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CAIXA 1 O seu consultor financeiro

sábado, domingo e segunda-feira, 14, 15 e 16 de dezembro de 2013

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Crédito fácil pode ser jogo difícil de vencer Aliado do fluxo de caixa, cheque especial pode causar dependência sem que o usuário perceba. Descubra se você faz essa contabilidade mental.

Rejane Tamoto eve ser usado apenas em situações de emergência, mas tem gente que não larga dele e se torna dependente. O limite do cheque especial é, de certa forma, uma ferramenta de segurança para quem não conciliou as datas de pagamentos de contas com as de recebimentos. É desse jeito organizado que Tatiana Filomensky, psicóloga e coordenadora do tratamento a compradores compulsivos do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas (HC), usa o limite para administrar seu fluxo de caixa. "Tenho pacientes que pagam em cheque em determinado dia e contas que vencem alguns dias antes. Então não acho que o cheque especial seja um vilão. No meu caso ele funciona bem, mas estabeleço controles", explica a psicóloga. Tatiana diz que já definiu um limite menor do que o banco queria estipular e pediu para incluir no contrato da contacorrente uma cláusula que proíbe a instituição de aumentar esse limite sem o consentimento dela. Outra dica é olhar sempre a conta-corrente e conferir quanto está sendo cobrado pelo uso do cheque especial. Tudo isso para não cair na armadilha do "saldo que fica piscando" no extrato. É assim que Renato Lucato, estudante de artes visuais e artista autônomo, aprendeu que aquele limite não é um dinheiro para ser usado livremente. Munido de aplicativo do banco no celular, ele acompanha a movimentação da conta universitária com frequência diária. Quando percebe que entrou no cheque especial, tenta segurar o consumo, o que é bastante difícil. "Tenho essa conta desde 2011 e acabo não usando tanto o cheque especial porque o meu limite é baixo, de R$ 1 mil. Quando uso R$ 300 já fico esperto", conta. Ele diz que o cheque especial para o universitário é útil. "É o banco fazendo o papel da sua mãe. Só que tem que pagar. Quando entro no vermelho já vejo o que tenho a receber para co-

ses que estou no azul", conta, depois de usar a linha ininterruptamente por cinco anos. Ao mesmo tempo, a professora guarda 30% da renda na poupança, com o plano de fazer uma viagem ao exterior em 2014. Mesmo que saiba que não compensa pagar 8,75% ao mês de juro por utilização do cheque especial e ganhar apenas 0,5% mais taxa referencial (TR) de rendimento na poupança, Renata tem medo de cancelar o limite. "Deixa ele ali. Em 2014 vou tentar diminuir pela metade", afirma.

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Como deixar o vício do crédito fácil

brir. Na verdade, mentalmente sei quanto vou gastar e quando vou pagar", explica.

Cuidado com a contabilidade mental

Renato se considera equilibrado no uso do cheque especial, mas deve tomar cuidado com as contas feitas de cabeça. Segundo Márcia Tolotti, coach (orientadora) psicofinanceira, o problema começa quando elas se transformam em contabilidade mental – uma matemática individualizada e irracional, na qual a pessoa consegue chegar a um

"resultado" que sempre a satisfaz emocionalmente. "Na contabilidade mental o lucro que a pessoa tem é emocional, psíquico e secundário. Mas o ganho é sempre menor porque ela sabe que está se enganando", explica. Esse mecanismo, que o cérebro adota sem que a pessoa perceba, pode levar a estranhas escolhas, como usar o cheque especial e guardar dinheiro na poupança ao mesmo tempo. "Há pessoas que preferem pagar um juro alto para não ter que tirar o dinheiro de uma

aplicação que vai bancar um sonho", afirma Márcia. Ela diz que o nome da linha de financiamento também não ajuda. "O nome especial ameniza tudo. É simpático e muitas pessoas não entendem que é um empréstimo. É fácil de usar e não precisa formalizar um contrato de crédito. A pessoa pode usar onde e com o que quiser", avalia. A especialista explica que isso faz com que muitos usuários incorporem o valor ao salário e, com o tempo, essa relação vira uma espécie de jo-

Tina Cezaretti/Hype

O estudante Renato Lucato fica de olho na conta, pelo aplicativo do banco, para não entrar no vermelho.

go. "Fica aquela adrenalina do vou conseguir cobrir ou não. Da angústia e do estímulo. Não são todas as pessoas que começam a encarar a dívida como um jogo, mas é um processo inconsciente, no qual o oponente é o banco. E tal como todo jogo, também vicia", diz. Mesmo com dinheiro na poupança, Renata Salles, professora de espanhol, é daquelas que não consegue pensar na própria vida sem ter um limite de cheque especial. "Não consigo cortar pela raiz e nem diminuir o limite. Faz dois me-

Marcia diz que viciados em crédito devem primeiro assumir e reconhecer o problema. "Precisa saber a regularidade com que acessa o limite de crédito, o período que usa e especificar. E, principalmente, saber que isso foi um empréstimo", afirma. Com isso, o usuário poderá descobrir se está no sinal vermelho (se usa o cheque especial a cada três meses e, portanto, vive em um padrão de vida que não corresponde ao que recebe), sinal amarelo (a cada seis meses) ou sinal azul (uma vez por ano). A especialista diz que outro passo importante é tomar a decisão de gastar apenas o que a renda mensal pode cobrir e partir para uma mudança de hábito. "É importante a pessoa saber que vai ter recaídas, que pode cobrir o cheque especial e, sem muita demora, voltar ao negativo. Mas sempre que isso acontecer, é preciso recomeçar", explica. Na opinião de Marcia, a máxima dos consultores – a recomendação de que é preciso cortar o limite do cheque especial – não funciona para todas as pessoas. "É mais ou menos como fazer dieta. Às vezes a pessoa é radical e corta todo o carboidrato mas, depois, fica desesperada e come o dobro. Por isso que aplico ao crédito o princípio da reeducação alimentar, e recomendo a diminuição do uso gradualmente. A pessoa precisa avaliar o próprio perfil. Se consegue cortar de uma vez, ou se prefere fazer isso aos poucos", conclui.

Cinco dicas práticas que ajudam a sair do sufoco s tradicionais conselhos para sair do cheque especial devem sempre ser lembrados, pois são úteis para quem já tomou a decisão de sair deste tipo de dívida. Veja as dicas de Diógenes Donizete, especialista em defesa do consumidor do Procon e Ricardo Pereira, sócio do site e autor do livro Dinheirama: 1- Faça um orçamento doméstico. Calcule todas as despesas fixas e variáveis e tente ajustá-las à sua renda líquida (descontada de impostos e contribuições). Inclua no plano os gastos com atividades de lazer e evite usar o limite para bancar esses prazeres. 2- Fique atento ao limite que o banco liberou. Se ele aumentar automaticamente peça para retornar ao valor anterior. Quan-

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to maior o limite, maior pode ser a dívida. 3- Quem estourou o limite do cheque especial deve procurar um crédito consignado no valor da dívida e quitá-la. Na hora de definir as parcelas, escolha uma opção que se ajuste ao orçamento, para que não volte a precisar usar o cheque especial. 4- Para evitar a reincidência, consultores recomendam cancelar o limite do cheque especial. Quem não consegue deve, ao menos, solicitar uma redução do valor disponibilizado pelo banco. 5- Preste atenção aos juros cobrados. Na hora de tomar empréstimo para quitar o cheque especial é preciso ficar atento ao Custo Efetivo Total (CET), que embute juros, seguros, e impostos da operação de crédito.


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