Nísia Floresta - dossiê

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Do século XIX até os dias de hoje


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Organização:

Beatriz Gianola André Daniela Polizel Perez Luane Baptistella Casagrande Souza Pinto

Sobre a revista: Dossiê realizado a partir de pesquisas acerca da escritora brasileira Nísia Floresta, sob orientação da professora Márcia Abreu na disciplina Tópicos em Pesquisa XLVI: Historiografia Literária III no segundo semestre de 2013 no curso de graduação em Letras na Universidade Estadual de Campinas. As fontes utilizadas para a composição da revista são principalmente as pesquisas da estudiosa Constância Lima Duarte presentes em Nísia Floresta Vida e Obra e o Almanaque do Projeto Memória de 2006, que escolheu Nísia Floresta como tema.


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Nísia Floresta, uma mulher de muitas lutas...............04

O lugar da Brasileira na literatura.............................10 Nísia no século XIX.....................................................12 A novela didático-moralista Fany ou a Modelo das

Donzelas e outras obras...........................................13 Nísia no século XXI....................................................17 Curiosidades sobre Nísia............................................18

Para saber mais.........................................................20


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Dionísia Gonçalves Pinto nasceu no dia 12 de outubro de 1810 no sítio Floresta, propriedade de seus pais, do português Dionísio Gonçalves Pinto Lisboa e da brasileira Antônia Clara Freire, no povoado de Papari, Rio Grande do Norte. Dionísia, que depois tornou-se Nísia Floresta Brasileira Augusta, teve uma infância muito parecida com a das meninas de sua época: árvores e cachoeiras nem sempre eram permitidos às crianças, assim como eram raros os livros e brinquedos. Ainda mais para as meninas, que tinham suas brincadeiras limitadas à imitação da vida adulta: brincando de cuidar das bonecas e cuidando da “casinha”, as meninas eram preparadas para serem donzelas submissas aos seus maridos e à sociedade que as cercaria. Quanto ao seu estudo, em uma época em que existiam poucas escolas e a maioria das crianças – de famílias tradicionais, pois, as mais humildes, se quer pensavam na possibilidade de estudar- estudavam em casa, Nísia não teve um destino diferente. Papari, atual Nísia Floresta Em 1948, o município de Papari tem seu nome alterado em homenagem à ilustre cidadã nascida ali. Conheça a sua localização no território brasileiro:

Mapa do Rio Grande do Norte. Disponível em: <http:// pt.wikipedia.org/wiki/ Ficheiro:RioGrandedoNorte_Municip_NisiaFloresta.svg >

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A Revolução de 1817 foi um movimento social (revolta) de caráter emancipacionista ocorrido em Pernambuco no ano de 1817. Considerado um dos mais importantes movimentos de caráter revolucionário do período colonial brasileiro.

Impulsionados pelo sentimento antilusitano que se espalhava pelo território brasileiro em 1817, causado pela Revolução de 1817, a família de Nísia partiu para Goiana, interior de Pernambuco, onde Nísia teve acesso à biblioteca do Convento das Carmelitas, que funcionava desde o século XVII. Nele, Nísia teve seu primeiro contato com a cultura europeia, assim como técnicas de trabalhos manuais e de canto – afinal, as moças estavam lá para tornarem-se damas exemplares. Em 1819, sua família retorna para Papari e Nísia se ocupa em ensinar a ler e escrever seu irmão mais novo: essa experiência é relatada por Nísia no livro publicado em 1878, na França, Fragmentos de uma obra inédita. Aos treze anos, em uma aliança entre famílias, Nísia casou-se com um grande proprietário de terras: seu casamento dura apenas alguns meses e Nísia, com apenas treze anos, pede o divórcio e volta para a casa de seus pais. Divorciar-se aos treze anos em uma sociedade regida pelo voto de casamento eterno, foi apenas o começo de uma vida repleta de rompimentos com os valores de sua época.


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Temos então uma menina de treze anos e divorciada. Sua coragem trouxe-lhe consequências: foi considerada adúltera, enfrentou preconceitos, e ameaças de seu ex-esposo, que a amedrontava “com a lei”, mas nada a fez mudar de ideia. Com a Confederação do Equador em andamento, Nísia e sua família partiram para Goiânia e depois para Olinda: todas suas experiências nesse período foram depois relatadas no livro publicado em 1842, Conselhos à Minha Filha.

Confederação do equador A Confederação do Equador, de 1824, foi um movimento liderado por liberais republicanos que eram contra a tendência absolutista proposta por Dom Pedro I, na Carta Outorgada de 1924. Ocorrido em Pernambuco e liderados por Augustinho Bezerra e Frei Caneca, os revoltosos proclamaram uma república independente: foram condenados a morte em 1825.

Aos dezoito anos, Nísia perde seu pai, assassinado por divergências políticas; nessa mesma época Nísia conhece seu futuro esposo, Manuel Augusto de Faria Rocha. Casaram-se e tiveram sua primeira filha em 1830, Lívia Augusta de Faria Rocha, que tornou-se companheira de viagens e tradutora dos textos de sua mãe. 1830: a década de sua estreia na imprensa Na primeira década de 1830, Nísia estreia no jornal O espelho das Brasileiras, tratando da condição feminina comprada à diferentes culturas ao longo da história. Em 1832 Nísia envolveu-se com um dos principais trabalhos de sua vida, ao traduzir Vindication of the Rights of Woman, ou, Direitos das Mulheres e Injustiça dos homens ,

de Mary Wollstonecraft, Nísia tornou- se a primeira mulher a publicar uma obra de cunho feminista no Brasil. Não apenas um trabalho de tradução, Nísia inseriu no texto comentários, críticas e comparações entre a realidade feminina europeia e brasileira, além de levantar questões, como por exemplo, o fato de não haverem mulheres ocupando cargos no governo, na medicina, advocacia ou até mesmo nas universidades. Após o levantamento dessas questões, embora não houvesse uma resposta imediata, Dionísia permitiu que as discussões iniciassem e trouxessem resultados para os séculos seguintes; Nísia era então precursora do que hoje chamamos feminismo. Agora, aos vinte e cinco anos, Nísia tem seu segundo filho, Augusto Américo de Faria Rocha, e ao mesmo tempo, perde seu esposo Augusto. Nessa época, encontra-se em Porto Alegre, e esse período de sua vida foi contado em sua obra Três anos na Itália, seguidos de uma viagem à Grécia, publicado em 1859. Enquanto isso ocorria a Revolução Farroupilha , e antes de decidir rumar para capital Nísia dedica- se à educação dos filhos, até que decide rumar para o Rio de Janeiro e realizar seu grande projeto: a construção do Colégio Augusto .

Mary Wollstonecraft

Escritora Irlandesa e mãe da escritora Mary Shelly (que obteve sucesso com sua obra Frankstein), Mary Wollstonecfraft foi considerada precursora do feminismo: em 1789 publicou V indication of the Rights of Woman, considerada a primeira carta do feminismo moderno- obra que foi traduzida para o português por Nísia Floresta, em 1832.

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provas de línguas que de agulhas, por exemplo. Os jornais publicavam às vezes, na mesma edição, notas elogiosas e críticas sobre o Colégio Feminismo

Augusto, mostrando que cada vez mais, Nísia era

Feminismo não possui um significado com um sentido unívoco. Segundo o dicionário Aurélio, editado em 1999, como: “ Movimento daqueles que preconizam a ampliação legal dos direitos civis e políticos da mulher, ou a equiparação legal de seus direitos aos do homem”.

reconhecida. É importante ressaltar que Nísia de-

É anacronismo intitular Nísia como feminista, pois na época em que viveu não havia esse termo nem uma definição dele. No entanto, com as ideias defendidas por Nísia podemos dizer que ela uma precursora dos ideias feministas no Brasil

abandonassem sua maternidade ou a posição de

fendia que as meninas deveriam tornar-se mulheres instruídas, críticas socialmente e também cientes da importância da educação de seus filhos, ou seja, Nísia não incentivava que as mulheres esposas.

Durante o funcionamento do colégio, Nísia não deixou a pena de lado e publicou seus preceitos morais como um presente a sua filha Lívia, o livro Conselhos à Minha Filha, publicado em

1842 tornou- se seu texto mais editado. Em 1847, O Colégio Augusto e seu reflexo na sociedade

publicou Fany ou o Modelo das Donzelas, po-

carioca

rém, apenas em 1935 foi encontrado um exem-

Em 1838, Nísia realiza seu projeto: fundou plar do livro; em 1847, um dos discursos que Níno Rio de Janeiro o Colégio Augusto. Voltado pa- sia realizava em sua escola foi publicado, o Disra a educação feminina, o Colégio Augusto con-

curso que ás suas educandas dirigiu Nísia Flo-

tava com uma grade curricular um pouco diferen-

resta Brasileira Augusto. Ainda no campo peda-

te das demais oferecidas na época: havia o ensino

gógico, Nísia publicou na mesma época uma his-

de português, história, geografia, línguas estran-

tória feita especialmente para suas alunas, Daciz

geiras e também trabalhos manuais. A busca cada ou A Jovem Comvez maior por vagas na escola fez com que Nísia pleta.

recebesse elogios, mas também, foi o alvo de inúmeras críticas; entretanto, críticas que apenas

A

feminina e o direi-

afirmavam aquilo que Nísia mais desejava: seu to colégio tinha um foco diferenciado dos demais.

educação

das

mulheres

não foram as úni-

As críticas partiam desde comentários sobre cas frentes de luta a vida pessoal de Nísia, considerada imoral por que Nísia travou ser divorciada e ter se casado de novo, até críti- contra a sociedade cas aos tipos de avaliações que eram aplicadas no

da época: defendeu

colégio, dizendo que as meninas faziam mais

também o direito indígena e ideais abolicionistas.

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Ao publicar em 1849, Lágrimas de um Caeté, po-


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ema de 712 versos, foi escrito após o fim da Re- enraizados na sociedade da época. Tal teor crítico volução Praieira , e retratava a opressão sofrida

de Nísia foi aguçado pela sua estadia europeia,

pelo índio durante a colonização, assim como a

pois ela vivenciou um período de efervescência

situação política do país pós Revolução. O índio

cultural e crítica dos europeus, resultado do mo-

construído por Nísia mostrava- se inconformado vimento iluminista, que defendia o pensamento com a sua posição inferior ao branco- ao contrá-

racional em detrimento do misticismo.

rio do que faziam os românticos, que sempre colocavam os índios como passivos e parceiros dos colonizadores. Não detendo-se ao indianismo, Nísia defende também o abolicionismo.

Revolução Praieira Movimento separatista, ocorreu em Pernambuco de 1848 a 1850 marcado pela disputa pelo poder entre os partidos Liberal (os chamados “praieiros”) e Conservador. No poder, os liberais aumentaram os impostos ocasionando uma insatisfação popular generalizada, eles então culparam os portugueses pelos aumentos: em 1847 estouraram revoltas populares e o governo Imperial interveio, os liberais foram derrotados.

Anúncio da saída de navios no Rio de Janeiro, um dos passageiros é Nísia Floresta. Imagem retirada do acervo da Hemeroteca Digital Brasileira do Correio da Tarde no dia 2 de novembro de 1849.

Ainda em 1855, Nísia publica Páginas de uma vida obscura, conto em que Nísia conta a história de um cativo que é trazido da África para

o Brasil ainda criança, criticando a sociedade escravocrata; e também Passeio ao Aqueduto Carioca, em que descreve a cidade do Rio e contra-

Ao viajar pela primeira vez para a Europa,

põe a escravidão e a beleza da cidade.

em 1849, sob orientação do médico de sua filha,

Em 1856 Nísia perde sua mãe, e retrata seu

Nísia publica em 1850 (em uma de suas poucas

sentimento em O Pranto Filial; sofrimento que

voltas ao Brasil, ao longo dos 28 anos que per-

não parou por ai: nossa autora ainda prestou tra-

maneceu na Europa), aquele que seria considera-

balho voluntário em ajuda às vítimas de febre

do o primeiro romance histórico escrito por uma

amarela que atingiu o Rio de Janeiro, candidatan-

norte rio-grandense, os dois volumes de Dedica- do- se para trabalhar como enfermeira. Esse períção de uma amiga. Alguns anos depois, em 1853, odo pode ser encontrado em sua publicação de

Nísia publica Opúsculo Humanitário, que ainda Três anos na Itália, em que aborda também uma contou com uma dedicatória a Augusto Comte, de suas visitas ao Hospital de Milão. Entre as de quem tornou-se amiga durante seus anos na

idas e vindas de Nísia da Europa, Nísia ficou

Europa. Nesse texto, Nísia prossegue com sua

muito amiga de Comte, com quem trocou muitas

luta contra as diferenças humanas, denunciando a

cartas,

escravidão, o tráfico humano, e os preconceitos

D`Auguste Comte, em Paris. Entre muitas cartas,

que

estão

conservadas

na

Mison 7


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Nísia também escreveu para seus familiares que

çamento em italiano de sua obra A lágrima de um

estavam no Brasil, que depois, rendeu uma publi-

Caeté e também receber uma crítica de Lisboa,

cação em 1857, o Itinerário de Uma Viagem à marcada por muitos elogios, sobre sua obra Alemanha. Suas cartas não restringiam-se a des- Opúsculo Humanitário. Agora em 1878 Nísia pu-

crever o lugar em que estava, eram sempre mar-

blica aquela que seria sua última obra, Fragmen-

cadas por sentimentalismo, em que Nísia expres-

tos de uma obra inédita, em que Nísia relata seus

sava aos parentes seu estado emocional: emoções

sentimentos ao deixar o Brasil pela última vez,

que floresceram em Três A nos na Itália, datado quando regressou para a França e lá ficou até seu de 1858. Desenho feito por Manuel Bandeira. Disponível no Projeto Memória de 2006.

Um ano depois é publicada a primeira edição em italiano de Conselhos à Minha Filha; mesmo ano em que é publicada, em italiano, a edição de Cintilações de uma Alma Brasileira, livro composto por cinco ensaios, incluindo o conto Mulher ( traduzido do italiano para o inglês, em 1865 por sua filha Lívia) e também o conto O Brasil ( traduzi-

do em 1871 para o francês, também por Lívia).

falecimento, em 1885. Nessa ultima obra, Nísia havia estado em seu país em um momento de muito alvoroço político, pois os brasileiros, influenciados pelos ideais espalhados pela Revolução Francesa, organizavam-se entre republicanos e liberais, causando problemas ao governo imperial.

Falecimento e oposição Com a morte de Nísia, muitas críticas reascenderam sobre seu nome. A também potiguar

Isabel Gondim foi responsável por críticas severas à Nísia, chamando-a muitas vezes de “adúltera” ou até mesmo “leviana”. Levantava também questionamentos sobre a real autoria de

muitas obras de Nísia, afirmando até mesmo que seu esposo Augusto, teria sido responsável pela autoria de Direito das Mulheres.

Porém,

nem só de críticas a memória de Nísia foi recebida. Esse papel inicial de reavivar a

memória de Nísia foi

Publicado em 1864 e reeditado em 1872,

conferido aos positi-

Nísia ainda publica uma obra que retrata suas vi-

vistas, que publica-

agens pela Europa em, Três anos na Itália, segui- ram em 1888 as cardos de uma viagem à Grécia, Nísia estabelece- se tas de Comte à Nísia, em Florença, lugar em que pode prestigiar o lan-

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mostrando a importância da autora e seu reco- da autora. Seus despojos chegaram até o Rio nhecimento estrangeiro; foram encomendados Grande do Norte em 1954, data comemorativa

medalhões com o perfil de Nísia, inúmeras no- para a região que recebeu folhetos lançados por tas em diversos jornais de elogios à autora e a aviões na chegada de seus despojos . conquista da abolição da escravatura também

Cem anos depois, no centenário de sua

seria motivo de orgulho para Nísia. Além des- morte, sua memória foi relembrada e muitos sas, muitas outras homenagens se concretiza- eventos trouxeram seu nome para as discusram, como os livros publicados sobre sua vida sões. Atualmente, Nísia vem sendo reconhecie obras, como Nísia Floresta- 1810/ 1885- A

da em projetos como o Projeto Memória , que

vida e obra de uma grande educadora, precur- busca reavivar a memórias de importantes ausora do abolicionismo, da República e da tores brasileiros, e que escolheu em 2006, Níemancipação da mulher no Brasil, do escritor sia, para ser protagonista do A lmanaque HistóRoberto Seild, em 1933; História de Nísia Flo-

rico- Nísia Floresta: Uma mulher à frente de

resta, de Adauto da Câmara, em 1941; e muitos seu tempo. outros como Nísia Floresta: Vida e Obra, de Constância Lima Duarte, em 1985 (Constância

Projeto Memória

que é considerada hoje a maior estudiosa sobre

Em parceria com o Governo Federal, o Projeto Memória visa produzir Almanaques para serem distribuídos pelas escolas públicas brasileiras, buscando reavivar a memória de importantes autores nacionais. Em 2006 a homenagem foi concedida a Nísia Floresta, destacada como “uma mulher a frente de seu tempo”.

a autora). Além dos diversos trabalhos, Nísia ainda foi estampada nos selos de Papari, que passou a ser o município Nísia Floresta, após a morte Folhetos distribuídos no dia da chegada de seus despojos . Disponível no Almanaque Projeto Memória.

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Pierre Bordieu define campo literário como um mundo à parte com as suas próprias regras, inclusive para que um autor seja canonizado ou não. O fato de muitos brasileiros desconhecerem Nísia Floresta já demonstra que ela foi esquecida e os seus livros estão em maior parte nas bibliotecas europeias do que nas brasileiras.

escritos por ela em outros gêneros, como literatura de viagem também são mais estudadas do que os romances da autora.

Ainda que tenha sido uma personalidade do século XIX, vivido na Europa, publicado livros línguas estrangeiras, o fato de ser mulher se sobrepõem ao seus feitos, o que pode explicar tanto a ausência de críticas e A autora não consta em histórias menções aos seus livros em geral e também literárias como a de Alfredo Bosi, História romances na época em que Nísia viveu assim Concisa da Literatura Brasileira, em como atualmente. dicionários bio-bibliográficos como o Os romances que Nísia escreveu Diccionario biographico brasileiro, de dificilmente são encontrados, uma das Sacramento Blake nem em livros didáticos do explicações possíveis é porque Fany ou o país. A única menção à autora é no Modelo das Donzelas e Daciz ou a Jovem Diccionario biográfico portuguez, de Perfeita são novelas didático-moralistas que Inoccencio Silva, que configura-se como uma foram feitas com foco em suas educandas do fonte portuguesa e não brasileira, confirmando Colégio Augusto, limitando um pouco as o fato de Nísia ter sido conhecida, até em sua obras para o público leitor que estava fora da época, mais no exterior do que no Brasil. As esfera escolar. fontes enumeradas anteriormente são as Encontrar anúncios de vendas de livros principais para verificar se um autor é cânone, portanto, uma vez que Nísia não está presente da Nísia é raro, ainda mais quando se trata de em nenhuma deles, concluímos o seu um romance. No entanto, no Periódico dos Pobres, jornal do Rio de Janeiro, em 1850, esquecimento na literatura. encontramos um anúncio de uma das novelas Por outro lado, não significa que o nome didático-moralistas, que integram o gênero de Nísia não permaneceu nos estudos romance. acadêmicos atuais, pelo contrário, estes focam -se nas questões pedagógicas, na educação feminina e o importante papel que a escritora teve para essa área, já que fundou e dirigiu o Colégio Augusto. Nos estudos femininos, Nísia também tem destaque por ser Anúncio disponível no acervo da Hemeroteca Digital Brasileira considerada a precursora do feminismo no A dificuldade para o acesso às obras país, imagem que teria se construído a partir da tradução adaptada para a realidade corrobora para que poucos conheçam a brasileira de Vindications of the Rights of escritora e a sua produção literária, Woman, de Mary Wollstonecraft. Os livros consequência de uma não canonização, apesar 10


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de sua importância tanto no período em que viveu quanto nos dias atuais.

escrito em francês. As várias suposições sobre as poucas edições de seus livros e o atual desaparecimento de Nísia na literatura, que tiveram como consequência sua ausência no cânone ocidental, não devem ser consideradas verdades absolutas , outros fatores que não foram apontados podem ter influenciado o ocorrido.

Poucas obras de Nísia superaram uma única edição, fato que deve ser levado em conta na reflexão sobre o seu lugar na literatura. A única obra com três edições, o número máximo entre as obras da escritora, foi Direito das mulheres e injustiça dos homens, que é também sua primeira publicação, tratando-se de uma tradução Os estudos em torno da vida e obra de adaptada, em 1832. Nísia buscam um espaço para discutir a Entre todas as obras publicadas, muitas importância de manter a personalidade tanto são em língua estrangeira, em francês ou em no âmbito escolar quanto acadêmico para uma italiano, são cinco obras (as últimas) entre o reflexão sobre as diferenças que fizeram a sua total de catorze obras que se tem tradução adaptada para a realidade brasileira e conhecimento até então. a sua postura como educadora e diretora de Os quatro romances, Fany ou o Modelo um colégio voltado para a educação feminina das Donzelas, Daciz ou a Jovem Perfeita, quando esta era envolta de preconceitos e Dedicação de uma amiga e Parsis só tiveram privações.

uma edição , em que a maioria desconhecemos exemplares, como Parsis,

Gráfico sobre as edições em língua original por obra. 11


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Na época em que Nísia Floresta

que as suas leitoras prediletas têm a no-

viveu a sociedade era muito diferente de

ção natural do bello”. Embora sejam

como vemos hoje, estava se estabelecen-

poucos os comentários sobre suas obras,

do um processo de industrialização e de os encontrados mostram um apreço gran-

ascensão da burguesia, e a educação foi de pelo que Nísia fazia e pela forma cotornada direito de todos, fazendo com mo o fazia, dedicando-se a educação feque as narrativas literárias se tornassem minina e defendendo essa classe em sua cada vez mais acessíveis, fosse por meio

escrita, sem deixar de lado o estilo e a

dos periódicos com seus folhetins, ou elegância da forma. ratos. A crítica literária, não aceitava que

a sua tão venerada arte chegasse às mãos de simples populares, trabalhadores e pobres, e nem das mulheres, que assumiam cada vez mais importância na sociedade,

mas que continuavam a ser menosprezadas enquanto público leitor. Portanto, por fazer uma literatura focada em um público feminino, que

buscava mudança e propunha o questionamento da sociedade de então, Nísia não foi muito mencionada pela crítica de sua época. Os poucos relatos que são encontrados sobre ela nos periódicos de então são sobre seu falecimento, notas que incluem suas obras e alguns elogios à

“compatriota e distinta escriptora”, como no jornal O Liberal do Pará , no dia 7 de julho de 1885: “Era uma escriptora que primava pelo seu estylo e tinha em gran-

de conta a elegancia da forma, pois sabia 12

Fragmentos de notícia do jornal O Liberal do Pará anunciando a morte de Nísia. Imagem do acervo da Hemeroteca Digital Brasileira.

dos livros que ficavam cada vez mais ba-


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Fany ou o Modelo das Donzelas, que e seus muitos irmãos pequenos, chegando a pode ser considerada uma novela didático- cruzar o fogo da batalha junto à sua mãe e irmoralista dentro do gênero romance, foi publi- mãos para salvar o pai, que com a graça da

cada em 1847 e se desconhece algum exem- Divindade saíram todos ilesos. Alguns dias plar, com exceção do manuscrito que foi doa- depois do resgate de seu pai, no entanto, este do por Borges de Medeiros para Fernando morre, deixando sua família pobre, o que não Osório que a incluiu em seu livro Mulheres impediu que Fany jamais se queixasse e se

Farroupilhas, de 1935. Fany é uma jovem e bela moradora da

mantivesse modesta e atenciosa com todas as pessoas, mesmo as que lhe desdenhavam, e

simples e sadia província São Pedro do Sul, renunciasse ao casamento, que poderia lhe dar hoje o estado Rio Grande do Sul, que vê sua uma vida melhor. vida mudada em 1835, com o início da Revo-

Tal estória é desenvolvida em dez pági-

lução Farroupilha, pois além dos conflitos nas, começando com uma descrição prolongaem que estava exposta, seu pai liderava uma da, se considerada a quantidade de páginas da

das forças rebeldes e sua mãe o apoiava, atitu- novela, das paisagens do Brasil e mais especides que a filha considerava imprudentes.

ficamente da região Sul, seguida por uma enunciação de qualidades esperadas de uma

Revolução Farroupilha Conhecida também como Guerra dos Farrapos, foi uma revolução de caráter republicano que aconteceu na então província de São Pedro do Rio Grande do Sul contra o Império do Brasil, e tinha como objetivo principal mostrar ao governo imperial que as oligarquias gaúchas estavam insatisfeitas com os altos impostos. A Revolução levou à declaração de independência da província como estado republicano até 1845.

donzela, representadas na protagonista da es-

tória, Fany. Apenas após tais descrições do local e da personagem principal, se apresenta o que pode-se chamar de auge da novela, a Revolução Farroupilha, porém, essa, assim como

seu desfecho e as outras personagens envolvidas na estória, é desenvolvida muito brevemente, aparentando certa pressa na finalização da obra, ou crença de que longos prolongamentos eram desnecessários para o desenvol-

A menina, apesar de tudo, mantém seus modos de vida doces, modestos e cristãos, e

vimento da estória. Pela classificação, é possível perceber

não desejava nada além de ser útil a seus pais que há um moralismo que cerca toda a narrati13


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va, defendendo posturas conservadoras por

Talvez por conta dessa falta de desen-

parte das mulheres como, por exemplo, o não volvimento do enredo e das personagens, além

envolvimento com a política, a glorificação da falta de estrutura da obra, a novela não tepela execução das tarefas domésticas, o zelo nha feito sucesso entre o público, nem chegado pela família, características consideradas in- a ser conhecida pela crítica literária da época. trínsecas em uma donzela que é perfeita, sendo

a modéstia a qualidade que coroa todas as outras. Dessa forma, esse romance não poderia

Contradições e possíveis explicações Quando lemos sobre Nísia Floresta pen-

ser considerado um meio para a corrupção mo- samos em como ela era uma grande defensora ral, uma vez que ele exalta os princípios, so- dos direitos das mulheres, de seu posiciona-

bretudo os que julga necessário a uma mulher, mento na sociedade, da igualdade de gêneros, ausentando-se em uma defesa de qualquer pos- mas quando nos deparamos com a novela Fany tura que poderia se assemelhar à emancipação ou o Modelo das Donzelas ficamos confusos feminina, com uma exceção, se formos consi- com a falta de ação e posicionamento crítico

derar a renúncia do casamento como uma ati- de sua protagonista, Fany. tude emancipatória. O enredo se desenrola de forma abrupta,

Porém, para compreendermos a razão da passividade com que Fany age perante os mais

já que há poucas explicações sobre a revolução acalorados conflitos da época é importante e sobre o falecimento do pai de Fany, que são considerar que essa novela foi escrita por Nísia brevemente citados, deixando evidente a real com a intenção de que fosse distribuída em seu razão da novela, mostrar como uma donzela colégio, o Colégio Augusto, uma instituição

deveria se comportar, mesmo frente a uma si- particular que tinha como alunas membros da tuação tão adversa como a de Fany, e ser mo- alta sociedade carioca, cujos pais provavelralizante para seu público-alvo, as jovens mulheres, principalmente suas educandas. Consi-

derando esse público ao qual foi direcionada, também é possível entender a linguagem utilizada na novela, de fácil compreensão, e a defesa das características que faziam o Brasil de

então, mostrando a importância que Nísia atribuía à defesa da nacionalidade brasileira (expressa até em seu nome).

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Colégio Augusto Estabelecimento de ensino para meninas fundado por Nísia Floresta em 1838, no Rio de Janeiro, nomeado em homenagem ao seu companheiro Manuel Augusto, onde publicou duas breves novelas moralistas oferecidas às educandas, Daciz ou A jovem completa, Fany ou O modelo das donzelas, e o Discurso que às suas educandas dirigiu Nísia Floresta Brasileira Augusta, pronunciado no encerramento das aulas do Colégio Augusto, em 18 de dezembro de 1847.


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mente não gostariam do ensinamento de mo- nacionalidade e Augusta como homenagem ao rais revolucionárias e libertárias.

Além disso, é importante perceber que

seu segundo marido, que morreu aos 25 anos.

A Lágrima de um Caeté, publicado em

apesar de Fany não mostrar pensamento crítico 1849, é um poema de 712 versos, que foi essobre a revolução e não se posicionar perante crito logo após a derrocada dos insurgentes da essa, ela se apresenta de forma independente Revolta Praieira, em Pernambuco. É abordada

ao renunciar ao casamento para cuidar de sua a opressão do império aos nacionalistas e o família, algo que não era comum na época em sentimento vivido pelo índio após a colonizaque a novela foi escrita, ainda mais com o fale- ção portuguesa. Nísia rompe com a estética rocimento de seu pai, o que significava falta de mântica, que idealiza o índio como guerreiro e alguém que sustentasse a casa, já que apenas aliado de Portugal, e apresenta-o inconformaos homens trabalhavam nesse período. Nísia parece, ter tentado mostrar da me-

lhor e mais amena forma, por conta dos limites

do com sua situação deplorável sem mostrar passividade.

O romance histórico Dedicação de uma

impostos por seus meios, como as donzelas de- amiga, publicado em 1850, que acordo com veriam se posicionar com relação à família, de historiadores, trata-se do primeiro romance esforma educada e prestativa até mesmo nos mo- crito por alguém natural do Rio Grande do

mentos de dificuldade e discórdia, e com rela- Norte. A publicação foi feita no Brasil em dois ção ao casamento, de maneira independente e volumes quando Nísia já estava morando na crítica, podendo viver e se sustentar sem um Europa. homem. Outras obras Direitos das mulheres e injustiças dos homens, publicado em 1832 é o primeiro livro de Nísia. A autora questiona a situação das mulheres da sua época e a educação inferior que recebiam em comparação aos homens. A

partir dessa obra, ela passa a adotar o pseudônimo Nísia Floresta Brasileira Augusta (Nísia de Dionísia, Floresta devido ao nome do sítio dos pais onde nasceu, Brasileira afirmar sua Capas de seus livres disponíveis no Almanaque Projeto Memória 2006 15


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Em Itineraire d’un Voyage en Allemagne (Itinerário de uma Viagem à Alemanha) é a primeira narrativa de viagem de Nísia, publicada em1857. A escritora relata as impressões que teve ao viajar pela Alemanha através de cartas ao filho e aos irmãos.

Capa de seu livro disponível em <http://www.skoob.com.br/ livro/266188-opusculo_humanitario >

Capa de seu livro encontrada no Almanaque Projeto Memória 2006.

Nísia Floresta publicou Opúsculo Humanitário em 1853, que reúne uma coletânea com 62 artigos publicados, parcialmente, no Diário do Rio de Janeiro. Trata de uma análise diacrônica da condição feminina com foco na questão educacional. A educação feminina é defendida pela autora como aspecto fundamental para o progresso da sociedade brasileira.

Trois Ans en Italie, Suivis d’un Voyage en Grèce (Três Anos na Itália, Seguidos de uma Viagem à Grécia) foi publicado em dois volumes, o primeiro em 1864 e o segundo em 1872. Configura-se como um diário de viagem em que a escritora discute a crise e os problemas sociais que estavam ocorrendo na Itália no momento em que morou em algumas O livro Páginas de uma vida obscura - cidades italianas. Nísia ainda faz críticas à esUm passeio ao aqueduto Carioca - Pranto cravidão no Brasil. Filial foi publicado em 1854. A obra é comO último livro que Nísia publicou em viposta por três artigos que abordam os maus da foi Fragments d’un Ouvrage Inédit: Notes tratos dispensados aos negros na escravidão, o Biographiques (Fragmentos de uma Obra InéRio de Janeiro através de uma descrição ufa- dita: Notas Biográficas) , em 1878. Há infornista da beleza da capital fluminense e sobre mações sobre seu irmão, Joaquim Pinto Brao abalo psicológico que a morte de sua mãe a sil, assim como dados autobiográficos. causou.

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Mesmo com o decorrer de muitos anos desde a publicação das obras de Nísia Floresta, essa continua atual e em pauta. Atualmente, muitos estudos envolvendo a autora têm sido desenvolvidos, estando ela em primeiro plano ou não, isso porque certas ideias que ela defendia estão

sendo cada vez mais discutidas, como a questão da defesa da força e da atuação da mulher. Nísia Floresta é considerada hoje em dia como a precursora do feminismo no

Auguste Comte Filósofo Francês do século XIX, conhecido como fundador da Sociologia e do sistema filosófico chamado Positivismo, que defende que o saber científico é superior ao filosófico e os dois são superiores ao saber religioso. A influência do Positivismo no Brasil pode ser observada no lema da bandeira nacional: “Ordem e progresso”.

Brasil, e de máxima importância social no desenvolvimento da educação feminina no país. Sua relevância em tais âmbitos também é apresentada, e registrada, na literatu-

ra em defesa do gênero feminino, em obras como Opúsculo Humanitário e Direitos das Mulheres e Injustiça dos Homens, além de participações de Nísia na imprensa. Porém, muito também é discutido sobre sua literatura de viagem, considerada como testemunho da história e da época,

além de memórias da autora, que está representada nos livros Itinerário de uma viagem à Alemanha, Três Anos na Itália e Seguidos de uma Viagem à Grécia, além de

suas correspondências, que também exercem grande papel como registro da época, principalmente as trocadas entre Nísia e Auguste Comte.

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Nísia faleceu em 1885 em Rouen, França, sendo enterrada no cemitério de Bonsecours. O túmulo foi localizado e transferido para o Brasil em 1954. Um mausoléu foi construído em sua homenagem assim como um selo que os Correios e Telégrafos lançaram para esta ocasião. Selo comemorativo disponível no Almanaque Projeto Memória 2006.

Mausoléu construído em homenagem a escritora perto do sítio Floresta, onde nasceu.

A volta ao Rio Grande do Norte

Várias homenagens foram feitas a partir da vinda de seus despojos mortais. Nísia Floresta deu nome a uma cidade, uma escola, ruas em Natal, Rio de Janeiro e Porto Alegre. É patrona de cadeiras nas academias do Rio Grande do Sul, do Ceará, do Rio Grande do Norte e na Academia Nacional de Letras e Artes do Rio de Janeiro.

Museu Nísia Floresta Em 2012 foi inaugurado um museu em homenagem à escritora para a preservação de seu acervo e de sua memória na cidade onde nasceu e que leva seu nome. Há, espaços com atividades permanentes de arte, salas de leitura, de exibições audiovisuais e exposições. Oficinas e cursos de música, dança, artes plásticas e artesanato também são oferecidos para alunos e professores da rede pública de ensino e grupos de comunidade.

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Faixada do Museu Nísia Floresta. Disponível em: <http://www.panoramio.com/user/5393464/tags/N% C3%ADsia%20Floresta >


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A novela da Rede Globo transmitida em 2012, Lado a lado, teve como inspiração o espírito feminista e emancipador de Nísia Floresta para a composição da personagem Laura, interpretada por Marjorie Estiano, que não se conforma com o destino já traçado em uma sociedade machista do século XIX, que deve, obrigatoriamente, passar pelo casamento. Não se pode negar o espírito pioneiro de Nísia no jornalismo, na educação, na literatura e nas causas sociais, o que faz do estudo sobre a escritora potiguar um ótimo laboratório para a personagem.

Atriz Marjorie Estiano, intérprete da personagem Laura, da novela Lado a lado. Disponível em: < http://tvg.globo.com/novelas/lado-a-lado/Bastidores/ noticia/2012/08/marjorie-estiano-se-inspira-em-feministas-pioneiras-dobrasil-para-viver-laura.html >

Nísia Floresta como musa inspiradora

Cartas trocadas com Comte

Os dois começaram a trocar cartas, no total foram sete escrita por Comte e seis por Nísia. As cartas do positivista são mantidas preservadas no Templo da Humanidade, no Rio de Janeiro e de Nísia na Maison D’Auguste em Paris.

Na última carta de Comte há menção sobre seu estado de saúde e sua doença que provocaria a morte em 1857.

Uma das cartas de Nísia a Comte. Disponível no Almanaque do Projeto Memória 2006.

Nísia conheceu Auguste Comte em uma de suas conferências no Curso de História Geral da Humanidade, em Paris. Era comum que ela organizasse encontros em torno de Comte, porém, a adesão de Nísia ao Positivismo foi parcial , a escritora se entusiasmou pelo destaque e pela valorização que a filosofia de Comte atribuía ao sexo feminino e pela importância dada à educação.

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Nísia Floresta: uma mulher à frente do seu tempo: almanaque histórico. Paulo Corrêa Barbosa; ilustrações de Edgar Raposo. Brasília: Mercado Cultural, 2006.

Nísia Floresta: Vida e Obra. Constância Lima Duarte. Natal: UFRN. Ed. Universitária, 1995.

Cartas: Nísia Floresta & Auguste Comte. Organização Constância Lima Duarte. Florianópolis, SC; Santa Cruz do Sul: Mulheres: EDUNISC, 2002.

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