O inesquecível evento linguístico e cultural pouco conhecido

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O inesquecível evento linguístico e cultural pouco conhecido: a origem da escrita nacional vietnamita, chữ Quốc Ngữ

MINH HA LO-CICERO

O inesquecível evento linguístico e cultural pouco conhecido: a origem da escrita nacional vietnamita, chữ Quốc Ngữ

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FICHA TÉCNICA Título: O inesquecível evento linguístico e cultural pouco conhecido: a origem da escrita nacional vietnamita, chữ Quốc Ngữ Autora: Minh Ha Lo-Cicero (locicero@uma.pt) Imagem da capa: Página de O conto de Kiều, disponível na Biblioteca Digital Mundial em https://www.wdl.org/pt/item/14382/ Paginação: Luís da Cunha Pinheiro Edição: Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Lisboa, Junho de 2018 ISBN: 978-989-8814-95-1 Esta publicação foi financiada por fundos nacionais através da FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I.P., no âmbito do Projecto UID/ELT/00077/2013 Esta é uma obra em acesso aberto, distribuída sob a Licença Internacional Creative Commons Atribuição – Não Comercial 4.0 (CC BY N C 4.0).

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Índice

1. Introdução ........................................................................... 11 2. O Vietname, a França e Portugal: pontos linguísticos e culturais comums................................................................. 13 3. O “chữ Quốc Ngữ”: a escrita nacional, grafia romanizada do Vietnamita....................................................................... 19 3.1. Breve apresentação histórica da escrita vietnamita ............................................................................................... 19 3.2. Apresentação do alfabeto Quốc Ngữ .................... 21 4. O artigo de Lý Toàn Thắng «Sobre o papel de Alexandre de Rhodes na renovação, na criação e no aperfeiçoamento da escrita vietnamita, o Quốc Ngữ» ................................... 23 4.1. O papel de Portugal: o missionário português Francisco de Pina e os seus trabalhos linguísticos em relação com a escrita Quốc Ngữ......................................... 24 4.2. O papel da França: o missionário francês Alexandre de Rhodes .......................................................... 25 4.3. A concretização da escrita Quốc Ngữ: os diferentes períodos do seu nascimento .............................. 26 4.4. Um trabalho coletivo : a criação da escrita Quốc Ngữ........................................................................................ 29 5. A influência da ortografia portuguesa na ortografia vietnamita ............................................................................. 31 6. Em jeito de conclusão: a forte ligação linguística e cultural entre a escrita Quốc Ngữ e a Língua Portuguesa ............. 35 5


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Références bibliographiques .................................................. 37

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Resumo: Como franco-vietnamita, nascida na França e a trabalhar em Portugal, seria interessante para mim compreender a origem da escrita vietnamita, que se explica precisamente pela relação entre o Vietname, a França e Portugal: uma relação interlinguística e cultural. Sobre a escrita vietnamita, o papel de Alexandre de Rhodes foi historicamente fundamental e decisivo: deu à luz a escrita do Quốc Ngữ, a escrita da língua nacional. No entanto, Portugal também teve um papel importante ainda pouco conhecido, sendo representado principalmente por um dos missionários portugueses, Francisco de Pina. Foi um trabalho coletivo internacional. Gostaria de partilhar com os leitores este memorável evento linguístico cultural, que é a origem da escrita vietnamita. Palavras chave: Origem do Quốc Ngữ – Vietnam / Portugal / França – Francisco de Pina, Alexandre de Rhodes – romanização

Résumé : En tant que vietnamienne, née en France et travaillant au Portugal, il est intéressant pour moi de comprendre l’origine de l’écriture vietnamienne, qui s’explique justement par la relation entre le Vietnam, la France et le Portugal: une relation tripartite interlinguistique. À propos de l’écriture vietnamienne, le rôle d’Alexandre de Rhodes est historiquement fondamental et déterminant: il a donné naissance à l’écriture du Quốc Ngữ, l’écriture de la langue nationale du pays. C’était une œuvre collective internationale. Cependant, le rôle du Portugal est encore peu connu – notamment représenté essentiellement par un des missionnaires portugais – Francisco de Pina. J’aimerais partager avec les lecteurs de cet événement culturel et linguistique important et mémorisable qu’est l’origine de l’écriture vietnamienne, le Quốc Ngữ. Mots clé: Origine du Quốc Ngữ – Vietnam / Portugal / France – Francisco de Pina, Alexandre de Rhodes – romanisation 9


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Abstract: As a Vietnamese, born in France, working in Madeira, Portugal, it is interesting for me to understand the origin of the Vietnamese writing, which could be explained precisely in the tripartite interlinguistic relation, Vietnam, France and Portugal. Regarding the Vietnamese writing, Alexandre de Rhodes’s role is fundamental and determinative: it gave birth to the writing of Quốc Ngữ, the national language one. It was a international collective work. Nevertheless, the Portugal’s role is still unknown – chiefly represented by one of the first Portuguese missionary – Francisco de Pina. I would like to share with the readers this unforgettable important, cultural and linguistic event which is the origin of the Vietnamise writing. Key words: Origin of Quốc Ngữ – Francisco de Pina – Alexandre de Rhodes – Romanisation – Vietnam / Portugal / France

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1. Introdução1 A França e Portugal foram países essenciais no papel da romanização do Quốc Ngữ, a escrita nacional do meu país. Como franco-vietnamita, nascida na França e trabalhando em Portugal, seria interessante poder compreender a origem da escrita vietnamita, que se explica precisamente pela relação entre o Vietname, a França e Portugal: uma relação interlinguística e cultural. Permite-me recolher parcialmente alguns factos linguísticos, no contexto histórico, sobre a origem da romanização do Quốc Ngữ. É um evento cultural e linguístico que gostaria de partilhar com os leitores e, ao mesmo tempo, de compreender o nascimento da escrita do Quốc Ngữ, a língua vietnamita. Além disso, conheço perfeitamente a sua escrita e falo a língua: mais uma razão para aprofundar os conhecimentos sobre a origem da escrita vietnamita atual. Entre os linguistas de reputação no Vietname, que escreveram artigos sobre este assunto, podemos citar alguns: Lý Toàn Thắng, Đỗ Quang Chính, Hoàng Xuân Hãn, Nguyễn Văn Hoàn, Thanh Lãng, Đào Trình Nhất e ainda outros autores. O primeiro artigo sobre este tema que li foi do vietnamita Lý Toàn Thắng: “Về vai trò của Alexandre de Rhodes đối với sự chế tác và hoàn chỉnh chữ Quốc Ngữ / A propósito do papel de 1

Queria agradecer particularmente à Professora Doutora Naidea Nunes a revisão deste artigo. 11


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Alexandre de Rhodes na criação e na concretização da escrita Quốc Ngữ” (1997: 229-239), no qual o autor menciona o missionário português Francisco de Pina, mestre de Alexandre de Rhodes. Como o título do artigo indica, “Como avaliar o justo valor do papel de Alexandre de Rhodes na romanização da escrita do Quốc Ngữ?”. É difícil abarcar um assunto tão interessante e, ao mesmo tempo, tão vasto e complexo apenas em algumas páginas. Vários linguistas e/ou historiadores de reputação nacional e internacional escreveram obras que tratam deste tema, nomeadamente Roland Jacques (2002 e 2004). No entanto, limito-me a reunir, parcialmente, alguns factos linguísticos que se referem à importante interrelação entre os três países, Vietname, França e Portugal, para ilustrar que há mais elementos linguísticos comuns entre o Vietnamita e o Português do que entre o Vietnamita e o Francês.

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2. O Vietname, a França e Portugal: pontos linguísticos e culturais comums Em primeiro lugar, parecia-me, à partida, que existiam muitos elementos linguísticos comuns entre o Vietnamita e o Francês, dado que a escrita vietnamita foi romanizada. Coloquei esta pergunta durante muito tempo, mas ela ficou com a única resposta possível: era mesmo uma evidência. O Francês é uma das línguas românicas que deriva do latim, o que explicava, no meu entender, a relação “lógica” linguística entre as letras do alfabeto francês e as da escrita vietnamita. Na Língua Vietnamita, há, até hoje, palavras que derivam da Língua Francesa, devido à presença histórica dos franceses no Vietname. Posso dar alguns exemplos: beurre (manteiga): bơ, café (café): cà phê, gâteau (bolo): ga tô, choufleur (couve): súp lơ, soupe (sopa): súp, chemise (camisa): sơ mi, cabine (cabine): ca-bin, radio (radio): ra-đi-ô, etc. São palavras emprestadas da Língua Francesa, que permaneceram e já estão totalmente integradas na Língua Vietnamita. A escrita vietnamita apresenta um outro problema: transformar a antiga escrita do caráter “Nôm” numa escrita com as letras do alfabeto latino. Antes de ir mais longe, recordo, em algumas linhas, o significado da escrita “Nôm”. O “Nôm”, que, infelizmente, desconheço, é um sistema de escrita derivado dos caracteres chineses. Foi usado na época da dominação chinesa até o século XIII, principalmente para transcrever os sons das palavras que expressavam características 13


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vietnamitas, não identificadas no vocabulário chinês. Desde a reconquista da independência até o século XIX, o “Nôm” tornou-se a linguagem de expressão poética. Ao descobrir a Língua Portuguesa, constatei que há alguns pontos comuns entre o Vietnamita e o Português. Parece surpreendente que possam existir sons comuns entre as duas línguas. Por exemplo, entre a palavra vietnamita “nhà” [ña] (casa) e a palavra portuguesa “montanha”, existe em comum o som [ñ], que se escreve com a ortografia “nh” e não com a grafia francesa “gn” (montagne). Não é um acaso. E, no entanto, seria mais lógico que houvesse pontos comuns entre o Francês e o Vietnamita, sob a influência dos missionários franceses da época, nomeadamente com o padre Alexandre de Rhodes. A Língua Vietnamita possui vogais com sinais diacríticos: o acento circunflexo, que indica que a vogal é fechada. Dou o exemplo das vogais “â”, “ê” e “ô”, em que o acento circunflexo marca o caracter “meio fechado”: cân (balança) [kVN] / can (defender) [kaN], xê [se] (afastar) / xe [sÈ] (veículo); cô [ko] (menina) / co [kó] (contratar-se). Parece-me que é uma influência direta da ortografia portuguesa e francesa. A vogal “â” do Francês não existe em Vietnamita. É um /a/ posterior, como na palavra “ âne – burro” ou “pâte – massa” [A], oposto ao som [a] anterior na palavra “patte – pata”. A vogal “e” com o acento circunflexo, como em “fenêtre – jánela, crêpe – crepe, fête – festa”, permanece meio fechada. De facto, o uso das letras das línguas românicas, francesa e portuguesa, podem encontrar-se na ortografia vietnamita. Darei outros exemplos ulteriormente. 14


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Em primeiro lugar, gostaria de ilustrar outra categoria de pontos comuns: a designação dos dias da semana. Os portugueses e os vietnamitas têm parcialmente em comum, por exemplo, a designação dos dias da semana:

Vietnamita Chúa Nhật (dia do Senhor) (Deus + dia) Thứ Hai (número dois) Thứ Ba (número três)

Português Domingo

Francês Dimanche (Deus do Sol)

Segundafeira Terça-feira

Lundi (dia da lua, Deusa Diana) Mardi (dia da guerra, Deus Marte) Mercredi (dia de Mercúrio, Deus do comércio) Jeudi (dia de Júpiter, Deus dos Deuses) Vendredi (dia de Vénus, Deusa do amor) Samedi (dia de Saturno, Deus dos camponeses)

Thứ Tư (número quatro)

Quartafeira

Thứ Năm (número cinco) Thứ Sáu (número seis)

Quintafeira Sexta-feira

Thứ Bảy (número sete)

Sabádo

Quadro 1: Comparação trilíngue das denominações dos dias da semana.

É interessante constatar que, entre a denominação dos dias portugueses e dos dias franceses, parece que não existe nenhuma semelhança morfológica ou semântica, exceto no nome samedi/sábado, que significa “o dia de descanso”, o sétimo dia da semana, e dimanche/domingo, que significa “dia do Senhor”. Com efeito, estes dois dias têm em comum o fundo latino: « sabbătum » (dia de repouso), « dominicus » (dia do Senhor).

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A origem dos nomes dos dias da semana é a seguinte: desde o princípio dos tempos, os Antigos tinham observado a presença de sete “astros errantes” entre as estrelas. Estes astros errantes eram associados às divindades notáveis que eram veneradas cada uma a seu tempo (a fim de evitar cóleras e invejas divinas inúteis). Estes sete astros são: o Sol, a Lua, Mercúrio, Vénus, Marte, Júpiter e Saturno. Os seus nomes foram associados aos dias da semana na maior parte das línguas europeias, tal como o Francês, o Espanhol e o Italiano. Todos os nomes dos dias da semana são nomes compostos, sendo que todos apresentam a sílaba “DI”, que vem do latim DIES, com o significado “dia”. Assim, na Língua Portuguesa, inicialmente mais arcaica, os dias da semana eram designados como os das outras línguas românicas, ou seja, de acordo com os sete nomes dos astros errantes, associados às divindades, antes de serem modernizados, transformando-se num sistema numérico ordinal:

Português Moderno Domingo Segundafeira Terça-feira Quarta-feira Quinta-feira Sexta-feira Sábado

Português Arcaico Domingo Lues (pronunciase lũes) Martes Mércores Joves Vernes Sábado

Espanhol

Italiano

Francês

Domingo

Domenica

Dimanche

Lunes

Lunedì

Lundi

Martes Miércoles Jueves Viernes Sábado

Martedì Mercoledì Giovedì Venerdì Sabato

Mardi Mercredi Jeudi Vendredi Samedi

Quadro 2: Os dias da semana em diferentes línguas românicas.

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Observa-se que o termo “Feira” é derivado do termo latino “feria”: dia de festa (feriado). Este termo tem origem na palavra “feira”. De acordo com a sua definição “Uma feira é um evento em um local público em que as pessoas, em dias e épocas predeterminadas, expõem e vendem mercadorias. Também é uma designação complementar dos cinco dias úteis da semana: segunda-feira, terça-feira, quarta-feira, quinta-feira sexta-feira”. De acordo com a mitologia greco-românica, domingo representava o dia do sol, o primeiro dia da semana, e o segundo dia, o dia da lua, daí o seu nome “Segunda-Feira”. Então, pode-se supor que os quatro dias seguintes, nomeados de forma numérica, indicam igualmente a ordem dos outros astros. Assim, os dias da semana em Vietnamita são, parcialmente, a tradução da denominação dos dias portugueses. A denominação atual dos dias em Francês e dos dias em Português, na sua forma arcaica e moderna, simboliza de facto os dias de Deus (os nomes de dia, do latim “di”, dia), que correspondem aos dias dos Deuses e das Deusas romanos. O facto de os dias da semana em Vietnamita serem parcialmente a tradução dos dias em Português moderno poderia ser explicado pela influência da Língua Portuguesa, levada pelos primeiros missionários católicos que eram portugueses. Assim, a adaptação das designações dos sete dias portugueses em Vietnamita parece evidente. Na Língua Vietnamita, o nome “dia” também é composto, neste caso, pela ordem numérica: Thứ Hai (número dois), Thứ Ba (número três), etc. (cf. Quadro 1) Existe ainda um ponto comum muito importante e interessante, mal conhecido entre os dois países. Este ponto 17


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precioso refere-se à romanização da escrita da Língua Vietnamita. Portugal e o Vietname são dois países nas antípodas um do outro, que possuem, no entanto, vários pontos comuns. Ninguém teria imaginado, à priori, esta relação, sobretudo do ponto de vista linguístico, que historicamente é representada pela escrita da Língua Vietnamita, chữ Quốc Ngữ (chữ: escrita; Quốc: nação; ngữ: língua). A partir de 1527, os Jesuítas portugueses em missão de evangelização no Vietname começaram a utilizar o alfabeto latino (de facto principalmente na sua versão portuguesa), para escrever a língua local (a Língua Vietnamita). Mas, foi o jesuíta nascido em Avignon, Alexandre de Rhodes (1591-1660), que compilou, melhorou e sistematizou os sistemas de transcrição dos seus antecessores, missionários portugueses, nomeadamente de Francisco de Pina, entre 1624 e 1644. A sua primeira obra, impressa em escrita latinizada atual, foi um dicionário Vietnamita-Português-Latim, publicado em 1651, que retoma o dicionário “Português-Vietnamita” dos autores portugueses Gaspar do Amaral e António Barbosa. A propósito da escrita vietnamita, o papel de Alexandre de Rhodes foi historicamente fundamental e determinante, porque deu origem à escrita da língua nacional do país, Quốc Ngữ. Contudo, não se pode esquecer que era uma obra coletiva. Neste artigo, concentro-me, sobretudo, no papel de Portugal, essencialmente representado por um dos primeiros missionários portugueses, Francisco de Pina.

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3. O “chữ Quốc Ngữ”: a escrita nacional, grafia romanizada do Vietnamita 3.1.

Breve

apresentação

histórica

da

escrita

vietnamita Antes de iniciar o tema que interessa, gostaria de apresentar o quadro de síntese sobre o percurso histórico da construção-fundação da escrita vietnamita. Distinguem-se três grandes períodos históricos:

TRÊS PERÍODOS TRÊS TIPOS DE ESCRITAS NOTÁVEIS NOTÁVEIS CORRESPONDENTES De 1000 a. antes de J.C. A única escrita utilizada no Vietname era a a cerca de 1000 a. escrita ideográfica chinesa, “chữ Hán”, a depois de J.C. mesma que era praticada na China na mesma época, pois o Vietname era considerado uma província chinesa. O Vietnamita não existia senão como língua falada. A língua escrita em “chữ Hán”, por conseguinte, era utilizada exclusivamente na administração e na literatura e, consequentemente, era dominada por uma ínfima minoria da população. Do século X depois de O Vietnamita forjava-se paralelamente J.C. até ao princípio do numa escrita “fonética”, para transcrever século XX depois de certas palavras do Vietnamita falado, J.C. nomeadamente dos nomes de lugares, de 19


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plantas, de animais, etc. A partir da independência do Vietname, século X, este sistema fonético formalizou-se, utilizando ao mesmo tempo caracteres “Hán”, para transcrever foneticamente palavras vietnamitas. Criaram-se novos caracteres, sempre baseados no “Hán”, para traduzir outros: foi o nascimento do “chữ Nôm”. Esta forma de escrita conheceu o seu apogeu no século XVIII, data em que as primeiras obras essenciais em “Nôm” foram escritas, nomeadamente a célebre obra “Kim Vân Kiều” (nome da personagem principal do romance) de Nguyễn Du. Os imperadores Tây Sơn utilizaram os caracteres Nôm, como escrita oficial, durante o seu reinado (1788-1802). Do século XVII até Os missionários europeus (nomeadamente hoje os Padres Francisco de Pina e Alexandre de Rhodes) elaboraram um sistema de transcrição fonética do Vietnamita em caracteres latinos, por necessidade de evangelização da população local. No século XX, este sistema, chamado “Quốc ngữ”, tomou um desenvolvimento considerável, graças à expansão do jornalismo e da literatura moderna, sendo atualmente a escrita oficial utilizada no Vietname. Quadro 3: Quadro de síntese dos períodos marcantes do Quốc Ngữ.

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3.2. Apresentação do alfabeto Quốc Ngữ AĂÂBCDĐEÊGHIKLMNOÔƠPQRSTUƯV XY As vogais A Ă Â E Ê I O Ô U Ư podem ser acompanhadas de um sinal diacrítico que indica o tom em que devem ser pronunciadas. Há seis tons possíveis: Tom huyền là acento grave

Tom sắc lá acento agudo

ser

folha

Tom hỏi lả acento «gancho» (crochet) cansaço

mà mais (conjunção)

má mãe

mả campa

Tom ngang la sem acento

Tom ngã lã til

Tom nặng lạ ponto

gritar nota la

água sem ferver mã cavalho

estranho, desconhecido mạ Semente de arroz

ma fantasma

Quadro 4: Palavras acompanhadas dos seis tons possíveis.

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4. O artigo de Lý Toàn Thắng «Sobre o papel de Alexandre de Rhodes na renovação, na criação e no aperfeiçoamento da escrita vietnamita, o Quốc Ngữ» Quando se menciona a romanização ou a latinização da escrita vietnamita, não se pode esquecer o papel precioso do padre jesuíta francês Alexandre de Rhodes e mais ainda do missionário português Francisco de Pina, entre os missionários da Companhia de Jesus da época. Proponho esboçar uma síntese histórica sobre a origem da escrita vietnamita – o Quốc Ngữ: a grafia vietnamita romanizada, inspirando-me em vários documentos (cf. referências bibliográficas), incluindo o documento essencial de Lý Toàn Thắng (1999: 229-239), reunindo as suas reflexões no artigo “A propósito do papel de Alexandre de Rhodes na criação e no aperfeiçoamento da escrita vietnamita, o Quốc Ngữ2 / Về vai trò của Alexandre de Rhodes đối với sự chế tác và hoàn chỉnh chữ”. Do ponto de vista das ciências socias e humanas, as pessoas que se interessam pela história da escrita vietnamita, estão todas 2

«Về vai trò của Alexandre de Rhodes đối với sự chế tác và hoàn chỉnh chữ Quốc Ngữ» (Le rôle d’Alexandre de Rhodes à propos de la création et l’accomplissement de l’écriture Quốc Ngữ [vietnamienne]), Lý Toàn Thắng, in Giao lưu văn hóa ngôn ngữ Việt Pháp, Service de Coopération, Ambassade de France à Hanoi, Nhà Xuất Bản Thành Phố Hồ Chí Minh, 1997). 23


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de acordo sobre um ponto: a contribuição fundamental de Alexandre de Rhodes para a escrita vietnamita. Como avaliar, com precisão e objetividade, a sua contribuição para a renovação, a criação e o aperfeiçoamento da escrita Quốc Ngữ? Lý Toàn Thắng, do Instituto Linguístico Vietnamita, efetuou algumas reflexões sobre a grande contribuição do missionário francês. Descreveu sobretudo o contexto internacional em que a escrita foi latinizada, em relação a outros países, nomeadamente a China, o Japão, a França e certamente Portugal. Este artigo sublinha igualmente o papel dos portugueses – incluindo o padre Francisco de Pina – nos seus trabalhos linguísticos sobre a Língua Vietnamita e a sua escrita, inspirada no alfabeto latino.

4.1. O papel de Portugal: o missionário português Francisco de Pina e os seus trabalhos linguísticos em relação com a escrita Quốc Ngữ Até agora, existem muito poucos documentos sobre o Padre Francisco de Pina, excluindo a obra de Roland Jacques sobre a origem da grafia romanizada do Quốc Ngữ, intitulada: “Portugal e o projeto da criação da escrita Quốc Ngữ: será necessário reescrever a história?”, que nos levou a compreender o papel de Francisco de Pina na romanização da escrita vietnamita. Eis as grandes linhas sobre as suas atividades e trabalhos essenciais relativos à Língua Vietnamita. Francisco de Pina chegou ao Vietname em 1617, para uma missão de 24


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Evangelização. Em 1624, o Padre Francisco de Pina fundou a primeira escola de ensino do Vietnamita para os estrangeiros europeus, entre os quais dois se tornaram famosos: António Fontes e Alexandre de Rhodes. A contribuição de Francisco de Pina iria determinar o futuro da escrita romanizada da Língua Vietnamita. Os seus trabalhos foram retomados por Alexandre de Rhodes, entre os de outros missionários portugueses. A 15 de dezembro de 1624, devido a uma forte tempestade, o pequeno veleiro (a bordo do qual se encontrava Francisco de Pina), que não pôde ser amarrado ao cais, teve de lançar a âncora na baía de Đà Nẳng (no centro do Vietname) e esperar um barco para chegar a terra firme. Infelizmente, um golpe de vento extremamente violento fez o barco virar-se e ele morreu afogado, com a idade de 40 anos.

4.2. O papel da França: o missionário francês Alexadre de Rhodes Alexandre de Rhodes era padre e missionário jesuíta, que nasceu em Avignon, a 15 de março de 1591, e morreu a 5 de novembro de 1660, em Ispahan (cidade do Irão, capital da província de Ispahan, situada a 350 Km a Sul da capital, Teerão). Esteve no Vietname de 1627 a 1645, para propagar o catolicismo. Anteriormente, Alexandre de Rhodes tinha vivido numa família de origem aragonesa e marrana. Os seus pais eram negociantes de seda. Para fugir à Inquisição, toda a sua família 25


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tinha-se refugiado em Avignon (no Sul de França), que acolhia muitas famílias judaicas. Com a idade de 18 anos, Alexandre de Rhodes partiu para Roma e decidiu entrar na Companhia de Jesus (1612), para se juntar às Missões japonesas. Durante este período, tinha aperfeiçoado o seu conhecimento das línguas antigas, como o Latim, o grego, o Hebreu, e do Italiano. Efetuando as formalidades necessárias ao seu projeto, partiu para Portugal, mais precisamente para Lisboa, lugar de embarque da Europa para as Índias Orientais.

4.3. A concretização da escrita Quốc Ngữ: os diferentes períodos do seu nascimento A evolução da escrita Quốc Ngữ, grafia romanizada do Vietnamita, do início à realização da latinização da escrita Quốc Ngữ, estendeu-se por quase dois séculos. A partir de documentos de arquivos existentes, tentei descrever as seguintes etapas fundamentais:

Os períodos Descrição da evolução da escrita Quốc marcantes da história Ngữ do Quốc Ngữ 1. Período inicial e - de 1620 a 1631: utilização dos embrionário da escrita documentos escritos à mão de J. Roiz Quốc Ngữ (1621), Gaspar Luis (1621, 1626), Alexandre de Rhodes (1625), Antonio Fontes (1626); Francisco Buzomi (1626) e da obra de Christophoro Borri (publicada 26


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2. Período de formação da escrita Quốc Ngữ

3. Período do desenvolvimento da escrita Quốc Ngữ

4. Período de conclusão da escrita Quốc Ngữ

em 1631), na qual a escrita Quốc Ngữ corresponde ao período que cobre os anos 1620 e 1621. - Observação: de 1626 a 1630, nenhum documento foi encontrado. - de 1631 a 1648: utilização do correio e dos documentos . de Alexandre de Rhodes (1631, 1636, 1644, 1647) . de Gaspar do Amaral (1631, 1637) . e dois outros documentos escritos à mão (1645, 1648). Nessa época, podemos encontrar algumas letras da escrita QN, que eram utilizadas para transcrever os sons do “chữ Nôm” (chữ: escrita, nôm: língua popular) em 40 obras escritas à mão em chu nôm, redigidas por G. Maiorica (de 1634 a 1640). - Observação: de 1648 a 1651, não se encontrou nenhum documento neste período de publicação dos livros de Alexandre de Rhodes. - de 1651 a 1659: utilização dos documentos redigidos em 1659 por Igesico Van Tin e Bento Thien. Contudo, foi deplorável que depois de 1772, ou seja, após mais de um século, também não se encontrou nenhum documento. - de 1772 a 1838: utilização do manuscrito do Dicionário Vietnamita - Latino (Tự Điển Việt – La de Pigneau de Béhaine, 1772) e da publicação de Taberd (1838), em que se constata que a escrita QN tinha já o seu aspeto atual. Sobre este mesmo período, observam-se igualmente muitos 27


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progressos significativos do QN, refletidos em 26 manuscritos, quase 4000 páginas de Philiphê Bỉnh, copiadas de 1796 a 1830. Quadro 5: Descrição da evolução da escrita Quốc Ngữ.

Assim, durante toda esta evolução da escrita QN, desde o seu início até à sua concretização, pode-se avaliar o seu percurso da seguinte maneira: a. Antes da chegada de Alexandre de Rhodes a Đại Việt (Antigo Vietname), sob o reino de Nguyen, em 1624 (no século XVII), a transcrição fonética do Vietnamita já tinha sido desenvolvida. Alexandre de Rhodes contribuiu sobretudo para a concretização final da escrita QN. Lý Toàn Thắng – autor do artigo “Sobre o papel de Alexandre de Rhodes na criação e no aperfeiçoamento da escrita Quốc Ngữ”, acrescentou em nota de fim de página: “Um facto extremamente importante que dura precisamente este período era poder tomar consciência verdadeiramente dos vestígios essenciais portugueses na formação/constituição da escrita do Quốc Ngữ. Diversos cientistas pensavam que a primeira pessoa que tinha utilizado as letras do alfabeto latino para transcrever os sons vietnamitas devia ser um missionário português; ou se pudesse ser uma outra pessoa a utilizar o alfabeto latino para transcrever os sons vietnamitas, devia certamente basear-se na fonética portuguesa. Neste caso, podia-se compreender este facto porque, durante este período, a língua portuguesa era utilizada como língua de comunicação entre os missionários de diferentes nacionalidades da Companhia de Jesus, a fim de evangelizar o Vietname e o leste da Ásia” (1999: 235). 28


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Para retomar o assunto sobre o papel do Padre Alexandre de Rhodes na invenção da escrita QN, sabe-se que teve um papel importante, mas não foi o único a conceber a escrita vietnamita. De resto, o cientista Thanh Lang (1961) sublinhou: “Alexandre de Rhodes não é o antepassado da escrita Quôc Ngữ”. b. Em segundo lugar, a grafia QN de Alexandre de Rhodes, datada de 1651, apesar das suas características relativamente sofisticadas, ainda não tinha adquirido a sua forma moderna. Esta é a razão pela qual não se pode dizer que Alexandre de Rhodes tivesse concretizado inteiramente a romanização da escrita QN.

4.4. Um trabalho coletivo: a criação da escrita Quốc Ngữ A criação da escrita Quốc Ngữ foi um trabalho coletivo dos missionários europeus da Companhia de Jesus para o qual contribuíram igualmente os vietnamitas. Para além da grande contribuição do missionário francês Alexandre de Rhodes, não se pode esquecer, naturalmente, o papel dos três missionários portugueses: Francisco de Pina, Gaspar do Amaral e, por último, António Barbosa. Infelizmente, não se pode citar os nomes dos professores de Vietnamita que ajudaram amplamente os padres europeus na sua obra. Alexandre de Rhodes contribuiu sobretudo para a modificação e o aperfeiçoamento na realização completa da escrita. Utilizou especialmente esta escrita e organizou a primeira publicação do Dicionário Vietnamita – Português – Latim” 29


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(neste dicionário há igualmente a parte “Gramática do Vietnamita”). Note-se que, antes da publicação do famoso Dicionário “Vietnamita – Português – Latim” de Alexandre de Rhodes, já existiam os dicionários de Amaral e de Barbosa, bem como os métodos de aprendizagem sobre o Quốc Ngữ de Pina e de Borges. O mais importante a notar e memorizar, durante este período, é que Francisco de Pina foi o primeiro autor europeu a introduzir o alfabeto latino na transcrição dos sons vietnamitas. A este propósito, o historiador Roland Jacques publicou uma obra “Portugal e o projeto da romanização da escrita Quốc Ngữ. Deve-se reescrever a sua história ?”, traduzido por Đang Trúc Nguyễn, que resume o trabalho colossal realizado pelos missionários portugueses sobre a criação da escrita Quốc Ngữ, com o objetivo de Evangelização do sudeste da Ásia, nomeadamente do Vietname.

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5. A influência da ortografia portuguesa na ortografia vietnamita Em primeiro lugar, observa-se, naturalmente, a presença dos usos das línguas românicas, particularmente os do Português na ortografia, tal como o uso das diferentes letras e os seus sons correspondentes. Os trabalhos de Alexandre de Rhodes, com efeito, retomaram os dos missionários portugueses:

Sons [k]

[ɣ]

[N]

Letras - escreve-se “q”, antes do “u”, para constituir o dígrafo “qu” [kw], k antes das primeiras vogais “e, ê” e “i, c” e outros: - escreve-se “g” antes das vogais posteriores, mas gh antes das anteriores: - seguem-se os mesmos princípios com ng et nghi:

[ñ]

- escreve-se como Português : “nh”

[f]

- escreve-se Francês

Exemplos - quê hương (país natal) Ke, kê, ki, kich

- ghê [ge] gớm (terrível), ghi [gi] âm (registo), giờ [jœ] giấc (hora). - Ngoài (exterior), nghi vấn (interrogação), ngã (cair), etc. em - nhà [ña] (casa), nhất (primeiro, único), nhẹ [ñÈ] nhàng (ligeiro), etc. em - phố [fo] (cidade)

como

Quadro 6: A influência da ortografia portuguesa na ortografia vietnamita.

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Em contrapartida, pode-se notar a influência portuguesa direta (e não hispânica como se poderia pensar) na ortografia, presente nos exemplos seguintes:

As letras e os sons correspondentes nh [ñ] ã ẽ ĩ õ ũ x [s] : pronunciado no Norte ou [S] : pronunciado no Sul

â, ê, ô em Quốc Ngữ e em Português.

Explicação contra ñ hispânico; O til sobre as diferentes vogais indica um dos seis tons e não as vogais nasais. A utilização de “x” e “s”, fonemas que remontam (segundo Nguyen Dinh Hoà3) a [ş] (/s/ laminal, parecendo [S]) e [s] antigos, que os missionários simplesmente grafaram à portuguesa com “x” e “s”. A evolução fonética, contudo, fez com que a ortografia seja agora invertida em relação ao Português: Xa (loin): [sa] ; sách (livre): [Sác] Alexandra: [álYSãdrá] Seta: [sÈtá] A utilização do acento circunflexo para indicar o caráter meio fechado das vogais. Em Português ['ɐ], ê ['e] e ô ['o], como em Quốc Ngữ. Em contrapartida, as línguas hispâ-

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Artucke «Vietnamese» de la section 59, «Adaptation of the Roman Alphabet», de The World’s Writing Systems de Peter Daniels et William Bright). 32


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nicas ignoram o acento circunflexo. Quadro 7: As letras e os sons correspondentes.

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6. Em jeito de conclusão: a forte ligação linguística e cultural entre a escrita Quốc Ngữ e a Língua Portuguesa Cheguei ao fim da minha exposição sobre o inesquecível evento cultural e interlinguístico, entre Portugal, a França e o Vietname, longo e curto ao mesmo tempo, porque o nascimento do Quốc Ngữ foi há 397 anos atrás, ou seja, mais de três séculos, dos quais tentei fazer uma síntese histórica da escrita Quốc Ngữ em algumas páginas deste artigo. Este regresso ao tempo passado ajudou-me a compreender melhor a origem da escrita da Língua Vietnamita. A minha contribuição é modesta e gostaria sobretudo de transmitir um facto linguístico e cultural essencial que criou uma ponte entre o Vietname e Portugal na história do Quốc Ngữ. Parece-me importante dar a conhecer aos portugueses que os seus antepassados do século XVII foram os autores e sobretudo os criadores da escrita vietnamita, ao lado dos missionários franceses. Levei muito tempo para descobrir a estreita relação interlinguística entre Portugal, a França e o Vietname. Aliás, a maioira dos vietnamitas ignora este facto histórico e cultural sobre a origem das escrita Quốc Ngữ, exceto os linguistas vietnamitas Chính Đỗ Quang, Phú Phong Nguyễn, e Toàn Thắng Lý (autor do artigo no qual me inspirei) e ainda muitos outros linguistas de renome. 35


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Segundo a minha opinião, o Vietname foi um dos primeiros países a adaptar oficialmente a romanização da sua escrita, o Quốc Ngữ, sempre utilizada até ao dia de hoje, contrariamente à China e ao Japão, que conservam a sua própria escrita, sabendo que os ideogramas foram romanizados pelos missionários ocidentais, como o Romaji. É interessante notar que o objetivo principal da romanização da escrita vietnamita era evangelizar o Extremo-Oriente, mas o único país a adotar a grafia romanizada foi o Vietname. Os vietnamitas aproveitaram amplamente esta revolução da escrita, julgada mais fácil do que a antiga escrita Nôm, para alfabetizar a população, após a independência do país, em 1945. Hoje, a Língua Vietnamita tornou-se bela e rica, capaz de expressar e transmitir ideias e emoções com grandeza, a mais profunda e sutil. Como qualquer outra linguagem, tem traços linguísticos e culturais próprios e originais. Famosos linguistas vietnamitas não faltam e continuam a fazer mais investigação em todos os domínios científicos da linguística, assim como existem muitos cientistas de vários domínios do saber que utilizam a Língua Vietnamita4.

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Queria agradecer também ao CLEPUL, à Professora Doutora Luísa Paolinelli e ao Luís Pinheiro. 36


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Références bibliographiques Cunha, C., & Cintra, L., 2002, Nova Gramática do Português Contemporâneo. Lisboa, Viseu, Edições João da Costa. Instituto de Lexicologia e Lexicografia da Academia das Ciências de Lisboa, com o apoio do Ministério da Educação e do Instituto Camões e da Fundação Calouste Gulbenkian, 2001, Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea Volume I, A – F, Volume II,G – Z, Verbo. Lý, T. T., 1999, Về vai trò của Alexandre de Rhodes đối với sự chế tác và hoàn chỉnh chữ Quốc Ngữ (À propos du rôle d’Alexandre de Rhodes dans la création et l’accomplissement de l’écriture Quôc Ngu), pp. 229-239, in Giao Lưu Văn Hóa Ngôn Ngữ Việt – Pháp (Échange culturel et linguistique: Vietnam – France), Trung Tâm Khoa Khoa Học Xã Hội Và Nhân Văn Quốc Gia, Nhà Xuất Bản Thành pho Hồ Chí Minh (Centre Social et Humaine National), Viện Ngôn Ngữ Học (Institut de Linguistique), Service Culturel et de Coopération, Ambassade de France à Hanoi. Lê, K. K., Nguyễn L., 1994, Dictionnaire Vietnamien – Français, Nhà Xuất Bản Khoa Học Xã Hội, Hà Nội, Viện Khoa Học Xã Hội Việt Nam. Jacques, R., 2004, Les missionnaires portugais et les débuts de l’Église catholique au Viet-Nam, Các nhà truyền giáo Bồ Đào Nha và thời kỳ của Giáo hội Công giáo Việt Nam, Bilingue – Tome 1, Định Hướng Tùng Thư 2004. Jacques, R., 1988, On line Roland Jacques [http://ttntt.free.fr/archive/Roland4.html], Traduit par Nguyen Dang Truc, Tap San Dinh Huong.

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Esta publicação foi financiada por Fundos Nacionais através da FCT– Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I.P. no âmbito do Projecto “UID/ELT/00077/2013”

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