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Desviaram o olhar. Seguiram em frente, sem querer saber o que mais haveria oculto no meio daquele matagal. A mesma questão os intrigava, permeava o silêncio: quanto o mato havia engolido? E em quanto tempo? A estrada terminou abruptamente depois de uma ladeira. O que restava não passava de alguns pedaços de concreto misturados a piche e lama. Alguém havia quebrado o concreto e levado embora. Nem mesmo capim crescia naquela faixa de terra. Ao longe, no alto de um morro, via-se um poste de telégrafo torto contra o céu, como uma cruz sobre uma enorme sepultura. Levaram três horas e furaram um pneu ao passarem por aquele trecho sem pista, com o carro em primeira, atravessando valas e sulcos de rodas de carros de boi, até chegarem ao vilarejo, no vale depois do morro onde ficava o poste de telégrafo. Ainda havia algumas casas naquele esqueleto de cidade industrial. Tudo o que era removível havia sido tirado. Algumas pessoas, porém, haviam ficado. As estruturas vazias eram ruínas, haviam sido carcomidas não pelo tempo, mas pelos homens: tábuas arrancadas a esmo, pedaços de telhado que faltavam, buracos nas entradas de porões. Era como se mãos cegas houvessem arrancado aquilo de que necessitavam no momento, sem pensar que no dia seguinte a vida continuaria. As casas habitadas estavam misturadas aleatoriamente às ruínas e a fumaça que saía de suas chaminés era a única coisa que se mexia no vilarejo. Uma estrutura vazia de concreto, que já fora uma escola, ficava nos arredores da cidadezinha. Parecia um crânio, cujas órbitas ocas eram as janelas sem vidro, cujos raros fios de cabelo restantes eram alguns fios elétricos partidos. Mais adiante ficava a fábrica da Companhia de Motores Século XX, num morro afastado da cidade. As paredes, o telhado, as chaminés – tudo parecia intacto, inexpugnável, como uma fortaleza. Havia apenas um sinal de abandono: a caixa d’água estava torta. Não havia sinal de estrada que levasse à fábrica naquele emaranhado de árvores na encosta. Pararam em frente à primeira casa em que viram fumaça saindo da chaminé. A porta estava aberta. Uma velha veio mancando ao ouvir o ronco do motor. Estava encurvada e inchada, descalça, vestida com uma roupa feita de saco de farinha. Olhou para o carro sem espanto, sem curiosidade – era o olhar de um ser que havia perdido a capacidade de sentir qualquer coisa que não fosse cansaço. – Como se chega à fábrica? – perguntou Rearden. A mulher não respondeu na mesma hora. Parecia não falar a mesma língua. Depois perguntou: – Que fábrica? Rearden apontou: – Aquela. – Fechou. – Eu sei. Mas como se chega lá? – Não sei. – Tem alguma estrada? – Tem estrada no mato. – Dá para passar de carro? – Talvez. – Bem, qual seria o melhor caminho?


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