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Lucca Maschietto Previtali Quase vidas, inférteis

como um camelo em busca dessa sensação novamente, estavam chegando?

O caminho habitual que fizeram até tal ponto já estava perdendo a cor, junto com o ar, que estava cada vez mais seco. A alguns passos à frente, notavam-se blocos de cimento espalhados pela grande avenida que se puseram a traçar. Fabiano, mesmo com todo aquele porte, estava sendo de pouco em pouco corroído pelas novas pequenas irritações e irregularidades encontradas a poucos passos de distância, eram aqueles pés firmes que estavam sendo torturados pelo puro cimento, frio e opaco da cidade, era aquele nariz, que estava queimando e sendo atacado pelo pior ar que Fabiano teria provado, todos estes fatores estavam desconstruindo de pouco em pouco a ficção irracional em que Fabiano tentava se esconder.

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O resto da família, que havia chegado pouco tempo depois, estava maravilhada, com todas aquelas luzes e detalhes prendendo-lhes as atenções, mal sabiam eles que esse grande espetáculo seria o maior motivo de suas lágrimas futuramente.

Ao passar do tempo, a família foi se dando conta de que talvez, não conseguissem avançar em relação à moradia, passavam dias jogados na rua, enquanto Fabiano tentava arrumar algum trabalho que lhes garantisse a comida. Lá na cidade, era diferente, não tinha gado ou bezerros para tratar e nem terras, mesmo que secas, para semear. O pensamento de que tudo estaria pior do que quando estavam na seca os atormentava, uma tormenta que não era passageira, já que não tinham onde dormir, a noite da cidade era o que mais incomodava Sinhá Vitória, que chorava ao lembrar que tinha, ao menos uma cama de varas, e que agora teria de dormir no chão seco, sujo e frio dos concretos da grande cidade.

Ao alvorecer da madrugada, via-se Fabiano voltando para o canto da família, de mãos vazias, sempre. Os meninos já estavam fracos, pois tinham de economizar recursos por uma chance de Fabiano voltar com alguma novidade. Enfim, a família chegou a uma conclusão, iriam todos trabalhar, com empregos fúteis e até desrespeitosos a eles. Saíam todos, de manhã, em busca de entulhos que lhes servissem, latinhas de bebidas e imperecíveis. Fabiano procurava trabalhos cujas instruções eram pelo menos claras à mente, lavava carros de senhores, procurava pessoas em busca de favores ou limpando partes grotescas de estabelecimentos para que, quando a noite caísse, tivessem algum dinheiro coletado para pagar a janta, dia após dia.

Após certo tempo, realizando este ciclo, Fabiano conseguiu não um, mas dois empregos, pelo período da manhã até a hora do almoço trabalhava como vigia e lavador de carros de um estacionamento, e no outro período, até a noite, trabalhava como ajudante de pedreiro, uma profissão bem popular nas grandes massas pobres, não?

Sinhá Vitória e os meninos quase explodiram de alegria quando ouviram a notícia, já que os dois empregos os ajudariam muito. Conseguiram alugar um quarto de hóspedes em uma casa de um senhor muito bondoso, Seu Tomás era o nome, parecia coisa do destino, o quarto tinha duas camas, o suficiente para que Sinha Vitória e os meninos dormissem tranquilamente. Todo final de noite Sinhá Vitória

chorava um pouquinho, mas era de alegria, pois teria sua tão sonhada cama.

Como Fabiano trabalhava no centro da cidade, convivia com os malandros de lá, Fabiano não teria tal indignidade a ponto de furtar ou roubar, mas convivia e conversava com os que o faziam. Certa noite, Fabiano estava curtindo algumas bebidas que tinha comprado com o dinheiro extra que havia juntado, estava em cima da laje de uma obra em que estava trabalhando, estava cambaleando pela construção quando alguém o puxou por trás de uma viga de madeira e apontou uma arma ao seu rosto, pedindo que desse todo seu dinheiro ao assaltante, Fabiano, atordoado, não soube reagir, talvez por conta da bebida, talvez por conta de nunca ter sido assaltado tão explicitamente ou porque não sabia como funcionavam os governantes da cidade grande. Nessa cena de tensão, o homem gritou mais uma vez com Fabiano pedindo seu dinheiro, engatilhando a arma, vendo isso, Fabiano partiu pra cima do cara, que deixou a arma cair, fazendo-se um combate “ mano a mano “, a briga continuava,, o ladrão levava Fabiano com um empurrão até a ponta da obra, cair dali seria morte certa. Pensando nisso, Fabiano com um impulso desnatural arremessa o ladrão por cima de sua cabeça, que cai lá de cima, não dando uma chance de vida. Fabiano, com o corpo muito mais desnutrido e fraco do que quando moravam na fazenda, cai, quase morto, para a parte de dentro da obra e, infelizmente acerta em cheio com seu peito em um grande tubo de aço compacto e firme, que o atravessa, sem nenhuma dúvida. mas porque todo o esforço que tinha feito teria sido em vão, já que depois de alguns dias a família não teria mais dinheiro para a comida, moradia e nem saúde, que já não era das melhores. Estes últimos segundos de vida de Fabiano podem ser descritos como os piores dos sentimentos, uma cena extremamente grotesca, ao pensar na situação da família e de tudo que havia acontecido anteriormente. A família de Fabiano, soube da notícia dois dias depois, ficaram ensandecidos, não conseguiriam viver, e nem ao menos sobreviver com esta perda, o que fez com que, pouco tempo depois, a família esquecida e fraca de Fabiano juntassem as cinzas de seus corpos secos que foram deixados apodrecer nos confins do grande mortuário tresloucado que era a cidade grande.