que procuramos seguir a observação de Cristo que nos foi transmitida por Mateusi e Marcosii: Não lestes que o Criador, desde o princípio, os fez homem e mulher e disse: “Por isso, o homem deixará o pai e a mãe, e unir-se-á à sua mulher, e serão os dois uma só carne?”iii.A união conjugal, no Livro do Gênesis, é definida como ―conhecimento‖: Adão conheceu Eva, sua mulher. Ela concebeu e deu à luz… e disse: “Gerei um homem com o auxílio do Senhor”iv. Procuramos já, nas nossas precedentes meditações, esclarecer o conteúdo daquele ―conhecimento‖ bíblico. Com ele o homem, isto é, o varão e a mulher, não só impõe o próprio nome, como fez impondo os nomes a outros seres vivos (animalia) tomando assim posse deles, mas ―conhece‖ no sentido de Gênesis 4, 1 (e doutras passagens da Bíblia), isto é, realiza o que o nome ―homem‖ exprime: realiza a humanidade no novo homem gerado. Em certo sentido, portanto, realiza-se a si mesmo, quer dizer, o homem-pessoa. Deste modo, fecha-se o ciclo bíblico do “conhecimento-geração”. Este ciclo do ―conhecimento‖ é constituído pela união das pessoas no amor, que lhes permite unirem-se tão intimamente entre si que se tornam uma só carne. O Livro do Gênesis revela-nos plenamente a verdade deste ciclo. O homem, varão e mulher, que, mediante o ―conhecimento‖ de que fala a Bíblia, concebe e gera um ser novo, semelhante a ele, a quem pode impor o nome de ―homem‖ (―gerei um homem‖), toma, por assim dizer, posse da humanidade mesma, ou melhor, retoma-a em posse. Todavia, isto acontece de modo

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diverso de quando tomou posse de todos os outros seres vivos (animalia), de quando lhes impôs o nome. Com efeito, então tinha-se ele tornado o senhor deles, tinha começado a cumprir o conteúdo do mandato do Criador: Enchei e dominai a terrav.

ele tinha ouvido as palavras da sentença, que determinava toda a perspectiva da existência humana ―dentro‖ do conhecimento do bem e do mal. Esta perspectiva é confirmada pelas palavras: Voltarás à terra de que foste criado; porque tu és pó e em pó te hás de tornarx.

Pelo contrário, a primeira parte do mesmo mandato crescei e multiplicai-vos, enchei a terravi encerra outro conteúdo e indica outro elemento. O varão e a mulher neste ―conhecimento‖, em que dão início a um ser semelhante a eles, do qual podem ambos dizer, é o osso dos meus ossos e a carne da minha carnevii, são quase juntamente ―raptados‖, juntamente colocados ambos de posse da humanidade que eles, na união e no ―conhecimento‖ recíproco, querem exprimir novamente, tomar novamente de posse, tirando-a deles mesmos, da própria humanidade, da admirável maturidade masculina e feminina dos seus corpos e enfim — através de toda a sequência das concepções e das gerações humanas desde o princípio — do mistério mesmo do Criador.

O caráter radical dessa sentença é confirmado pela evidência das experiências de toda a história terrena do homem. O horizonte da morte estende-se a toda a perspectiva da vida humana sobre a terra, vida que foi inserida naquele original ciclo bíblico do ―conhecimento-geração‖. O homem que violou a aliança com o seu Criador, colhendo o fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, é por Deus-Javé apartado da árvore da vida: Agora é preciso que ele não estenda a mão para se apoderar também do fruto da árvore da vida, comendo do qual, viva eternamentexi. Deste modo, a vida dada ao homem no mistério da criação não foi tirada, mas restringida pelo limite das concepções, dos nascimentos e da morte, e além disso agravada pela perspectiva da pecaminosidade hereditária; é-lhe, porém, em certo sentido, novamente dada como encargo, no mesmo ciclo sempre a repetir-se. A frase Adão uniu-se a (“conheceu”) Eva, sua mulher. Ela concebeu e deu à luzxii é como selo impresso na revelação original do corpo no ―princípio‖ mesmo da história do homem sobre a terra. Esta história forma-se sempre de novo na sua dimensão mais fundamental quase desde o ―princípio‖, mediante o mesmo ―conhecimento-geração‖, de que fala o Livro do Gênesis.

Neste sentido, pode-se explicar o “conhecimento” bíblico como “posse”. É possível ver nela algum equivalente bíblico do eros? Trata-se aqui de dois âmbitos conceituais, de duas linguagens: bíblica e platônica; só com grande cautela podem elas ser interpretadas uma pela outra1. Parece, ao contrário, que na revelação original não está presente a ideia da posse da mulher por parte do homem, ou viceversa, como de um objeto. Por outro lado, é sabido que, baseados na pecaminosidade contraída depois do pecado original, o homem e a mulher devem reconstruir, com canseiras, o significado do dom recíproco desinteressado. Este será o tema das nossas próximas análises. A revelação do corpo, encerrada no Livro do Gênesis, especialmente no capítulo 3º, mostra com impressionante evidência que o ciclo do ―conhecimento-geração‖, tão profundamente radicado na potencialidade do corpo humano, foi submetido, depois do pecado, à lei do sofrimento e da morte. Deus-Javé diz à mulher: Aumentarei os sofrimentos da tua gravidez, os teus filhos hão de nascer entre doresviii. O horizonte da morte abre-se diante do homem, juntamente com a revelação do significado generativo do corpo no ato do ―conhecimento‖ recíproco dos cônjuges. E eis que o primeiro homem, varão, impõe à sua mulher o nome de Eva, porque ela seria mãe de todos os vivosix, quando já

E assim cada homem traz em si o mistério do seu ―princípio‖ intimamente ligado à consciência do significado generativo do corpo. Gênesis 4, 1-2 parece calar-se sobre o tema da relação que medeia entre o significado generativo e o significado esponsal do corpo. Talvez agora nem seja tempo nem haja lugar para esclarecer esta relação, embora na futura análise isso pareça indispensável. Será necessário, então, levantar de novo as perguntas relacionadas com o aparecimento da vergonha no homem, vergonha da sua masculinidade e da sua feminilidade, anteriormente não experimentada. Neste momento, todavia, isto passa para segunda ordem. No primeiro plano mantém-se, na verdade, o fato de ―Adão se ter unido (―conhecido‖) a Eva, sua mulher e ela ter concebido e dado à luz‖. Este é verdadeiramente o limiar da história do homem. É o seu ―princípio‖ na terra. Sobre este limiar o homem, como varão e mulher, tem a consciência do

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estado generativo do próprio corpo: a masculinidade encerra em si o significado da paternidade e a feminilidade o da maternidade. Em nome deste significado, um dia dará Cristo resposta categórica à pergunta que lhe fizeram os fariseusxiii. Nós, todavia, penetrando o simples conteúdo desta resposta, procuramos ao mesmo tempo pôr em realce o contexto daquele ―princípio‖, a que se referiu Cristo. Nele mergulha as raízes a teologia do corpo. A consciência do significado do corpo e a consciência do seu significado generativo tomam contato, no homem, com a consciência da morte, de que trazem em si, por assim dizer, o inevitável horizonte. Todavia, sempre volta na história do homem o ciclo do ―conhecimento-geração‖, em que a vida luta, sempre de novo, com a inexorável perspectiva da morte, e sempre a domina. É como se a razão desta inflexibilidade da vida, que se manifesta na “geração”, fosse sempre o mesmo “conhecimento”, com que o homem ultrapassa a solidão do próprio ser e, mais ainda, de novo se decide a afirmar tal ser num ―outro‖. E ambos, homem e mulher, o afirmam no novo homem gerado. Nesta afirmação, o ―conhecimento‖ bíblico parece adquirir uma dimensão ainda maior. Isto é, parece inserir-se naquela ―visão‖ de Deus mesmo, com que termina a primeira narrativa da criação do homem acerca do ―varão‖ e da ―mulher‖ feitos ―à imagem de Deus‖: Deus, vendo toda a sua obra, considerou-a muito boaxiv. O homem, não obstante todas as experiências da própria vida, não obstante os sofrimentos, as desilusões de si mesmo, a sua pecaminosidade, e não obstante, enfim, a perspectiva inevitável da morte, coloca todavia sempre de novo o ―conhecimento‖ no ―início‖ da ―geração‖; ele, assim, dir-seia que participa naquela primeira ―visão‖ de Deus mesmo. Deus Criador ―viu…, e toda a sua obra a considerou muito boa‖. E, sempre de novo, confirma ele a verdade destas palavras. _______________ 1 Segundo Platão, o eros é o amor sedento do Belo transcendente e exprime a insaciabilidade tendente ao seu eterno objeto; eleva, portanto, sempre o que é humano para o divino, que é o único a ser capaz de saciar a ansiedade da alma aprisionada na matéria; é amor que não recua diante do maior esforço, para atingir o êxtase da união; portanto é amor egocêntrico, é cobiça, embora dirigida para valores sublimes (cfr. A. Nygren, Erôs et Agapé, Paris 1951, vol. II, pp. 9-10). No decorrer dos séculos, através de muitas transformações, o si-gnificado do eros foi abaixado até assumir notas meramente sexuais. Característico é, a este propósito, o texto de P. Chauchard, que parece mesmo negar ao eros as características do amor humano:

―La cérébralisation de la sexualité ne réside pas dans les trucs techniques ennuyeux, mais dans la pleine reconnaissance de la spiritualité, du fait qu‘Erôs n‘est humain qu‘animé par Agapé et qu‘Agapé exige l‘incarnation dans Erôs‖ (P. Chauchard, Vices des vertus, vertus des vices, Paris 1963, p. 147). A comparação do ―conhecimento‖ bíblico com o eros platônico revela a divergência das duas concepções. A concepção platônica baseia-se na ansiedade do Belo transcendente e na fuga da matéria; a concepção bíblica, pelo contrário, dirige-se à realidade concreta e alheia-se do dualismo do espírito e da matéria, como também da hostilidade específica contra a matéria (―E Deus viu que isto era bom‖: Gn 1, 10.12.18.21.25). Ao passo que o conceito platônico de eros ultrapassa o alcance bíblico do ―conhecimento‖ humano, o conceito contemporâneo parece demasiado restrito. O ―conhecimento‖ bíblico não se limita a satisfazer o instinto ou o gozo hedonístico, mas é ato plenamente humano, dirigido conscientemente para a procriação, e é também a expressão do amor interpessoal (cfr. Gn 29, 20; 1Sm 1, 8; 2Sm 12, 24).

________________ i ii iii iv v vi vii viii ix x xi xii xiii xiv

Mt 19, 3-9. Mc 10, 1-12. Mt 19, 4-5. Gn 4, 1. Cfr. Gn 1, 28. Gn 1, 28. Gn 2, 24. Gn 3, 16. Gn 3, 20. Gn 3, 19. Gn 3, 22. Gn 4, 1. Mt 19; Mc 10. Gn 1, 31.

7 23ª. Catequese 2 de Abril de 1980

As interrogações sobre o matrimônio na visão integral do homem

O Evangelho segundo Mateus e o Evangelho segundo Marcos apresentam-nos a resposta dada por Cristo aos fariseus, quando eles O interrogaram acerca da indissolubilidade do matrimônio, referindo-se à lei de Moisés que admitia, em certos casos, a prática do chamado libelo de repúdio. Recordando-lhes os primeiros capítulos do Livro do Gênesis, Cristo respondeu: ―Não lestes que o Criador, desde o princípio, fê-los homem e mulher e disse: ‗Por isso, o homem deixará o pai e a mãe, e se unirá à sua mulher, e serão os dois uma só carne? Portanto, já não são dois, mas uma só carne. Pois bem, o que Deus uniu, não o separe o homem‘‖. Depois, referindo-se à pergunta deles sobre a lei de Moisés, Cristo acrescentou: Por causa da dureza do vosso coração, Moisés permitiu que repudiásseis as vossas mulheres; mas ao princípio não foi assimi. Na

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sua resposta Cristo referiu-se duas vezes ao ―princípio‖, pelo que também nós, no decurso das nossas análises, procuramos esclarecer do modo mais profundo possível o significado desse ―princípio‖, que é a primeira herança de cada ser humano no mundo, homem e mulher, primeira certidão da identidade humana segundo a palavra revelada, primeira fonte da certeza da sua vocação como pessoa criada à imagem do próprio Deus. A resposta de Cristo tem um significado histórico — mas não apenas histórico. Os homens de todos os tempos fazem esta interrogação sobre o mesmo tema. Fazem-na também os nossos contemporâneos que, porém, nas suas perguntas não se referem à lei de Moisés, que admitia o libelo de repúdio, mas a outras circunstâncias e leis. Estas suas interrogações estão carregadas de problemas, desconhecidos aos interlocutores do tempo de Cristo. Sabemos as perguntas a propósito do matrimônio e da família que foram dirigidas no último Concílio, ao Papa Paulo VI, e que são continuamente formuladas no período pós-conciliar, dia a dia, nas mais diversas circunstâncias. Formulam-nas as pessoas individualmente, casais, noivos, jovens, e também escritores, jornalistas, políticos, economistas, demógrafos, enfim — a cultura e a civilização contemporânea. Penso que entre as respostas que Cristo daria aos homens do nosso tempo e às suas interrogações, muitas vezes tão impacientes, seria ainda fundamental a que deu aos fariseus. Respondendo àquelas interrogações, Cristo referir-se-ia, antes de mais, ao “princípio”. Fá-lo-ia talvez de modo ainda mais decidido e essencial, dado que a situação interior e, ao mesmo tempo, cultural do homem de hoje parece afastar-se daquele ―princípio‖ e assumir formas e dimensões que divergem da imagem bíblica do ―princípio‖ em pontos evidentemente cada vez mais distantes. Todavia, Cristo não ficaria ―surpreendido‖ com nenhuma destas situações, e suponho que continuaria a referir-se sobretudo ao ―princípio‖. É por isto que a resposta de Cristo exigia uma análise particularmente profunda. De fato, naquela resposta foram recordadas verdades fundamentais e elementares sobre o ser humano, como homem e mulher. É a resposta através da qual entrevemos a própria estrutura da identidade humana nas dimensões do mistério da criação e, ao mesmo tempo, na perspectiva do mistério da redenção. Sem isto não

se pode construir uma antropologia teológica e, no seu contexto, uma ―teologia do corpo‖, da qual tenha origem também a visão, plenamente cristã, do matrimônio e da família. Isto foi salientado por Paulo VI, quando na sua encíclica dedicada aos problemas do matrimônio e da procriação, no seu significado humana e cristãmente responsável, se referiu à ―visão integral do homem‖ii. Pode-se dizer que, na resposta aos fariseus, Cristo revelou aos interlocutores também esta ―visão integral do homem‖, sem a qual não pode ser dada nenhuma resposta adequada às interrogações relacionadas com o matrimônio e com a procriação. Precisamente esta visão integral do homem deve ser construída desde o ―princípio‖. Isto é igualmente válido para a mentalidade contemporânea, tal como o era, se bem que de modo diferente, para os interlocutores de Cristo. Com efeito, somos filhos de uma época em que, para o desenvolvimento de várias disciplinas, esta visão integral do homem pode ser facilmente rejeitada e substituída por múltiplas concepções parciais que, detendo-se sobre um ou outro aspecto do compositum humanum, não atingem o integrum do homem, ou deixam-no fora do próprio campo visual. Nelas, inserem-se diversas tendências culturais que — baseadas nestas verdades parciais — formulam as suas propostas e indicações práticas sobre o comportamento humano e, ainda com maior frequência, sobre como comportar-se com o “homem”. O homem torna-se, então, mais um objeto de determinadas técnicas do que sujeito responsável da própria ação. A resposta dada por Cristo aos fariseus quer também que o homem, varão e mulher, seja esse sujeito, isto é, um sujeito que decida as próprias ações à luz da verdade integral sobre si mesmo, enquanto verdade original, ou seja, fundamento das experiências autenticamente humanas. É esta a verdade que Cristo nos faz haurir do ―princípio‖. Referimo-nos assim aos primeiros capítulos do Livro do Gênesis. O estudo destes capítulos, talvez mais do que o de outros, torna-nos conscientes do significado e da necessidade da ―teologia do corpo‖. O ―princípio‖ diz-nos relativamente pouco sobre o corpo humano, no sentido naturalista e contemporâneo da palavra. Sob este ponto de vista encontramo-nos, no presente estudo, a um nível totalmente pré-científico. Não sabemos quase nada sobre as estruturas internas e sobre os métodos que regulam o organismo humano. Todavia, ao mesmo tempo — talvez precisa-

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BOLETIM ON LINE – PASTORAL FAMILIAR – CNBB/REGIONAL SUL 2 capítulos do livro do Gênesis, o conteúdo da própria vida e do próprio comportamento. Com efeito, quanto é indispensável, no caminho desta vocação, a profunda consciência do significado do corpo, na sua masculinidade e feminilidade quanto é necessária uma precisa consciência do significado esponsal do corpo, do seu significado gerador — dado que tudo isto, que forma o conteúdo da vida dos esposos, deve encontrar constantemente a sua dimensão plena e pessoal na convivência, no comportamento e nos sentimentos! E isto, ainda mais no contexto de uma civilização que permanece sob a pressão de um modo de pensar e de julgar materialista e utilitário. A biofisiologia contemporânea pode oferecer muitas informações precisas sobre a sexualidade humana. Todavia, o conhecimento da dignidade pessoal do corpo humano e do sexo, pode ser obtido ainda noutras fontes. Uma fonte particular é a palavra do próprio Deus, que contém a revelação do corpo, a que remonta ao ―princípio‖.

mente devido à antiguidade do texto — a verdade importante para a visão integral do homem revelase de modo mais simples e pleno. Esta verdade diz respeito ao significado do corpo humano na estrutura do sujeito pessoal. Em seguida, a reflexão sobre estes textos arcaicos permite-nos estender esse significado a toda a esfera da intersubjetividade humana, em especial na permanente relação homem-mulher. Graças a isto, adquirimos, a respeito desta relação, uma ótica que devemos necessariamente colocar na base de toda a ciência contemporânea acerca da sexualidade humana, em sentido biofisiológico. Isto não quer dizer que devemos renunciar a esta ciência ou privar-nos dos seus resultados. Pelo contrário: se eles devem servir para nos ensinar alguma coisa sobre a educação do homem, na sua masculinidade e feminilidade e sobre a esfera do matrimônio e da procriação, é necessário — através de cada um dos elementos da ciência contemporânea — chegar sempre ao que é fundamental e essencialmente pessoal, tanto em cada indivíduo — homem ou mulher — como nas suas relações recíprocas. E é precisamente neste ponto que a reflexão sobre o arcaico texto do Gênesis se revela insubstituível. Ele constitui realmente o ―princípio‖ da teologia do corpo. O fato de a teologia compreender também o corpo não deve maravilhar nem surpreender ninguém que seja consciente do mistério e da realidade da Encarnação. Pelo fato de o Verbo de Deus se ter feito carne, o corpo entrou, eu diria, pela porta principal da teologia, isto é, na ciência que tem por objeto a divindade. A encarnação — e a redenção que dela provém — tornou-se também a fonte definitiva da sacramentalidade do matrimônio de que, em tempo oportuno, trataremos mais amplamente.

As interrogações feitas pelo homem contemporâneo são também as dos cristãos: daqueles que se preparam para o Sacramento do Matrimônio ou daqueles que já contraíram o matrimônio, que é o sacramento da Igreja. Estas não são apenas as perguntas das ciências mas, mais ainda, as perguntas da vida humana. Muitos homens e muitos cristãos procuram no matrimônio a realização da própria vocação. Muitos querem encontrar nele o caminho da salvação e da santidade. Para eles é particularmente importante a resposta dada por Cristo aos fariseus, zeladores do Antigo Testamento. Aqueles que procuram a realização da própria vocação humana e cristã no matrimônio são chamados, antes de mais, a fazer desta ―teologia do corpo‖, cujo ―princípio‖ encontramos nos primeiros

Quanto é significativo que Cristo, na resposta a todas estas perguntas, ordene ao homem que retorne, de certo modo, ao início da sua história teológica! Ordena-lhe que se coloque no limite entre a inocênciafelicidade original e a herança da primeira queda. Porventura não lhe quererá dizer, deste modo, que o caminho por onde Ele conduz o homem, varão e mulher, no Sacramento do Matrimônio, isto é o caminho da ―redenção do corpo‖, deve consistir em recuperar esta dignidade em que se realiza, simultaneamente, o verdadeiro significado do corpo humano, o seu significado pessoal e ―de comunhão‖? Terminemos, por ora, a primeira parte das nossas meditações dedicadas a este tema tão importante. Para dar uma resposta mais completa às nossas perguntas, por vezes ansiosas, sobre o matrimônio — ou ainda mais exatamente: sobre o significado do corpo — não podemos deter-nos apenas sobre aquilo que Cristo respondeu aos fariseus, fazendo referência ao ―princípio‖iii. Devemos tomar também em consideração todas as suas outras afirmações, entre as quais sobressaem, de modo especial, duas, de caráter particularmente sintético: a primeira, do Sermão da Montanha, a propósito das possibilidades do coração humano em relação a concupiscência do corpoiv, e a segunda, quando Jesus se referiu à ressurreição futurav. Pensamos fazer destes dois enunciados o objeto das nossas ulteriores reflexões. __________________________ i Mt 19, 3ss.; Mc 12, 2ss. ii iii iv v

Humanae vitae, 7. Cfr. Mt 19, 3ss.; Mc 10, 2ss. Cfr. Mt 5, 8. Cfr. Mt 22, 24-30; Mc 12, 18-27; Lc 20, 27-36.

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Juares Celso Krum Diácono Permanente, Bacharel e Mestre em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná PUCPR

verdadeiro matrimônio e que sejam juridicamente hábeis, não observam as formalidades da lei. Há ―Agora ficou mais fácil „anular‟ o casamento!‖. falta de forma. Muitos veículos de comunicação têm dado esta Esse grupo de motivos continua valendo para esclanotícia. Assim, dessa forma É lamentável que isso recer a validade ou não de um matrimônio, e orienesteja acontecendo. Seria sensacionalismo, má fé tar o processo de declaração de nulidade junto ao ou falta de informação? Tribunal Eclesiástico, seja na forma em vigor até Muito bem, vamos aos fatos, àquilo que a Igreja ensina. então ou a partir de 8 de dezembro de 2015 data em Se os noivos celebram o matrimônio com o livre con- que passa a valer as alterações que estão no motu sentimento e segundo as normas da Igreja católica, próprio Mitis Iudex Dominus Iesus do Papa Franele não pode ser anulado, porque é indissolúvel e cisco. nem a Igreja tem o poder de anulá-lo. Você pode conferir no Código de Direito Canônico, Porém, pode ocorrer que o matrimônio não tenha os impedimentos dirimentes nos cânones 1083 a sido válido, e aí, sim, a Igreja, por meio do Tribu- 1094, os cânones 1095 a 1107 para o consentimennal Eclesiástico, pode dar uma sentença de decla- to matrimonial e a forma de celebração do matriração de nulidade do matrimônio, ou seja, declarar mônio nos cânones 1108 a 1123. Além, é claro, dos que ele nunca existiu. demais cânones que tratam do matrimônio, no TítuPara que um matrimônio seja válido, é preciso que: lo VII, cân. 1055 até o cân. 1165. a) haja consentimento dos noivos; b) ele seja dado Comissão Especial sobre o Matrimônio por pessoas juridicamente hábeis; c) ele seja manifestado legitimamente, quer dizer, na forma previs- Em 27 de agosto de 2014, o Papa Francisco assinou ta pela lei. Se faltar um desses três requisitos não have- o ato de criação de uma Comissão Especial de estudo para a reforma do processo matrimonial, rá um verdadeiro matrimônio, ele é inválido ou nulo. tendo como presidente o Decano do Tribunal da Temos, portanto, três grupos de motivos pelos Rota Romana Dom Pio Vito Pinto e pelos seguintes quais o matrimônio pode ser nulo: 1) se as pessoas, membros: Cardeal Francesco Coccopalmerio, Prenão obstante as aparências, não querem casar ver- sidente do Pontifício Conselho para os Textos Ledadeiramente. Falta o consentimento matrimonial; gislativos; Dom Luis Francisco Ladaria Ferrer, 2) se as pessoas mesmo querendo casar, não são Secretário da Congregação para a Doutrina da Fé; juridicamente hábeis, ou seja, possuem um impe- Dom Dimitrios Salachas, Exarca Apostólico para dimento legal para celebrar um verdadeiro matri- os católicos gregos de rito bizantino; o Rev. Mons. mônio. Há um impedimento dirimente e 3) mesmo Maurice Monier, Leo Xavier Michael Arokiaraj e que se trate de duas pessoas que querem contrair Alejandro W. Bunge, Prelados Auditores do Tribu-

Como assim?

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nal da Rota Romana; o Rev. Nikolaus Schöch, O.F.M., Promotor Substituto do Supremo Tribunal da Signatura Apostólica; o Rev. P. Konštanc Miroslav Adam, OP, Reitor da Pontifícia Universidade de São Tomás de Aquino (Angelicum); o Rev. P. Espinoza Jorge Horta, OFM, Decano da Faculdade de Direito Canônico da Pontifícia Università Antonianum; e o Prof. Paolo Moneta, ex-professor de Direito Canônico na Universidade de Pisa.

A III Assembleia Extraordinária Fruto da III Assembleia Extraordinária do Sínodo dos Bispos realizada de 5 a 19 de outubro de 2014 ficou registrado entre os mais de sessenta parágrafos do Relatório Final que: ―numerosos Padres sinodais sublinharam a necessidade de tornar mais acessíveis e céleres, se possível totalmente gratuitos, os procedimentos para o reconhecimento dos casos de nulidade. Entre as propostas foram indicados: a superação da necessidade da dupla sentença conforme; a possibilidade de determinar um percurso administrativo sob a responsabilidade do bispo diocesano; a iniciação de um processo sumário nos casos de nulidade notória. Todavia, alguns Padres sinodais afirmam que são contrários a tais propostas, porque não garantiriam um juízo confiável. É necessário reiterar que em todos estes casos se trata de averiguar a verdade sobre a validade do vínculo. Em conformidade com outras propostas, também seria preciso considerar a possibilidade de dar relevância ao papel da fé dos nubentes em ordem à validade do sacramento do matrimônio, conscientes de que entre os batizados todos os matrimônios válidos constituem um sacramento‖ (Relatio Synodi, n. 48). E que ―a propósito das causas matrimoniais, a simplificação do procedimento, exigida por muitos, além da preparação de suficientes agentes, clérigos e leigos com dedicação prioritária, requer que se realce a responsabilidade do bispo diocesano, que na sua diocese poderia encarregar consultores devidamente preparados, para aconselhar gratuitamente as partes interessadas sobre a validade do próprio matrimônio. Esta função pode ser desempenhada por um gabinete ou por pessoas qualificadas (cf. Dignitas Connubii, art. 113, 1)‖ (Relatio Synodi, n.49).

O Instrumentum laboris 2015

Ficou evidente a importância e a necessidade da simplificação dos processos de nulidade, o que fez que ambos os parágrafos fossem incluídos ipsis literis no Instrumentum laboris (23/jun/2015) para a XIV Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, tendo nele recebido os números 114 e 116 respectivamente. Além da inserção dos números 115 e 117 complementando os argumentos para este mesmo tema.

Mitis Iudex Dominus Iesus A caminhada feita para agilizar os processos de nulidade matrimonial que começaram com a Comissão Especial em 27 de agosto de 2014, os parágrafos 48 e 49 da Relatio Synodi em 18/10/14 com uma votação favorável de 78% e 84% respectivamente e os parágrafos 114 e 116 do Instrumentum laboris para a XIV Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos de 23 de junho de 2015 indicavam a premência de um caminho para agilizar os processos de declaração de nulidade matrimonial. Na terça-feira, 8 de setembro de 2015, foram apresentados na Sala de Imprensa da Santa Sé as principais mudanças nos processos de nulidade matrimonial, por meio de dois documentos datados de 15 de agosto de 2015: ‗Mitis Iudex Dominus Iesus‘ (Senhor Jesus, meigo juiz) e ‗Mitis et misericors Iesus‘ (Jesus, meigo e misericordioso), este último para as Igrejas orientais. O próprio documento do papa fala por si só. Assinalaram-se alguns critérios fundamentais que nortearam o trabalho de reforma. I. – Uma só sentença em favor da nulidade executiva. - Pareceu apropriado, em primeiro lugar, que não seja mais necessária uma “dupla sentença conforme‖ a favor da nulidade do matrimônio, a fim de que as partes tenham direito a um novo casamento canônico, mas que seja suficiente a certeza moral alcançada pelo primeiro tribunal em conformidade com o direito.

II. – O juiz único sob a responsabilidade do bispo. - A nomeação do juiz monocrático, clérigo, em primeira instância, sob a responsabilidade O resultado favorável da votação final para esses do bispo que, no exercício pastoral do próprio poder judiciário, deverá garantir que não ocorra ladois parágrafos foi de um porcentual significativo: xismo. Parágrafo

SIM

NÃO

ABS

%

48

143

35

05

78,14

49

154

23

06

84,15

III. – O próprio bispo é juiz. - Para se traduzir na prática o ensinamento do Concílio Vaticano II em um âmbito de grande importância, decidiu-se deixar claro que o próprio bispo na sua Igreja

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© by Juares Celso Krum

particular, da qual ele é constituído pastor e dirigente, é, por isso mesmo, juiz entre os fiéis confiados a ele. Espera-se que, tanto nas grandes quanto nas pequenas dioceses, o próprio bispo ofereça um sinal da conversão das estruturas eclesiásticas e não delegue completamente as funções jurisdicionais em matéria matrimonial. Isso se aplica especialmente ao processo mais breve, estabelecido para resolver os casos mais evidentes de nulidade.

IV. – O processo mais breve. – De fato, além de tornar o processo mais ágil, estatui-se uma forma de processo mais breve - além do documental atualmente em vigor - a ser aplicada nos casos em que a nulidade se apoia em argumentos particularmente evidentes. Não me escapou, contudo, como um procedimento abreviado possa colocar em perigo o princípio da indissolubilidade do matrimônio; exatamente por isso eu quis que em tal processo o próprio bispo fosse constituído como juiz, pois, por força de seu ofício pastoral, é, com Pedro, o maior fiador da unidade católica na fé e na disciplina.

VI. – A competência específica das conferências episcopais. - As conferências episcopais, que devem se pautar especialmente pelo ardor apostólico em reunir os fiéis dispersos, observem fortemente o dever de compartilhar a mencionada conversão, prestigiando o direito dos bispos de organizarem o poder judiciário na própria Igreja particular. A restauração da proximidade entre os juízes e os fiéis, de fato, não será bem-sucedida, se as conferências não oferecerem aos bispos o estímulo e a ajuda para pôr em prática a reforma do processo matrimonial. Juntamente com a proximidade dos juízes, tanto quanto possível, cuidem as conferências episcopais, salvo as justas e dignas remunerações dos membros dos tribunais, que se assegure a gratuidade dos processos, porque a Igreja, mostrando-se aos fiéis mãe generosa em um tema estritamente ligado à salvação das almas, manifesta o amor gratuito de Cristo, pelo qual todos somos salvos.

VII. – O apelo à Sé Apostólica. – Convém, no entanto, que se conserve a apelação ao tribunal ordinário da sé apostólica, que é a Rota Romana, em razão de um princípio legal antigo, o qual reforça o vínculo entre a sé de Pedro e as Igrejas particulares, tomando-se cuidado, todavia, na disciplina V. – O recurso para a sé metropolitana. - Con- de tais apelos, a fim de conter quaisquer abusos ao vém que se restaure a apelação ao metropolita, uma direito, para que não haja dano à salvação das alvez que o cargo de moderador da província ecle- mas. siástica, estável ao longo dos séculos, é um sinal O regimento da Rota Romana será, o mais breve distintivo da colegialidade na Igreja. possível, adaptado às regras do processo reformado, nos limites do que for necessário. OUTUBRO DE 2015

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A participação das paróquias O canonista Edson Sampel destaca em artigo publicado no dia 25 de setembro em Zenit (cf. nosso Boletim Expresso 1592 de 26/09/2015, p.1) que há previsão no art. 2º das Regras Procedimentais do motu próprio Mitis Iudex Dominus Iesus de engajamento das paróquias na “investigação” de relações matrimoniais conflitantes. Ou seja, é um exame da possível nulidade que deverá ser feito antes da abertura do processo, por outros clérigos, consagrados ou mesmo leigos com a aprovação do ordinário do lugar.

próprios cônjuges ou pelo patrono em face do tribunal competente”.

O supremo legislador realmente valoriza essa nova forma pré-processual de se aferir, na paróquia, o “fumus boni iuris” (o fumo ou a fumaça do bom direito), ou seja, o indício da nulidade do sacramento, visto que o “motu proprio” propõe até mesmo a redação de um vademecum, para orientar o trabalho dos agentes de pastoral envolvidos na investigação (art. 3.º das Regras Procedimentais). A investigação extrajudicial será meio caminho andado para o êxito do processo, porque tal investigação se encerra com “o A análise, de acordo com o art. 3º, deverá acon- libelo a ser apresentado, se for o caso, ao tributecer no âmbito da pastoral matrimonial dioce- nal competente” (art. 5.º das Regras Procedisana por fiéis idôneos, dotados de competência mentais). não exclusivamente jurídico-canônica. Entre essas pessoas, esteja em primeiro lugar o pároco pró- Estamos, neste momento, no período denomiprio ou quem preparou os cônjuges para a celebra- nado de “vacatio legis”, que é um tempo concedido pelo supremo legislador para as adaptações ção das núpcias. necessárias ao fiel cumprimento da lei. RealO “motu proprio” sugere uma estrutura diocesamente, o tempo é exíguo para tanta novidade. na estável para a execução desse serviço de inTodavia, com calma e prudência, os bispos sabevestigação dos casos concretos. O art. 4.º das rão pôr em prática a nova legislação, erigindo Regras Procedimentais reza que a investigação essas instâncias paroquiais de aconselhamento. tem por objetivo coletar os elementos úteis para uma eventual propositura do processo, “pelos

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14 Nos dias 19 e 20 de setembro foi realizado o 11º Retiro Diocesano para casais que vivem em Segunda União promovido pela comissão diocesana de Pastoral Familiar e pela paróquia Nossa Senhora Auxiliadora de Piraquara. O retiro aconteceu na Escola Social Sagrado Coração de Jesus em Piraquara com a participação de 28 casais em segunda união e 7 casais pilotos que irão acompanhar os casais em Segunda União com reuniões mensais e em seguida inseri-los nas comunidades.

se separados da igreja, devendo enquanto batizados, participar de sua vida. Teve também como propósito apresentar um Deus que é puro Amor, cheio de misericórdia, que ama tanto o justo como o pecador, e que está sempre pronto a perdoar. Visa igualmente, integrar esses casais na comunidade paroquial, estimulando-os a participar de suas atividades. A igreja deve rezar por eles, encorajando-os e se mostrando uma Mãe misericordiosa, sustentando na fé e na esperança.

Além de casais da paróquia Nossa Senhora Auxiliadora participaram casais das paróquias Nossa Senhora Aparecida do Guatupê, Nossa Senhora dos Remédios de Araucária, Paróquia São José (Catedral), Paróquia São Pedro e, Paróquia Nossa Senhora do Monte Claro de São José dos Pinhais além de dois casais da cidade de Palmeira e um casal de Curitiba. O retiro teve por objetivo acolher os casais em Segunda União que não devem sentirOUTUBRO DE 2015


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PASTORAL FAMILIAR DIOCESE DE SÃO JOSÉ DOS PINHAIS

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16 Nossa Senhora abre o Seu coração Maternal a São Domingos e lhe faz estas promessas para quem rezar devotamente seu Rosário todos os dias:

7. Os verdadeiros devotos do meu Rosário não morrerão sem antes receber os sacramentos;

1. Quem me servir constantemente rezando o Rosário, receberá uma graça especial;

8. Os que rezarem meu Rosário terão em vida na morte e na luz e a plenitude da graça, serão admitidos à participação dos méritos dos santos;

2. Aos que rezarem devotamente o Rosário prometo minha especialíssima proteção e graça;

9. Os devotos do meu Rosário que forem para o purgatório, Eu os libertarei no mesmo dia;

3. Será arma poderosíssima contra o inferno, destruirá os vícios, os pecados e abaterá as heresias;

10. Eles terão grande Glória no céu;

4. O Rosário fará florescer as virtudes e as boas obras, atrairá às almas copiosas bênçãos de Deus, e substituirá o amor pelas coisas terrenas e mundanas pelo amor de Deus; 5. A alma que por meio do Rosário recorrer a mim não perecerá; 6. Todo aquele que rezar devotamente o Rosário contemplando os mistérios, não será oprimido pelas desgraças, não será castigado pelas justiças de Deus e não morrerá de morte repentina, mas se converterá se for pecador, se conservará na graça se for justo e se fará digno da vida eterna;

11. Tudo o que for pedido pelo Rosário será concedido; 12. Os que propagarem o meu Rosário, serão por mim socorridos em todas as necessidades; 13. Eu alcançarei de Meu Filho que todos os devotos do Rosário tenham por irmãos toda a corte celeste em vida e na morte; 14. Todos os que recitam o meu Rosário são meus filhos e irmãos de Jesus Cristo, meu Unigênito; 15. A devoção de meu Rosário, é um grande sinal de salvação.

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Além disso, devido ao seu caráter meditativo com a serena sucessão das ―Ave Marias‖, exerce uma ação pacificadora sobre quem o reza, predispondo-o a receber e experimentar no mais fundo de si mesmo e a espalhar ao seu redor aquela paz verdadeira que é um dom especial do Ressuscitado (cf. Jo 14, 27; 20, 21).

A Igreja reconheceu sempre uma eficácia particular ao Rosário, confiando-lhe, mediante a sua recitação comunitária e a sua prática constante, as causas mais difíceis. Em momentos em que estivera ameaçada a própria cristandade, foi à força desta oração que se atribuiu a libertação do perigo, tendo a Virgem do Rosário sido saudada como propiciadora da salvação. À eficácia desta oração, confio de bom grado hoje – como acenei ao princípio – a causa da paz no mundo e a causa da família.

A paz As dificuldades que o horizonte mundial apresenta, neste início de novo milênio, levam-nos a pensar que só uma intervenção do Alto, capaz de orientar os corações daqueles que vivem em situações de conflito e de quantos regem os destinos das Nações, permite esperar num futuro menos sombrio. O Rosário é, por natureza, uma oração orientada para a paz, precisamente porque consiste na contemplação de Cristo, Príncipe da paz e « nossa paz » (Ef 2, 14). Quem assimila o mistério de Cristo – e o Rosário visa isto mesmo – apreende o segredo da paz e dele faz um projeto de vida.

Depois, o Rosário é oração de paz também pelos frutos de caridade que produz. Se for recitado devidamente como verdadeira oração meditativa, ao facilitar o encontro com Cristo nos mistérios não pode deixar de mostrar também o rosto de Cristo nos irmãos, sobretudo nos que mais sofrem. Como seria possível fixar nos mistérios gozosos o mistério do Menino nascido em Belém, sem sentir o desejo de acolher, defender e promover a vida, preocupando-se com o sofrimento das crianças nas diversas partes do mundo? Como se poderia seguir os passos de Cristo revelador, nos mistérios da luz, sem se empenhar a testemunhar as suas ―bem-aventuranças‖ na vida diária? E como contemplar a Cristo carregado com a cruz ou crucificado, sem sentir a necessidade de se fazer seu ―cireneu‖ em cada irmão abatido pela dor ou esmagado pelo desespero? Enfim, como se poderia fixar os olhos na glória de Cristo ressuscitado e em Maria coroada Rainha, sem desejar tornar este mundo mais belo, mais justo, mais conforme ao desígnio de Deus? Em suma o Rosário, ao mesmo tempo que nos leva a fixar os olhos em Cristo, torna-nos também construtores da paz no mundo. Pelas suas características de petição insistente e comunitária, em sintonia com o convite de Cristo para « orar sempre, sem desfalecer » (Lc 18, 1), aquele permite-nos esperar que, também hoje, se possa vencer uma ―batalha‖ tão difícil como é a da paz. Longe de constituir uma fuga dos problemas do mundo, o Rosário leva-nos assim a vê-los com olhar responsável e generoso, e alcança-nos a

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força de voltar para eles com a certeza da ajuda de Deus e o firme propósito de testemunhar em todas as circunstâncias « a caridade, que é o vínculo da perfeição » (Cl 3, 14).

A família: os pais... Oração pela paz, o Rosário foi desde sempre também oração da família e pela família. Outrora, esta oração era particularmente amada pelas famílias cristãs e favorecia certamente a sua união. É preciso não deixar perder esta preciosa herança. Importa voltar a rezar em família e pelas famílias, servindo-se ainda desta forma de oração. Se, na Carta apostólica Novo millennio ineunte, encorajei a celebração da Liturgia das Horas pelos próprios leigos na vida ordinária das comunidades paroquiais e dos vários grupos cristãos, o mesmo desejo fazer quanto ao Rosário. Trata-se de dois caminhos, não alternativos mas complementares, da contemplação cristã. Peço, pois, a todos aqueles que se dedicam à pastoral das famílias para sugerirem com convicção a recitação do Rosário. A família que reza unida, permanece unida. O Santo Rosário, por antiga tradição, presta-se de modo particular a ser uma oração onde a família se encontra. Os seus diversos membros, precisamente ao fixarem o olhar em Jesus, recuperam também a capacidade de se olharem sempre de novo olhos nos olhos para comunicarem, solidarizarem-se, perdoarem-se mutuamente, recomeçarem com um pacto de amor renovado pelo Espírito de Deus. Muitos problemas das famílias contemporâneas, sobretudo nas sociedades economicamente evoluídas, derivam do fato de ser cada vez mais difícil comunicar. Não conseguem estar juntos, e os raros momentos para isso acabam infelizmente absorvidos pelas imagens duma televisão. Retomar a recitação do Rosário em família significa inserir na vida diária imagens bem diferentes – as do mistério que salva: a imagem do Redentor, a imagem de sua Mãe Santíssima. A família, que reza unida o Rosário, reproduz em certa medida o clima da casa de Nazaré: põe-se Jesus no centro, partilham-se com Ele alegrias e sofrimentos, colocam-se nas suas mãos necessidades e projetos, e d'Ele se recebe a esperança e

a força para o caminho.

... e os filhos É bom e frutuoso também confiar a esta oração o itinerário de crescimento dos filhos. Porventura não é o Rosário o itinerário da vida de Cristo, desde a sua concepção até à morte, ressurreição e glória? Hoje torna-se cada vez mais árdua para os pais a tarefa de seguirem os filhos pelas várias etapas da sua vida. Na sociedade da tecnologia avançada, dos mass-media e da globalização, tudo se tornou tão rápido; e a distância cultural entre as gerações é cada vez maior. Os apelos mais diversos e as experiências mais imprevisíveis cedo invadem a vida das crianças e adolescentes, e os pais sentem-se às vezes angustiados para fazer face aos riscos que aqueles correm. Não é raro experimentarem fortes desilusões, constatando a falência dos seus filhos perante a sedução da droga, o fascínio dum hedonismo desenfreado, as tentações da violência, as expressões mais variadas de falta de sentido e de desespero. Rezar o Rosário pelos filhos e, mais ainda, com os filhos, educando-os desde tenra idade para este momento diário de ―paragem orante‖ da família, não traz por certo a solução de todos os problemas, mas é uma ajuda espiritual que não se deve subestimar. Pode-se objetar que o Rosário parece uma oração pouco adaptada ao gosto das crianças e jovens de hoje. Mas a objeção parte talvez da forma muitas vezes pouco cuidada de o rezar. Ora, ressalvada a sua estrutura fundamental, nada impede que a recitação do Rosário para crianças e jovens, tanto em família como nos grupos, seja enriquecida com atrativos simbólicos e práticos, que favoreçam a sua compreensão e valorização. Por que não tentar? Uma pastoral juvenil sem descontos, apaixonada e criativa – as Jornadas Mundiais da Juventude deram-me a sua medida! – pode, com a ajuda de Deus, fazer coisas verdadeiramente significativas. Se o Rosário for bem apresentado, estou seguro de que os próprios jovens serão capazes de surpreender uma vez mais os adultos, assumindo esta oração e recitando-a com o entusiasmo típico da sua idade. (Carta Apostólica Rosarium Virginis Mariae. São Paulo: Edições Loyola, 2002, nº 39-42)

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Em alguns contextos decisórios, o argumento do mal menor não pode ser aplicado, porque sua aplicação significaria colocar no mesmo plano o mal moral com os sofrimentos, as contrariedades e as adversidades da condição humana, o que é um erro grave, denunciado já desde as origens da ética, quado, nos primórdios da filosofia grega, Sócrates ensinava a seus discípulos que é melhor sofrer o mal do que cometê-lo.

A ambiguidade que pode ser encontrada no uso atual do modelo argumentativo do mal menor tem três componentes fundamentais: 1) a confusão entre bens e valores morais com outros bens, como os bens econômicos, a saúde, o bem-estar, a vida; 2) a distinção inadequada entre a bondade ou a maldade das consequências da ação, e a bondade ou a maldade da própria escolha; o sentido variado em que se diz que alguma coisa é preferível, dado que em alguns casos significa que é obrigatória e em outros que é simplesmente melhor. No seu aspecto social, o princípio do mal menor implica que, prevendo-se dois males sociais que se verificam inevitavelmente e desde que a decisão não seja má em si mesma (como acontece, por exemplo, com a aprovação legislativa do aborto, da eutanásia etc, que são um mal mo-

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ral em si próprios) é lícita a escolha do mal menor. No caso de razões graves, pode ser lícita a tolerância para com o mal moral dos cidadãos, se com isso não forem prejudicados outros ou o bem comum da sociedade. Pode ser lícito, também, o intento parlamentar de melhorar legislações iníquas através da escolha, na ausência de alternativas, de um mal menor em relação a um pior. A aprovação legislativa de leis iníquas, contrárias à lei natural, em contrapartida, é sempre ilícita. Em seu aspecto pessoal, o princípio do mal menor deve ser aplicado nas situações de perplexidade de consciência (em princípio raras) em que qualquer escolha parece moralmente má para o indivíduo, não há como sair dessa dúvida e é necessário agir. Sempre que não conste de outro modo o comportamento adequado (como aconteceria se o Magis-

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tério da Igreja já se tivesse pronunciado sobre o assunto), é lícito escolher aquilo que parece menos mal, procurando ir o menos possível contra a ordem natural da moralidade humana. Embora o argumento do mal menor tenha sido tradicionalmente aplicado ao conjunto de argumentações práticas, seu conteúdo principal é de ordem especificamente moral, assim como mostraram desde a antiguidade os grandes pensadores. Disto se origina a principal fonte de confusão. Quando não está claro o primado dos valores morais em relação à ordem dos bens e dos males presentes na vida humana, desaparecem conceitos fundamentais – como o do absoluto moral – que derivam das exigências éticas da verdade sobre a pessoa humana e sua dignidade. As guerras, que ensanguentaram o mundo no século XX, foram uma lição que não deveria ser esquecida tão rapidamente em debates de grande importância, como os que dizem respeito à família e à vida. Em alguns contextos decisórios, o argumento do mal menor não pode ser aplicado, porque sua aplicação significaria colocar no mesmo plano o mal moral com os sofrimentos, as contrariedades e as adversidades da condição humana, o que é um erro grave, denunciado já desde as origens da ética, quan-

do, nos primórdios da filosofia grega, Sócrates ensinava a seus discípulos que é melhor sofrer o mal do que cometê-lo. Uma autêntica reflexão racional no momento em que se toma uma decisão, pública ou pessoal, não pode ignorar a sua moralidade, em si mesma considerada, antes de ponderar suas consequências. Política e direito são inseparáveis da ética, visto que esta constitui, por assim dizer, a alma do corpo social. A escolha do mal menor tem seus princípios nessa delicada relação.. Sem se identificarem, política, direito e ética devem em profunda simbiose entre si. Do contrário, as consequências são muito graves e vão do relativismo social, com a subsequente dissolução da moral pública e privada, ao totalitarismo. Esse delicado equilíbrio jamais poderá ser alcançado se não for reconhecido o primado da ética sobre as outras considerações pertinentes na avaliação das exigências éticas a absolutas da dignidade humana e na consideração de sua fragilidade e existencial. Francisco C. Fernández Sánchez Leia o artigo completo em LEXICON – PONTIFÍCIO CONSELHO PARA A FAMÍLIA – Termos Ambíguos e discutidos sobre família, vida e questões éticas. Brasília: Edições CNBB. 2. Ed. 2007, p. 777 a 788.

Bispo Referencial Dom Orlando Brandes Arcebispo de Londrina do.brandes@uol.com.br Casal coordenador Jorge Luis Bovo e Sandra Regina P.Bovo Diocese de Apucarana jorgebovo@gmail.com sandrabovo@gmail.com Assessor Regional Diác. Juares C. Krum Diocese de União da Vitória jckrum@gmail.com

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PRIORIDADE: EVANGELIZAÇÃO DAS FAMÍLIAS Com seis destaques:

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Catequese Grupos de Reflexão Pais e Filhos Espiritualidade Conjugal Juventude Noivos


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