Desenvolvimento Social, Envelhecimento e Saúde

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DESENVOLVIMENTO SOCIAL, ENVELHECIMENTO E SAÚDE Social Development, Aging and Health


DESENVOLVIMENTO SOCIAL ENVELHECIMENTO E SAÚDE SOCIAL DEVELOPMENT, AGING AND HEALTH

COORDENAÇÃO: Paula Coutinho Ermelinda Marques João Leitão

COLABORADORES:

Agostinha Corte, Ermelinda Marques, João Leitão, Maria Hermínia Barbosa, Paula Coutinho, Maria João Nunes, Fátima Roque e Maximiano Prata Ribeiro Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico da Guarda (ESS – IPG) Unidade de Investigação para o Desenvolvimento do Interior (UDI)

EDIÇÃO:

Instituto Politécnico da Guarda Av. Dr. Francisco Sá Carneiro, 50 6300 – 559 Guarda

DESIGN, PAGINAÇÃO E EXECUÇÃO GRÁFICA Serviço de Artes Gráficas do IPG

DESIGN CAPA

Humberto Pinto (ESTH/IPG)

TIRAGEM

300 exemplares

DEPÓSITO LEGAL: 338167/11 ISBN: 978-972-8681-40-1 CO-FINANCIAMENTO: PEst-OE/EGE/U14056/2011


Índice

NOTA DE ABERTURA..................................................................................... 4 ENVELHECIMENTO E SOCIEDADE DE BEM-ESTAR ......................................... 7 João Leitao ENVELHECIMENTO ATIVO E SEXUALIDADE ................................................ 37 Ermelinda Gonçalves Marques Maria Hermínia Barbosa ENVELHECIMENTO E ALTERAÇÕES NUTRICIONAIS ...................................... 53 Agostinha Corte ENVELHECIMENTO E POLIMEDICAÇÃO ....................................................... 63 Fátima Roque ENVELHECIMENTO E DEPRESSÃO ............................................................... 81 Ermelinda Gonçalves Marques Maria João Nunes ENVELHECIMENTO E CICATRIZAÇÃO .......................................................... 93 Paula Coutinho Maximiano Prata Ribeiro


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Envelhecimento e Sociedade de bem-estar

Nota de Abertura Hoje tinha como principal objetivo realizar esta introdução. No dia anterior a ideia, a partir do meio da tarde, tinha-me vindo a assolar, em tom de desafio umas vezes, outras porém no receio do confronto da folha em branco, que penso desassossegar muitos dos que se aventuram a tentar ultrapassar a letargia inicial da escrita. Tudo isto para dizer que, no trajeto que todos os dias realizo entre Castelo Branco e a Guarda, não poderia deixar de ver a realidade que sempre entra pelos meus olhos e que serve hoje de reflexão a esta equipa de investigação, sendo também o tema deste livro. Depois de refletir durante algum tempo, tinha já estruturada a forma como pelo menos iria começar esta introdução; contudo, aos altifalantes do rádio do meu carro, impunha-se uma voz que em tom agudo começava mais um frenético e informativo noticioso. O locutor de serviço esforçava-se por debitar mais palavras do que as que conseguia dizer num esforço inglório. No meio da banda sonora da manhã informativa, percebia-se que a grande notícia de abertura era: “Em Portugal nasceram menos 776 bebés”; deste momento em diante viajava com toda a equipa de investigação que deu corpo a este trabalho no meu pequeno, mas generoso, carro. Mais adiante, na continuação da notícia, ouvíamos que o principal problema seria que num futuro próximo, com a diminuição da população ativa, não haveria quem pagasse os impostos que sustentam o Estado Social. Sendo esta certamente uma realidade que nos irá preocupar num futuro não muito longínquo, reduzir esta questão a uma abordagem meramente contabilística, seria esquecer que esta problemática é bem mais vasta e que, para além da fraca taxa de natalidade, temos uma grande taxa de envelhecimento da população portuguesa, que se vem agravando desde os anos 90 e que hoje já resulta num saldo fisiológico negativo. Estas duas faces da mesma moeda são, sem dúvida alguma, o ponto de partida para a reflexão que deixamos aqui, perante uma realidade com a qual cada um dos membros desta equipa de investigação. sediada no interior e vivendo num eixo dos mais


Envelhecimento e Sociedade de bem-estar

envelhecidos do país, não poderia deixar de ser sensível ao envelhecimento daqueles que lhes são próximos. Assim, na abordagem desta temática, damos conta do percurso que Portugal tem vindo a fazer até aos nossos dias, esforçando-nos por integrar a atualidade tanto quanto possível, neste nosso trabalho, desde questões como a evolução demográfica ao estado social, num espaço que pretende dar conta do estado da arte, a questões inerentes à qualidade de vida daqueles cidadãos que envelhecem e em que os seus episódios de saúde, ou melhor, de falta dela, vão exigindo cada vez mais e melhores cuidados de saúde de forma a assegurar qualidade de vida dos nossos seniores. Deste modo, convidamos os nossos leitores a realizarem a viagem por esta realidade no nosso convívio, esperando com este contributo reclamar maior atenção para o envelhecimento da população portuguesa e para os fatores inerentes ao envelhecimento desta, em particular no interior, onde está sediada esta nossa Unidade de Investigação do Interior.

João Leitão


Envelhecimento e Sociedade de bem-estar

Envelhecimento e Sociedade de bem-estar João Leitão

Caraterizando a economia portuguesa do pós-guerra A história económica de Portugal demonstra que o período de maior crescimento da nossa economia aconteceu no final do regime autoritário português, Estado Novo, na transição para a democracia. Na compreensão deste processo, teremos que ter em linha de conta a crise internacional, que na década de 1970, provocou graves crises económicas mas também sociais, em grande parte estas crises desencadeiam-se com o choque petrolífero, em 1973. A braços com uma crise internacional, o mundo e Portugal muito em particular, juntava a esta crise um período de profunda conturbação e de mudança interna em 1974, com a chamada Revolução dos Cravos, que permitiu a transição de Portugal para um regime democrático. Se a situação já era complexa, mais complexa ficaria com a profunda mudança na sociedade portuguesa, que promoveu profundas reformas nas instituições que consequentemente desembocaram numa nova constituição, que veio a consagrar alguns dos direitos que hoje estão muito sedimentados na nossa sociedade. Contudo, a alteração subsequente à revolução alterou profundamente a posse da propriedade dos meios privados, que foram nacionalizados passando a ser bens públicos, através dos processos de nacionalização, tendo-se mantido estas empresas na posse do estado até 1989. Em contraponto com estas profundas modificações na forma como a nossa economia estava organizada, os direitos sociais também eles se modificavam e permitiam aos cidadãos aceder a um conjunto de coberturas, até agora nunca experimentado na nossa sociedade. Assim, se por um lado, a um momento económico de desenvolvimento no fim do Estado Novo, se sucedeu uma grande contração económica fruto da instabilidade económica internacional, ocorrida com o choque

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petrolífero, somando-se a esta, a alteração da propriedade industrial, agrícola e nalguns casos imobiliária para a esfera pública, por outro, havia na nossa sociedade a explosão de direitos de cidadania até agora nunca vividos, em que se destaca com grande visibilidade, a abertura salarial que se deu em 1975. Contudo, a situação económica e financeira que hoje se vive em Portugal, em que a entrada do Fundo Monetário Internacional parece ter algum carácter algo cíclico, já que no período entre 1977 – 1979 bem como entre 1983 – 1984, este mesmo organismo esteve presente no nosso país com o mesmo objetivo: estabilizar económica e financeiramente a nossa economia. Ultrapassado este mau momento do passado da nossa economia, vislumbrava-se a nossa entrada na Comunidade Económica Europeia e entre expectativas e euforias a adesão consumou-se. Estávamos perante um novo período de crescimento económico, período que se manifestou essencialmente entre 1986 e 1992, seguindo-se períodos de quebra e de crescimento alternados. De meados da década de 90 até ao seu final, assiste-se a um novo crescimento da economia portuguesa, ainda que o seu crescimento tenha sido muito mais lento que em momentos anteriores já referidos. Em parte, este ritmo de crescimento mais moderado assentava numa procura interna que demorava a crescer. Parte deste crescimento da procura interna sustenta-se num aumento da despesa do Estado em despesas sociais, de resto uma justa reivindicação de sempre do país numa consciencialização global das assimetrias sociais e económicas ainda hoje visíveis na nossa sociedade e a tenderem a agravar-se. Estava-se perante a ideia e a implementação do Estado-Providência, com todas as justas e inerentes despesas que tal desiderato exige. Analisando o período de 1961 a 2009, será importante destacar que as oscilações quer do Produto Interno Bruto, quer do Produto Interno

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Bruto – per capita 1 registaram sempre no período em análise fortes oscilações, em função dos momentos sociais, económicos e políticos, pelos quais o nosso país passava. Gráfico 1– Taxa de crescimento (%) do PIB e PIB per capita a preços constantes (base=2006) (R) (Pordata, Taxa de crescimento (%) do PIB e do PIB per capita a preços constantes (base=2006) (R), 2011)

Exemplo da relação entre desenvolvimento e as conturbações sociais, económicas e políticas foi o período entre o século XIX e a primeira metade do século XX, na qual o comportamento da economia portuguesa foi medíocre (o que deu origem a um persistente e crescente atraso relativamente às economias mais desenvolvidas), verificou-se uma clara mudança entre o fim da II Guerra Mundial e 1973. Esse foi o período de mais forte crescimento económico registado em toda a História de Portugal, quase 30 anos de expansão ininterrupta, em que a economia não se limitou a acompanhar as mais desenvolvidas mas encurtou muito a distância em relação a elas (Amaral, 2010, p. 23).

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Entenda-se como sendo a quantidade de bens e serviços produzida num país, dividido pela sua população.

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Assim, num primeiro momento de forte crescimento do pós-guerra (Segunda Guerra Mundial), ambos os indicadores entre 1970 e fins de 1972 registaram um significativo aumento, coincidindo, como já se referiu, com a implementação do Estado Novo, que logo viria a cair a pique, como um dos momentos de transformação da sociedade portuguesa que foi o 25 de Abril de 74, dadas as profundas mudanças institucionais, mas que também se fizeram sentir na economia portuguesa. O momento seguinte de crescimento económico português coincidia precisamente com a nossa entrada na então Comunidade Económica Europeia conjuntamente com Espanha a 1 de Janeiro de 1986; seguiuse, como de resto se verifica pelo gráfico 1, de 1986 a 1989, um forte crescimento económico. De 1989 até 2009, sendo de resto a tendência de 2010 e 2011, o que se tem verificado é um forte abrandamento da economia e a consequente queda dos dois PIB, consequência em parte do aumento das despesas do Estado, mas também fruto de uma demografia mais envelhecida, da incapacidade de se gerar emprego e de aumentos de produtividade, como de resto esta última fica visível no quadro infra, onde de 2008 a 2010 a produtividade cai para valores negativos, 0,3 em 2010. Quadro 1 - Produtividade por hora de trabalho 1993

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European Union (27 countries)

timegeo

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1997 1998 1.3

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2010 -1.1

European Union (25 countries)

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1.4

2.1

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2.1

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1.6

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1.7

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European Union (15 countries)

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1.4

2.0

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GDR from 1991)

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Estonia

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Ireland

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2.6(p)

Greece

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Spain

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1.0

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0.6

0.9

0.7

0.8

0.8

1.7

0.6

2.7

France

-1.7

1.5

1.9

1.1

2.5

2.7

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Italy

1.0

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1.3

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Poland

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119.8 -47.5

Portugal

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Fonte:(Eurostat, 2010), Legenda: =Not available e=Estimated value p=Provisional value,

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4.0

1.7

5.0

2.9

1.3

4.1

0.8

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0.5

0.3

0.1

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4.2

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2.9

2.3

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1.3

1.1

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1.7

0.5

-0.3


Envelhecimento e Sociedade de bem-estar

Ao ritmo contrário da produtividade e de outros indicadores económicos, as despesas sociais sobem, como já se disse, fruto em parte de um forte envelhecimento da população portuguesa, mas também da expansão do estado social, de modo a cobrir universalmente todos os cidadãos, tendo como objetivo a diminuição das assimetrias sociais. “Em Portugal, (...) os fatores que geram encargos para a segurança social têm vindo a agravar-se e a provocar acréscimos de despesa muito superiores aos acréscimos regulares de receitas: o número de pensionistas cresce mais depressa que o número de beneficiários ativos” (Campos, 2000, p. 57).

Gráfico 2 – Despesa da Segurança Social em % do PIB (R)

Fonte: GPEARIMCTES,PORDATA – © FFMS – Powered by Agle Reporting Services,

O esforço de redução das assimetrias sociais é, durante todo este período, incessante por parte do estado, como de resto se verifica no gráfico acima, sendo que este crescimento se fica a dever essencialmente a dois vetores: por um lado, a uma maior inclusão dentro das participações sociais de um maior número de cidadãos e por outro pelo envelhecimento constante da nossa população, como de resto fica patenteado no quadro abaixo, sobretudo no índice de dependência dos idosos e no índice de envelhecimento do país.

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Disto mesmo dá conta Berta Nunes (1997, p. 97): O padrão de fecundidade e mortalidade infantil da aldeia alterou-se radicalmente desde meados dos anos sessenta, tendo morrido a última criança de menos de um ano de idade em 1970. A partir desta data não se registou mais nenhuma morte de criança na aldeia. A uma taxa de fecundidade das mulheres, correspondia uma alta taxa de mortalidade infantil tendo as famílias passado de 6 ou mais filhos por casal, para 1,2 filhos por casal, que é a média atual. Quadro 2 - Indicadores de envelhecimento segundo os Censos em %

Índice de Índice de Índice de Índice de Anos dependência dependência dependência envelhecimento total jovens idosos 1960 27,3 59,1 46,4 12,7 1970 34 61,7 46 15,6 1981 44,9 58,6 40,5 18,2 1991 68,1 50,6 30,1 20,5 2001 102,2 47,8 23,6 24,2 Fonte: (Pordata, http://www.pordata.pt/azap_runtime/?n=4, 2010).

Um olhar mais atento sobre o índice de envelhecimento demonstra um profundo agravamento do mesmo, passando em 1960 de 27,3%, para não mais deixar de aumentar até aos dados do último censo de 2001, em que o mesmo índice se cifra em 102,2%. Estes dados resultantes do envelhecimento da população portuguesa são fruto de melhores condições de vida, de avanços significativos na saúde e nos cuidados de saúde do pós-25 de Abril e da extensão da rede de saneamento básico, medidas que juntas permitiram que Portugal se tenha afastado de um estado de subdesenvolvimento, que durante anos arredava um grande número de cidadãos de uma vida condigna. Um outro indicador social que marca bem a diferença entre estes dois períodos, o antes e o pós-25 de Abril, fica também bem expresso na diminuição do número da taxa bruta de mortalidade infantil, que era de 77,5 % antes do 25 de Abril, para nos últimos resultados apurados de 2009 ser de 3,6%, tendo diminuído 13,4% entre 1980 e 1990, sendo que no ano da integração de Portugal e Espanha, na então Comunidade Económica Europeia, a Taxa de Mortalidade Infantil era de 21,8%.

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A diminuição desta taxa fica a dever-se, sobretudo, à criação do Serviço Nacional de Saúde 2, muito em particular de uma política de saúde pré-natal, em que todas as mães são acompanhadas por profissionais de saúde durante todo o período de gestação, bem como depois do nascimento, sendo que nos primeiros anos de idade todas as crianças são acompanhadas por profissionais de saúde, destacandose neste trabalho a criação e a consolidação do Serviço Nacional de Saúde e do Programa Nacional de Vacinação, criado em 1965 e que tem por objetivo cobrir a população portuguesa desde o nascimento. Quadro 3 - Taxa bruta de mortalidade e taxa de mortalidade infantil Anos Taxa bruta de mortalidade Taxa de mortalidade infantil 1960 10,7 1970 10,7 1980 9,7* 1990 10,3 2000 10,3 2009 9,8 Fonte: (Pordata, www.pordata.pt, 2011). Legenda: * quebra de série.

77,5 55,5 24,3* 10,9 5,5 3,6

Portugal tem vindo, assim, a redirecionar cada vez mais o seu Orçamento de Estado para funções sociais em detrimento das funções de soberania, sendo que a maior parcela do Orçamento de Estado é destinado para três áreas sociais: Educação, Saúde e Segurança Social, correspondendo a 16,4% do PNB em 2008. Mas nem sempre foi assim, na década de 1970 e sobretudo até 1972 as guerras coloniais exigiam da parte dos orçamentos de estado um grande esforço, representando só a despesa com a Defesa Nacional 4,3% do PNB.

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O Serviço Nacional de Saúde, foi criado à luz do artigo 64.º da Constituição da República Portuguesa, que consagra o direito à proteção da saúde e o dever de a defender e promover, foi com a publicação da Lei n.º 56/79, aprovada a 28 de Junho e publicada no Diário da República de 15 de Setembro de 1979, pela mão do então Ministro dos Assuntos Sociais, Saúde e Segurança Social, Dr. António Arnaut.

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Quadro 4 - Despesa por rubrica do Orçamento de Estado

Anos 1972 1980 1990 2000 2009

Defesa Nacional 4,3 2,1 1,7 1,3 1,1

Educação

Saúde

1,4 3,2 3,8 4,9 5,1

0,2 2,9 3,2 4,2 5,8

Segurança e Ação Social 0,3 1 1,1 3,8 6,7

Fonte: (Pordata, www.pordata.pt, 2010).

Com os diversos processos de descolonização, Portugal entregou formalmente os territórios às suas populações. Tal facto permitiu, em 1978, redirecionar o Orçamento de Estado para as áreas sociais; assim, pela primeira vez, inverteu-se a tendência, tendo as Funções Sociais do Estado ultrapassado as Funções de Soberania do Estado. Até à primeira década do século XXI, a Educação foi a despesa mais importante do Estado, o alargamento da escolaridade obrigatória é em grande parte responsável por essa despesa do Estado; se em 1964 a escolaridade obrigatória era de seis anos, já em 2009 a escolaridade obrigatória tinha duplicado o número de anos, passando a ser doze anos de escolaridade obrigatória. Apesar de todo este percurso do aumento da escolaridade obrigatória, em 2004 as despesas de Saúde, Segurança Social e Ação Social, ultrapassam as despesas de Educação, por um lado, pela estabilização do Parque Escolar, por outro lado pelo profundo envelhecimento da população sobretudo no interior do país, levando por outro lado, ao crescimento das despesas de Saúde, Segurança Social e Ação Social, para fazer frente ao envelhecimento, cada vez mais acentuado, da população. Ainda que de forma mais tardia, a despesa na Saúde também tem vindo a aumentar desde 1972 com uma parcela do orçamento de estado de 0,2%, sendo em 2009 de 5,8% do PIB. Este grande investimento na Saúde deriva de uma decisão política que foi a constituição do Serviço Nacional de Saúde, que tem como objetivo garantir cuidados mínimos de saúde à população portuguesa.

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Foi precisamente em 1976 que se inscreve na Constituição da República Portuguesa 3 o dever do estado garantir cuidados mínimos de saúde. A par deste direito à saúde, surge um outro conjunto de apoios sociais, a Pensão Social que foi instituída em 1974, tendo sido alargada em 1977 a não contribuintes, prestações por velhice ou invalidez, subsídio de desemprego para trabalhadores por conta de outrem, extensão da proteção social na doença, velhice e invalidez dos trabalhadores em 1975. Esta mesma lógica é reforçada mais tarde pela Organização Mundial de Saúde (OMS), tendo sido adotadas por Portugal, procurando garantir que “as questões da eficiência, equidade e qualidade têm estado no centro das atenções. Elas são fulcrais para que os sistemas de saúde atinjam os três objetivos fundamentais propostos pela OMS em 2000: (1) melhorarem a saúde das populações que servem; (2) responderem às expectativas das pessoas; (3) proporcionarem proteção financeira contra os custos de falta de saúde” (Miguel & Bugalho, 2002, p. 57). Estes direitos garantidos constitucionalmente veem crescer o seu orçamento que em 1972 era de 0,3% do orçamento de estado, para em 2009 aumentar para 6,7%. Todos estes mecanismos de proteção 3

ARTIGO 64.º (Saúde)

1. Todos têm direito à proteção da saúde e o dever de a defender e promover. 2. O direito à proteção da saúde é realizado pela criação de um serviço nacional de saúde universal, geral e gratuito, pela criação de condições económicas, sociais e culturais que garantam a proteção da infância, da juventude e da velhice e pela melhoria sistemática das condições de vida e de trabalho, bem como pela promoção da cultura física e desportiva, escolar e popular e ainda pelo desenvolvimento da educação sanitária do povo. 3. Para assegurar o direito à proteção da saúde, incumbe prioritariamente ao Estado: a) Garantir o acesso de todos os cidadãos, independentemente da sua condição económica, aos cuidados da medicina preventiva, curativa e de reabilitação; b) Garantir uma racional e eficiente cobertura médica e hospitalar de todo o país; c) Orientar a sua ação para a socialização da medicina e dos sectores médico-medicamentosos; d) Disciplinar e controlar as formas empresariais e privadas da medicina, articulando-as com o serviço nacional de saúde; e) Disciplinar e controlar a produção, a comercialização e o uso dos produtos químicos, biológicos e farmacêuticos e outros meios de tratamento e diagnóstico. (www.parlamento.pt, 1976)

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social, provêm das verbas da Segurança Social, sendo criados a partir das contribuições dos trabalhadores e das entidades empregadoras, sendo que nestes últimos trinta anos estas verbas têm vindo sempre crescendo, devendo-se grande parte desse aumento ao forte envelhecimento da população portuguesa.

Portugal um país com 10 milhões de habitantes Como já se disse e se demonstrou, muitas foram as transformações sociais ocorridas em Portugal durante este período em análise (1960 – 2010), também a demografia como aqui e ali já foi referido, teve as suas oscilações até termos ultrapassado a barreira dos 10 milhões. Neste percurso a demografia portuguesa, enfrentou três guerras coloniais 4, um forte fluxo migratório sobretudo até 1973, sendo que hoje este processo (e)migratório, está a ter novamente grande relevância. Nesta dimensão demográfica a sua caracterização ficaria incompleta, caso não se considerasse, que também “a descida da mortalidade infantil e o aumento da esperança de vida possibilitaram que um número crescente de pessoas chegasse à terceira (mais de 65 anos) e à quarta (mais de 75 ou 80 anos) idades, isto fez aumentar exponencialmente o peso da população vulnerável às doenças crónicas e às doenças degenerativas associadas à velhice” (Cabral & Silva, 2009, p. 21). No período em análise Portugal em 1960, registava 8,9 milhões de residentes, atingindo somente em 1985, os 10 milhões de residentes, mantendo este número de residentes até 2010. Apesar de tudo, este número sofre em diversos momentos oscilações, entre 1960 e 1970 houve um decréscimo populacional que muito se ficou a dever à emigração, apesar de tudo o número de nascimentos, era em muito superior ou de óbitos, tendo Portugal um saldo natural muito positivo, contudo o fluxo migratório português era muito forte, tendo entre 1964 e 1973 registado um saldo migratório fortemente negativo. 4

Guerras coloniais em Angola, Moçambique e Guiné-Bissau

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Estava-se prestes a iniciar um novo fluxo migratório, que viria a inverter este estado de coisas, assim entre 1974 e os anos 80, Portugal vai restabelecer e ultrapassar o número de residentes, tendo aumentado em cerca de 600 mil indivíduos. Tal movimento migratório, desta vez de regresso a Portugal fica sobretudo a dever-se em grande parte aos processos de descolonização em África, mas também ao regresso de muitos emigrantes, que tinham ano após ano, emigrado para outros países europeus e que agora regressavam a Portugal sobretudo vindos de França, uns na expectativa de reorganizar a sua vida ativa em Portugal, outros tendo cessado a sua vida ativa, procuram agora o reencontro com a sua comunidade de origem. Não obstante, as oscilações continuariam a fazer-se sentir; assim, no período entre 1987 e 1991, Portugal vai perder cerca de 62 mil indivíduos, a emigração vai voltar a crescer e a taxa de nascimentos e de óbitos começa a aproximar-se. Mas mais uma vez, ainda que por razões diferentes, Portugal vai alterar uma vez mais a sua tendência demográfica, de 1993 a 2008, Portugal passa a ser um país de destino tendo aumentado mais uma vez o número de residentes, contudo o saldo natural começa a aproximar-se do zero. Começava-se a vislumbrar a nova tendência da demografia portuguesa e que nos traz até aos nossos dias, se por um lado Portugal era visto como um país de imigração, sobretudo como porta de entrada para a Europa, por outro lado, ficava claro que o número de nascimentos tinha caído de forma inequívoca. Sobretudo o que mudou, foi uma grande quebra na fecundidade, em parte devido aos meios anticoncecionais, que se generaliza na população, permitindo à mulher controlar o número de gravidezes, pondo fim ao que era muito comum em Portugal, que se caracterizava por famílias numerosas. Ao mesmo tempo fruto de uma melhor saúde, assente no Sistema Nacional de Saúde e em melhores condições de vida, deu-se o aumento do tempo médio de vida e um consequente envelhecimento da população. Esta tendência no entanto significa também que Portugal, segue agora a tendência mundial dos países mais desenvolvidos, em que a sua

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população envelhece devido ao aumento do tempo médio de vida5, mas também porque as mulheres são mães cada vez mais tarde e com menos filhos, de 3,2 filhos por mulher em 1960, passou-se em 2008 para 1,4 filhos por mulher, sendo que em 2009 o índice sintético de natalidade é de 1,32 filhos por mulher. Assim, desde 1982 que a renovação de gerações não está garantida, as mulheres tinham o primeiro filho com 25 anos em 1960, tendo-se alterado profundamente a partir de 1980, sendo que em 2001 a idade com que a mulher tinha o primeiro filho era aos 28,4 anos. Esta mesma tendência verifica-se quando se constata uma alteração profunda no padrão de fecundidade, se em 1960 a idade em que as mulheres se apresentavam mais fecundas era entre os 25 aos 29 anos, em 2005 verifica-se que a idade em que as mulheres se apresentavam mais fecundas, passou para o intervalo entre os 30 e os 34 anos de idade. O adiamento dos nascimentos “desenha-se a partir de início/meados dos anos 80. O adiamento dos nascimentos manifestase de forma consistente ao longo dos últimos vinte anos – entre 1985 e 2005 a idade média ao nascimento sobe de 27,0 anos para 29,5 anos” (Oliveira, 2008, p. 36). As razões para esta alteração, comportamental ficam a dever-se sobretudo como já foi referido à introdução dos meios anticoncecionais, ao aumento da escolaridade das mulheres e ao facto de estas a partir dos anos 60 terem integrado o mercado de trabalho. Todas estas alterações, de emancipação da mulher, tal como aconteceu noutros países produziram alterações comportamentais na fecundidade levando a um menor número de filhos e gravidezes mais tardias, de resto comportamentos que já se vinham assistindo noutros países europeus mais desenvolvidos, ou que conheceram mais cedo processos de desenvolvimento social e económico e de paridade entre os géneros, como é o caso da Holanda, Alemanha, do Reino Unido ou da Suécia. Contudo em Portugal o aumento da participação da mulher no mercado de trabalho, distingue-se das demais pela taxa de mulheres 5

A esperança média de vida para as mulheres à nascença, entre 2007 – 2009, situa-se em 81,8 e para os homens, no mesmo período em 75,8.

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no mercado de trabalho a tempo parcial, que na Europa se cifra em 31%, sendo que em Portugal essa taxa é muito baixa 17%, (valores de 2008), quando comparada com a média europeia. Tal opção por parte das mulheres em muito se fica a dever aos baixos salários quer da remuneração a tempo parcial, quer da remuneração a tempo inteiro no mercado de trabalho. Portugal na tentativa de controlar o seu saldo fisiológico cada vez mais negativo, tem vindo a implementar mais medidas de incentivo à natalidade, sendo exemplo disso as medidas de apoio à família, que se materializam em Subsídios de Nascimento, Aleitamento e Abono de Família. No conjunto destes subsídios, o Estado gastava em 1975, 470 milhões de euros passando a gastar em 660 milhões de euros, em 2008 por ano a preços constantes. Se por um lado se verifica que o percurso demográfico de Portugal acompanha agora, o percurso demográfico, que antecipadamente se verificou noutros países da Europa sobretudo nos países mais desenvolvidos, em Portugal essa mudança reveste-se de uma particularidade, aconteceu num período de tempo mais curto, por outro lado, a melhoria dos cuidados de saúde, permitiu também em pouco tempo a redução da taxa de mortalidade infantil, que apresenta uma das maiores reduções em toda a Europa e num breve trecho de tempo, sendo Portugal o sexto país da União Europeia com a Taxa de Mortalidade Infantil mais baixa. A contribuir para este processo, encontramos certamente medidas como o aumento da escolaridade, o saneamento básico e sobretudo um Programa Nacional de Vacinação eficaz, universal e gratuito, destacando-se a vacinação contra a poliomielite, difteria e tosse convulsa, que contribuiu em muito para a diminuição da mortalidade infantil. A par e passo com estas medidas, também a reestruturação dos cuidados de saúde com o encerramento dos serviços médicos sem condições, concentrando meios e profissionais de saúde em maternidades apetrechadas, com médicos e enfermeiros especializados, melhoria nas condições de transporte das parturientes e com a aquisição e a generalização de equipamentos de apoio à vida de prematuros, permitiu entre 1990 e 2008 um grande salto qualitativo, nos cuidados de saúde.

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Mas as medidas não se fizeram só sentir, na melhoria dos cuidados de vida dos mais novos, a diferença da esperança de vida é também significativa, acompanhando Portugal a tendência Europeia, sendo que aqui também, este processo sucedeu mais tardiamente do que para os países de referência na União Europeia em termos de desenvolvimento humano como seja a Holanda, Alemanha o Reino Unido ou a Suécia. Assim a esperança média de vida dilatou-se, se em 1960 para os homens era 60,7 anos, em 2007 era de 75,5, no caso das mulheres em 1960 era de 66,4 anos, sendo em 2007 de 81,7 anos, este esforço de melhoria das condições de vida é de tal forma considerável, que num espaço de cinco décadas a esperança de vida aumentou em quinze anos. Contudo a medicalização da sociedade, promoveu um crescimento intenso dos atos médicos, sendo esta uma das características mais evidentes da sociedade portuguesa em torno do desenvolvimento, coloca-se no entanto a necessidade de “financiamento e provisão dos cuidados médicos que são cada vez mais difíceis, dada a contínua escalada dos custos” (Miguel & Bugalho, 2002, p. 51). Com a esperança média de vida a aumentar e a natalidade a diminuir e apesar de todos os esforços feitos de apoio social, a nossa pirâmide etária demonstra precisamente o insucesso das medidas, na inflexão do processo de envelhecimento da população portuguesa, como de resto fica documentado nas pirâmides demográficas que se seguem. Gráfico 3 - Pirâmides etárias 1991 - 2001

Fonte: INE, Recenseamento Geral da População, 1991 e 2001 - Resultados Definitivos.

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Analisando as pirâmides etárias, verificamos que de 1991 a 2001, há um crescimento das classes etárias dos mais idosos, sobretudo no topo da pirâmide, que é bem visível nas últimas duas classes etárias (>=85 e 80-84). Por oposição a estas duas classes etárias, encontramos na pirâmide um estreitamento da sua base, sobretudo nas classes etárias dos 0-4 anos e dos 5-9 anos. Comparando a base da pirâmide de 1991 para 2001 nota-se que esse estreitamento é muito mais severo. Pode-se assim considerar um duplo envelhecimento nesta pirâmide etária, por um lado existe um envelhecimento notório no topo da pirâmide, fruto de uma maior esperança média de vida, demonstrando o peso das melhores condições de vida, por outro lado, também um envelhecimento na base da pirâmide, demonstrando que o número de nascimentos é manifestamente insuficiente para inverter o processo de envelhecimento demográfico da base da pirâmide, resultando num saldo fisiológico negativo. Se em 1960 existiam mais jovens que idosos, já em 2000 eram mais os idosos que os jovens, sendo que em 2008 a população de idosos superou claramente o número de jovens. Em 2007 o saldo natural, ultrapassou o número de nascimentos em 1000 indivíduos, tendo em 2008, nascido apenas mais 314 indivíduos, por contraponto aos indivíduos que morreram. Hoje como numa grande parte dos países europeus, Portugal está cada vez mais dependente, dos processos migratórios externos à União Europeia. A partir de 1993, Portugal é claramente um destino migratório, estabelecendo-se a partir daqui um fluxo migratório positivo, para Portugal, registando-se um maior número entradas em detrimento do número de saídas de residentes em Portugal. No entanto de 1993 a 2003, estima-se que tenham saída em média 27 mil pessoas por ano de Portugal, ou seja, Portugal está longe de estancar o fluxo migratório de residentes em Portugal para outros países. O peso da população, que escolhe o nosso país, como destino migratório, ainda que esta fatia da população represente apenas 5% do total, desempenha no entanto um papel fundamental para Portugal. Quem escolhe o país são sobretudo pessoas em vida ativa e

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em período fértil. Pode-se sinteticamente dizer, para caracterizar ao longo do tempo, as comunidades que escolhem Portugal como país de acolhimento, que em 1960 a comunidade que em maior número escolhia o nosso país para residir eram os cabo-verdianos, já nos anos 70, fruto dos diversos processos de descolonização, foram os cidadãos provenientes de Angola, Cabo-Verde, Guiné-Bissau, S. Tomé e Príncipe e Moçambique. Volvidos mais dez anos, Portugal é escolhido maioritariamente por brasileiros, chineses, paquistaneses e indianos, já em 1990 os países que em maior número cederam população a Portugal foi a Ucrânia, a Moldávia, a Rússia e a Roménia fruto da desagregação a leste e de desejo de melhores condições de vida por parte destes cidadãos, que viam no resto da Europa a possibilidade de uma vida condigna. Assim, em 2008, a maior comunidade de cidadãos estrangeiros em Portugal, correspondia a 100 mil cidadãos brasileiros, seguidos de 52 mil ucranianos ao que se juntavam 51 mil emigrantes provenientes de Cabo-Verde.

O desafio da qualificação Numerosas são as análises referentes à qualificação dos portugueses, de um modo geral todas elas caracterizam Portugal, como sendo dos países onde a qualificação da sua população é mais baixa, como facilmente se verifica nas diversas análises estatísticas sobre este assunto, remetendo-nos ou para a última posição, ou para a penúltima posição no ranking da Europa a quinze estados. Sendo que a situação era já de si preocupante, constituindo um dos handicaps da competitividade portuguesa a quinze estados, mais preocupante se torna quando se verifica que com a entrada de novos países na União Europeia, Portugal em termos de qualificação vê agudizado ainda mais o seu problema. Em rigor podemos até dizer que a linha que demarca o litoral do interior, é também a mesma que promove uma profunda diferença entre os níveis de qualificação, de algum modo esta característica

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compreende-se se tivermos em atenção que o interior do país não é um polo aglutinador de empresas e por consequência de recursos humanos, uma vez que a estrutura do mercado de trabalho é extremamente débil e longe de captar investimentos em áreas de ponta. Porém o esforço que tem vindo a ser feito tem sido sempre em crescendo, se em 1972 a verba para a educação em orçamento de estado era de 1,4%, já em 2009 a parte do orçamento destinada à educação era de 5,1%. Este crescendo em investimento na educação foi tendo geração após geração resultados positivos, se em 1960, 65,6% da população com quinze anos ou mais não possuía nenhuma escolaridade, em 2001, a população sem qualquer habilitação formal tinha descido para 9,2%, (Rosa & Chitas, 2010, p. 45) sendo que esse número continua a diminuir e a aumentar o número de pessoas com mais habilitações académicas. Até 1981 o 1º ciclo, que até aqui tinha correspondido ao ciclo com maior número de inscritos, atinge o seu número máximo com 946 mil alunos, daqui para a frente a dinâmica demográfica de Portugal começa a mostrar sinais de uma diminuição da taxa de natalidade, que ano após ano se agrava, diminuindo consequentemente o número de alunos inscritos no 1º ciclo. Sucessivamente esta quebra vem-se fazendo sentir, ciclo após ciclo de ensino, em 1964 alargou-se a escolaridade obrigatória para o 2º Ciclo de Ensino 6, procedendo-se em 1986 a mais um alargamento da escolaridade obrigatória para nove anos, estendendo-se ao 3º Ciclo de Ensino 7, sendo também este o ciclo onde encontramos maior número de alunos inscritos presentemente. Duas décadas volvidas concretiza-se o último alargamento da escolaridade obrigatória, que hoje em dia se situa em doze anos de escolaridade ou até aos dezoito anos de idade 8.

6

Conforme Decreto-Lei n.º 45810/1964. Conforme Lei n.º 46/1986. 8 Conforme e Lei n.º 85/2009. 7

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Quadro 5 - Alunos matriculados: total e por nível de ensino Nível de ensino Anos Total

Educação Pré-Escolar

x

1970 1980 1990 2000

Ensino Básico

Ensino Secundário

CET

Ensino Médio

Ensino Superior

13116

-

x

x

186914

27028

-

x

x

304878

169516

-

4362

80919

370607

444626

309568

-

//

157869

276529

424364

417705

-

//

373745

488114

271924

523155

498327

5832

//

373002

x

x

x

x

x

//

383627

Total

1º Ciclo

2º Ciclo

3º Ciclo

6528

1066471

887235

78064

101172

x

15153

1316279

935453

193912

1873559

80373

1538389

927852

305659

2160180

161629

1531114

715881

2260745

228459

1240836

539943

2009

2434982

274628

1283193

2010

x

x

x

1961

Fonte: (PORDATA, 2011). Legenda: “X” - Valor não disponível “-“ - Ausência de valor “//” - Não aplicável

Verifica-se a partir da primeira metade dos anos 70, que é no préescolar que se dá a maior explosão de inscritos, tendo-se passado de 6 mil crianças inscritas em 1960 para 266 mil em 2008. É também no Ensino Superior que se regista um crescimento no número de inscritos, se em 1978, estavam 290 mil alunos inscritos, já em 2003 atingia-se o número máximo de alunos, cerca de 400 mil inscritos, daqui para a frente o número de alunos estabiliza no Ensino Superior, sendo em 2009 de 373 mil inscritos. Paulatinamente a população portuguesa, com acesso ao ensino superior, vai aumentando sucessivamente, perdendo este nível de ensino o carácter elitista que tinha desde 1960 em que menos de 1% da população com 20 anos ou mais, tinha acesso a este nível de ensino, em 2008 a população matriculada no ensino superior ascende a 12%. Ainda assim a percentagem da população portuguesa, que hoje em dia não tem qualquer nível de ensino completo, situava-se em 2009 em quase um milhão de indivíduos, sendo a maioria com 65 anos ou mais, pertencente ao género feminino. O analfabetismo é ainda uma circunstância, como já se viu, que persiste em Portugal, sendo mais severo nas mulheres, e sobretudo nas faixas etárias mais velhas, de resto esta característica descrita fica bem patente nos gráficos abaixo representados.

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Gráfico 4 – Taxa de analfabetismo por sexo Mulheres

Homens

Fonte: (INE, http://alea-estp.ine.pt/index.html, 2011).

Durante os Censos de 1991, apurou-se que grande parte dos indivíduos que não sabem ler nem escrever pertenciam ao género feminino. Sendo que a população que não sabe ler nem escrever do género feminino e masculino aumentava à medida que a idade avançava, ou seja o analfabetismo, era tanto mais severo quanto mais velhos eram os indivíduos. Quando se compara as gerações mais novas com as mais velhas, constata-se que à população mais nova, foram concedidas melhores oportunidades para poderem continuar a estudar, contrariamente ao que aconteceu com as gerações mais velhas. Fica claro também na interpretação dos gráficos acima representados, que a população que sabe ler e escrever sem possuir grau de ensino, é sempre superior no género feminino em todos os grupos etários, quando comparada com a população do género masculino. A conclusão semelhante chegava o Plano das Nações Unidas para o Desenvolvimento 2007/08, que considerava que em 2005 Portugal tivesse 658 mil analfabetos, apesar de constatar a diminuição no número de analfabetos assinalando a diminuição de 142 mil analfabetos em 2001, mantendo-se no entanto a mesma estrutura que caracterizava os analfabetos até então, sendo a sua maioria idosos e mulheres. A perspetiva que se tem para os Censos de 2011, é que a

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evolução da taxa de analfabetismo decresça, da mesma forma que aconteceu em censos anteriores, sendo grande parte desta população idosa, a alteração da taxa de analfabetismo em muito se fica e ficará a dever nos Censos 2011 à morte das gerações mais velhas, sendo também esta a convicção da socióloga Maria Filomena Mónica, para quem o analfabetismo nos idosos “só se altera com a morte”, mais assevera esta socióloga que “esses 9% têm, decerto, mais de 65 anos, nunca foram à escola e estão demasiado velhos para se darem à ‘pachorra’ de ser alfabetizados. A pouco a pouco, a percentagem desce, à medida que vão morrendo, o que é trágico por todas as razões” (Marques, 2010, p. 50). Se por um lado têm sido as mulheres, aquelas em que o peso do analfabetismo, daqueles que não sabem ler nem escrever, maior peso tem nos grupos etários mais velhos, não sendo alheio a esta situação uma sociedade em que o acesso à educação em função do género era diferenciado, como de resto os diferentes “estudos de caso, mas também os Censos, mostram-nos que no meio rural, os homens chegaram primeiro às letras e à escola do que as mulheres, e que isto além de provavelmente refletir uma estrutura social de contornos patriarcais, se dá por vários mecanismos que se cruzam” (Candeias & Simões, 1999, p. 191). Na interpretação desta perspetiva há ainda que considerar que para estas gerações mais velhas de mulheres, “nos meios rurais do Minho como nos do Alentejo, (…) foi atribuída à mulher uma certa menoridade, expressa pela obrigação de se sujeitar ao marido depois do matrimónio” (Ramos, 1988, p. 1088). Não é no entanto menos verdade, que nos dias de hoje também são as mulheres que mais qualificações têm, em detrimento do género masculino, podendo-se também na atualidade caracterizar o género feminino, por esta oposição entre os grupos etários mais velhos e mais novos. Disto mesmo dá conta o gráfico infra, que demonstram que de 1985 até aos nossos dias, o número de mulheres no ensino superior aumentou sempre, tal como nos homens, mas a um ritmo muito superior no caso das mulheres, o aumento do número de inscritos em ambos os géneros, demonstra no entanto a partir de 2002 algumas flutuações na população que acede ao ensino superior.

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Gráfico 5 – Alunos matriculados no ensino superior, total e por sexo

Fonte: GPEARIMCTES,PORDATA – ©FFMS . Powered by Agle Reporting Services.

Quanto à distribuição pelo território nacional, da taxa de feminilidade no acesso ao ensino superior, verifica-se que apesar do peso das mulheres, como já se disse, ser sempre superior ao número de homens no ensino superior em todas as NUT’s 9, é no entanto muito superior no Alentejo, Algarve e Região Autónoma da Madeira, atingindo um maior peso na Região Autónoma dos Açores, em que a taxa de feminilidade é de 63%, como de resto se verifica no seguinte gráfico.

9

Nomenclatura de Unidades Territoriais para fins Estatísticos.

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Gráfico 6– Relação de feminilidade no ensino superior por NUTS II – alunos inscritos – ano lectivo 2009 – 2010

Fonte: (INE, www.ine.pt, 2009)

Relativamente à distribuição por género das mulheres pelos diversos cursos do ensino superior, Portugal demonstra uma posição de liderança deste processo de feminização do ensino superior: Portugal é o país da União Europeia com maior percentagem de alunas de Direito, Informática, Matemática, Engenharia e Arquitetura e está entre os que têm mais raparigas em Ciências Naturais, segundo o relatório de informação de educação Eurydice, 1998. Como os resultados do 12.º ano são mais favoráveis ao sexo feminino, nalgumas faculdades como a de Medicina, em que o número de vagas é muito inferior ao número de candidatos, a maioria dos admitidos são raparigas. (Machado, 2003, p. 128).

Fica claro que o acesso das mulheres a uma maior qualificação, foi um caminho paulatinamente feito, geração após geração, até aos dias de hoje onde a presença e o sucesso das mulheres em todos os níveis de ensino é superior ao dos homens é no entanto no ensino superior, que mais se sentiu a partir de meados dos anos 80 a imparável caminhada das mulheres no acesso, sucesso e conclusão do ensino superior. Esta realidade, marca sobretudo as gerações mais novas de mulheres, tendo por oposição as gerações de mulheres mais velhas que têm as taxas mais baixas de qualificação. Esta discrepância entre as gerações de mulheres mais novas e as gerações de mulheres mais novas fica a dever-se a razões de ordem cultural marcada pela profunda diferenciação de papéis entre géneros, que aprofundou diferenças

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habilitacionais entre géneros nas gerações mais velhas, sendo nas mulheres que se regista em maior número o analfabetismo, esta realidade é tanto mais pesada, quanto mais velha é a população que auscultamos. É no entanto inquestionável que o acesso independentemente do género, a cada vez maior qualificação por parte da população portuguesa marca presentemente a nossa sociedade mostrando um grande fosso qualificacional entre gerações.

Cuidados de saúde (quase) universais Os cuidados de saúde como hoje os conhecemos, surgiram há um século, se antes os desafios se revestiam de uma imensidão, hoje a meta da universalidade dos sistemas de saúde está mais próxima de ser alcançada, contudo sempre que se perde de vista o desiderato da universalidade e da equidade, a saúde tende a desviar-se do seu rumo e a tornar-se num bem precioso mas mais escasso à grande maioria da população, manter o rumo é por assim dizer o grande desafio dos dias de hoje, num sector onde os custos são sempre crescentes, seja pela integração de mais recursos humanos e melhor qualificados, seja pela integração de nova tecnologia, seja pelo desafio do financiamento do próprio sistema, que tende a ser sempre um desafio em crescendo. Em Portugal, para além do Serviço Nacional de Saúde, existem outros subsistemas de saúde entre os quais a Assistência na Doença aos Servidores Civis do Estado (ADSE), que abrange uma larga fatia da população portuguesa, para além deste, existe um outro que visa prestar Serviços de Assistência Médico-Social a Bancários (SAMS) entre outros de menor dimensão. Existe já hoje um sistema de saúde privado, com alguma relevância e em expansão, seja através de grupos de médicos organizados, seja organizado a partir de instituições financeiras como sejam os bancos e seguradoras, com interesses na área dos cuidados de saúde.

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Quadro 6 – Número de Beneficiários da ADSE Anos 1966 1970 1980 1990 2000 2009

N.º beneficiários 57174 179902 1278456 1159812 1375694 1353272

Fonte de Dados: ADSE/MFAP. Fonte: PORDATA.

Hoje, em Portugal, pretende-se que os seus cidadãos estejam cobertos pelo sistema de saúde nacional, mesmo antes da sua gestação (nas consultas de planeamento familiar) até à sua velhice (gerontologia), ou seja, pretende-se garantir melhor saúde e durante mais tempo para cada indivíduo tendo em conta, o aumento da esperança de vida que se registou e que se espera que continue a aumentar. O sistema de saúde como hoje o conhecemos, tem sido fruto de diversos momentos históricos no desenvolvimento deste sistema, o desenvolvimento do sindicalismo em diversos países trouxe para o mundo político a preocupação com a discussão e com a tomada de medidas que permitam melhorar o potencial de saúde dos trabalhadores. É com Bismarck que essa preocupação ganha mais peso, na Alemanha, criando leis que regulam as prestações dos trabalhadores para a Segurança Social, mas também para a Saúde 10. Em Portugal tal como nos restantes países europeus a “construção social da doença” fica a dever-se a “contextos histórico-sociais precisos: conjunto de doenças que tipificam cada sociedade em dado momento; a sua distribuição social; o traçado histórico das doenças que precedem a situação atual; as mudanças produzidas no seu estatuto qualitativo; as mudanças no sistema de valorização social das doenças; a diversidade dos seus usos sociais” (Carapinheiro, 1986, p. 10), produziram na sociedade portuguesa uma profunda consciência, 10

“In 1883, Germany enacted a law requiring employer contributions to health coverage for lowwage workers in certain occupations, adding other classes of workers in subsequent years. This was the first example of a state-mandated social insurance model.” (Organization, 2000, p. 12)

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Envelhecimento e Sociedade de bem-estar

do papel do estado na forma como a procura de serviços de saúde deve ser assegurada, devendo o estado procurar esbater as diferenças socioeconómicas entre os indivíduos no acesso à saúde. Considerando o processo de desenvolvimento dos sistemas de saúde e da “construção social da doença” pode-se considerar, que o desafio presente será estender, os Cuidados de Saúde para Todos, conforme é o objetivo proposto pela Organização Mundial de Saúde, dos diversos momentos e reformas que se têm sucedido na saúde, “no momento atual pode considerar-se que nos encontramos na terceira geração de reformas fundamentais que têm abrangido, entre outros aspetos, a criação de sistemas de saúde nacionais, a extensão dos esquemas de segurança social e a promoção dos cuidados de saúde primários” (Miguel & Bugalho, 2002, p. 55). Considerando a seguinte tipologia de apoio à saúde, tal como descrita pela OMS, referindo-se aos modelos organizativos adotados pelos diversos países, Portugal ficou longe de um modelo em que se possa estabelecer com clareza a tipologia da qual é subsidiário. Quadro 7 - Cobertura da população em função das diversas noções de cuidados primários de saúde

Fonte: (Organization, 2000, p. 15).

Portugal poderá dizer-se que “balanceia-se” num modelo híbrido de saúde em que maioritariamente se baseia no modelo clássico de universalismo da saúde promovendo a cobertura de todos os cidadãos, sendo que alguns dos custos são nos dias de hoje suportados pelos cidadãos, sendo exemplo disso as Taxas Moderadoras.

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Envelhecimento e Sociedade de bem-estar

Apesar do “sistema de saúde português caracterizar-se pela existência de um Serviço Nacional de Saúde (SNS), com uma qualidade relativamente boa, já demonstrado por alguns indicadores que demonstram grandes avanços em comparação com outros países da União Europeia, não é menos verdade que noutras vertentes o serviço é manifestamente insuficiente exemplo disso mesmo são as grandes listas de espera existentes em algumas especialidades” (Giraldes, 2002, p. 939). Contudo desde 2002 que Portugal tem vindo a repensar de forma mais sistemática a organização do Estado-Providência e consequentemente a forma como este desempenha e responde a uma necessidade social que é a Saúde, ou seja, hoje o Estado não é o único prestador de cuidados públicos de saúde, ficando em aberto a necessidade de se reconfigurar interesse público e o novo modelo “que conceptualiza o modo de produção da saúde” (Correia, 2009, p. 84). Para além desta mudança nos prestadores dos cuidados de saúde, perdendo o estado o monopólio dos cuidados de saúde públicos, subjaz um outro conjunto de questões, independentemente do sistema que seja escolhido e que urge resolver: “(i) a não adequada segurança dos sistemas de saúde; (ii) a ineficiência e os custos excessivos de algumas tecnologias e procedimentos clínicos; (iii) a insatisfação dos utentes; (iv) o acesso desigual aos serviços de saúde; (v) as longas listas de espera; (vi) desperdício inaceitável advindo da escassa eficácia” (Serapioni, 2009, p. 65) ao que se acrescenta também o custo exagerado de alguns medicamentos. Serão então estes os desafios que o Sistema Nacional de Saúde Português criado em 1979 11 terá que enfrentar para melhor servir os seus cidadãos.

11 O Serviço Nacional de Saúde, criado à luz do artigo 64.º da Constituição da República Portuguesa, que consagra o direito à proteção da saúde e o dever de a defender e promover, após conhecer um labiríntico mapa de atos e factos foi – com a publicação da Lei n.º 56/79, aprovada a 28 de Junho e publicada no Diário da República de 15 de Setembro de 1979 – “politicamente” criado pelo então Ministro dos Assuntos Sociais, Saúde e Segurança Social, Dr. António Arnaut. Os primeiros decretos regulamentares, já previamente “esboçados” pelo Ministro Arnaut, foram exarados pelo, à época, Secretário de Estado da Saúde, Prof. Doutor António Correia de Campos, ambos figuras integradas no V Governo Constitucional, presidido pela Eng.ª Maria de Lurdes Pintassilgo. (Gamito)

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Envelhecimento e Sociedade de bem-estar

Um indicador que nos é muito difícil de ultrapassar, pese embora os esforços feitos, é a alta taxa de tuberculose, que persiste em Portugal em valores muito mais altos que nos restantes países que compõem a União Europeia e que demonstram uma forte assimetria social, dentro da Europa, mas também no espaço nacional. Se por um lado, a taxa de tuberculose é muito maior junto das comunidades migrantes, que de um modo geral fixaram-se em Lisboa e Vale do Tejo 12, não se poderá no entanto dizer que os processos migratórios explicam tudo, torna-se evidente que essa assimetria também se manifesta na restante população, ainda que com menor expressão, bastando que para isso a condição socioeconómica seja a mesma.

12

“In 2000, 46 846 cases of tuberculosis were reported in the EU, 12.4 cases per 100 000 inhabitants. The rates were lower than 20 per 100 000 inhabitants in all Member States except Portugal (44.1) and Spain (21.3). At regional level, there are high levels of incidence in regions where there are major cities (Île-de-France, Greater London, Lisboa e Vale do Tejo, BruxellesCapitale/Brussels Hfdst.) contrasting markedly with other regions in the same country. Almost all the Portuguese regions (especially Algarve, Lisboa e Vale do Tejo, Norte and Centro) and some Spanish regions (Ceuta y Melilla, Galicia and Principado de Asturias) are clearly above the European average. The Baltic States (Estonia, Latvia and Lithuania) and many of the Polish regions (in particular Łódzkie, Świętokrzyskie and Mazowieckie) and Hungarian regions (in particular Közép-Magyarország and Észak-Alföld) also have a very high incidence”. (Eurostat, 2003)

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Envelhecimento e Sociedade de bem-estar

Quadro 8 - Taxa de incidência da tuberculose por 100 000 habitantes ano 2000 Region with highest Region with value lowest value Belgium

BruxellesBrabant 38.2 Capitale / wallon Brussels Hfdst.

Denmark

Region with highest value

4.6 Luxembourg

10.1

Netherlands Flevoland

9.8 Zeeland

3.2

Germany Berlin

7.6 Austria

Wien

15.6 Tirol

7.5

Greece

1.8 Portugal

Algarve

58.3 Açores

16.8

9.1 Finland

Etelä-Suomi

18.8

Spain France

11.2

Region with lowest value

13.9 Sachsen Notio Peloponnissos 11.3 Aigaio CastillaCeuta y Melilla 55.0 La Mancha Île-de-France

Ireland Italy

United Kingdom

10.7 Lazio

Bulgaria Czech Rep. Estonia

28.8 Limousin 4.6 Sweden

8.4 Veneto

17.8

: Hungary Střední Morava

London

1.8

Mellersta 3.7 Norrland Northern 25.9 1.8 Ireland 6.4

0.0

: Severozápad

Stockholm

PohjoisSuomi

KözépNyugat47.4 20.6 Magyarország Dunántúl

6.4 Malta

57.7

Poland

4.2 Lódzkie

38.0 Lubuskie 15.9

Cyprus

:

Romania

:

Latvia

71.9

Slovenia

19.1

Lithuania 80.6 Fonte: (Eurostat, 2003). Legenda: Germany, Ireland, United Kingdom: NUTS 1. “:” – Data not available.

Slovak Rep.

:

: :

Do Estado Novo, passando pelo 25 de Abril de 1974, marco histórico e fundamental para a compreensão da abertura e para a criação de estruturas fundamentais das respostas sociais do Estado com carácter universal, ao momento em que Portugal integra a Comunidade Económica Europeia em 1986, até aos nossos dias o nosso país demonstra avanços ímpares nas estruturas de apoio às respostas sociais, que o Estado-Providência vem proporcionando à sociedade portuguesa. Independentemente da tipologia das respostas sociais para onde possamos desviar o nosso olhar, as condições que hoje são dadas aos cidadãos na cobertura das suas necessidades sociais, são

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Envelhecimento e Sociedade de bem-estar

incomparavelmente melhores, quando comparadas com qualquer outro momento da história de Portugal, o tempo em que desenvolvemos as bases e em que se concretizou o Estado Social, foi talvez dos processos mais rápidos no panorama da União Europeia. Não obstante, o avanço civilizacional que tal feito nos permitiu atingir, na solidariedade intergerações, na saúde, na educação e em que nalguns casos realizámos em menos tempo e melhor, que outros países bem mais desenvolvidos que Portugal, fica ainda assim a ideia de que muito ainda haverá por realizar, se pretendermos que a ideia da equidade independentemente da perspetiva que se tenha dela, seja reafirmada. Esta preocupação que deve ser constante na manutenção, mas também no alargamento do Estado Social é tanto mais importante, quanto mais gravosos são os efeitos de uma crise financeira, que se abateu sobre o mundo com contornos muito particulares nos efeitos que produziu e produzirá sobre Portugal. A ideia que Portugal poderá ficar, com menores coberturas sociais, deixando antever um recuo do Estado Social, num contexto de crise económica, será sem dúvida um grave e rude golpe no conceito de equidade, que deve orientar as políticas sociais de um estado democrático como é o caso de Portugal.

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Envelhecimento Ativo e Sexualidade

ENVELHECIMENTO ATIVO E SEXUALIDADE

Ermelinda Gonçalves Marques Maria Hermínia Barbosa

“Todos envelhecemos. É um facto!” Face ao acentuado envelhecimento da população, envelhecer ativamente é um dos mais importantes temas da atualidade debatidos pela ciência e pela sociedade (Fernandez-Ballesteros, 2009). Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) o envelhecimento ativo “é o processo pelo qual se otimizam as oportunidades de bemestar físico, social e mental durante toda a vida, com o objetivo de ampliar a esperança de vida saudável, a produtividade e a qualidade de vida na velhice” (Vallespir & Morey, 2007, p. 241). O conceito de ativo não se refere unicamente à capacidade de estar fisicamente ativo, mas, refere-se também ao envolvimento contínuo dos idosos nos assuntos sociais, económicos, espirituais, culturais e cívicos. A Direção Geral da Saúde (DGS) (2006, p. 6) considera que O envelhecimento não é um problema, mas uma parte natural do ciclo de vida, sendo desejável que constitua uma oportunidade para viver de forma saudável e autónoma o mais tempo possível, o que implica uma ação integrada ao nível da mudança de comportamentos e atitudes da população em geral e da formação dos profissionais de saúde e de outros campos de intervenção social, uma adequação dos serviços de saúde e de apoio social às novas realidades sociais e familiares que acompanham o envelhecimento individual e demográfico e um ajustamento do ambiente às fragilidades que, mais frequentemente, acompanham a idade avançada.

Envelhecer com saúde, autonomia e independência, o mais tempo possível, constitui, hoje, um desafio à responsabilidade individual e coletiva, com tradução significativa no desenvolvimento económico dos países. Face ao envelhecimento, diversos acontecimentos internacionais

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Envelhecimento Ativo e Sexualidade

marcaram a política social relativamente ao idoso, destacando-se a I Assembleia Mundial de Viena sobre o envelhecimento em 1982 e a Assembleia das Nações Unidas a favor dos idosos no ano de 2002 (Osório, 2007). O primeiro acontecimento mundial ocorreu em Viena, onde foi elaborado o Plano de Viena, constituído por considerações gerais da política social e recomendações pontuais de ação: - Considerações gerais da política social - as políticas devem inspirar-se na vontade firme de alcançar o prolongamento da vida humana e conseguir que as pessoas idosas desempenhem um papel ativo na sociedade; a partir da idade adulta todas as pessoas devem preparar-se para a reforma; as medidas destinadas a beneficiar as pessoas idosas, devem dar a estas, as oportunidades para satisfazerem as suas necessidades de realização pessoal, mediante a participação ininterrupta na família e no sistema de parentesco, serviços voluntários na comunidade, crescimento contínuo através da aprendizagem escolar e não escolar, expressão pessoal através da arte e de ofícios, participação nas organizações da comunidade, atividades religiosas, recreio e viagens, trabalho parcial e participação no processo político. Com estas primeiras considerações pretende-se o desenvolvimento de um papel ativo na sociedade, preparação para esse papel na fase da reforma e oferecer nesta a oportunidade de realização pessoal através de várias atividades; - Recomendações pontuais de ação nas áreas da saúde e nutrição; da habitação e meio ambiente; da família; do bem-estar social; da educação; da segurança do rendimento e do emprego. A II Assembleia Mundial de Madrid sobre o envelhecimento ocorreu vinte anos após a primeira, dando-se atenção aos países “em vias de desenvolvimento”, enquanto que na primeira Assembleia Mundial o foco de atenção eram os países ditos “desenvolvidos”. O fenómeno do envelhecimento é global, está presente em todas as sociedades, devendo ser considerado num contexto de desenvolvimento através do ciclo de vida. Nesta Assembleia foram traçados dois grandes objetivos, nomeadamente: o envelhecimento tem que ser ativo e a sociedade é feita por todas as pessoas, em todas as idades. O lema básico foi uma sociedade para todas as idades, o que implica: o desenvolvimento individual durante toda a vida, as relações

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Envelhecimento Ativo e Sexualidade

multigeracionais; a relação mútua entre o envelhecimento da população e o desenvolvimento, a situação das pessoas idosas. Estabeleceram-se algumas prioridades, nomeadamente: assegurar e manter o desenvolvimento em todas as idades, criar ambientes potenciadores para todos os grupos etários e assegurar o bem-estar das pessoas idosas. Neste contexto, torna-se necessário considerar as pessoas idosas como participantes ativas de uma sociedade que integra o envelhecimento e que as coloque na posição de contribuintes ativos e beneficiários do desenvolvimento. A OMS e a Comissão da União Europeia consideram de grande importância todas as medidas políticas e práticas, que contribuam para um envelhecimento saudável. Para que haja um envelhecimento saudável devem, segundo a DGS (2006), verificar-se os seguintes aspetos: Autonomia – é uma vertente central do envelhecimento saudável, pelo que se deve promover a autonomia das pessoas idosas, o direito à sua autodeterminação, mantendo a sua dignidade, integridade e liberdade de escolha; Aprendizagem ao longo da vida – outro aspeto muito importante para se envelhecer saudavelmente, porque contribui para que se conservem as capacidades cognitivas; Manter-se ativo – mesmo após a reforma, esta é uma das formas que mais contribui para a manutenção da saúde do idoso nas componentes, física, psicológica e social. Tendo em conta os determinantes comportamentais de um envelhecimento ativo ao longo da vida, a adoção de estilos de vida mais saudáveis e uma atitude mais participativa na promoção do autocuidado serão fundamentais para se viver com mais saúde e por mais anos, contrariando um dos mais frequentes mitos negativos ligados ao envelhecimento, que considera ser tarde demais, quando se é mais idoso, para se alterar o modo como se vive. Neste âmbito, destaca-se também a importância da promoção da saúde, a qual, representa um processo global, que compreende, não só as ações que visam reforçar as aptidões e capacidades dos indivíduos, mas também,

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Envelhecimento Ativo e Sexualidade

as medidas que visam alterar a situação social, ambiental e económica, de modo a reduzir os seus efeitos negativos sobre a saúde pública e sobre a saúde das pessoas (OMS, 1986). Os fatores determinantes do envelhecimento ativo preconizados pela OMS podem ser observados na figura 1. Figura 1 - Fatores determinantes do envelhecimento ativo, segundo a OMS Género Serviços de Saúde e Sociais

Económicos

Sociais

Envelhecimento ativo

Comportame nto: estilos de vida

Pessoais: biológicos/ genéticos, Psicológicos

Ambiente físico

Cultura

Fonte: (Adaptado de Fernandez-Ballesteros, 2009)

Segundo a OMS (2001), citado por Fernandez-Ballesteros (2009) as políticas a favor de um envelhecimento ativo devem ter em conta quatro tipos de componentes:

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Envelhecimento Ativo e Sexualidade

1 - Reduzir os fatores de risco associados às doenças mais importantes e aumentar os fatores que favorecem a saúde comportamental e a boa forma física - Assegurar uma alimentação adequada ao longo da vida; - Prevenir o tabagismo e não ultrapassar os limites do consumo saudável de álcool; - Políticas do controlo do estado de saúde, o uso de medicamentos prescritos e o seguimento e adesão aos tratamentos médicos; - Promover a atividade física ao longo de todo o processo de envelhecimento. 2 - Promover os fatores protetores do funcionamento cognitivo - Promover programas de alfabetização ao longo de toda a vida, assim como programas de formação contínua; - Promover a prática da atividade cognitiva na velhice; - Promover a implicação em tarefas cognitivamente exigentes; - Promover o exercício de habilidades verbais e de comunicação. 3 - Promover o afeto positivo, o controlo e as habilidades para enfrentar o stresse e os problemas - Promover acontecimentos agradáveis na velhice, como fatores preventivos da depressão e do isolamento; - Promover uma atitude ativa e adequada para enfrentar as dificuldades, a ansiedade e os conflitos; - Promover a confiança nas suas capacidades; - Promover o pensamento positivo e a perceção de controlo. 4 - Promover o funcionamento psicossocial e a participação - Fomentar a autonomia e a participação na tomada de decisão do idoso; - Combater as imagens negativas sobre a velhice e o envelhecimento; - Estimular a confiança nas capacidades coletivas; - Promover os comportamentos pró-sociais; - Promover a participação social. Tendo em conta que o envelhecimento ativo é um conceito multidimensional, a sua promoção não pode limitar-se à promoção da

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saúde e à prevenção da doença. Os projetos ou programas para a promoção do envelhecimento ativo requerem condições para que obtenham um cariz científico, nomeadamente: supostos teóricos básicos; objetivos gerais e específicos; ações e componentes bem definidos; desenho de avaliação; implementação e seguimento; e avaliação dos resultados; no entanto, verifica-se que a maioria dos esforços levados a cabo neste âmbito não cumpre estes requisitos (Fernandez-Ballesteros, 2009). Esses projetos ou programas de promoção do envelhecimento ativo podem, ainda, distinguir-se entre iniciativas dirigidas à população ou a indivíduos, salientando-se também, o importante papel de alguns organismos internacionais, nomeadamente, da União Europeia, do Conselho Internacional sobre Envelhecimento Ativo, das Nações Unidas e da OMS. A maioria destes programas ou projetos, consistem na promoção do exercício físico, estimulando, secundariamente, a relação social. Mas, infelizmente, verifica-se que poucos publicam os seus resultados, tendo-se pouca informação sobre o seu impacto no envelhecimento ativo. A promoção do envelhecimento ativo, supõe um processo prolongado ao longo da vida que requer a otimização do funcionamento bio-psicosocial do indivíduo, com objetivo final de minimizar o declive durante a idade madura e a velhice. Favorecem o “envelhecer bem” fatores como, manter hábitos e estilos de vida saudáveis, educação permanente e a formação profissional, atividades culturais que fomentem as políticas de promoção social e muitos outros fatores dependentes do meio envolvente. O sistema educativo, de saúde, de serviços sociais e de proteção social podem considerar-se como programas de envelhecimento ativo de âmbito populacional, que só podem ser avaliados através de indicadores populacionais, como a esperança de vida sem incapacidade ou esperança de vida saudável. Por outro lado, temos que ter em conta que, a nível individual, é a pessoa que toma ativamente decisões acerca das suas linhas de atuação ao longo da sua vida, tornando-se por isso, muito difícil, ou quase impossível tirar conclusões (em que medida o indivíduo esteve implicado ativamente no seu próprio processo de envelhecimento ou em que medida os programas desenvolvidos a nível populacional se repercutiram no seu processo de envelhecimento). O indivíduo e os seus comportamentos interferem no processo, acelerando-o ou retardando-o, envelhecendo em interação com o seu meio. Verifica-se

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também que, sendo a saúde um dos ingredientes mais importantes do envelhecimento ativo, são básicas a promoção da saúde e a prevenção da doença, não se limitando, contudo, os programas de envelhecimento ativo a esta área (Fernandez-Ballesteros, 2009). Em Portugal, foi desenvolvido no setor da saúde, o “Programa Nacional para a Saúde das Pessoas Idosas”, que pretende contribuir para a promoção de um envelhecimento ativo e saudável ao longo de toda a vida e para a criação de respostas adequadas às novas necessidades da população idosa. Pretende ainda, que sejam estimuladas as capacidades das pessoas idosas, assim como a sua participação ativa na promoção da sua própria saúde, autonomia e independência. A estimulação da iniciativa pessoal dos idosos para a autonomia e a independência, é um imperativo de natureza ética, revelador da conceção humanista em que assenta uma sociedade, da responsabilidade solidária do Estado e da consciencialização, de cada cidadão, do sentimento de pertença a uma comunidade, através da sua participação e empenhamento generosos a favor da saúde dos mais frágeis. Este é o princípio básico em que assenta o Programa Nacional, o qual visa informar sobre o envelhecimento ativo e sobre as situações mais frequentes suscetíveis de influenciar a autonomia e independência das pessoas idosas, orientar, na área da saúde, a organização de todos os intervenientes, profissionais ou utilizadores e contribuir para a promoção de ambientes facilitadores da autonomia e independência, tendo em conta o impacto destas estratégias nos principais determinantes do envelhecimento ativo de cada cidadão. Salienta-se também o Projeto PALADIN (Promover a Aprendizagem e o Envelhecimento Ativo dos Seniores em Situações de Desvantagem), do qual Portugal é parceiro, através da Associação VIDA. Este projeto visa capacitar os seniores em situações de desvantagem (maiores de 50 anos com baixas qualificações) através do desenvolvimento das suas capacidades de autoaprendizagem em cinco áreas: Atividade (emprego e voluntariado); Saúde; Finanças; Cidadania; Educação (formal/não-formal/informal) (Associação VIDA, 2009). Neste sentido, o PALADIN desenvolveu um conjunto de cinco escalas de prontidão para a autoaprendizagem nessas áreas, e realizaram-se, até agora, 12 estudos em Portugal, Espanha, Grécia, Malta, Hungria e Suíça, com mais de 670 participantes. Dos resultados da sua aplicação, salienta-se

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que estes têm idades compreendidas entre os 50 e os 100 anos, a maioria vive em casa de familiares, é do sexo feminino, tem baixos níveis de educação, nenhuma qualificação ou apenas o nível mínimo, é casada, tem baixo rendimento mensal, não participa em ações de formação ou atividades de aprendizagem e muitos deles vivem em áreas urbanas (Associação VIDA, 2011). Encontrando-se a União Europeia num processo significativo de envelhecimento da população, o Parlamento Europeu propôs o ano de 2012 como “Ano Europeu do Envelhecimento Ativo”, cujo objetivo global é incentivar e apoiar os esforços dos Estados-Membros, das suas autoridades regionais e locais, dos parceiros sociais e da sociedade civil, no sentido de promover o envelhecimento ativo e de melhor explorar o potencial da população, em rápido crescimento, com 50 ou mais anos de idade, preservando desta forma a solidariedade entre gerações (Comissão Europeia, 2010). No sentido de incrementar o envelhecimento ativo, deverão ser criadas melhores oportunidades e condições de trabalho de forma a que os trabalhadores mais velhos desempenhem o seu papel no mercado de trabalho, combater a exclusão social fomentando a participação ativa na sociedade e incentivar o envelhecimento saudável. Neste sentido, e de acordo com a Resolução do Conselho de Ministros n.º 61/2011, de 22 de dezembro (Governo de Portugal, 2012, p. 9), os objetivos para o Ano Europeu do Envelhecimento Ativo e Solidariedade entre Gerações são: - Sensibilizar a opinião pública para o valor do envelhecimento ativo das suas diversas dimensões [incluindo a intergeracionalidade] e conseguir uma posição destacada nas agendas políticas; - Estimular o debate e o intercâmbio de informações e desenvolver a aprendizagem mútua entre os Estados-Membros e as várias partes interessadas; - Propor um quadro de compromisso e de ação concreta para que a União, os Estados-Membros e as partes interessadas

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possam elaborar soluções, políticas, estratégias e iniciativas de longo prazo inovadoras, sustentadas e duradouras; - Promover atividades de luta contra a discriminação em razão da idade, superando estereótipos e eliminando obstáculos, em especial quanto à empregabilidade.

Assim, cuidar do envelhecimento e, sobretudo, do envelhecimento ativo pressupõe cuidar da saúde, fazer exercício físico, estimular as funções cognitivas, mas também cuidar da qualidade das relações de intimidade, promovendo a saúde sexual.

Sexualidade no Idoso A saúde sexual requer uma abordagem positiva da sexualidade e uma compreensão de que existem múltiplos e complexos fatores e contextos que moldam o comportamento sexual humano. Profissionais de saúde, técnicos sociais, políticos, gestores e famílias precisam de compreender e promover o papel potencialmente positivo da sexualidade, uma vez que esta desempenha uma função importante na vida e na saúde das pessoas independentemente da sua idade, estado civil e orientação sexual. Os serviços de saúde deverão assim, promover pessoas e sociedades sexualmente saudáveis (OMS, 2006). Em qualquer idade a sexualidade é uma fonte de amor para a vida, para a atitude positiva frente a si próprio e para com os outros, e é um importante contributo para a qualidade de vida, como salienta Cardoso (2004, citado por Maia & Pessoa, 2009, p. 4) “a sexualidade representa uma das valências com impacto significativo sobre a qualidade de vida, independentemente da idade da pessoa” sendo que esta cresce e evolui com o ser humano, é por isso necessária para a realização plena de qualquer pessoa. Na mesma linha López & Fuertes (1993) afirmam que a sexualidade vivida satisfatoriamente torna mais fácil a compreensão dos outros e que é também uma fonte de equilíbrio e harmonia para a pessoa. Apesar da sexualidade ser difícil de definir, uma vez que o homem é um ser sexuado, a OMS define-a como

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uma energia que nos motiva para encontrar amor, contacto, ternura e intimidade; que se integra no modo como nos sentimos, movemos, tocamos e somos tocados; é ser-se sensual e ao mesmo tempo ser-se sexual. A sexualidade influencia pensamentos, sentimentos, acções e interacções e, por isso, influencia também a nossa saúde física e mental. http://juventude.gov.pt/SaudeSexualidadeJuvenil/Sexualidade/NossoCorpo/Paginas/ Afisiologiadasexualidade.aspx

Ora, esta dimensão da vida está muitas vezes esquecida quando nos referimos aos velhos. A velhice não implica uma perda de identidade sexual, os homens continuam a ser homens e as mulheres continuam a ser mulheres, independentemente da idade que tenham. As necessidades sexuais não acabam com o avançar da idade e a fonte de prazer é das últimas a perder-se, podendo-se desfrutar ao máximo das capacidades sexuais (Sánchez & Ulacia, 2006; Rathus, Nevid, & Fichner-Rathus, 2005). Não se pode negar a sexualidade na velhice, uma vez que ela é uma função vital que está presente durante toda a vida (Chincolla, 2006). E, em todas as idades, as pessoas são biológica, fisiológica e psicossocialmente sexuados – têm género, identidade sexual, desempenham papéis relativos ao género, traduzem a conduta sexual em desejos, sentimentos e fantasias, tudo isso regulado pela sociedade e cultura vigente. No entanto, a sexualidade modifica-se ao longo do ciclo vital, de tal modo que cada período de vida tem caraterísticas próprias mas, a capacidade de se enamorar, o desejo e o interesse sexual, mantêm-se ao longo de toda a vida (López & Fuertes, 1993; Rathus, Nevid, & Fichner-Rathus, 2005). O processo de envelhecimento é acompanhado de várias mudanças, tanto nos homens como nas mulheres, o que pode afetar a capacidade dos idosos para viver a sexualidade. Mas, os idosos, no que concerne à sexualidade, constituem um grupo heterogéneo, uma vez que existe uma grande diversidade em relação aos seus interesses e às suas capacidades, o que, em parte, se deve às mudanças individuais (Chincolla, 2006) e ainda, como defende Lima (2006), ao significado específico atribuído pela pessoa ou casal; a mesma autora acrescenta que (p.93) “a atividade sexual anterior é um dos grandes preditores da sexualidade na terceira idade” uma vez que “a sexualidade ao longo

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do tempo, (...) tende a manter a posição, de maior ou menos centralidade, na vida de uma determinada pessoa ou casal. A ideia seria que envelhecemos como vivemos.” Assim, cada pessoa escreve, ao longo da sua vida a sua ‘biografia sexual´ (Sánchez, 2005) vivendo, no presente, a sua sexualidade, mas, tendo em consideração o passado e projetando o futuro.

Transformações biofisiológicas Os processos biofisiológicos de envelhecimento sexual são lentos e variáveis de pessoa para pessoa. Existem alterações ao nível hormonal, reprodutivo, cardiovascular, osteoarticular, bem como patologias e tratamentos associados. De acordo com Sánchez & Ulacia (2006) e com Martí, J. et al. (s.d.), as alterações fisiológicas não justificam a perda brusca e significativa da atividade sexual, sendo que a adaptação às novas caraterísticas poderá ser enriquecedora. Segundo Chincolla (2006), as mudanças que afetam os genitais pouco interferem na sexualidade, já que esta vai muito para além dos genitais, implicando outros fatores - o indivíduo participa de forma completa, mas só parcialmente, com determinadas zonas do seu corpo. Pelo que é necessário ter-se em conta não só as componentes fisiológicas do desejo, da excitação, do orgasmo e da resolução, mas também o contacto corporal, o interesse e o desejo de ser abraçado, tocado, querido e por último, a satisfação final da atividade sexual, qualquer que seja a sua forma, duração e manifestação. A satisfação sexual, em geral, não está relacionada diretamente nem com número de coitos nem com a capacidade erétil do homem, mas sim, com a qualidade das relações em que está integrada a atividade sexual e a qualidade desta. Deste ponto de vista, pode-se afirmar e considerar a velhice como um período de evolução sexual. Concluindo, as alterações que ocorrem na velhice não implicam que a sexualidade seja afetada. Algumas das aparentes limitações anatomofisiológicas da velhice podem converter-se numa vantagem para a relação sexual, como é o caso da lentificação no processo de excitação e de resposta ejaculatória, que ocorre no homem e, na mulher idosa, a perda do medo de engravidar, e ainda, para ambos, a maior disponibilidade de tempo. Estas caraterísticas ajudam a que os

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Envelhecimento Ativo e Sexualidade

membros intervenientes tenham relações mais vagarosas, por vezes menos centradas no coito mas quase sempre mais centradas nos afetos, no beijo, no toque, nas massagens, nas carícias mútuas e na comunicação (Rathus, Nevid, & Fichner-Rathus (2005); Sánchez & Ulacia (2006)).

Transformações psicossociais Em termos psicossociais os idosos têm necessidade de relações íntimas, emocionais e de sentimentos de pertença, no entanto são múltiplos os aspetos que podem interferir negativamente e, de um modo geral, estão intimamente ligados à forma como é percecionada, em cada indivíduo, o envelhecimento e as mudanças decorrentes do mesmo. Os fatores psicossociais influenciam a intensidade do desejo sexual, as práticas e o comportamento sexual. Neles se incluem as atitudes, o conhecimento, as expetativas sobre si próprio e sobre o seu parceiro, assim como, as experiências prévias, pelo que a adaptação a esta fase do ciclo vital será mais fácil ou mais difícil quanto mais tiverem existido facilidades ou dificuldades de adaptação ao longo da vida. A vivência da sexualidade nos idosos sofre influência das atitudes e expetativas impostas pela sociedade (Sánchez & Ulacia, 2006). Atitudes e expetativas negativas - como considerar a velhice um período de deterioração -, bem como estereótipos frente à sexualidade favorecem o desinteresse por esta, a redução da atividade sexual e a insatisfação sexual em todas as idades. Lima (2006, p. 84), tendo em consideração Gomes et al (1987) organiza os estereótipos em três categorias: “cessação da sexualidade com a idade, as influências nefastas que a sexualidade pode ter na saúde e a conotação perversa se as atividades sexuais continuarem”. As principais transformações psicossociais, de acordo com Lima (2006), Lopéz & Fuertes (1993) e Fernandez (1996), são: - A perda do companheiro(a) - é uma das causas mais importantes. Este facto dificulta o acesso a um(a) parceiro(a) sexual.

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Neste particular salienta-se que existem muito mais mulheres do que homens sem parceiro (há mais viúvas do que viúvos, a moral sexual é mais rígida para as mulheres do que para os homens). A existência de um companheiro(a) favorece a conduta sexual ativa; - Relações rotineiras conflituosas e insatisfatórias que diminuem o desejo sexual, o grau de excitação e as próprias capacidades sexuais. No entanto atividade sexual satisfatória, ao longo da vida, é um bom indicador de vivências sexuais positivas na velhice; - A aceitação da imagem corporal (rugas, cabelos brancos, diminuição do vigor físico), a perda de capacidade física e as mudanças fisiológicas, as condições físicas como obesidade, perdas auditivas e visuais, dificuldade com a higiene pessoal, podem interferir na atratividade para os outros; - As condições económicas e sociais podem favorecer ou dificultar o interesse e as capacidades sexuais; - A atitude dos filhos, dos cuidadores e da sociedade em geral, normalmente negativa frente à ideia de que os velhos possam manter interesse sexual, considerando-os como assexuados e criando-lhes dificuldades acrescidas. Esta atitude, a falta de espaço, de condições e de oportunidades fazem, sobretudo para os idosos que moram em instituições ou em casa dos filhos, com que seja praticamente impossível terem condutas sexuais; - Viver desejando que o tempo não passe, pensando que o tempo passado foi melhor e convencendo-se a si mesmo que a vida está definitivamente perdida, é uma “condenação” para quem tem ainda muitos anos pela frente e muitas ocasiões para amar, de ter e dar prazer, sendo também uma forma de idadismo para consigo próprio; - Sentir a vulnerabilidade da vida e a proximidade da morte, nomeadamente a perda de pessoas significativas como amigos e familiares. As mudanças requerem e implicam adaptação e modificações nos processos psicológicos dos idosos, e a capacidade de mudar e de se adaptar é importante para se conseguir bem-estar e qualidade de vida. Do ponto de vista psicológico, a sexualidade não corresponde, apenas, a uma necessidade, mas é um desejo, um comportamento vivencial, uma conduta humana. Esta dimensão introduz “sentido” e “significado” na sexualidade, uma vez que a abre à relação, reveste-a

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de linguagem, encarna-a em símbolos, desenvolve uma dimensão celebrativa da sexualidade e da vida. O importante é que cada um descubra a maneira como se sente mais feliz e a felicidade não está no que os outros acham, fazem ou pensam, mas sim, na vontade de cada pessoa.

Promoção da saúde sexual e necessidade de educação sexual Neste contexto entende-se que a educação sexual deve ser universal, ao longo de toda a vida e promotora de oportunidades para que as pessoas, independentemente da sua idade, género, estado civil, possam ter uma vida sexual satisfatória e segura. Ora os mais velhos têm sido sistematicamente relegados para segundo plano no que respeita à educação sexual. As políticas, a legislação, os programas e as prioridades têm-se dirigido fundamentalmente para os mais jovens. Este particular faz com que – jovens, adultos e idosos, enfim a sociedade em geral - interiorizem, cada vez mais, modelos sociais e sexuais próprios da juventude. Todas as pessoas, em todas as idades e portanto também os idosos necessitam de educação sexual. No que concerne aos velhos, é essencial mudar a conceção social da velhice para se desenvolver o tema da sexualidade neste período de vida. Enquanto os idosos continuarem a interiorizar o modelo social e da sexualidade próprio da juventude, continuarão a pensar que não têm nenhum direito a interessar-se por algo que, pensam, já não lhes pertence ou a sentirem-se frustrados (Sánchez & Ulacia, 2006). Sabendo que, como defende Sánchez & Ulacia (2006), as dificuldades impostas aos idosos para que vivam a sexualidade são fundamentalmente de natureza psicossocial e não dependem da maior parte dos casos dos próprios velhos, seria vantajoso fazer-se educação sexual tanto aos funcionários dos centros e residências de idosos, como aos filhos, aos próprios idosos e à sociedade em geral. Na linha de pensamento dos mesmos autores, os principais objetivos da educação sexual seriam: - Fomentar o debate sobre problemática sexual, abordando este tema com naturalidade e estimulando que este seja desenvolvido

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por iniciativa própria dos participantes, esclarecendo dúvidas e obtendo maior informação; - Dar a conhecer mudanças corporais normais e forma de se adaptar com normalidade a novas situações; - Criar uma nova visão de sexualidade não tendo como principal objetivo a procriação, a contraceção, as relações sexuais, as manifestações heterossexuais e ainda promover uma visão da sexualidade que permita viver diferentes possibilidades de prazer e de comunicação, promovendo qualidade de vida psíquica e física das pessoas mais velhas; - Erradicar estereótipos e preconceitos que muitas vezes se convertem em opressão e justificam variadíssimas proibições; - Tentar solucionar dificuldades psicossociais limitadoras da sexualidade na terceira idade, como por exemplo: resistências e medos das pessoas (filhos, idosos e profissionais), erradicação de barreiras institucionais/familiares e criação de um novo modelo de sexualidade e de relações interpessoais. Em suma, deve-se estudar as possibilidades de melhorar as vivências da sexualidade nos idosos, a sua atividade/conduta sexual, oferecerlhes ajudas compatíveis com os seus valores, crenças, histórias e decisões, favorecendo que os velhos tenham vínculos afetivos estáveis e uma ampla rede de relações, devendo ser eles mesmos a tomar as decisões mais pertinentes. Mais que prescrever atividade sexual, devese deixar de criar dificuldades, reduzir ou até mesmo remover aquelas que desejam ultrapassar mas não conseguem e oferecer possibilidades para que se relacionem como considerem mais oportuno. Todas as pessoas têm direito à saúde sexual entendida como potenciadora da vida e das relações interpessoais. A saúde sexual requer uma abordagem positiva e respeitosa para com a sexualidade e as relações sexuais, bem como, a possibilidade de ter prazer e experiências sexuais seguras, livres de coação, discriminação e violência. Para que a saúde sexual seja alcançada e mantida, os direitos sexuais de todas as pessoas devem ser respeitados, protegidos e cumpridos (OMS, 2006). Neste contexto deve ser fomentada a oportunidade de que as pessoas, independentemente da sua idade, género, estado civil, possam ter uma vida sexual satisfatória e segura, contribuindo para envelhecer ativamente.

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Envelhecimento e alterações Nutricionais

Envelhecimento e Alterações Nutricionais

Agostinha Corte

A nutrição é um dos fatores mais importantes da saúde e do bemestar desempenhando um papel crucial no aumento da longevidade e na qualidade de vida da pessoa idosa, (Saldanha & Oliveira (1995) e Alix & Ferry, (2004)). Os genes (fatores intrínsecos) ditam a longevidade e os fatores extrínsecos como é o caso dos hábitos alimentares, condicionam a longevidade. Os hábitos alimentares e o estado nutricional podem influenciar o aparecimento ou agravamento de doenças crónicas, podendo influenciar negativamente o estado nutricional pela diminuição do apetite e redução da ingestão de nutrientes indispensáveis (Saldanha & Oliveira, 1995). O estado nutricional é o resultado de um conjunto de fatores que o condicionam como a alimentação ao longo do ciclo vital, o processo fisiológico do envelhecimento, as doenças crónicas, o isolamento social, o isolamento familiar, a interação fármacos/nutrientes e o consumo imoderado de bebidas alcoólicas. Uma nutrição adequada desde a vida fetal e neonatal, constitui uma base elementar no funcionamento celular e na melhoria da qualidade de vida. A alimentação é um dos aspetos mais estudados relacionado com o envelhecimento e aquele que reúne consenso como sendo capaz de alterar a longevidade e a qualidade de vida das populações. Os idosos apresentam necessidades nutricionais e adquirem hábitos dietéticos que os colocam em risco alimentar, dado que se por um lado as necessidades nutricionais diminuem com a idade devido à diminuição das necessidades metabólicas, por outro necessitam de consumir alimentos de maior densidade nutricional (Baker, 2008). Assim, começou-se a tomar consciência das interações que existem entre o envelhecimento e a nutrição.

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A senescência, ou seja, o vulgarmente chamado de envelhecimento normal, é acompanhada de um conjunto de modificações, tais como a alteração do olfato e do gosto, uma gestão menos adequada das energias armazenadas e da utilização dos nutrientes, que aumenta significativamente o risco de défices nutricionais. Diversos estudos revelam que a nutrição pode influenciar favoravelmente o envelhecimento natural e diminuir a incidência de certas patologias associadas à idade. Na opinião de Alix & Ferry (2004), as pessoas idosas têm maior probabilidade de envelhecerem de boa saúde quanto melhor for o seu estado nutricional.

Sistema gastrointestinal Durante o processo do envelhecimento existe uma perda de elasticidade do tubo digestivo, uma limitação da função secretora e uma alteração da circulação mesentérica. Todas estas modificações associadas a fatores relacionados com uma deficiente alimentação, ao consumo de fármacos, ao estado dos dentes e maxilares, a prótese dentária mal adaptada e à diminuição da motilidade, produzem alterações na flora intestinal (Alix & Ferry, 2004). A secreção salivar diminui, ficando a saliva mais espessa com consequente secura da mucosa oral, pelo que a digestão se processa de forma mais lenta. A atrofia da mucosa gástrica com a idade resulta na diminuição da secreção de ácido clorídrico, provocando um atraso na evacuação gástrica o que origina epigastralgias, em alguns idosos, após as refeições. A mucosa intestinal também sofre atrofia, dificultando as trocas e a digestão, sendo por isso frequentes alterações na eliminação intestinal como a flatulência, a obstipação, os fecalomas e a incontinência fecal. A parede abdominal também se atrofia originando, nos locais mais frágeis, hérnias inguinais, umbilicais e diafragmáticas. O fígado a partir dos 50 anos de idade diminui de peso e de volume, acelerando-se a diminuição a partir dos 70 anos de idade, sofrendo alterações celulares que reduzem a sua capacidade funcional (Alix & Ferry, 2004). Também o fluxo sanguíneo diminui, o que afeta a função metabólica do fígado que, por sua vez, vai afetar o metabolismo dos

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fármacos que se podem administrar à pessoa idosa. É aconselhável o idoso fazer uma alimentação equilibrada sem excessos ou abuso de substâncias tóxicas, tais como o álcool. Os principais problemas no sistema gastrointestinal na pessoa idosa devem-se à diminuição de ingestão de líquidos, sobretudo a água, alimentação deficitária, falta de exercício físico e toma de muitos fármacos (Triadó, 2006).

Paladar O gosto e o olfato são fatores essenciais na regulação do apetite e muitas vezes, não são avaliados nos indivíduos idosos (Alix & Ferry, 2004). Com a idade, embora consigam identificar os sabores o paladar altera-se, o que pode contribuir para a anorexia. O número de papilas gustativas diminui com a idade, mas só cerca de “10 % dos idosos se queixam de já não distinguirem o sabor dos alimentos” (Berger, 1995, p. 135). Daqui poderá resultar na tendência de excessos de uso nos temperos de alimentos, com predominância do sabor açucarado. O aumento de cílios nas narinas associado à atrofia dos órgãos olfativos e redução do número de papilas gustativas, leva à diminuição da sensação de sede que pode, em casos extremos, originar desidratação e anorexia. Uma vez que existe uma “(…) pérdida de sensibilidad para los alimentos o dulces; poco olfato.” (Triadó, 2006, p. 81).

Sistema Endócrino e Metabólico Os problemas mais comuns são: “(…) elevacíon anormal de colesterol, trigliceridos o de ambos a la vez…descenso de lípidos … fundamentalmente relacionado con la malnutrición.” (Carrillo, 2008, p. 136). Nos idosos parece existir uma dificuldade na metabolização da glicose o que se explica pela reduzida secreção de insulina pelo pâncreas, predispondo o idoso à diabetes mellitus. Cumulativamente, o pâncreas apresenta uma diminuição do tamanho e peso proporcional à idade,

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tal como as glândulas salivares, levando à diminuição da assimilação de proteínas e aumentando a flora intestinal. O volume da tiróide vai diminuindo ligeiramente, assim como as suprarenais, o metabolismo basal e surgem transformações gonadais e a nível do sistema reprodutor masculino e feminino. O envelhecimento endócrino é responsável pela atrofia dos órgãos reprodutores e pela alteração morfológica dos genitais.

Inanição/desnutrição Ser idoso não significa ser doente, essencialmente significa ter mais idade (Ermida, 1995). Entre os problemas mais frequentes nos idosos, também designados de síndromes geriátricos, destacamos a inanição (desnutrição). Segundo Ferreira (2001) devido a uma má nutrição, o idoso é mais propenso à obesidade, à magreza e à astenia, devendo-se às alterações fisiológicas próprias do envelhecimento, mas também às condições socioeconómicas, às doenças e à interação entre nutrientes e alguns tipos de fármacos. O envelhecimento diminui a capacidade funcional dos sistemas orgânicos, aumenta a prevalência das doenças crónicas e a incidência das doenças agudas (Pinto, 2006). As necessidades energéticas diminuem com a idade, quer por diminuição do metabolismo basal quer pela diminuição da atividade física (Vieira, 2001). Assim, “(…)a má nutrição tem como principais consequências uma redução da massa magra, uma fadiga muscular, quedas e uma imunodepressão responsável por infeções.” (Alix & Ferry, 2004, p.112). Os idosos por vezes manifestam alterações cognitivas que são atribuídas à idade mas, a verdade, é que essas alterações podem ser devido à carência de vitaminas nomeadamente vitaminas B1 (tiamina), B3 (niacina), B9 (ácido fólico), B12 (cobalamina), B6 (piridoxina), C e Vitamina E (Saldanha & Oliveira, 1995). A prevalência de desnutrição na pessoa idosa depende “(…) del grado de autonomia y del lugar donde vive; asi, se considera a entre un 3 y

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un 15% de los ancianos que viven en su domicilio, de un 30 a un 60% en los ingresados en instituciones.” (Garijo, 2003, p. 733).

Determinantes do estado nutricional O estado nutricional da pessoa idosa pode ser afetado por fatores físicos, psicológicos e sociais/culturais. Os fatores físicos podem estar relacionados com o processo de mastigação, com a diminuição do tónus muscular dos músculos da mastigação, com a ausência de dentes ou com a presença de prótese dentária parcial ou total mas, por vezes, desajustada à estrutura da mandíbula e das gengivas tornando a mastigação dolorosa e consequentemente com problemas de deglutição (Vieira, 2001). A degradação de estado bucodental é responsável por uma insuficiência mastigatória o que acaba por se traduzir numa alimentação monótona, desequilibrada e pouco apetitosa (Alix & Ferry, 2004). Como o sistema músculo-esquelético é o sistema mais afetado, este pode levar à incapacidade de o idoso se deslocar a adquirir alimentos ou mesmo confecioná-los dificultando ou tornando impossível a ingestão dos nutrientes essenciais. Associado à diminuição do sistema músculo-esquelético está a anorexia e consequentemente quedas/fraturas o que conduz a uma imobilidade prolongada e tornando-o dependente com riscos acrescidos de infeções. Os fatores psicológicos que influenciam o estado nutricional são as alterações cognitivas, as perturbações do humor como a depressão, a falta de confiança e o isolamento. Os fatores sociais, culturais e a falta de estruturas de apoio (família, amigos, económicos), o alcoolismo, o analfabetismo, a cultura diferente (barreira da língua), a mudança de residência, a institucionalização são também importantes. Para além destes fatores, atualmente a polimedicação surge também como um aspeto relevante (Alix & Ferry, 2004). Uma deficiente alimentação na pessoa idosa pode dever-se ao desconhecimento da importância da nutrição e hidratação, aos escassos recursos económicos, às limitações funcionais que se podem repercutir na dificuldade para a aquisição e confeção dos alimentos. Todos estes fatores têm consequências que podem ser a obesidade

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com maior incidência de doenças metabólicas tais como: a diabetes e o aumento da tensão arterial; a carência de nutrientes, de vitaminas e de sais minerais; a desnutrição que propicia o risco de quedas, as fraturas, as úlceras de pressão, o aumento de infeções tanto por afetar o sistema imunitário como pela diminuição de respostas aos fármacos, o aumento da morbi-mortalidade pode afetar a capacidade funcional tornando a pessoa idosa dependente e frágil.

Avaliação do estado nutricional É fundamental a avaliação do estado nutricional da pessoa idosa, deve integrar o exame clínico e ser “indispensável na elaboração de uma estratégia terapêutica” (Alix & Ferry, 2004, p. 125). Devido à especificidade do perfil epidemiológico dos idosos, em termos nutricionais, é recomendado que se avalie a população em dois grupos, no grupo etário dos 60-69 anos apresenta perfil epidemiológico semelhante aos adultos, têm alta prevalência de sobrepeso e os idosos com 70 ou mais anos de idade apresentam alta prevalência de baixo peso, com um perfil nutricional diferenciado (Guigoz & Garry, 1996). A avaliação nutricional não pode ser realizada apenas através de um único instrumento porque nenhum tem sensibilidade suficiente que possibilite o diagnóstico do tipo e gravidade da alteração da nutrição. Assim, é necessário associar várias ferramentas. Da avaliação devem fazer parte a averiguação de fatores sociais, psíquicos, funcionais (escalas de atividades de vida diária, escalas de atividades instrumentais de vida diária), exames laboratoriais e medidas antropométricas. A antropometria visa a deteção, através de medidas objetivas, da ocorrência do baixo peso versus excessivo. O indicador antropométrico é essencial na avaliação nutricional geriátrica (Duarte, 2002; Sampaio, 2004). O exame laboratorial é imprescindível para não se confundir parâmetros inalterados e parâmetros alterados com o processo do

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envelhecimento. Parâmetros inalterados: hemoglobina e hematócrito, hemograma, electrólitos (sódio, potássio, cloreto e bicarbonato), ureia, transaminases, bilirrubinas, tempo de protrombina, cálcio e fósforo; cujos valores anormais necessitam de uma reavaliação (Kane, 2005). Os parâmetros alterados com o processo do envelhecimento são: creatinina, albumina, velocidade de sedimentação e a glicose. Os valores elevados da creatinina indicam uma redução significativa da função renal. Os valores médios da albumina diminuem com o avançar da idade sendo um dos indicadores de desnutrição. A fosfatase alcalina, o ferro sérico, a ferritina são parâmetros que diminuem com a idade, indicadores de desnutrição ou de hemorragia, podendo originar anemia (Kane, 2005). A anemia é “(…)uma das primeiras manifestações de desnutrição proteico-calórica(…)” (Kane, 2005, p. 56). A população idosa com idade superior a 80 anos requer mais atenção, uma vez que existe um elevado risco de infeções que diminuem as hipóteses de sobrevivência nas doenças críticas, como por exemplo em patologias cancerosas (Coitinho et al., 1991). A Organização Mundial da Saúde (OMS), em 1995, sugere que os valores de IMC entre 16 e 18,4 para indicar os graus 1 e 2 de desnutrição proteico-calórica. Os dois extremos de IMC estão associados, com maior risco de morbilidade e mortalidade. As causas de morte, associadas a valores de IMC baixo, foram patologias pulmonares, tuberculose, enquanto as causas de mortalidade, associadas a altos valores de IMC, foram doenças cardiovasculares, diabetes e cancro do cólon. O cálculo do peso é “(…) a pedra angular de la malnutrición (…)” (Garijo & Dávila, 2003, p. 737). Deve-se avaliar o peso atual e questionar o peso habitual para calcular a diferença entre estes valores, contabilizar o tempo em que decorreu esta diferença, para se identificar a gravidade. O peso atual pode ser expresso como percentagem do peso habitual: % do peso habitual(Kg) = Peso atual(Kg)/ Peso habitual(Kg)×100. Conforme tabela 1, sempre que apresentem variações superiores a 10 % pode sugerir desnutrição (Blackburn et al, 1982).

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Tabela 1 – Variação de peso em função do tempo Tempo

Perda de significativa%

peso

Grave%

1 semana

1 - 2%

>2

1 mês 3 meses

5% 5 - 7%

6 meses

10%

>5 >7 > 10

Fonte: (adaptado de Blackburn et al., 1982).

A percentagem de alteração é expressa pela fórmula: VPP Velocidade de Perda de Peso (%) = Peso habitual (Kg)- Peso atual(Kg)/ Peso habitual(Kg)×100. Com o processo do envelhecimento a massa gorda aumenta e a massa magra diminui, tal como a quantidade de água corporal, assim como a sensação de sede podendo originar desidratação na pessoa idosa. A desidratação pode resultar tanto da perda de água como da falta de ingestão, sendo esta uma situação grave (Alix & Ferry, 2004). A relação entre desnutrição e desidratação é estreita porque “(…) qualquer restrição alimentar implica obrigatoriamente uma restrição em água (…) ” (Alix & Ferry 2004, p. 204). A avaliação dos perímetros, braquial e da perna possibilitam-nos uma estimativa acerca da massa muscular. Na opinião de Alix & Ferry (2004), a avaliação do perímetro da cintura é um marcador da gordura visceral. Nas mulheres com perímetros da cintura superiores a 80 cm e nos homens valores superiores a 94 cm, conforme tabela 2 são considerados fatores de risco acrescido. Tabela 2 – Valores de perímetro da cintura por sexo Perímetro da cintura Normal Risco elevado Risco muito elevado

Homem Até 94 cm > 94 cm > 102 cm

Fonte: (Garganta, 2003).

60

Mulher Até 80 cm > 80 cm > 88 cm


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Pode ser realizada a avaliação nutricional através da escala Mininutricional Assessment (MNA) que avalia o risco de desnutrição constituído por 18 itens, fiável e de baixo custo (Garijo & Dávila, 2003). Os parâmetros antropométricas mais utilizados são o Índice de Quetelet ou Índice de Massa Corporal (IMC), com a massa corporal expressa em quilogramas e a estatura em metros. Consiste num questionário que pode ser preenchido em 10 minutos, é dividido, além da triagem inicial, em quatro partes: avaliação antropométrica em que os parâmetros a avaliar são: (o IMC, perímetro braquial, perímetro da perna); avaliação global (questões sobre o modo de vida, medicação, mobilidade e problemas psicológicos); avaliação dietética (questões sobre o número de refeições, ingestão de alimentos e líquidos e autonomia na alimentação); e autoavaliação (a auto percepção da saúde e da condição nutricional). O objetivo da escala é calcular o risco individual de desnutrição de forma a permitir uma intervenção precoce. A soma dos scores da MNA permite uma identificação do estado nutricional além de identificar riscos de desnutrição (Santo, 2005). A avaliação nutricional é um dos parâmetros mais importantes a considerar com o fim de manter a saúde na terceira idade em virtude da sua correlação com a qualidade de vida e longevidade do ser humano (Veríssimo, et al, 1994).

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Envelhecimento e Polimedicação

Envelhecimento e Polimedicação Fátima Roque

A grande prevalência de doença no idoso é propícia a uma grande utilização de medicamentos por parte desta população. A população idosa utiliza, diariamente, em média, dois a cinco medicamentos prescritos e, cerca de 20 a 40%, utilizam mais de cinco medicamento (McLean et al., 2004). Num estudo, realizado em Portugal, para avaliar o consumo crónico de medicamentos verificou-se que nos idosos há uma proporção crescente de utentes a fazer um, dois e três ou mais fármacos, sendo o consumo crónico de três ou mais fármacos, máximo neste grupo etário (65,1% dos utentes com mais de 70 anos consumiam três ou mais medicamentos) (Ferreira, 2007). Se por um lado a utilização de vários medicamentos, é assumida como trazendo benefícios para a saúde dos indivíduos, que podem sofrer de diferentes doenças, a polimedicação é também conhecida como um fator de risco devido ao aparecimento de reações adversas, interações medicamentosas, e, propiciar uma baixa adesão dos doentes ao tratamento. Tem sido demonstrado, também que, muitas vezes a polimedicação é responsável por gastos em saúde desnecessários, diretamente com medicamentos e, indiretamente, devido ao aumento de internamentos por reações adversas (Bjerrum, 1998; Bjerrum et al., 1997). Os problemas relacionados com medicamentos têm sido referidos como responsáveis por grande percentagem de tratamentos de emergência e internamento hospitalar de doentes idosos (Mjörndal et al., 2002). Desta forma, torna-se importante avaliar a necessidade e a adequabilidade dos medicamentos que são prescritos aos idosos, tendo em conta as suas características fisiopatológicas e socioculturais que podem influenciar a resposta aos medicamentos.

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Patologias mais frequentes no idoso e o uso de medicamentos As alterações morfológicas, fisiológicas, bioquímicas e psicológicas que decorrem durante o processo de envelhecimento vão determinar a perda de capacidade de adaptação, tornando o idoso mais suscetível às agressões externas, ocorrendo maior incidência de processos patológicos. Desta forma, a presença de múltiplas doenças afeta mais de metade da população idosa, com prevalência aumentada na população muito idosa, nas mulheres e indivíduos com baixo nível sociocultural. As principais consequências da multimorbilidade, são a diminuição da capacidade funcional, a baixa qualidade de vida, e, a crescente utilização de cuidados de saúde e custos em saúde (DGS, 2004). As principais causas de morbilidade e mortalidade no idoso são as doenças cerebrovasculares e cardiovasculares, neoplasias, demências, acidentes por perda de audição e visão, diabetes, doenças osteoarticulares e doenças mentais (OMS, 2005). A prevalência de muitas doenças vai aumentando com a idade, e apresenta diferenças de acordo com o género. A doença de Parkinson, é uma das doenças neuro-degenerativas mais comuns no idoso e aumenta de 0,6% aos 65 anos, para 3,5% aos 85 e mais anos (DGS, 2004). A prevalência da demência aumenta, de 1% aos 65 anos, para 30% aos 85 anos de idade, duplicando, entre os 60 e os 95 anos, em cada cinco anos e apesar de maior prevalência no sexo feminino, estas sobrevivem mais tempo com a doença que os homens. Os acidentes vasculares cerebrais (AVC), apresentam uma importante causa de morte e de ocorrência de deficiências, sendo que a sua prevalência também aumenta com a idade, de 3% aos 65 anos para 30% aos 85 anos. O risco de desenvolver demência (nomeadamente Alzheimer) está acrescido em cerca de 30% nos indivíduos com doenças cardiovasculares (DGS, 2004). Nos países industrializados o envelhecimento está associado a um aumento da prevalência de hipertensão, doenças vasculares, insuficiência cardíaca e diabetes, as quais por sua vez afetam a função renal do idoso (Fliser et al., 1997). Portugal representa o país da União Europeia com maior mortalidade para os indivíduos acima dos 65 anos, sendo que as principais

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patologias associadas a esta mortalidade são as doenças do aparelho circulatório e os tumores malignos, estando-se a verificar um crescimento de mortalidade também para as doenças do aparelho respiratório (DGS, 2004). Dada a prevalência de diversas doenças crónicas no idoso, é de prever que haja um elevado número de indivíduos idosos a tomar mais de 3 ou 5 medicamentos, verificando-se que, a maioria são doentes polimedicados. A agravar a situação de múltiplas patologias surge o problema da polimedicação, que, se por um lado o uso de medicamentos é importante para controlar a doença, aumentar a sobrevida e melhorar a qualidade de vida do idoso, pelo outro, pode ser mais uma causa de problemas de saúde, quer devido a erros de medicação, por dificuldades na toma dos medicamentos, quer devido à ocorrência de reações adversas, quer ainda devido ao aparecimento de interações medicamentosas.

Características fisiológicas implicações na terapêutica

do

envelhecimento

e

suas

As alterações fisiológicas relacionadas com o próprio processo de envelhecimento natural condicionam modificações na resposta aos fármacos, mesmo na ausência de doença. A redução da massa muscular e da água corporal, alteram a farmacocinética dos fármacos, principalmente dos hidrofílicos, reduzindo o seu volume de distribuição (Vd). Por outro lado, verifica-se um aumento da massa lipídica, resultando numa elevação do Vd para fármacos lipofílicos (Aymanns et al., 2010). Alterações importantes ocorrem também a nível vascular, a elasticidade vascular diminui, o fluxo sanguíneo capilar é mais baixo, com consequente diminuição acentuada da perfusão sanguínea de alguns órgãos (principalmente do cérebro), alterando o perfil de distribuição de alguns fármacos. Há uma redução do tónus venosos, podendo ser frequentes as situações de hipotensão assintomáticas (por haver diminuição dos sintomas de ortostatismo), alteração do equilíbrio hidro-electrolítico, podendo ser frequentes situações de desidratação, além de que, estas alterações são difíceis de estabilizar podendo ocorrer situações graves de intoxicação aquosa devido a administração de grandes volumes de soluções parentéricas.

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A função hepática também está alterada, sendo que alguns processos metabólicos hepáticos estão diminuídos (particularmente a desalquilação e a N-acetilação), no entanto há processos metabólicos que se mantêm semelhantes. As mudanças mais significativas em órgãos no idoso ocorrem com o envelhecimento renal. A perda de parênquima renal relacionada com a idade é aproximadamente 10% por cada dez anos de vida (Gourtsoyiannis et al., 1990). Esta perda é acompanhada por uma diminuição acentuada do fluxo plasmático renal, de 618-689 ml/min para 349-485 ml/min (Berg, 2006; Fuiano et al., 2001). A função tubular está também comprometida devido ao stresse oxidativo (Cusack, 2004). Da mesma forma, o clearance da inulina (índice de filtração) baixa de um valor médio de 120 ml/min (num individuo de 20 a 50 anos e com uma superfície corporal média de 1,7m2) para 90 ml/min aos 60-70 anos e para 65ml/min, nos indivíduos com mais de 80 anos. O índice de secreção tubular também está diminuído (de 600ml/min para 350 ml/min) dos 50 para os 70 anos ( Guimarães, 2006). Também ocorrem importantes modificações fisiológicas a nível dos órgãos dos sentidos, sendo de destacar a nível da visão (12% dos idosos têm deficiência visual e 2% com cegueira, devido a cataratas ou à degenerescência macular, relacionada com a própria idade) e da audição (28% apresentam redução da acuidade auditiva que pode ir até à surdez) (Guimarães, 2006).

Implicações farmacocinéticas Devido às alterações fisiológicas mencionadas, verificam-se grandes alterações na farmacocinética dos fármacos, que podem ocorrer em todas as fases do processo farmacocinético - absorção, distribuição, metabolismo e excreção (ADME) (Tabela 1). Estas modificações estão essencialmente relacionadas com diminuição da capacidade funcional de alguns órgãos e com a redução da eficácia dos mecanismos de homeostase (Corsonello et al., 2010).

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Tabela 1– Principais alterações farmacocinéticas, no idoso, relacionadas com a idade Etapa da Farmacocinética Absorção

Distribuição

Metabolismo

Excreção

Alteração relacionada com a idade

Efeito

Aumento do pH gástrico Atraso no esvaziamento gástrico Redução do fluxo snguíneo Diminuição da área de absorção Diminuição da motilidade gastrointestinal

A absorção diminui ligeiramente

Aumento da massa lipídica corporal Diminuição da massa corporal não lipídica

Aumento do volume distribuição e tempo de semi-vida dos fármacos lipídicos.

Redução da água corporal total

Aumento das concentrações plasmáticas de fármacos hidrossolúveis.

Redução da albumina plasmática

Aumento da fracção livre de fármacos acidicos com afinidade para as proteínas plasmáticas.

Aumento da α1-glicoproteína ácida

Diminuição da fracção livre de fármacos básicos

Redução do fluxo sanguíneo hepático e da massa hepática total

Menor ocorrência do metabolismo de 1ª passagem e do metabolismo de fase I.

Redução do fluxo sanguíneo renal

Comprometimento da eliminação renal de fármacos solúveis em água.

Redução da taxa de filtração glomerular

de

Fonte: [adaptado de (Corsonello, et al., 2010)].

As alterações que ocorrem com a idade a nível do aparelho gastrointestinal podem modificar a biodisponibilidade de alguns fármacos administrados por via oral. A biodisponibilidade de fármacos administrados por outras vias de administração, para além da via oral, também pode estar modificada devido às alterações fisiológicas que ocorrem com o envelhecimento. A administração de fármacos por via transdérmica, muito útil para administração de vasodilatadores, analgésicos, anti-inflamatórios e estrogénios, pode apresentar modificações devido às alterações de hidratação e estrutura lipídica da camada córnea, aumentando a sua função de barreira, essencialmente para fármacos hidrofílicos. O tempo de semi-vida para alguns fármacos lipídicos pode aumentar significativamente e a concentração máxima baixar, no entanto, há que ser prudente com qualquer ajuste de dose, pois há que considerar todas as outras modificações que acontecem, a

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nível cardiovascular, cerebral, hepático e renal (Kaestli et al., 2008; Thompson et al., 1998). Com a idade também se verifica uma modificação na deposição pulmonar de fármacos administrados por via inalatória, como é o caso dos broncodilatadores (agonistas β2adrenérgicos e dos anticolinérgicos), dos esteroides para inalação e dos anestésicos. A habituação tabágica e a presença de doenças frequentes com o envelhecimento, como a asma, doença pulmonar obstrutiva crónica e infeções agudas das vias aéreas superiores aumentam o impacto sobre a farmacocinética dos fármacos administrados por via inalatória no idoso. Nesta via de administração há ainda a considerar a técnica de inalação que pode dificultar a adesão ao tratamento por parte do doente idoso (Allen, 2008; Anhoj et al., 2000; Matsuura et al., 2009). A função renal diminuída altera a excreção renal de fármacos, as alterações hepáticas interferem com a atividade do citocromo P450, a capacidade de ligação às proteínas está alterada assim como aos tecidos (Benet et al., 2002; Ginsberg et al., 2005; Nolin et al., 2003). As modificações que ocorrem a nível da permeabilidade da barreira hematoencefálica são importantes na distribuição de fármacos ao Sistema Nervoso Central (SNC), verificando-se alterações sobre a farmacocinética dos fármacos que atuam neste sistema. A diminuição de glicoproteína P associada ao envelhecimento facilita a acumulação de substâncias tóxicas no cérebro, com o avançar da idade, aumentando o risco de patologias neuro-degenerativas (Bartels et al., 2009) e a exposição do SNC a concentrações elevadas de fármacos e de xenobióticos (Toornvliet et al., 2006). A nível do metabolismo, é importante referir que, nos idosos, dada a diminuição do processo de 1ª passagem hepática e das reações enzimáticas de fase I, a biodisponibilidade de fármacos que são fortemente metabolizados pode estar bastante aumentada, podendo ocorrer situações de toxicidade e que, por outro lado, a biodisponibilidade de fármaco ativo aquando da administração de prófármacos pode estar bastante reduzia, podendo surgir situações de ineficácia terapêutica.

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Desta forma podemos dizer que os processos de absorção, distribuição e eliminação de muitos fármacos estão alterados pelo que será necessário em muitas situações proceder a uma monitorização dos parâmetros farmacocinéticos no doente idoso.

Implicações farmacodinâmicas Os mecanismos de ação dos fármacos também podem estar alterados, diminuindo ou aumentando a resposta a determinados fármacos, devido a algumas modificações, quer no tipo, quer no número de recetores, e ainda devido a modificações nos sistemas de contraregulação. Existem mesmo situações de resposta paradoxal como é o caso dos barbitúricos hipnóticos que, nalguns casos em vez de sedação podem provocar excitação, confusão e reação psicótica (Guimarães, 2006). Uma pequena alteração farmacocinética que modifique ligeiramente as concentrações plasmáticas pode ser responsável por múltiplos efeitos farmacodinâmicos, que nalgumas situações podem ser benéficos mas que, na maioria podem ser perigosos (Aymanns, et al., 2010). Estas alterações farmacodinâmicas são importantes, pois influenciam quer os efeitos terapêuticos quer os efeitos tóxicos e o aparecimento de reações adversas. As alterações fisiológicas também tornam os órgãos alvo mais suscetíveis a reações adversas relacionadas com esses órgãos. As reações alérgicas imediatas e os sintomas de alerta estão diminuídos, o que pode influenciar a instalação de reações adversas graves, sem que tenham sido detetadas numa fase inicial (Guimarães, 2006). Implicações relacionadas com a capacidade funcional e cognitiva As alterações a nível da capacidade funcional e cognitiva dificultam a comunicação com o médico e outros profissionais de saúde, dificultando a compreensão das suas instruções terapêuticas. Como principais implicações relacionadas com a capacidade funcional salienta-se o seguinte: défices visuais dificultam a leitura das

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instruções e dos rótulos dos medicamentos, défices auditivos podem contribuir para problemas de compreensão das instruções verbais, défices de mobilidade e presença de artrite dificultam a utilização do próprio medicamento. A diminuição da capacidade cognitiva pode dificultar o recordar de novas instruções e contribuir para a falta de adesão no cumprimento terapêutico por perdas de memória ou dificuldade de compreensão (Moodabe, 2001).

Adesão à terapêutica no doente idoso A Organização Mundial de Saúde (OMS) define adesão à terapêutica a longo prazo, como o grau de coincidência do comportamento de um indivíduo - toma de medicamento, dieta ou alterações de estilos de vida - com as recomendações acordadas com o profissional de saúde (OMS, 2003). Num estudo realizado com 13835 doentes não institucionalizados observou-se elevada taxa de não adesão aos medicamentos, por falhas, redução da dose ou mesmo suspensão total do medicamento (Soumerai et al., 2006). Os principais fatores associados à não adesão à terapêutica podem ser agrupados em várias categorias, nomeadamente, socioculturais, patológicas, terapêuticas, comportamentais e económicas. Também podemos considerar que alguns fatores estão relacionados com os fármacos (posologia, número de fármacos, reações adversas, características da embalagem e/ou do dispositivo de administração) outros estão relacionados com o doente (alterações fisiológicas, morbilidades múltiplas, capacidade cognitiva, crenças e perfil sociopsicológico), e outros com os próprios sistemas de cuidados de saúde, nomeadamente relação entre o doente e o médico, acesso aos medicamentos (por ex. seguros e restrições) e apoio social (Hughes, 2004). As consequências da não adesão à terapêutica podem ser a falta de eficácia do tratamento, a ocorrência de reações adversas que podem contribuir para um aumento da morbilidade e ou mortalidade, assim

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como para um aumento dos custos em saúde (Gottlieb, 2000; Vik et al., 2006). Desta forma, é necessário instituir procedimentos de forma a melhorar a adesão à terapêutica do idoso. As intervenções utilizadas para melhorar a adesão dos idosos à terapêutica devem ser multifacetadas, envolvendo médicos, farmacêuticos e enfermeiros, e combinar abordagens práticas, nomeadamente reduzir o número de medicamentos, simplificar os regimes terapêuticos e educação dos doentes tendo sempre em conta as suas atitudes e perceções em relação à doença (Hughes, 2004).

Medicamentos potencialmente inadequados no idoso Considera-se que os doentes tomam medicamentos adequados à sua condição clínica quando o risco de utilização é inferior aos benefícios esperados. Esta questão tem maior relevo no caso do doente geriátrico, pois dadas as modificações fisiopatológicas que ocorrem, muitos medicamentos podem ser adequados para determinadas condições clínicas e serem considerados inadequados neste grupo específico. Segundo o critério de Beers (Beers et al., 2000) considerase que existe utilização inadequada de medicamentos nas seguintes situações: i. ii. iii.

Medicamento utilizado quando não é necessário – uso excessivo; Utilização de um medicamento não indicado ou numa dose incorreta, para a situação clínica, esquema posológico ou duração terapêutica desajustada – mau uso; Não utilização de um medicamento que deveria ser utilizado – subutilização.

Tendo em conta a atualização ao critério de Beers (Fick et al., 2003) alguns medicamentos são considerados inadequados no doente idoso independentemente da condição clínica, e outros são considerados inadequados para determinadas condições clínicas. Dada a dificuldade da aplicação direta do critério de Beers no desenvolvimento de estudos sobre medicamentos inapropriados em Portugal, os critérios

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foram operacionalizados para Portugal (Soares et al., 2008) e desta operacionalização resultou uma sistematização de medicamentos potencialmente inapropriados independentemente da patologia (Tabela 2) e de medicamentos potencialmente inapropriados por patologia (Tabela 3). Na operacionalização destes critérios, os autores tiveram o cuidado de identificar os fármacos para os quais não existe Autorização de Introdução no Mercado (AIM) em Portugal, e incluíram substâncias com AIM em Portugal que pertencem aos grupos fármacoterapêuticos indicados por Beers.

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Envelhecimento e Depressão Ermelinda Gonçalves Marques Maria João Nunes

O processo de envelhecimento é um fenómeno normal e universal, contudo, diferencial, ou seja, ninguém envelhece do mesmo modo ou ao mesmo ritmo. As modalidades de senescência variam de uma população para outra, assim como dentro da mesma população (Berger, 1995). Não obstante, há determinadas patologias que se tornam mais frequentes nos idosos. Assim, a nível físico, são as afeções osteoarticulares que limitam a capacidade funcional do idoso; a nível psicológico são as doenças mentais que se assumem como o principal fator de cronicidade. Os problemas psicológicos ligados ao envelhecimento, relacionam-se, sobretudo, com as perdas de papéis, as crises, as múltiplas situações de stresse, a doença, o afastamento da família, o que pode causar depressão ao idoso. A depressão não deve ser confundida com tristeza, uma vez que a tristeza é caraterizada como uma reação normal e comum, uma emoção desagradável precipitada por uma situação de perda, enquanto que o humor é um estado de ânimo interno e mantido (Costa, 2002). Segundo Cordeiro (2005), a tristeza é uma vivência normal e comum que se sente em relação à perda de qualquer coisa que consideramos relevante. O modo como as pessoas reagem à tristeza depende da sua personalidade: há pessoas que ficam impacientes, irritadas e tensas, outras tornam-se apáticas, alheadas como se desistissem de tudo e ainda outras suscetíveis e agressivas ou passivas, dependentes e apelativas. Para Kaplan (1997), o humor pode ser normal, elevado ou depressivo. A depressão define-se essencialmente pelo aparecimento de um estado de humor depressivo, em que a pessoa experimenta a perda de energia e interesse, sentimentos de culpa, dificuldades em concentrarse, perda de apetite, pensamentos sobre morte, suicídio, alterações nos níveis de atividade, das capacidades cognitivas, da linguagem e

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das funções orgânicas. O humor depressivo e a perda de interesse ou prazer constituem os sintomas nucleares da depressão. Do ponto de vista psicomotor, o humor depressivo exprime-se na inibição e perturba o comportamento e a aparência do indivíduo (descuidado, mal penteado, vestuário desarranjado, sujo ou negligente). Quanto à expressão facial, o indivíduo apresenta comissuras labiais para baixo, sobrolho carregado, ómega melancólico. É frequente uma postura fletida, ombros descaídos, movimentos vagarosos e cabeça inclinada para baixo (Montgomery, 1993; Kaplan, 1997; Costa, 2002). A maioria dos doentes refere perturbações do sono, especialmente insónia terminal (despertar nas primeiras horas da manhã) e múltiplos despertares durante a noite (Kaplan, 1997). Hale (2000) aponta como caraterísticas da depressão, além de um sistemático estado de mau humor, perda de interesse ou de satisfação, pouca energia e menos atividade, pouca concentração e atenção, baixa autoestima e autoconfiança, ideias de culpa e pessimistas sobre o futuro, ideias suicidas, perturbações do sono, falta de apetite, acrescentando ainda que a gravidade da depressão é, em grande parte, uma questão do número e da intensidade dos sintomas caraterísticos. O pessimismo sobre o futuro, os sentimentos de inutilidade e a culpa são frequentes e facilmente identificados se forem colocadas as questões corretas (Montgomery, 1993). Nos doentes moderadamente deprimidos o apetite pode manter-se, no entanto em casos mais graves de depressão, têm o apetite diminuído e consequentemente uma diminuição do peso (Montgomery, 1993; Kaplan, 1997). Os sintomas de ansiedade surgem em cerca de 90% dos casos de depressão. A ansiedade é um indicador rigoroso da gravidade da depressão, devendo ser considerada como parte integrante da mesma. Alguns doentes deprimidos podem apresentar um grau mais elevado de ansiedade que os doentes com estados ansiosos (Montgomery, 1993; Kaplan, 1997).

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Vaz Serra (1996) considera a depressão uma entidade clínica que surge da interceção de fatores predisponentes - circunstâncias de natureza genética ou psicológica que aumentam a suscetibilidade de uma pessoa vir a apresentar uma depressão e fatores precipitantes – circunstâncias do meio ambiente que são suscetíveis de ativar as vulnerabilidades genéticas ou psicológicas que o indivíduo apresenta. Atualmente, para uma correta definição e diagnóstico da depressão utilizam-se os critérios expostos no Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM)-IV e Classificação Internacional de Doença (CID)10. A depressão é um transtorno comum, com uma prevalência de 15% durante toda a vida. É sem dúvida mais prevalente no sexo feminino (10-25%) do que no sexo masculino (5-12%). Esta diferença de prevalência pode ser explicada pelo facto da mulher desempenhar múltiplos papéis na sociedade (Costa, 2002; Kaplan, 1997). Na perspetiva de Costa (2002), podem ser apontados um conjunto de fatores de risco para a depressão: sexo feminino, mulheres casadas, homens que vivem sozinhos, idades compreendidas entre os 40 e os 60 anos, perdas parentais, história familiar de depressão, acontecimentos vitais negativos, ausência de um confidente e residência em área urbana. A depressão não é benigna, tende a ser crónica, com recaídas (Kaplan, 1997). Após o primeiro episódio, a probabilidade de recorrência é de 50%, de 70% após o segundo e de 90% em doentes que sofreram mais de dois episódios (Costa, 2002). Em média, cerca de 50% dos doentes apresentam sintomas depressivos significativos antes de ser detetado o primeiro episódio depressivo. Em cerca de metade dos doentes surge antes dos 40 anos. Os episódios depressivos não tratados persistem entre 6 a 13 meses, os tratados duram cerca de três meses (Kaplan, 1997). Como indicadores de bom prognóstico são de salientar: episódios leves, ausência de sintomas psicóticos, curto internamento hospitalar, ambiente familiar estável, funcionamento social estável nos cinco anos anteriores ao episódio, ausência de transtorno da personalidade, idade avançada de início, entre outros. A coexistência de um

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transtorno distímico, abuso de álcool e de outras substâncias, ansiedade e história de mais de uma hospitalização anterior por episódio depressivo são indicadores de mau prognóstico (Kaplan, 1997). Na opinião de Lapid & Rummans (2003, citados por Salgueiro, 2007), a depressão aumenta com o envelhecimento dos indivíduos, não querendo com isto dizer, que o estado depressivo tem o seu início após os 65 anos, no entanto com o aumento da longevidade, é natural que a depressão acompanhe a pessoa que previamente já sofreu algum episódio depressivo. O início da reforma é uma fase marcante na vida de uma pessoa, defendendo alguns indivíduos que é nesta altura que se dá a transição da idade adulta para a velhice. Esta interpretação é feita à luz dos mitos e preconceitos da velhice, como sendo uma fase improdutiva e de cariz negativo, o que, na realidade, não o é. A perda de energia ou fadiga é caraterística da depressão que muitas vezes passa despercebida, sendo interpretada como um sintoma físico (Salgueiro, 2007). Para Figueiredo (2007) a depressão é o problema psicológico mais comum no idoso, sendo considerada por Cantera & Domingo (1998) uma manifestação frequente de alteração psíquica na idade pré-senil e senil, independentemente dos estados de melancolia que, habitualmente, ocorrem neste grupo etário. O idoso está numa situação de perdas contínuas a diversos níveis, como por exemplo: diminuição do suporte sociofamiliar, perdas do estatuto profissional e económico, algum declínio físico, maior frequência de doenças, o que pode estar associado ao aparecimento de estados depressivos (Salgueiro, 2007). Por vezes, os indivíduos são reformados, porque atingem um patamar etário, delimitado somente pela idade cronológica, sendo assim excluídos da produção, mesmo que seja contra a sua vontade. O idoso vai para casa e não têm nada para fazer, verificando-se uma mudança radical nos hábitos de vida. Deixa de se preocupar com determinados aspetos, como o cumprimento de horários, cuidar da sua aparência para ir trabalhar, estabelecer contactos com outros indivíduos, responsabilidades a nível profissional, caindo assim num vazio que até essa altura não existia. A

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pessoa reformada pode ter uma ocupação cheia de significado para si, tornando-se imperativo que a sociedade reconheça o valor laborativo e ocupacional das pessoas mais velhas e, quando tal acontece, o próprio idoso sente-se mais incentivado e estimulado a desenvolver atividades em diversas áreas. Na opinião de Cantera & Domingo (1998), muitos idosos apresentam a primeira depressão da sua vida, por outro lado, outros tiveram a primeira na juventude, sofrendo nesta fase de uma segunda depressão. Há ainda casos que tiveram fases depressivas repetidas e que acabaram por desaparecer na velhice. A depressão, passando muitas vezes desapercebida e sem tratamento, pode contribuir para alterações consideráveis na saúde do idoso e aumentar a mortalidade nesta etapa da vida. Segundo os mesmos autores, a incidência da depressão nos idosos na comunidade é de cerca de 2% e a prevalência aproximadamente 10%. Nos idosos internados a incidência aumenta para 20 a 25% e no caso dos idosos institucionalizados (em lares), cerca de 13 a 18% desenvolvem um episódio de depressão grave no primeiro ano. Se falarmos de depressões menores, os valores aumentam significativamente para 11 a 25% na comunidade, 40% no internamento (doenças agudas) e 30 a 35% em lares de idosos, o que mostra que a frequência da doença é bastante influenciada pelo meio. Apesar de estes valores poderem parecer excessivos, na verdade, a depressão está subdiagnosticada devido a diversos fatores, nomeadamente: os idosos raramente reconhecem que têm sintomas psiquiátricos; sendo-lhes mais difícil reconhecer determinados sintomas, como manifestações patológicas, não consultam os profissionais da área da saúde mental; a depressão manifesta-se, com frequência, por queixas somáticas distintas; não procuram ajuda especializada e, quando o fazem com o seu médico, a depressão não é diagnosticada entre 45 e 90% dos casos. A OMS considera que, cerca de 66% de indivíduos com uma perturbação depressiva, estão subdiagnosticados, sobrecarregando as famílias e instituições que proporcionam cuidados aos idosos, sendo também altamente destruidora da qualidade de vida, impondo, consequentemente, uma carga social e económica para a sociedade. Como já foi referido, o idoso está numa situação de perdas contínuas, o que naturalmente envolve sentimentos de tristeza que, em

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indivíduos com uma personalidade pré-mórbida, ou seja, onde já exista uma tendência depressiva, é normal que surja a depressão. Neste sentido, Kaplan et al (1997) referem que a depressão é uma resposta inadequada à perda. Os mesmos autores apresentam-nos alguns fatores que predispõem os indivíduos idosos à depressão, nomeadamente: Biológicos - história familiar (predisposição genética); episódio(s) pregressos de depressão; alterações dos neurotransmissores associadas ao envelhecimento; Físicos - doenças metabólicas, endócrinas, neurológicas, músculo-esqueléticas, pulmonares, gastrointestinais, infeções, entre outras; distúrbios clínicos crónicos, principalmente quando provocam principalmente dor ou perda funcional; uso de fármacos (ex: agentes psicotrópicos, hipnóticos, esteróides); privação sensorial (perda de visão ou audição); perda da função física; Psicológicos - conflitos não resolvidos (ex: raiva, culpa); perda de memória e demência; distúrbios da personalidade; Sociais - perda de familiares e amigos (privação), isolamento; perda do emprego; perda de rendimentos. Nos idosos, os sinais e sintomas de depressão podem ser atribuídos a processos naturais do envelhecimento, o que torna mais difícil o diagnóstico. Por outro lado, Kane et al (2005), chamam atenção para que o aspeto físico do indivíduo idoso sob suspeita de estar deprimido seja interpretado com algum cuidado. As alterações associadas ao envelhecimento, tais como cabelos grisalhos e escassos, pele enrugada, ausência de dentição com alteração da arquitetura facial, postura encurvada e marcha lenta, podem sugerir aspeto de depressão. Algumas doenças como doença de Parkinson, surdez, doenças sistémicas, podem também causar aparência física de depressão. Alguns sintomas podem ser causados por depressão, por doenças físicas ou por combinação de ambas, pelo que, deve haver algum cuidado na interpretação dos mesmos. Nos idosos, é particularmente comum a depressão que se evidencia principalmente por sintomas físicos, sendo esta conhecida como depressão mascarada. Os idosos, por terem dificuldade em expressar sentimentos como tristeza, culpa e raiva, podem somatizar essas

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emoções e relatar sintomas físicos. Paralelamente, alguns indivíduos idosos com diminuição da estimulação sensorial associada à perda de visão, audição ou sensibilidade tátil, podem exagerar as respostas aos estímulos internos (ex: batimentos cardíacos e motilidade gastrointestinal) e enfatizar essas queixas, quando, na verdade o que sentem é ansiedade e depressão. Alguns exemplos de sintomas físicos que podem indicar depressão, podem ser visualizados no quadro 1. Quadro 1 - Exemplos de sintomas físicos que podem indicar depressão

SISTEMAS Gerais

Cardiorespiratório

Gastrointestinal Genitourinário Musculoesquelético Neurológico

SINTOMAS Fadiga Astenia Anorexia Emagrecimento Ansiedade Insónia Dores generalizadas Dor torácica Respiração curta Palpitações Tontura Dor abdominal Obstipação Polaquiúria Urgência Incontinência Dor difusa Dor lombar Cefaleia Distúrbio de memória Tontura Parestesias

Fonte: (Kane, 2005)

Cantera & Domingo (1998) referem que, no início, a depressão pode apresentar sinais similares aos da demência, o que leva a que, cerca de 30% dos diagnósticos iniciais de demência não seja corretos. A falta de interesse por parte dos doentes depressivos e a perda de atenção, de

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memória e de concentração, dificultam a distinção entre ambos os processos, o que pode vir a ter consequências desastrosas para o idoso, como é o caso do suicídio que é mais comum entre os idosos deprimidos do que nos adultos, tornando-se crucial a distinção entre ambas as doenças, já que uma delas é tratável, a depressão. Em média, dois terços dos doentes deprimidos apresentam pensamentos de morte, sendo que 10 a 15% cometem suicídio. Para se considerar um ato como suicida, é indispensável haver intenção de morte. Assim, podemos definir suicídio como todo o caso de morte resultante direta ou indiretamente de um ato realizado pela própria vitima e pelo qual ela sabia produzir esse resultado. Há no entanto outras situações, os chamados para-suicídios em que a intenção de morte não existe de forma consciente, neste caso o risco de morte está latente, mas não é admitido ou fantasiado pelo individuo. Em Portugal as taxas de suicídio são mais elevadas nos viúvos e divorciados de ambos os sexos do que nos solteiros e casados, sendo que as taxas de suicídio são mais baixas no Outono e Inverno, do que na Primavera e no Verão. A capacidade de ouvir, compreender e sentir o desespero é normalmente fonte de alívio para o doente em sofrimento. Este pode, no entanto, reagir com agressividade ou refugiar-se no mutismo, podendo negar-se a qualquer contacto (Kaplan, 1997). A depressão, em conjunto com a esquizofrenia, é responsável por 60% dos suicídios em Portugal (Ministério da Saúde, 2004). Os resultados do terceiro censo psiquiátrico realizado em 2001 revelaram, nos idosos, uma predominância de casos de depressão na consulta externa e na urgência. Alguns estudos realizados na união europeia, como por exemplo Eurodep Study, permitem estimar que aproximadamente oito milhões de pessoas, com idade igual ou superior a 65 anos, sofrem de formas de depressão potencialmente tratáveis. É um facto que há uma elevada percentagem de falhas no reconhecimento preciso de doentes com depressão, o que poderá implicar uma potencial diminuição da função e um aumento do tempo de internamento. Não obstante, sabe-se que, mais de 80 % das pessoas com depressão são tratadas com sucesso recorrendo à medicação e à psicoterapia ou à

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combinação de ambas (Copeland, 1999 citado por Santos, 2007). Apesar da dificuldade em diagnosticar esta patologia e verificando-se que nos últimos anos a principal preocupação tem sido dada à avaliação da gravidade da depressão e às alterações ocorridas nos doentes em quem já foi diagnosticada a doença, torna-se imperioso um diagnóstico o mais precocemente possível. Neste sentido, Woods (1996) é de opinião que uma completa entrevista de diagnóstico é o melhor instrumento de avaliação para determinar se um idoso sofre ou não uma perturbação de humor. Por outro lado, muitas investigações utilizam, atualmente, auto-questionários da depressão ou escalas de bem-estar subjetivo preenchidas pelo próprio sujeito, sendo este último, na opinião de Fontaine (2000), o nível de prazer em viver que a pessoa conservou. Dentro dos numerosos instrumentos existentes para avaliar a depressão, a Escala de Depressão Geriátrica (Teste de Yesavage) é um instrumento construído especificamente para pessoas idosas. A escala original foi desenhada por Brink, Yesavage et al, (Brink, 1982; Yesavage, 1983, citados por Molina, 2008), tem 30 questões, apresentando como vantagens o facto de as perguntas serem facilmente entendidas, ter uma pequena variação nas possibilidades de resposta e de poder ser auto-aplicada. A versão reduzida apresenta 15 questões (Sheikh & Yesavage, 1986) e requer apenas entre 5 a 7 minutos para ser preenchida, evitando assim o cansaço e diminuição da atenção, que são frequentes neste grupo etário. Foi traduzida, aferida e adaptada para a população portuguesa por Veríssimo em 1988 na “Avaliação Diagnóstica dos Síndromes Demenciais”. O tratamento da depressão deve assentar nos seguintes pilares: garantir a segurança do doente, realizar uma completa avaliação do diagnóstico e instituir um plano de tratamento que aborde não apenas os sintomas imediatos, mas também o bem-estar futuro do doente. O internamento está indicado quando são necessários procedimentos diagnósticos, em casos de risco de suicídio ou homicídio, em situações de incapacidade para cuidar da alimentação, habitação e vestuário e em história de sintomas de rápida progressão e de rutura dos sistemas habituais de suporte (Kaplan, 1997).

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Segundo Cantera & Domingo (1998) os objetivos do tratamento da depressão no idoso, são atenuar os sintomas depressivos, reduzir o risco de recaídas, melhorar a qualidade de vida, aumentar o estado de saúde física e diminuir a mortalidade. O tratamento pode ter como modalidades, a terapia farmacológica e a terapia psicossocial. A medicação antidepressiva para ser eficaz deve perdurar o tempo suficiente, de acordo com a prescrição médica, o que nem sempre é fácil de controlar neste grupo etário devido a uma maior sensibilidade aos efeitos secundários, falta de apoio familiar para assegurar as tomas, existência de outras patologias, auto-medicação oculta com outros psicofármacos ou álcool, problemas económicos. Os três tipos de antidepressivos mais conhecidos são os IMAOS (Inibidores da Monoaminoxidase), os Tricíclicos e os IRSS’s (Inibidores da Recaptação Selectiva da Serotonina). A educação do doente em relação aos efeitos secundários e a elucidação deste para o facto de serem necessárias três a quatro semanas para que se sintam os efeitos do antidepressivo é tão importante para o sucesso terapêutico como a utilização destas terapêuticas (Costa, 2002; Kaplan, 1997). O tratamento farmacológico não resolve todos os aspetos envolvidos na depressão do idoso, sendo necessário recorrer à terapia psicossocial, que pode envolver por ex: terapias interpessoais e terapias familiares, que têm efeitos duradouros, sobretudo em indivíduos cuja saúde física é adequada. As várias psicoterapias focalizam-se nos défices associados ao humor depressivo. Temos como exemplos: Terapia Cognitiva (focaliza as distorções cognitivas), Terapia Interpessoal (concentra-se em um ou dois problemas interpessoais), Terapia Comportamental (aborda os comportamentos mal-adaptativos), Terapia de Orientação Psicanalítica (baseia-se na mudança na estrutura da personalidade ou caráter do doente) e Terapia Familiar (examina o papel do membro afetado, procurando o bem-estar de toda a família) (Costa, 2002; Kaplan, 1997). Existe um vasto leque de terapêutica para a depressão, que em situações ideais deve estar integrada juntamente com as psicoterapias.

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Verifica-se assim que, uma forma de abordagem mais ampla e completa do tratamento da depressão no idoso, consiste em efetuar um tratamento combinado (farmacológico e não farmacológico). Salienta-se ainda o facto de a depressão estar subdiagnosticada havendo, assim, a necessidade de continuar a dar importância aos sintomas sugestivos da mesma e, posterior encaminhamento para cuidados de saúde especializados, quando tal se justifique. É muito importante para o idoso sentir-se útil para alguém, habitualmente para a família, o que faz com que a sua auto-estima e dignidade se mantenham elevadas. Consideram-se fontes importantes de mal-estar psíquico nos idosos, a solidão, a perda de autonomia devido a doença e a má tolerância ao envelhecimento numa sociedade que valoriza essencialmente o jovem, procurando a psicoterapia, obter uma melhor adaptação a esses condicionalismos. Neste sentido, “(…) qualquer medida que facilite a autonomia e os cuidados pessoais contribui para melhorar o estado de ânimo e para evitar recaídas afetivas” (Cantera & Domingo, 1998, p. 250).

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Envelhecimento e Cicatrização Paula Coutinho Maximiano Prata Ribeiro

Os desafios fisiológicos, psicológicos, sociais e espirituais específicos/ exclusivos dos idosos devem ser considerados em todas fases do processo de cuidados de saúde. Se de facto o envelhecimento não é uma doença, mas pode ser responsável por um grande número de distúrbios que resultam de processos intrínsecos ao nível dos órgãos, tecidos e células. Seja qual for o mecanismo e o tempo de envelhecimento celular, este não atinge simultaneamente todas as células e, consequentemente, todos os tecidos, órgãos e sistemas. Cada sistema tem o seu tempo de envelhecimento. Um dos sinais mais evidentes do envelhecimento está relacionado com as mudanças produzidas na pele, caracterizadas por alterações na sua estrutura e função. O envelhecimento do individuo está identificado como um fator de risco para a cicatrização de feridas. Assim, importa analisar o envelhecimento e o seu efeito na cicatrização de feridas, bem como processos e estratégias que se podem utilizar para promover a recuperação relativamente a processos traumáticos da pele nos idosos.

Caraterização da Pele A pele é o maior órgão do corpo humano, pesa entre 6 a 10 kg, é indispensável à vida, e está constantemente exposta a elementos potencialmente nocivos no ambiente. Em adultos, apresenta uma área aproximada de 2m2, e exerce diferentes funções, entre elas: imunológicas, neurossensoriais, metabólicas, proteção contra radiação ultra violeta (UV) e agentes infecciosos, regulando ainda a homeostase e a temperatura corporal. A pele é formada por duas camadas a epiderme e a derme. Em continuidade com a derme está o tecido subcutâneo que embora não faça parte da pele, serve de suporte e


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união com os órgãos e tecidos subjacentes (Figura1) (Church et al., 2006; Priya et al., 2008; Tobin, 2006). Figura 1 - Ilustração da pele humana: epiderme, derme e tecido subcutâneo

Fonte: (adaptado de (MacNeil, 2008)).

Epiderme A epiderme deriva da ectoderme e corresponde à parte externa da pele. Esta camada é avascularizada, tem uma espessura compreendida entre 75 a 150 µm (podendo ir até 600 µm nas mãos e pés) (Dyer et al., 1990; Tobin, 2006) e é constituída por um epitélio queratinizado de descamação estratificado que a separa da derme por uma membrana basal (Tobin, 2006). A epiderme é constituída por três tipos de células. Os queratinócitos, que são os mais abundantes, produzem uma mistura proteica, insolúvel em água denominada queratina, que dificulta a evaporação da água para a sua superfície (Tobin, 2006). Os melanócitos que são responsáveis pela cor da pele, e determinantes na defesa contra os raios ultravioleta e as células de Langerhans que fazem parte do sistema imunitário, que atuam na captação, processamento e apresentação antigénica, migração celular, interação com linfócitos T, secreção de citocinas e ativação da resposta imune específica (Seeley et al., 2003).


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Derme A derme é uma matriz extracelular (MEC) fibrosa e amorfa com intensa atividade, com origem na mesoderme e localizada abaixo da epiderme. A derme é responsável pela maior parte da força estrutural da pele, e sustentação da epiderme, pela nutrição das células da epiderme e pela remoção dos produtos de excreção. Esta camada é constituída por fibras proteicas de elastina, reticulina e colagénio (a mais abundante) que formam um denso tecido conjuntivo fibroelástico irregular. Os feixes de colagénio conferem à derme o tónus da pele e respondem pelo seu vigor e resistência. As fibras elásticas conferem elasticidade à pele, permitindo a movimentação, flexão e extensão dos membros, além da fixação da derme às estruturas adjacentes, epiderme e hipoderme. Este tecido é também constituído por fibroblastos, macrófagos e algumas células adiposas (Seeley et al., 2003). Na sua estrutura estão localizadas, glândulas sudoríparas e sebáceas, folículos pilosos, vasos sanguíneos, terminações nervosas e vasos linfáticos. Apenas a derme é vascularizada, em que os seus capilares além da nutrição do tecido são responsáveis pela regulação térmica em conjunto com as glândulas sudoríparas. Esta camada pode ter entre 2 a 4 mm espessura (Tobin, 2006). Apesar de possuir um volume superior ao da epiderme, contém menos células e estas encontram-se mais distanciadas (Tobin, 2006).

Alterações na pele resultantes do envelhecimento A primeira estrutura a modificar-se com o envelhecimento é a pele. Muitos dos efeitos deletérios do envelhecimento na pele são uma combinação de fatores intrínsecos e extrínsecos (Gosain et al., 2004). Os fatores intrínsecos, como a idade do individuo e a sua genética, são definidos como alterações que ocorrem nas áreas da pele protegidas de agressões ambientais. O envelhecimento intrínseco da pele expressa-se como uma pele seca, enrugada e flácida, característica do idosos. Alguns deles estão relacionados com alterações no tecido conjuntivo da derme, que atua como alicerce estrutural para a epiderme, e conduzem às mudanças na aparência externa refletidas no estrato córneo. Os fatores extrínsecos resultam da exposição da pele ao meio ambiente, tais como a exposição aos raios ultra violeta e


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infra vermelho, agentes químicos e tabagismo. Em geral, os fatores extrínsecos têm maior impacto na morfologia da pele que os intrínsecos, pelo que as mudanças nas características da pele humana durante o envelhecimento são frequentemente determinadas por forças ambientais ou extrínsecas. O processo de envelhecimento intrínseco da pele assemelha-se ao registado na maioria dos órgãos internos e está associado à diminuição da capacidade proliferativa que conduz à senescência celular e à alteração da atividade biossintética das células que compõem a pele. Os eventos relacionados com o envelhecimento intrínseco da pele resultam de uma combinação de processos, incluindo (i) a menor capacidade proliferativa de células da pele; (ii) a diminuição da síntese da matriz na derme; (iii) a maior expressão de enzimas que degradam a matriz de colagénio. (iv) teoria do stress oxidativo no envelhecimento (Sohal et al., 1990), que sugere a forte influência do stress oxidativo no envelhecimento e que altera o programa genético através da modulação de genes sensíveis a reações redox e que o seu efeito resulta de danos produzidos sobre os lipídios, proteínas e DNA celulares, que naturalmente também influenciam a senescência celular. O envelhecimento extrínseco, mais comumente denominado por fotoenvelhecimento, também envolve alterações na atividade biossintética celular mas conduz a uma severa desorganização da matriz dérmica. Os mecanismos moleculares subjacentes a algumas destas alterações começam a ser revelados e são atualmente muito discutidos. Sugere-se que 80% do envelhecimento facial é atribuível à exposição solar (Gilchrest, 1989). Clinicamente, a pele fotodanificada carateriza-se pela perda de elasticidade, maior rugosidade e secura, pigmentação irregular e rugas profundas (Kligman et al., 1986). As alterações que ocorrem na epiderme da pele fotodanificada incluem um aumento e diminuição da espessura epidérmica (correspondentes a hiperplasia ou atrofia grave, respetivamente), perda da polaridade epidérmica (Gilchrest et al., 1992), alterações na distribuição da percentagem e/ou funcionalidade dos componentes dérmicos extracelulares, e representam as principais alterações visíveis associadas aos danos induzidos por UV.


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Está bem descrito que o envelhecimento altera a morfologia da pele (Ashcroft et al., 2002; Gosain & DiPietro, 2004), com uma diminuição da sua espessura após os 60 anos de idade e diminuição progressiva da superfície de contato epiderme-derme ao longo da vida, associada à perda da distribuição em rede das fibras elásticas com sua progressiva fragmentação, o que resulta em menor resistência ao estiramento da pele. As fibras de colágeno tornam-se mais ásperas e aleatórias, reduzindo a elasticidade da pele. Com a pele tornando-se menos elástica, mais seca e frágil, e com a perda da gordura subcutânea, as linhas, as rugas e a flacidez passam a ser evidentes. A pele torna-se irritada e rompe-se mais facilmente. A pele dos idosos tem reduções na vascularização, tecido de granulação, produção de colagénio e densidade, elastina, mastócitos e número de fibroblastos. O turnover epidérmico reduz-se em cerca de 50% na passagem dos 20 para os 70 anos, o que se deve sobretudo à menor capacidade de resposta dos queratinócitos relativamente aos fatores de crescimento que limita a capacidade proliferativa dessas células. Há uma redução no número de melanócitos, e os que estão presentes aglomeram-se causando a pigmentação da pele comumente denominada manchas da idade. Ocorre redução do número de células de Langerhans e de mastócitos. O declínio da população mastocitária resulta numa menor produção de histamina e consequente resposta inflamatória cutânea diminuída. Há diminuição da espessura e da quantidade de vasos sanguíneos. A diminuição da espessura dos vasos sanguíneos dá origem à fragilidade dos vasos, palidez e redução da temperatura da pele, condição facilitada pela redução da gordura dérmica; desta forma, além de favorecer a progressiva fibrose e atrofia dos anexos cutâneos, compromete a termorregulação, predispondo o idoso a hipotermia. Como resultado da acentuada redução no fluxo sanguíneo cutâneo está também afetada a capacidade de adaptação à temperatura e também a capacidade de reparação de feridas devido à limitação da disponibilidade de oxigénio e nutrientes, e redução da infiltração de células do sistema imunológico nos tecidos (Tsuchida, 1993). As glândulas sudoríparas decrescem em 15% aproximadamente, gerando uma redução da capacidade de transpiração espontânea diante do aumento da temperatura ambiente (Freitas et al., 2006).


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Em geral, com a idade, a derme torna-se menos densa, menos celular e menos vascular (Thomas, 2001). Clinicamente, a pele envelhecida caracteriza-se pela atrofia, desidratação, rugosidade, alterações de pigmentação, flacidez, e eventualmente presença de tumores benignos ou malignos. O pH da pele permanece constante (pH = 5,5) até idade adulta (70 anos) e depois sobe de forma significativa. Como a acidez cutânea inibe a colonização bacteriana, o acréscimo do pH aumenta a suscetibilidade à infeção. As peculiaridades acima apresentadas favorecem a instalação de lesões na pele idosa. O achatamento da junção dermoepidérmica e a redução da adesão entre estas camadas, torna mais prováveis a perda da camada superficial e a exposição da derme em pequenos traumas. A perda da elasticidade diminui a capacidade da pele de suportar forças de cisalhamento, que são criadas pela inter-relação das forças gravitacionais (forças que empurram o corpo para baixo) e o atrito. A resposta imunológica está comprometida e a pele encontra-se seca e sem lubrificação. Desta forma, o idoso é mais suscetível a ter escoriações, ulcerações e infeções na pele, além de ter uma cicatrização mais lenta e difícil (Freitas, et al., 2006). Tabela 1 - Alterações histológicas e clínicas

Alterações histológicas

Alterações Clínicas

Redução da epiderme

Atrofia

Redução da vascularização

Desidratação

Diminuição do tecido granulação Diminuição da elastina

de

Rugosidade Alteração da pigmentação

Redução de mastócitos

Flacidez

Redução de Fibroblastos

Tumores

Diminuição da motilidade celular

Diminuição da espessura


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Cicatrização A perda da integridade cutânea pode resultar num desequilíbrio fisiológico, numa deficiência significativa ou até mesmo na morte do indivíduo. Todos os anos ocorrem milhões de casos de perda significativa da integridade da pele. Devido a este problema, existe a necessidade de estudar o processo de cicatrização (Clark et al., 2007; Lu et al., 2008; Ma et al., 2007). Figura 2 - Representação esquemática das diferentes fases da cicatrização

Legenda: Inflamação (a), reparação e formação (b) e remodelação (c) Fonte: (adaptado de (Katlic, 2011)).

A cicatrização é um fenómeno biológico específico, dinâmico e muito complexo que envolve diversos fatores. Alguns desses fatores são as interações entre as células da epiderme (queratinócitos, que regeneram tecido cutâneo), derme (fibroblastos, que produzem um suporte para a MEC), factores de crescimento e monócitos que se


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infiltram na área traumatizada produzindo citocinas (Hong et al., 2008; Kumbar et al., 2008; Sezer et al., 2007). A cicatrização no ser humano possui as seguintes fases: inflamação, angiogénese, proliferação celular, migração, diferenciação, formação da MEC e remodelação do tecido conjuntivo (Hung et al., 2001; Ueno et al., 2007). As fases de inflamação, reparação e formação, e remodelação são as mais importantes do processo de cicatrização (Figura 2).

Inflamação A primeira fase da cicatrização é a inflamação que ocorre imediatamente após a lesão do tecido e pode ser dividida em aguda ou crónica. A fase aguda é caraterizada pela presença abundante de neutrófilos, enquanto que a fase crónica se carateriza pela abundância de células mononucleares, incluindo linfócitos e macrófagos (Hung et al., 2001). Durante a inflamação, os elementos do processo inflamatório, da cascata de coagulação e do sistema imunitário são ativados para impedir a perda de sangue e outros fluidos, para remover o tecido necrosado e para prevenir infecções. A hemostase é mantida inicialmente através da formação de um agregado de plaquetas, seguida de uma matriz de fibrina que se torna o suporte para as células que vão remodelar o tecido. Os neutrófilos são então recrutados para a área lesada, devido à ativação do sistema complemento, à degranulação das plaquetas e devido a produtos resultantes da degradação de bactérias. Passados 2-3 dias os monócitos surgem na área lesada e diferenciam-se em macrófagos, estes parecem ter um papel fundamental na coordenação dos últimos acontecimentos da resposta à lesão. Estudos recentes sugerem que na ausência de ambos os tipos de células pode ocorrer a reparação de pequenas feridas com menor formação de cicatriz (Martin et al., 2003).


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Reparação e a formação Na segunda fase ocorre a reparação e a formação do novo tecido. Esta fase dura entre 2-10 dias após a lesão e é caraterizada pela proliferação celular e pela migração de diferentes tipos de células. O primeiro passo consiste na migração de queratinócitos na parte superior da derme lesada, seguida da formação de novos vasos sanguíneos (capilares). Os fibroblastos e os macrófagos são responsáveis pela rápida substituição da matriz de fibrina por tecido de granulação (fibroblastos e células endoteliais vasculares), que formam um novo substrato para a migração de queratinócitos. Os queratinócitos próximos da área lesada proliferam e restituem a barreira protetora do epitélio. No último estágio desta fase, os fibroblastos próximos da área lesada ou provenientes da medula óssea são estimulados pelos macrófagos a diferenciarem-se em miofibroblastos. Estas células apresentam contractilidade e são responsáveis pela união das margens da ferida. Os fibroblastos e os miofibroblastos interactuam e produzem a MEC, principalmente formada por colagénio, que é fundamental para que ocorra uma boa cicatrização das feridas (Gurtner et al., 2008; Hung et al., 2001).

Remodelação A terceira e última fase do processo de cicatrização da lesão é a remodelação e inicia-se 2-3 semanas após a lesão, podendo prolongarse por mais de um ano. Durante esta última fase todos os processos iniciados após a lesão cessam. Ocorre a migração, maturação e morte celular programada (apoptose) da maioria das células endoteliais, macrófagos e miofibroblastos, originando-se assim uma massa que contém poucas células e que consiste principalmente em colagénio e outros constituintes da MEC. Após 6-12 meses o colagénio tipo III da matriz acelular é transformado em colagénio tipo I. Este processo fortalece o tecido remodelado e é realizado por metaloproteinases produzidas por fibroblastos, macrófagos e células endoteliais. Contudo, o novo tecido não possui as mesmas propriedades do tecido nativo (Gurtner et al., 2008; Hung et al., 2001).


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Alterações na cicatrização resultantes do envelhecimento A debilidade da regeneração da pele no idoso é afetada por múltiplos fatores que contribuem para a cicatrização retardada e cronicidade da ferida, incluindo diabetes mellitus, infeção bacteriana, doenças cardiovasculares, insuficiência renal, deficiência nutricional, incontinência urinária, imobilidade e certos fármacos (Neil, 2000). Estudos em humanos indicam que o envelhecimento provoca alterações qualitativas e com um enorme impacto em todas as fases do processo de cicatrização (Tabela 2). Essas alterações incluem o aumento da agregação plaquetária, maior taxa de infeção, diminuição da contração da ferida e função dos macrófagos, e atrasos na reepitelização, angiogénese, infiltração de macrófagos e remodelação (Gosain & DiPietro, 2004; Swift et al., 2001; Thomas, 2001). Além disso, ocorre atraso na deposição das fibras de colagénio e a sua estrutura torna-se cada vez mais desorganizada. Esta redução e desorganização do colagénio são referidas como sendo responsáveis pela redução de resistência à tração e aumento da taxa de deiscência observada em feridas cirúrgicas de pacientes idosos (Cook et al., 1997). Contudo, muitas das alterações não são provocadas por anomalias celulares, mas sim devido a diferenças entre o grau e tempo do infiltrado celular no tecido (Freedland et al., 1995), como por uma resposta inflamatória diminuída, diminuição da produção de citocinas e de fatores de crescimento, diminuição dos recetores de citocina e aumento do número de células senescentes (Bryant et al., 2007). Tabela 2 - Efeito do Envelhecimento na Cicatrização Efeito do Envelhecimento na Cicatrização Diminuição da cicatrização Diminuição da contração da ferida Diminuição do tempo de reação de exposição ao sol Redução da sensação Aumento do risco de rutura da junção (rasgo de pele) Diminuição da entrega de nutrientes na epiderme Aumento do risco de rutura e formação de bolhas Diminuição da microcirculação

Diminuição da resposta imune


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Diminuição da hidratação da pele. Aumento do pH da pele. Aumento da suscetibilidade a alérgenos Alterações da permeabilidade transdérmica Diminuição da capacidade de diferenciação Diminuição da proteção. Aumento do risco de danos das estruturas subjacentes Diminuição da capacidade de regular temperatura Diminuição da formação de novos capilares Diminuição da formação de tecido de granulação Diminuição da entrega de nutrientes para a pele Fonte: (Adaptado de (Worley, 2006)).

Feridas e envelhecimento Com o aumento da esperança média de vida da população, houve também aumento da frequência das doenças que acompanham o envelhecimento, tais como as neoplasias, cardiopatias, hipertensão arterial, diabetes, vasculopatias, etc. Essas condições aumentam a prevalência e a complexidade das feridas e atrasam a sua cicatrização. Pode-se afirmar que a idade é um dos aspetos sistémicos mais importantes, como co-fator de risco tanto para a ferida como para seu tratamento, pois gera um impacto no funcionamento de todos os sistemas fisiológicos corporais (João et al., 2006). Todas estas alterações tornam o idoso mais susceptível a contrair lesões cutâneas. Dentro das várias lesões de pele que afetam o idoso, as mais recorrentes são as úlceras de pressão, lacerações e

queimaduras.

Úlceras de Pressão As úlceras de pressão são feridas que resultam da irritação da pele devido à falta de irrigação sanguínea nesse local e conduzindo à morte dos tecidos. Estas podem ocorrer por um excesso de pressão ou fricção numa determinada região contra uma saliência óssea (EPUAP, 2009; Kottner et al., 2009).


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As úlceras de pressão são classificadas em quatro tipos, conforme os tecidos que atingem. Quanto mais profundo for o tecido lesado, mais elevado é a categoria e mais grave é a úlcera de pressão (EPUAP, 2009; Kottner et al., 2009). Categoria I – Nesta categoria observa-se alterações da pele, aparece um eritema não branqueável de uma área definida. Também pode ser observado alterações nos seguintes aspetos: descoloração da pele, calor, edema, tumefação e dor. Categoria II - Esta envolve a epiderme, derme ou as duas, dá-se uma perda da espessura da pele, é uma ferida superficial com leito vermelho rosa sem crosta. Pode também apresentar-se como flictena fechada ou aberto preenchido por líquido seroso ou sero-hemático. Categoria III – Envolve o tecido subcutâneo, este é afetado por lesões ou necrose. É possível observar uma perda total da espessura da pele. Podem incluir lesão cavitária e encapsulamento. Categoria IV - Dá-se uma destruição extensão, necrose dos tecidos ou lesão do músculo, ossos ou estruturas de suporte da pele com perda total da sua espessura. Frequentemente são cavitárias e fistuladas.

Lacerações As lacerações são lesões que resultam da separação das duas principais camadas da pele humana, a derme e epiderme. Representam um grave problema para as pessoas idosas e indivíduos debilitados. Na sua fase final causam imensa dor e sofrimento ao paciente (Baranoski, 2003).


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Queimaduras As queimaduras são lesões resultantes da exposição do tecido cutâneo a energia térmica, química ou elétrica. São classificadas mediante a área afetada e a sua profundidade, em queimaduras de primeiro, segundo e terceiro grau (figura 3) (Singer et al., 2007). Figura 1 - Diagrama dos diferentes graus de queimadura

Fonte: (adaptado de (Burns et al., 2010)).

Primeiro Grau - As queimaduras de primeiro grau envolvem apenas a epiderme (figura 3). Têm como consequência a dor e a formação de edema, usualmente a pele demora vários dias a restabelecer-se, no entanto não ocorre formação de cicatrizes (Singer et al., 2007). Segundo Grau - As queimaduras de segundo grau envolvem toda a epiderme e parte da derme subjacente (figura 3). São classificadas como queimaduras superficiais ou profundas mediante a profundidade da área lesada na derme. Esta distinção é importante, pois muitas queimaduras de segundo grau profundas levam à formação de cicatrizes (Singer, et al., 2007). As queimaduras superficiais são caraterizadas por edemas, formação de bolhas, dor intensa e sensibilidade da pele ao toque e quando se aplica pressão descama. Estas caraterísticas indicam a preservação da circulação


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cutânea. Usualmente, nestes casos a pele restabelece-se num período de 2 semanas com cicatrização mínima. As queimaduras profundas (figura 3) envolvem as duas camadas da derme e caraterizam-se pela presença de uma camada não elástica, vermelha ou branca no topo da queimadura. Este tipo de queimaduras não descama quando sujeitas a pressão. Devido à destruição de muitos apêndices epiteliais responsáveis pela regeneração da epiderme, a pele necessita aproximadamente 3 semanas para se restabelecer com cicatrização ligeira (Singer et al., 2007). Terceiro Grau - As queimaduras de terceiro grau são as lesões mais graves, devido a ocorrer uma destruição completa da epiderme, derme e parte do tecido subcutâneo (figura 3) (Sezer et al., 2008). Os indivíduos com queimaduras graves necessitam de cuidados especializados imediatos de modo a minimizar a morbilidade e a mortalidade (Church et al., 2006). Após uma queimadura deste tipo, a pele apresenta uma cor branca, castanho claro, ou morena e tem uma textura de pele animal. Neste tipo de queimaduras a pele fica insensível ao toque, não descama e necessita de excisão (Singer et al., 2007). Nestes casos a pele restabelece-se a partir da periferia com a formação de tecido de granulação associado frequentemente à formação de cicatrizes. Normalmente este tipo de queimadura necessita de ser removida (Seeley et al., 2003; Sezer et al., 2008).

Substitutos de pele e envelhecimento Após lesão a pele deve ser revestida (Lu, et al., 2008), de modo a minimizar os danos e o risco de infeção, e a promover a restituição da integridade do tecido lesado o mais rápido possível (Risbud et al., 2000). Esta necessidade fez com que nas últimas décadas um grande número de biomateriais fosse desenvolvido e introduzido no mercado para desempenhar a função de substituto deste tecido (Shingel et al., 2008). Atualmente, existem três categorias de revestimentos cutâneos: biológicos, sintéticos e biológico-sintético. Tradicionalmente são usados clinicamente para revestimento biológico autoenxertos, aloenxertos e xenoenxertos. Os autoenxertos (provenientes do


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próprio indivíduo) têm uma elevada taxa de sucesso, mas estão limitados à dimensão da lesão. Quando a área lesada é extensa o autoenxerto é insuficiente para a revestir, além disso este tipo de enxertos é um processo doloroso para o paciente (Kellouche et al., 2007; Kumbar et al., 2008). Os aloenxertos (provenientes de cadáveres da mesma espécie) não são limitados, mas têm o risco de transmissão de doenças e de rejeição imunológica (Balasubramani et al., 2001; Kumbar et al., 2008). Da mesma forma que o anterior os xenoenxertos (provenientes de organismos de espécies diferentes) não são limitados, têm o risco de transmissão de doenças, de rejeição imunológica e possuem um tempo de vida limitado (Eaglstein et al., 1997). Os revestimentos sintéticos, por seu lado, têm um tempo de vida útil longo, induzem uma reação inflamatória mínima e minimizam o risco de contaminação por microrganismos patogénicos. Os revestimentos biológico-sintéticos, constituídos por polímeros e materiais biológicos têm sido alvo de estudo nos últimos anos (Lu et al., 2008). Um revestimento ideal deve possuir diferentes propriedades, entre elas: ser pouco dispendioso, não antigénico, durável, flexível, não tóxico, não aderente, fácil de fixar nas lesões, aplicar numa única operação, de fácil remoção sem causar trauma e constituído por material biológico (que exija um processamento mínimo), não permitir a perda de água, estar em conformidade com as superfícies irregulares das lesões, permitir trocas gasosas e a remoção do excesso de exsudado; conferir proteção contra os microrganismos, ter uma vida longa e propriedades que promovam a cicatrização (Draye et al., 1998; Ehrenreich et al., 2006; Kim et al., 2007; Sheridan et al., 1999; Shibata et al., 1997; Ulubayram et al., 2001). Na tabela podemos observar alguns exemplos de substitutos da pele usados no tratamento de úlceras de pressão, lacerações e queimaduras (tabela 3).


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Tabela 3 - Substitutos de pele aplicados a diferentes tipos de lesão Tipos de lesões

Substitutos de Pele

Lacerações

Filmes, Hidrocolóides, Espumas

Queimaduras

Hidrocolóides; biossintéticos

Hidrogéis;

Revestimentos

Úlceras de Pressão Categoria I Categoria II-III Categoria IV

Filmes, Hidrocolóides Hidrocolóides; Espumas Hidrogéis; Agentes de desbridamento Alginatos; Hidrofibras; Agentes de desbridamento

Hidrogéis Os hidrogéis são habitualmente constituídos por uma rede polimérica com capacidade de doar água para a superfície da ferida de modo a manter um ambiente húmido, mas, uma vez que eles são parcialmente hidratados, podem também absorver exsudados (Ribeiro et al., 2009). Eles são semipermeáveis ao gás e vapor de água. Os hidrogéis são normalmente utilizados na forma de gel, em folhas ou impregnados em gaze com um penso secundário aplicado sobre eles. Têm muitas vezes um efeito calmante de arrefecimento e analgésico porque os polímeros reticulados tendem a reter água e reduzir a temperatura da superfície da pele até 5 °C. Os hidrogéis são úteis em feridas superficiais e profundas. Devem ser tomadas algumas precauções para evitar a maceração da pele vizinha (Hampton, 2004).

Hidrocolóides Compreendem uma mistura opaca de adesivas absorventes, polímeros e agentes gelificantes (Gorse et al., 1987). Os hidrocolóides aderem à extremidade das feridas. As suas


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partículas hidrofílicas interagem com o exsudado da ferida para formar um gel amarelo ao lado da ferida. Este gel pode ser confundido com uma descarga purulenta da ferida, mas o microambiente ácido do gel forma uma barreira antibacteriana e antiviral e é útil no desbridamento autolítico da ferida. Os curativos hidrocolóides podem aderir a qualquer local seco ou húmido, permitindo assim ao paciente efectuar a sua higiene pessoal. Eles são amplamente utilizados em feridas superficiais ou com cavidade, especialmente em áreas de difícil vestir como o sacro e calcanhares. Os efeitos colaterais destes curativos incluem um aumento da quantidade de tecido de granulação e maceração dos tecidos vizinhos (Thomas, 2008).

Hidrofibras São compostos por fibras que formam um gel macio quando expostas feridas fortemente exsudadas. As hidrofibras são a extremamente absorvente. São adequadas para feridas com cavidade e requerem uma estrutura secundária (Barnea et al., 2009).

Alginatos São produzidos a partir de algas castanhas e são altamente hidrofílicos, passando de uma estrutura fibrosa para a forma de gel. O alginato pode absorver até 20 vezes seu próprio peso. Os seus principais constituintes são sais de cálcio de ácido manurónico e gulurónico. Quando exposto a soluções ricas de sódio (tal como o exsudado) o cálcio e iões sódio interagem resultando em elevadas quantidades de cálcio livre. Isto leva à amplificação da cascata de coagulação normal da ferida. Os alginatos estão disponíveis em placas ou em forma de corda e são adequados para revestir as feridas muito exsudativas, feridas profundas e cavidades. Além disso, podem ser facilmente removidos sem danificar a superfície da ferida quando bem hidratada. Requerem um substituto secundário que deve ser trocado diariamente (Paul et al., 2004).


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Espumas As espumas são absorventes, e permeáveis ao gás e vapor de água. Podem possuir uma espessura variável e são adequadas para feridas com exsudado moderado ou forte. As espumas têm, frequentemente, um suporte de semi-permeável para absorver o exsudado. Os revestimentos de espuma convencionais têm como principal contrariedade adesão à lesão o que dificulta a sua remoção, contudo existem espumas revestidas com silicone que evitam este problema e protegem a pele circundante (Wang et al., 2005).

Revestimentos desbridantes São produtos químicos ou enzimáticos que podem ser utilizados para remover o tecido necrótico, muito aplicados para complementar o uso de hidrocolóides (Chaby et al., 2007).

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