O principio do fim apocalipse manel loureiro doval

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dizer tudo. Nossa situação estava ficando bastante preocupante. Uma vez mais, tínhamos de continuar correndo. Após fazer um curativo na mão dele, saímos cautelosamente da sala das enfermeiras. O corredor estava vazio, mas o tiro da AK parecia ter desatado um ataque de fúria no hospital. Ouviam-se de novo os gemidos e as batidas, só que dessa vez muito mais perto. Da sala fechada que ficava bem em frente, do outro lado do corredor, saíam uns golpes surdos, como socos em um muro. Apoiei a mão na parede e senti a vibração. Havia algo bem do outro lado da fina parede, algo que estava descarregando socos de raiva. Afastei-me, assustado. Rezei para que, fosse o que fosse, não conseguisse sair dali. Um súbito som de vidros quebrados nos assustou. O som vinha de duas salas além, por onde havíamos passado menos de dez minutos antes. Alguém havia tropeçado em alguma coisa, espatifando-a. Os rugidos já se ouviam mais perto. Prit colocou Lúculo no colo e, com a AK engatilhada na mão boa, fez sinais com a outra. Fui para trás da cadeira de novo e empurrei, dessa vez mais rápido que antes. Sentia um peso enorme no estômago e um suor frio descendo pelas minhas costas. Estava assustado, assustado de verdade, e não me importa reconhecer. Acho que qualquer um nessa situação estaria morrendo de medo, e quem disser que não ou é um mentiroso, ou um inconsequente. O corredor desembocava, depois de uma porta arrebentada, em um setor um pouco mais amplo. Uma enorme placa branca pendurada sobre nossa cabeça dizia "PEDIATRIA" com grandes letras azuis. Nas paredes, desenhos infantis de campos cobertos de vacas, palhaços e margaridas davam à sala um curioso aspecto de creche, imagino que para parecer mais tranqüilizador para seus pequenos pacientes. No entanto, naquele instante, o ambiente estava totalmente arruinado pelos grumos de sangue seco que salpicavam a decoração aqui e ali. Dava a sensação de que alguém havia acionado um gigantesco moedor de carne no meio daquela sala. Prit suspirou, angustiado. Sequei o suor da testa. O calor ali era opressivo. Em frente a nós, na parede, o desenho de um imenso palhaço nos observava com um grande sorriso, sem saber que uma enorme mancha de sangue seco cobria seu rosto. Tinha escrito "Pupi Dudi" no macacão amarelo e segurava um gigantesco feixe de balões na mão enluvada. O macacão pingava sangue e um grumo de massa cerebral seca estava incrustado em seus dentes, dando-lhe um aspecto diabólico. Estremeci. O simpático Pupi Dudi parecia um predador demente com restos de suas vítimas na boca, prestes a pular da parede. Aquela sala era um pesadelo. Afastamo-nos daquele desenho e seguimos nosso caminho, evitando olhar certas cenas realmente desagradáveis. Não era preciso ser muito esperto para perceber que alguém, em algum momento, havia se entrincheirado naquela sala para oferecer resistência. Pelo que se podia ver, era fácil adivinhar como aquilo havia terminado. Dezenas de cartuchos de bala forravam o chão e montes de corpos malcheirosos se acumulavam


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