Sugestões para bibliotecas de práticas de leitura e literatura nas Olimpíadas e e Paralimpíadas

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Imagem: Associação Nossa Casa

Sugestões para bibliotecas públicas e comunitárias de práticas de leitura e literatura nas Olimpíadas e Paralimpíadas


Por que leitura, literatura e biblioteca? No mundo contemporâneo, diante da revolução tecnológica que vivemos, com o uso crescente de aparelhos eletrônicos, dos dispositivos digitais e de redes sociais, a leitura faz parte das necessidades para o exercício da nossa cidadania. Além disso, a vida social é plural, sendo que nossa sociedade aparece dividida em diferentes classes sociais, com desigualdade de renda e de acesso aos bens materiais e culturais. Assim, torna-se uma exigência que cada pessoa domine o código escrito da língua para garantir sua existência e sua participação na sociedade. Precisamos da leitura para interpretar o mundo à nossa volta, para conhecermos e nos apropriarmos dos nossos direitos e para o exercício de uma vida plena. Sem o domínio da leitura, a nossa vida fica fragmentada. Não participamos da vida social, familiar e política com consciência dos nossos deveres e direitos na sociedade. A leitura como bem cultural é um direito do cidadão, desde a infância. As crianças e os jovens precisam ter contato com livros, literatura e com profissionais da área para que a leitura literária faça parte, de fato, da vida de cada um deles. No ano em que o Brasil recebe dois importantes eventos esportivos, os Jogos Olímpicos Mundiais 2016 e os Jogos Paralímpicos 2016, uma programação literária em espaços públicos (ao longo do ano) pode ampliar o sentido dessas competições. Além disso, é um modo de fortalecer o papel das bibliotecas, na medida em que permite com que as atividades nelas realizadas dialoguem com o contexto histórico e social mais amplo. Assim, é possível transformar a inspiração esportiva olímpica em atividades e serviços oferecidos pelas bibliotecas à comunidade.

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Para os Jogos Olímpicos e Paralímpicos de 2016 a cidade do Rio do Janeiro propôs um modelo educacional diferenciado denominado GEO (Ginásio Experimental Olímpico) que vem proporcionando sucesso acadêmico e esportivo, concomitantemente, desde a sua criação há apenas quatro anos. O Ginásio Experimental Olímpico Juan Antonio Samaranch, situado no bairro de Santa Teresa, foi a primeira das quatro unidades já existentes e desenvolve um trabalho único em sala de leitura, unindo os ensinamentos literários e acadêmicos ao esportivo. Depoimentos tanto dos professores quanto dos alunos - entre 11 e 15 anos - afirmam que o esporte desenvolve, em muito, a concentração nas aulas, a percepção de mundo e o interesse pela leitura literária. Como professora de Sala de Leitura em 2016, dessa unidade escolar, posso testemunhar casos inacreditáveis de superação acadêmica e argumentativa de alunos que chegaram à escola sem o hábito da leitura em sua formação e que aos poucos foram construindo sua história dentro da escola e em suas comunidades. Ano passado, por exemplo, tivemos quase 30 alunos aprovados em escolas Federais (CEFET, FAETEC, Pedro II e a FIOCRUZ) e estaduais para o Ensino Médio, cujo maior rendimento foi em língua portuguesa e redação. Fruto de um trabalho de leitura, interpretação e escrita consolidados ao longo dos anos dentro da Unidade Escolar. Sendo que mais da metade desses alunos, além dos conceitos MB (Muito Bom) e B (Bom) em seus boletins na escola da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, também foram destaques nos esportes que praticaram. Portanto, posso afirmar, sem medo de errar, que a leitura literária constrói e tece a rede que “embala” resultados acadêmicos, sonhos e realizações pessoais transformando esses jovens em protagonistas de suas histórias dentro e fora da unidade escolar. Tânia Almeida, professora do Ginásio Experimental Olímpico Juan Antonio Samaranch, Secretaria Municipal de Educação, Rio de Janeiro, RJ

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A literatura, por sua vez, é a única expressão de arte que nos amadurece como leitores e escritores da nossa própria vida. Isso porque ela nos confronta com o desconhecido, o mistério da existência e nos exige ler/interpretar/associar/refletir. Ao nos trazer a ficção, a literatura nos transporta para um mundo imaginário, fantasioso, onde podemos experimentar o lugar e o papel de personagens semelhantes e diferentes de nós. Ocupar imaginariamente o lugar do outro faz com que possamos entender melhor o nosso papel na vida social. Ao nos trazer os versos poéticos, a literatura nos possibilita um contato com imagens e com musicalidade, tão próximas à música e ao ritmo do nosso corpo e da nossa vida: a passagem do tempo, a divisão do dia, das horas, dos anos. A poesia e a prosa, como manifestações literárias, nos fazem deslocar,

imaginar,

viver

outras

experiências.

Com

isso,

nos

tornamos pessoas mais conscientes da nossa jornada. Por um lado, há um entretenimento, algo que distrai o leitor. Por outro, há um empoderamento que as letras fazem crescer em quem lê e em quem se apropria da literatura. A biblioteca é um equipamento cultural presente na maioria dos municípios, e que deve ser acessível a todas as pessoas. É ela a responsável pelo acesso aos livros e por criar experiências com as narrativas literárias, o que contribui para a formação de leitores em nosso país. Quem frequenta a biblioteca se beneficia das obras consultadas, lidas, das atividades proporcionadas ao público. Mas aqueles que não a frequentam também podem se beneficiar de leituras compartilhadas feitas em casa com livros emprestados da biblioteca. Logo, o poder de disseminação de leitura vai além da quantidade de usuários da biblioteca e da quantidade de empréstimos realizados.

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Uma biblioteca pública é um centro cultural, onde podemos ter acesso a livros (consultas, leituras, empréstimos etc) e a debates em torno ao livro e à leitura. Ela é um bem da comunidade, da cidade, do estado, do país. Um equipamento que deve estar disponível à população. Alguns de seus propósitos: •

Oferecer acervos e serviços que beneficiem uma dada comunidade;

Dialogar com os acontecimentos contemporâneos (sociais, políticos, artísticos etc), por meio de exposições, discussões com autores e profissionais do livro e da leitura, exibição de filmes, atualização do acervo;

Integrar-se à vida da comunidade ao seu entorno, abrindo espaços de participação para os seus usuários;

Ser um equipamento cultural que dissemine leituras e saberes, possa absorver tradições, inovações e irradiar cultura;

Fortalecer o sentido autossustentável da vida contemporânea, ao oferecer exemplos para as pessoas fazerem coleta de lixo seletiva, aproveitamento de acervos. O acervo deve ser renovado e cuidado. O que não serve pode e deve ser passado adiante. Campanhas de atualização de acervo e planejamento conjunto de atividades são estratégias de sustentabilidade.

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Esportes combinam com literatura e vice versa

Trabalhei com alunos-atletas durante os anos de 2013 e 2014. No começo, achava que seria difícil levar a leitura literária para pessoas que são envolvidas com algo tão instigante como o esporte. Depois percebi que tanto uma quanto o outro possuem muitas semelhanças e são movidos por um mesmo sentimento: a paixão. O esporte trabalha com a disciplina. A literatura mexe com a sensibilidade. Uma combinação perfeita para a formação de qualquer cidadão. No final, todos saem ganhando. (Martha Maria Gomes, Elemento de equipe da Gerência de Mídia Educação, Secretaria Municipal de Educação, Rio de Janeiro, RJ)

A leitura, atividade de entretenimento para as crianças, os jovens e os adultos pode ser aliada à prática de esportes. Fazer exercícios físicos pode caminhar junto com os exercícios para a nossa subjetividade (a leitura literária, por exemplo). Uma atividade deve ser parceira da outra. Em relação ao jovem, ele deve ser incentivado a diferentes práticas artísticas e desportivas. Isso contribui para o seu crescimento físico, emocional, cognitivo e intelectual saudável. É o que chamamos de bemestar biopsicossocial. Nada como repousar de um dia de esportes com a leitura de um livro. Além disso, o corpo é nosso referencial em relação ao mundo. É por meio dele que existimos e nos relacionamos com os demais. Portanto, não podemos separá-lo da mente, do intelecto, dos pensamentos e dos sentimentos. A mente não existe sem o corpo e este não existe sem a mente. Associar atividade física à educação é

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um caminho necessário para articular conceitos centrais de uma nova visão pedagógica. Atividade física não é só entretenimento. Ela é, em sua essência, um poderoso recurso educacional. Além de motivar e despertar a criatividade da criança, a atividade física trabalha a comunicação, a confiança e a capacidade de interação social. Ela é, em última análise, uma estratégia dinâmica que possibilita novas formas de pensar e construir o conhecimento. Hoje sabemos que engajar simultaneamente o cérebro e o corpo durante o aprendizado melhora significativamente o desempenho em outras tarefas. Esta estratégia didática é baseada na crescente evidência científica da relação entre atividade física e aprendizagem. Há evidências de que certos movimentos repetitivos do corpo abrem caminhos neurais que facilitam tanto a disposição para aprender (atenção) quanto a capacidade do cérebro para se desenvolver (ou seja, aprender novas informações). Por exemplo, crianças solucionam problemas matemáticos de uma forma mais eficaz quando gesticulam ao raciocinar, o que nos ensinou a estudiosa norte-americana Susan Goldin-Meadow. Em outras palavras, o que a literatura científica tem demonstrado de forma recorrente é que nós pensamos não apenas com nosso cérebro, mas também com nosso corpo. Sabemos de obras que abordam os esportes, a prática esportiva, algumas delas de caráter informativo, com curiosidades e informações sobre os esportes. Elas podem ser esclarecedoras, trazer conteúdos que orientem o leitor, construam diálogos e funcionem como material de referência para orientação às dúvidas. Assim como livros, há vídeos, filmes, peças de teatro etc. Outras obras, de caráter ficcional, que tratam da vida de um atleta ou de um contexto de práticas esportivas, são também usuais

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no mercado de livros literários. Podem colocar o leitor em confronto com personagens diferentes dele e o levarem a entender melhor suas escolhas de entretenimento, esportes, escolares, acadêmicas etc. E as obras de caráter poético, com poemas, versos que saúdam os esportes e/ou os atletas. São textos para serem lidos, cantados, apreciados. E há ainda as obras de caráter biográfico (não ficcional), com depoimentos de atletas, suas experiências, seus desafios e glórias etc. Essas leituras costumam ser mais diretas para o leitor. Com essa variedade de publicações podemos sugerir várias atividades leitoras para as bibliotecas públicas e comunitárias, que unam os esportes e a leitura. Outra boa dica é estar sempre atento às novidades do mercado de livros.

Trabalhar literatura com alunos atletas pode parecer, a princípio, um grande desafio. No entanto, vivenciar essa experiência trouxe à luz as inúmeras possibilidades de interação entre o esporte e a literatura (...). Entre os anos de 2012 e 2013, período em que lecionei Língua Portuguesa como professor polivalente de Humanidades (além de História e Geografia), no Ginásio Experimental Olímpico Juan Antonio Samaranch, dois projetos sintetizaram esse diálogo entre as letras e os treinos. O primeiro, iniciado com a exibição do curta metragem “Uma História de Futebol” no cineclube da escola (CineGEO), estimulou os alunos a produzirem relatos de suas experiências com o esporte a partir da leitura do livro homônimo que deu origem ao filme. O segundo, foi uma parceria entre Humanidades, Matemática e Sala de Leitura para a produção de uma espetáculo teatral chamado “Geocrônicas na Arquibancada”, em comemoração aos centenários de Rubem Braga e Vinícius de Moraes. Nele, os alunos tiveram contato com a vida e a obra do cronista e do compositor, estabelecendo um diálogo entre fragmentos de textos, músicas e a paixão pelo esporte. José Leandro Cardoso foi professor do Ginásio Experimental Olímpico Juan Antonio Samaranch, Secretaria Municipal de Educação, Rio de Janeiro, RJ

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Durante muito tempo, imaginou-se que esporte e cultura, em sentido amplo, fossem áreas diversas e não congruentes. Isto se deu porque, ao falarmos de esporte, nos vem à cabeça imediatamente as grandes competições e campeonatos, com atletas altamente preparados e com a preocupação com o rendimento e com a superação dos limites corporais e temporais. No entanto, o esporte está muito além do rendimento. Vem daí o conceito de esporte educacional, o qual busca unir o âmbito esportivo com cultura e educação. Neste sentido, ao aliar esporte, cultura e educação, é possível atingir a formação ampla do indivíduo e atuar na busca por mais inclusão e transformação social. O conceito de esporteeducação foi criado pela Carta Internacional de Educação Física, elaborada pela Unesco, como reação ao uso do esporte competitivo para fins políticos durante a Guerra Fria. No Brasil, o esporte educacional foi reconhecido formalmente em 1998, pela Lei 9615.

Leitura + Literatura + Livro é um trinômio do qual não podemos prescindir no cotidiano social. É vital na formação básica escolar de uma nação que queremos fortalecida e reconhecida mundialmente. Portanto, despertar, incentivar e promover a leitura no âmbito desportivo também é uma necessidade, pois, auxilia no processo de autonomia e na formação de valores de cada atleta. No Centro Educacional Anísio Teixeira – CEAT, literatura, artes e esportes são esferas primordiais para a prática do convívio humano – o desenvolvimento do sentido da união do grupo e o exercício do reconhecimento do outro que não sou eu. (Emília Fernandes, diretora pedagógica do Centro Educacional Anísio Teixeira – CEAT, Rio de Janeiro, RJ)

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Os princípios do esporte educacional não seguem necessariamente as regras dos diversos esportes e a proposta é readaptá-las aos muitos contextos locais, inserindo atividades culturais e educacionais. Em linhas gerais, o esporte educacional se baseia nos seguintes parâmetros: •

Totalidade: cada indivíduo é entendido como uma junção de diferentes âmbitos, sendo necessário levar em conta não apenas o corpo em si, mas as emoções, a imaginação, o pensamento e a influência do meio mais amplo em que cada um se situa.

Participação: todos participam das atividades, de acordo com suas aptidões e respeitando suas crenças e individualidades. Há o estímulo à não-competitividade e à parceria.

Contextualização: todas as atividades são pensadas contextualmente, respeitando os diferentes marcadores sociais da diferença em jogo, tais como, raça, classe social, renda, gênero e sexualidade.

Pelo Brasil afora, possuímos vários exemplos de instituições públicas e organizações não-governamentais que aplicam o conceito de esporte educacional, com o objetivo de melhorar a vida de crianças e jovens, despertando neles o protagonismo social e possibilitando o contato com diferentes visões de mundo. Assim, o conceito de esporte educacional é perfeitamente aplicável às atividades desenvolvidas nas bibliotecas, na medida em que permite unir esporte e educação sem uma vinculação com o sentido estrito da prática esportiva. As próprias regras das modalidades esportivas podem ser adaptadas em atividades que as mesclem com a leitura. Neste sentido, a leitura é um aliado estratégico para o esporte

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educacional, como mostra o depoimento de Eduardo, ex-atleta e dinamizador comunitário de uma comunidade da cidade do Rio de Janeiro:

Sou ex-atleta de futebol e, desde 1997, atuo em projetos sociais, no conjunto de favelas chamado Complexo do Muquiço. Vejo claramente que o esporte sozinho tem resultados parciais. Focar apenas no rendimento exclui grande parte dos participantes. Na ONG que dirijo, trabalhamos com o esporte educacional, associado a atividades como leitura, cinema e música, sendo que cada criança ou jovem é livre para descobrir aquilo que mais gosta e se dedicar a estas atividades. Enfatizamos o caráter lúdico do esporte e também da educação. Você aprende desenvolvendo suas várias capacidades, não importando a competitividade, o rendimento e ser o melhor. Durante esses anos de trabalho, percebi o quanto a comunidade tinha pouco acesso a livros e, por isso, resolvemos investir na leitura, com nosso projeto “Favela Leitora”. Temos 3 tipos de atividades: as rodas de leitura, a doação de livros e a gelatoteca. (Eduardo Silva, ex-atleta e dinamizador comunitário).

Outro ponto importante é que associar esporte e leitura permite até mesmo uma ressignificação dos espaços. Campos, quadras e outros equipamentos esportivos públicos deixam de ser locais destinados apenas à prática esportiva e são transformados em lugares onde é possível o contato com a prática de leitura. Além da bola, das traves, das cestas, dos tênis, dos apitos, dos maiôs e calções, dos uniformes, também há espaço para os livros. Carolina Parreiras, gestora de projetos de uma ONG do Rio de Janeiro, conta um pouco dessa experiência:

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No projeto “Favela Leitora”, realizamos a ocupação de quadras e campos das comunidades com atividades relacionadas à leitura. A opção pela ocupação destes locais tem como fim sua transformação em espaços não-formais de leitura, sendo que, deste modo, pode-se contribuir para o aumento da sensação de pertencimento destas populações, para atingir um público mais amplo, bem como para o incremento do cuidado com os espaços públicos. São realizadas atividades que permitem tanto o contato com o acervo de livros, quanto a vivência de experiências proporcionadas pela leitura, tais como, contação de histórias e o troca-troca de livros, por meio do que chamamos de gelatoteca. Como estas quadras e campos são locais muito conhecidos da comunidade e com grande frequência, disponibilizamos em uma geladeira remodelada, livros que ficam disponíveis para retirada. Qualquer um pode também deixar ali seus livros que circularão por entre novos leitores. Assim, é possível fazer um jogo de futebol, por exemplo, e propor antes ou depois uma atividade de leitura, possibilitando o contato com o acervo disponível, o debate de ideias, a leitura compartilhada e a troca de ideias. Carolina Parreiras, gestora de projetos da Instituição Nossa Casa.

Ainda nesta linha de raciocínio,

Realizar atividades de leitura em campos e quadras da comunidade atrai as crianças, por se tratar de um lugar comum e íntimo de todos eles. Nesses locais, realizamos atividades que agregam o esporte e a literatura. Ao contrário do esporte de rendimento, a literatura e o esporte educacional não excluem. Pelo contrário, são ferramentas de inclusão, educação e socialização entre mundos diferentes. Viviane Mattar, coordenadora de projetos da Instituição Nossa Casa.

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O que estes exemplos nos mostram é que o esporte e a leitura não são, de forma alguma, atividades incompatíveis. Um atleta ou praticante de esporte que lê, desenvolve diferentes faculdades de sua construção como indivíduo. Além disso, ele pode ter contato com universos diversos do seu: povos, cenários, subjetividades. E um leitor pode ser um atleta ou pode praticar esportes, respeitando suas aptidões, suas peculiaridades e suas preferências. Diante do cenário das Olimpíadas e Paralimpíadas 2016, na cidade do Rio de Janeiro, é oportuno para os brasileiros pensarem sobre essa aproximação leitura/esportes. Sobretudo, é importante enfatizar que não se tratam de atividades excludentes, mas sim, complementares, na medida em que auxiliam na formação do indivíduo e no reconhecimento de sua cidadania.

Os continentes e a literatura Você sabia que o símbolo olímpico, composto por cinco anéis/ aros coloridos e entrelaçados, se referem aos cinco continentes? Este foi originalmente concebido, em 1913, pelo Barão Pierre de Coubertin, fundador dos Jogos Olímpicos como praticados hoje. O anel azul representa a Europa; o amarelo, a Ásia; o preto, a África; o verde, a Oceania; e o vermelho, a América. Como sabemos, existem inúmeras diferenças entre os povos: língua, cultura, modos de vida, costumes, crenças. Em eventos como as Olimpíadas e Paralimpíadas, esta diversidade é notável, sendo que o Brasil receberá uma miscelânea de gentes. Assim, o ideal olímpico celebra e enfatiza a diferença como diversidade e como troca e diálogo. E a literatura é uma expressão artística que lida com a diferença e a subjetividade. Cada obra literária lida afeta os leitores de maneiras

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diferentes. Isso porque sua identidade, sua história de vida é única. e, consequentemente, sua experiência leitora também será única. O significado simbólico dos aros olímpicos é a união entre as diferentes nações, com ênfase em valores como o humanismo e o universalismo, sem discriminação de qualquer espécie. Estes são valores evocados pelos Jogos Olímpicos e Paralímpicos, sendo que eles funcionam como uma congregação de atletas de diferentes locais do mundo, com ênfase na diversidade e no respeito mútuo. Outro símbolo importante dos ideais e objetivos olímpicos é a chamada Trégua Olímpica, que tem como objetivo enfatizar a cultura de paz entre os povos.

Confira as palavras de um escritor gaúcho de Caxias do Sul/RS. Ele se dedica a abordar o lado humano de esportistas do passado, em um exercício de não-ficção criativa: Como autor de histórias que resgatam velhos campeões do esporte, tive uma experiência frustrante, no sentido de tentar interagir com os mesmos. Enviando os meus livros para os protagonistas das minhas crônicas, raramente recebi algum tipo de retorno. Uma saudável exceção foi o Eder Jofre (ex pugilista brasileiro), que chegou a ligar na minha casa para agradecer o livro enviado. No fim, cheguei à conclusão que o atleta, de um modo geral, não lê. Lúcio Humberto Saretta é autor de Alicate contra diamante, Crônicas douradas e Lições da barbearia. Finalista do concurso Brasil em Prosa, promovido pelo jornal O Globo, em 2015.

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Uma boa pedida é que na sua biblioteca os livros estejam organizados por países ou por continentes. Já pensou nisso antes? Que tal colar um selo ou adesivo colorido nos livros para identificá-los com essas cores? Ou dividir os livros por prateleiras sinalizadas por cores? A apresentação e visibilidade de uma biblioteca fazem diferença no interesse/não interesse do visitante. Você já parou para pensar sobre quantos continentes podem estar presentes em um livro de história? De onde é o autor que a escreveu? Qual a origem da sua família (a sua ancestralidade)? Onde se passa a história? E onde foi impresso, pela primeira, aquele texto? E o leitor, qual a origem dele? Tudo isso constitui uma diversidade que faz de um livro um universo muito mais amplo do que podemos supor.

Mesmo se o livro for brasileiro, o autor brasileiro, você poderá

averiguar sobre a ancestralidade do autor. E sobre a história ou poema. Onde surgiu aquela categoria de livro ou gênero literário? No final das contas, vai descobrir como estamos entrelaçados a diferentes povos pelas histórias que lemos.

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Sugestões de programação cultural Exposições na biblioteca: •

Linha do Tempo dos jogos Olímpicos desde 1896, a ser montada em cartolina, em maquete ou digital (se a biblioteca dispor deste recurso);

Atletas brasileiros que se destacaram nos jogos; / Modalidades específicas de esportes e sua origem (fotos, desenhos etc);

Fatos interessantes ou curiosidades relacionadas às Olimpíadas (em mural, painel, cartolina);

Mostra sobre a cidade do Rio de Janeiro, sede dos Jogos Olímpicos em 2016, primeira cidade da América Latina a sediar uma Olimpíada (histórico da preparação da cidade para sediar os jogos, com recortes de jornais, notícias);

Mostra de Mascotes desde a primeira Olimpíada da Era Moderna; / Atletas da cidade onde a biblioteca está localizada;

Exposição de camisetas dos times da comunidade e dos atletas presentes no território onde a biblioteca está alojada;

Exposição especial sobre as Paralímpiadas, desde seu surgimento, com enfoque especial na inclusão;

Mostra de filmes com foco nas diferentes modalidades esportivas olímpicas e paralímpicas;

Mostra de objetos feitos por pessoas deficientes da sua comunidade: artes, artesanato, como um meio de contato com pessoas que vivem um mundo a parte, com dificuldades de inserção social.

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Concursos: •

Concurso de redação sobre os jogos olímpicos (pode ser especificada a participação de crianças e jovens, a critério da biblioteca pública);

Concurso de desenho dos Mascotes 2016, Olímpicos e paraolímpicos;

Concurso de jingles (uma música feita especialmente para um produto, de fácil memorização) relacionados às Olimpíadas;

Concurso de poemas sobre os esportes;

Concurso de conto ou crônica sobre os esportes;

Levantamento de frases de atletas famosos. Pesquisa de frases que fizeram história;

Gincanas sobre os jogos;

Em cidades com mais de uma Biblioteca Pública, poderiam ser realizados torneios, jogos e gincanas entre os usuários das bibliotecas destacando o papel social das bibliotecas e a interação da comunidade.

Os concursos podem ser dirigidos a crianças, jovens e adultos. Para a comissão julgadora, podem ser convidados profissionais do livro e da leitura da cidade. Ou jornalistas, blogueiros etc.

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Palestras: •

Convidar pessoas para falar sobre os esportes, a história das olimpíadas / das paralimpíadas, a história dos atletas, narrar fatos interessantes, tanto no âmbito olímpico como paralímpico;

Convidar autores para conversarem sobre seus livros e também se praticam ou praticaram algum esporte;

Convidar professores de educação física, treinadores, atletas para falarem de suas leituras preferidas.

Mais atividades: •

Pesquisa junto à comunidade de peças de teatro, apresentações musicais associadas aos esportes e aproveitamento para exibição;

Antes de serem atletas são crianças e adolescentes, e é com esse olhar que eu indico ou escolho textos para trabalhar com as turmas. Aqui eles passam por uma experimentação nos esportes. Eles experimentam todas as modalidades até identificarem aquelas que mais se identificam, brinco que na literatura também é assim, precisamos experimentar diversos textos e gêneros para nos identificarmos mais com algum. Aqui eles descobrem modalidades que nem conheciam, e na literatura também acontece isso. Também dou o exemplo com os filmes, não é todo filme que assistimos que gostamos. Depois de assistir alguns, conseguimos identificar o gênero que mais nos agrada. Na literatura também é assim. E quando você lê, você passa a ser o diretor do filme, porque você constrói na sua cabeça as cenas de acordo com o roteiro que o autor te passa. Vanessa Lima, professora do Ginásio Experimental Olímpico Félix Mielli Venerando, Secretaria Municipal de Educação, Rio de Janeiro, RJ

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Inclusão de moradores da comunidade em atividades de debates, apresentações etc. Moradores atletas ou não atletas que tenham histórias para contar.

Mostra audiovisual temática: •

Filmes ou desenhos relacionados aos jogos olímpicos (ficção);

Documentários sobre atletas ou determinadas modalidades mais específicas, como futebol, atletismo, natação etc.

As bicicletas de Belleville (desenho) Boleiros Campo dos sonhos Carruagens de fogo Driblando o destino Duelo de Titãs Febre de bola Gol! Invictus Jamaica abaixo de zero Karatê Kid Menina de ouro Olympia Rocky: um lutador Space Jam (desenho) Um sonho possível Um time show de bola (desenho) O vencedor Coleção Memória do Esporte Olímpico Brasileiro (disponível em http://memoriadoesporte.org.br/ documentarios)

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Mediações de leitura Uma biblioteca deve dialogar permanentemente com o contexto social e cultural. Logo, as bibliotecas podem organizar pequenas exposições de livros, por continentes. Isso vai chamar a atenção dos usuários e trazer curiosidade para a leitura. Pode estar sobre uma mesa, um balcão, com as bandeiras de alguns países ou cartões e outros objetos característicos dos países. As estantes também podem trazer cores ou símbolos que chamem a atenção. A programação da biblioteca pode contar com atividades de: •

mediação de leitura, de preferência, obras de diferentes continentes. Não necessariamente obras sobre esportes, mas leituras que tragam um passeio pela diversidade de povos;

Criação de espaços não-formais de leitura, em quadras e campos que se situem próximos às bibliotecas, trazendo condições para ressignificação dos mesmos e para um maior contato com a comunidade;

criar um espaço para livros serem abandonados/esquecidos, ou seja, o leitor poderá deixar livros que não quer mais e pegar algum que queira. Isso vai movimentar os livros, as pessoas e as leituras;

debates sobre livros e autores;

bate papos com escritores e outros profissionais do livro;

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depoimentos de atletas sobre suas experiências leitoras. Convidar um atleta da comunidade e ele será entrevistado para contar sobre suas leituras;

mutirão da comunidade reunindo objetos, manuais, revistas, gibis, livros que se relacionam aos esportes;

retrospectiva da biblioteca sobre a história dos esportes ali na região onde está;

criar um jornal mural, com notícias sobre esportes e sobre a vida cultural dos atletas;

rodas de leitura: será escolhido um tema, um autor ou trecho de um livro a ser lido e discutido no grupo.

Diante deste cenário internacional que o Brasil está vivendo com as Olimpíadas e as Paralimpíadas, você deve ter notado como a literatura é de uma riqueza ímpar. Possibilita aos bibliotecários, agentes de bibliotecas, mediadores de leitura, professores e demais profissionais do livro, uma gama de explorações leitoras. E não podemos esquecer que esportes e literatura podem conviver bem na biblioteca e nas atividades culturais oferecidas à comunidade. Nesta oportunidade única, em que nosso país é palco de duas importantes competições internacionais, sua biblioteca deve se mobilizar e aproveitar o momento para dinamizar as leituras, movimentar os acervos e dialogar com a vizinhança, associando esportes, leitura e as artes de modo geral. Ao longo deste ano de 2016 e de outros que virão, a literatura precisa ser a personagem principal do seu trabalho. Isso vai fortalecer nossa nação e abrir caminhos para mais leitores e o crescimento de uma cidadania comprometida com o cenário cultural e social em que vivemos.

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Bibliografia sugerida Infantil •

Alguém para jogar com Bóris, de Edward van de Vendel.

Clara e as olimpíadas de 2016, de Ilan Brenman.

Cordel dos atletas: o espírito olímpico, de Sandra Lopes.

A decisão do campeonato, de Ruth Rocha.

Enfim, Atleta, de Anna Claudia Ramos.

Esportes radicais, de Ziraldo.

Uma história sobre futebol, de José Roberto Torero.

Jackie: uma campeã olímpica, de Rodrigo Lacerda & Fabiana Werneck Barcinski.

O livro das garotas audaciosas, de Miriam Peskowitz & Andrea J. Buchanan.

Maluquinho por esporte, de Ziraldo.

Você conhece os jogos olímpicos?, de Alexandre Martins.

Adultos •

Almanaque das Confederações do mundo inteiro, de Rodolfo Rodrigues.

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Atletas olímpicos brasileiros, de Kátia Rúbio.

Brasileiros olímpicos, de Lédio Carmona et al.

Capoeira: a circularidade do saber na escola, de Maria Lopes de Araújo.

Capoeira: uma herança cultural afro-brasileira, de Elisabeth Vidor.

O ciclista mascarado-uma aventura de bicicleta na África ocidental, de Neil Peart.

Educação Física Desenvolvimentista para todas as crianças, de David L. Gallahue & Frances Cleland Donnelly.

Esportes de aventura ao seu alcance.

Formação de esportistas, de Valdir J. Barbanti.

Futebol ao sol e à sombra, de Eduardo Galeano.

Futebol – Arte do Oiapoque ao Chuí, de Caio Vilela.

O guia dos curiosos: Jogos olímpicos, de Marcelo Duarte.

O ideal olímpico e o herói de cada dia, de Phil Cousineau.

Jogos de todo o mundo, de Oriol Ripoli & Rosa Maria Curto

Manual poético dos esportes olímpicos (e um dedinho de prosa), de Luís Eduardo Lacombe.

Mestres e capoeiras famosos da Bahia, de Pedro Abib.

Minha vida em imagens, de Edson Arantes do Nascimento.

O negro no futebol brasileiro, de Mário Rodrigues Filho.

Olimpíadas: Os Jogos Olímpicos através dos tempos, de Richard Platt.

Pelé: a importância do futebol, de Edson Arantes do Nascimento.

Resenha esportiva, de Nelson Motta.

Sustentabilidade, governança e megaeventos: Estudo de caso dos Jogos Olímpicos, de Maureen Flores (org).

Time dos sonhos, de Luís Fernando Veríssimo.

100 histórias dos jogos olímpicos, de Mustapha Kessous.

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Tente fazer um levantamento dos livros que você tem na sua biblioteca que tratam dos esportes. Faça um resumo deles ou busque resenhas que estejam postadas na internet. Organize a “propaganda” desses livros, ou seja, uma divulgação que atraia o leitor. Isso pode ser colocado em um painel, mural, quadro. Ou até em uma cartolina. Use a imaginação! Aqui temos alguns livros comentados que trazem leituras associadas aos jogos olímpicos:

O guia dos curiosos: Jogos olímpicos

Marcelo Duarte. São Paulo: Panda Books, 2012. 336p.

Este livro informativo, uma pequena enciclopédia dos esportes, de autoria do jornalista Marcelo Duarte, que cobriu as Olimpíadas de 1988 e 1996 como repórter da revista Placar e as de 2004 e 2008, como repórter da ESPN Brasil, está com a edição atualizada e novo projeto gráfico. É uma obra para consulta, leitura e pesquisa para leitores de todas as idades. Traz desde fatos históricos e das origens das olimpíadas até curiosidades sobre os jogos nos tempos contemporâneos. São 10 capítulos repletos de informações, nomes de atletas, países etc. Destaque para os capítulos “Início das Olimpíadas”; “Piores momentos dos jogos” e ”As medalhas e o pódio”. São passatempo de leitura e podem agradar a todo tipo de pessoa.

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Cordel dos atletas: o espírito olímpico

Sandra Lopes. Ilustração Julio Carvalho. Rio de Janeiro: Zit, 2015. 40p.

O cordel, forma poética bastante nacional, tem suas origens no nosso folclore, com influência dos povos ibéricos e um tempero dos nativos e negros que constituíram o povo brasileiro. Ritmo, humor, descontração são algumas das suas marcas. O desafio e a improvisação são bem acolhidos. Já imaginou um livro em forma de cordel que fala do espírito olímpico? Sextilhas (estrofes de seis versos), com a rima na 2a, 4a e 6a linhas, trazem graça e passeiam pela história dos jogos. Tudo isso ilustrado para divertir leitores de todas as idades.

Manual poético dos esportes olímpicos (e um dedinho de prosa) Luís Ernesto Lacombe. Ilustração Leo Queiroz. Rio de Janeiro: Escrita Fina, 2016. 140p.

Apresentador de esporte do Bom Dia Brasil, Rede Globo, Luís Ernesto Lacombe, também praticante dos esportes, se dedicou aqui ao soneto, forma poética clássica de quatro estrofes. E cada modalidade esportiva ganha um poema, como o judô, hóquei, hipismo, ginástica, futebol, ciclismo, canoagem, boxe, vela, tiro, tênis etc. Já pensou quantos esportes e quantos poemas para serem lidos e declamados na sua biblioteca? E ainda há curiosidades sobre algumas modalidades esportivas, o que enriquece mais ainda este livro.

100 histórias dos jogos olímpicos

Mustapha Kessous. Tradução Maria Luiza Newlands. Rio de Janeiro: Edições De Janeiro, 2016. 148p. Se os jogos olímpicos nos contam sobre a história da sociedade humana, suas competições, suas práticas esportivas, sua diversidade, muitas histórias brotam desses jogos que surgiram há muitas centenas de anos atrás. A maior competição esportiva do planeta gerou uma série de vitórias, frustrações e de acontecimentos que marcaram a vida social e cultural dos povos. Aqui estão reunidos 100 fatos históricos relevantes da história dos esportes. Para leitores de todas as idades, esta obra pode ser lida pulando partes, escolhendo os episódios.

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Autoria do texto: Ninfa Parreiras Pesquisa: Carolina Parreiras Colaboração: Monica Baloussier Fotografia: Acervo da Associação Nossa Casa


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