Clínica Veterinária n. 108

Page 51

www.revistaclinicaveterinaria.com.br

ca após a aplicação intramuscular do diaceturato de diminazeno, em que foi descrita uma mononeuropatia caracterizada por impotência funcional da musculatura inervada pelo nervo isquiático, ausência de resposta proprioceptiva consciente, arreflexia isquiática e ausência de dor profunda no dígito lateral do membro pélvico afetado 7. Objetivou-se comparar o método convencional de aplicação de IM com uma técnica alternativa que evite a neuropatia isquiática iatrogênica. Material e métodos O presente estudo foi realizado com trinta cadáveres frescos da espécie canina (quinze machos e quinze fêmeas), oriundos do Centro de Vigilância Ambiental de Pernambuco, que passaram por eutanásia por motivos independentes deste estudo. Os animais foram divididos em três grupos: G1 – animais com peso menor ou igual a 10 kg (n = 10); G2 – animais pesando entre 10 e 20 kg (n = 10); G3 – animais com mais de 20 kg (n = 10). O protocolo experimental foi aprovado pela Comissão de Ética no Uso de Animais da Universidade Federal Rural de Pernambuco (Ceua-DMV/UFRPE Nº0004/2011). Após a pesagem, realizou-se a tricotomia da região crural caudal de ambos os membros, e em seguida aplico-se diaceturato de diminazeno a associado com azul de metileno b nas seguintes proporções: G1 – 0,5 mL de diaceturato para 0,05 mL de azul de metileno; G2 – 1 mL de diaceturato para 0,1 mL de azul de metileno; G3 – 1,5 mL de diaceturato para 0,1 mL de azul de metileno. No membro pélvico direito de todos os animais, foi inserida uma agulha descartável c de calibre 25 x 0,7 mm, até a metade, perpendicularmente à área caudal entre os músculos semitendinoso e semimembranoso (Figura 1). Já no membro pélvico esquerdo introduziu-se a agulha, também até a metade, no ventre do músculo semitendinoso, sendo o local de aplicação padronizado pela metade da distância entre o linfonodo poplíteo e o trocânter maior, com a seringa inclinada Felipe Purcell de Araujo

Introdução Topograficamente, o nervo isquiático é definido como a continuação extrapélvica do tronco lombossacral 1. Seu trajeto é bem definido na espécie canina, onde se encontra dorsalmente à articulação coxofemoral, seguindo caudodistalmente no seu percurso e provendo ramos para os músculos bíceps femoral, semimembranoso e semitendinoso proximalmente, transitando a seguir entre esses músculos e craniolateralmente com seus ramos tibial e fibular, até a região do joelho 1,2. As lesões de nervo isquiático constituem uma síndrome bem reconhecida e de etiologia múltipla 3,4. Podem decorrer de traumas (fraturas de pelve ou fêmur), fraturas/luxação sacroilíaca e sacrocaudal, ferimentos profundos por mordedura ou arma de fogo, pela inserção de agulhas ou pinos ortopédicos no canal medular femoral, passando pela fossa trocantérica, da compressão por gessos ou talas, como complicação de uma herniorrafia perineal, na síndrome compartimental, e ainda por lesões iatrogênicas, como injeções intramusculares (IM), por ação da agulha, inflamação, edema compressivo e fármacos ou seus veículos 5-11. As lesões do nervo isquiático podem desenvolver sinais como dor, déficit proprioceptivo, monoparesia, monoplegia, hipotonia muscular, hiporreflexia ou arreflexia dos reflexos flexores, atrofia muscular neurogênica e hipoestesia ou anestesia das regiões lateral, cranial e caudal do membro pélvico distal 6,12-14. Na literatura médica humana encontram-se vários relatos de neuropatia isquiática em crianças e adultos 13,14. Um estudo retrospectivo realizado em Ancara, na Turquia, descreve 41 pacientes adultos que apresentaram neuropatia isquiática após injeção intramuscular na região glútea. Em 51% desses pacientes foram injetados anti-inflamatórios e anestésicos, em 17%, antibióticos, e 32% não sabiam informar qual fármaco foi injetado 15. Em cães, as injeções intramusculares na região caudal da coxa podem ser consideradas um risco potencial de dano ao nervo isquiático 11. Para administrar injeções intramusculares na região caudal da coxa, é indispensável um apropriado conhecimento do trajeto anatômico do nervo, para evitar lesioná-lo. O tratamento da neuropatia isquiática secundária à aplicação intramuscular depende de fatores como a gravidade da lesão neurológica e o tempo de ocorrência dos sinais clínicos. Em alguns casos, o uso de anti-inflamatórios, acupuntura e fisioterapia (com bandagem específica para esse tipo de lesão) são suficientes, porém em alguns pacientes é necessária a abordagem cirúrgica ao nervo isquiático para lavagem do fármaco injetado ou descompressão, a fim de remover o envoltório da fibrose secundária à inflamação 16-21. O diaceturato de diminazeno possui uma excelente atividade antiprotozoária, e por isso é amplamente utilizado, mas pode causar alterações clínicas. As principais complicações vistas após a aplicação IM da droga foram nistagmo, ataxia, espasmo, tremores musculares e, eventualmente, óbito. Além dessas, também se observou edema no local da injeção intramuscular 22. Existem relatos de neurotoxicidade isquiáti-

Figura 1 - Local de introdução da agulha segundo a técnica convencional de aplicação de injeção intramuscular. Observar que a agulha entra perpendicularmente à área caudal entre os músculos semitendinoso e semimembranoso

Clínica Veterinária, Ano XIX, n. 108, janeiro/fevereiro, 2014

55


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.