Memórias Paroquiais, Santana de Cambas e Corte do Pinto

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Memórias Paroquiais

Datas de produção: 1722 a 1832 Dimensão e suporte: 44 vol.; papel Entidade detentora: Arquivo Nacional Torre do Tombo História custodial e arquivística: Um aviso de 18 de Janeiro de 1758 do Secretário de Estado dos Negócios do Reino, Sebastião José de Carvalho e Melo, fazia remeter, através dos principais prelados, e para todos os párocos do reino, os interrogatórios sobre as paróquias e povoações pedindo as suas descrições geográficas, demográficas, históricas, económicas, e administrativas, para além da questão dos estragos provocados pelo terramoto de 1 de Novembro de 1755. As respostas deveriam ser remetidas à Secretaria de Estado dos Negócios do Reino. As respostas ao inquérito terão sido levadas para a Casa de Nossa Senhora das Necessidades, em Lisboa, da Congregação do Oratório, para serem trabalhadas pelo Padre Luís Cardoso (?-1769). O ex-libris existente na maioria dos volumes confirma esta custódia. O índice terá sido elaborado ou concluído no ano de 1832, data que apresenta. Passaram depois para a Biblioteca da Ajuda depois da extinção das ordens religiosas, seguindo para o Depósito Geral das Livrarias, no antigo Convento de São Francisco da Cidade, e daí para a Torre do Tombo entre os anos de 1836 e 1838. As datas desta história custodial são incertas, mas encontra-se registado em livro do Ministério do Reino o ofício de 17 de Março de 1843, de D. Manuel de Portugal e Castro (vedor da Casa Real) reclamando como pertencentes à Biblioteca Real os 44 volumes que formam a coleção dos apontamentos para o dicionário geográfico de Portugal, reunidos pelo Pe. Luís Cardoso. Na sequência, surge a Portaria de 21 de Março de 1843 do Ministério do Reino para a Torre do Tombo, inquirindo sobre a existência dessa coleção neste arquivo, para onde tinha sido conduzida pelo Dr. António Nunes de Carvalho (guarda-mor da Torre do Tombo entre 1836 e 1838), retirando-a do Depósito Geral das Livrarias dos extintos conventos. A resposta dada pela Torre do Tombo, a 27 de Março do mesmo ano, confirmou a existência dessa coleção, referindo que não devia sair do arquivo, porque não era propriedade particular, mas sim o resultado de uma diligência que o Governo mandara fazer. Âmbito e conteúdo: Esta coleção é constituída pelas respostas elaboradas pelos párocos ao interrogatório, através do qual se pretendia obter informações sobre as paróquias, abrangendo a totalidade do território continental português. Apesar de a exaustividade das respostas não ser constante, apresentam-se, na generalidade, de forma sequencial aos pontos do interrogatório (que está dividido em três partes relativas à localidade em si, à serra, e ao rio) fornecendo dados de carácter geográfico (localização, relevo, distâncias), administrativo (comarca, concelho, dimensão, e confrontações), e demográfico (número de habitantes), sendo possível obter informações sobre a estrutura eclesiástica e vivência religiosa (orago, benefícios, conventos, igrejas, ermidas, imagens milagrosas, romarias), a assistência social (hospitais, misericórdias, irmandades), as principais atividades económicas (agrícola, mineira, pecuária, feira), a organização judicial (comarca, juiz), as comunicações existentes (correio, pontes, portos marítimos e fluviais), a estrutura defensiva (fortificações, castelos ou torres), os recursos hídricos (rios, lagoas, fontes), outras informações consideradas assinaláveis (pessoas ilustres, privilégios, antiguidades), e quais os danos provocados pelo terramoto de 1755. Os volumes 42 e 43 contém apontamentos sobre múltiplas freguesias, elaborados pela mesma pessoa, provavelmente o Padre Luis Cardoso, incluindo algumas resposta originais de párocos, datadas de 1722, 1730 e 1732, e que deverão corresponder a um inquérito anterior ao de 1758. O volume 44 serve de índice à documentação.

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1758 Abril 12 - Santana de Cambas Memória Paroquial de Santana de Cambas, Mértola. [ANTT, Memórias Paroquiais, vol. 8, n.º 58, pp. 351 a 354]

Relaçam desta terra

[1] Respondendo ao primeyro interregatório na forma que se me ordena, digo que esta terra he hum lugar chamado aldeya de Sancta Anna de Cambas, da província do AlemTejo, arcebispado de Évora, comarca do Campo de Ourique, termo de Mertola e freguezia de Sancta Anna de Cambas.

[2] Ao segundo, digo que he de donatarios que no prezente he, digo, que he d’El Rey Nosso Senhor.

[3] Ao treceiro digo, que consta de outenta e nove vezinhos, e há trezentos e sincoenta e seis pessoas, e toda a freguezia de trezentos e sinco vezinhos, e de 890 pessoas.

[4] Ao quarto respondo, que está situada em hum alto pouco levantado, e se não descobre della povoação algua.

[5] Ao quinto digo que não tem termo seu.

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[6] Ao sexto digo que parte desta freguezia está dentro desta aldeya, como tãobem a mesma igreja, e parte fora, porque se compoem desta aldeya, e de treze lugares, a saber: aldeya de Sancta Anna e Eytados; Giraldos; Magros; Sapos; Moriannes; Serralhos; Costa; Alv(a)res; Picoytos; Fermoa; Salgueyros; Morenos; Bens; que todos constão de trezentos e sinco vezinhos.

[7] Ao setimo digo, que o orago desta Igreja he a Senhora Sancta Anna e que tem sinco altares, o altar-mor, o altar do Rozario, o Sancta Catherina, das Almas, o de Nossa Senhora dos Remedios; e que tem três naves e seis colunas, e três irmandades, a saber: a irmandade das Almas, a de Nossa Senhora do Rozario, a do Santissimo Sacramento.

[8] Ao ouctavo digo que o parocho he cura, e he aprezentado pello Excelentissimo Senhor Arcebispo de Évora, e tem de renda três moios de trigo e hum de cevada.

[9, 10, 11, 12] Ao nono, decimo, undecimo e duodecimo digo, que não (tem) beneficiados , nem convento algum , nem hospital , nem Caza da Mizericordia.

[13] Ao decimo treceyro digo que fora desta aldeya há duas ermidas, a saber: hua de Sam Bento e outra de Sam Domingos, que pertencem ambas a esta igreja.

[14] Ao decimo quarto digo que sucede algumas vezes irem os fieis fazer romagem mas não tem dias detreminados.

[15] Ao decimo quinto digo que a maior abundancia de fructos que se recolhem nesta terra sam trigos e sevadas e senteyos.

[16] Ao decimo sexto digo que não tem Juiz ordinario nem Camara, mas que está sujeyta ao governo da justiça de Mertola.

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[17, 18, 19] Ao decimo setimo e decimo ouctavo e decimo nono digo que não he couto nem cabeça de concelho nem há memoria de que florecessem nela homens alguns insignes por vertudes, letras ou armas , e que nela se não faz feyra alguma.

[20] Ao vigecimo digo que não há nela correyo e que se serve com o correyo de Mertola.

[21] Ao vigecimo primeiro digo que dista de Évora, cidade capital do arcebispado dezacete legoas, e de Lisboa trinta.

[22] Ao vigecimo segundo digo que não tem previlegios nem couzas dignas de memoria.

[23] Ao vigecimo terceyro digo que não há fonte alguma nem lagoa.

[24] Ao vigecimo quarto digo que não he porto de mar.

[25] Ao vigecimo quinto digo que não he terra murada, nem praça de armas nem tem castelo algum nem torre antiga.

[26] Ao vigecimo sexto digo que não pedeceo ruina alguma no terremoto de 1755.

[27] Ao vigecimo setimo digo que não há couza digna de memoria. Relaçam desta Serra

[1] Respondendo ao premeyro interrogatório digo que esta serra se chama serra de Sam

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Domingos.

[2] Ao cegundo digo que terá de comprimento hum quarto de legoa e o mesmo de largura e prencipia na portela a que se chamão das Ferrarias e acaba no pego do Servo.

[3] Ao terceyro digo que não tem coza de que se faça menção.

[4] Ao quarto digo que não nasce dela rio algum, e só sim corre por ela cá pelos baos (sic) dela hum ribeyro que corre pera o meyo dia e vay feneçer em outro a que chamão Chumbeyro.

[5] Ao quinto digo que nesta serra nem ao longo dela há vila ou lugar algum.

[6] Ao sexto digo que no seu districto há hum pego que conçerva // agoa todo anno, que tem vertude pera curar sarna asim há gente como aos gados, a que chamão pego de Sam Domingos por estar próximo a huma ermida de Sam Domingos.

[7] Ao septimo digo que nesta serra ouve antigamente minas de metaes e de prata pelo que mostra asim em varias covas que se achão na dita serra, como por outros signais que se devisão nela.

[8] As outavo digo que não consta de plantas algumas senão de matos e que se não cultiva nem dá fruto algum.

[9] Ao nono digo que junto da serra está huma ermida com a imagem de Sam Domingos, onde vão algumas peçoas e juntamento para se lavarem no pego asima dito a

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que chamão pego da sarna ou de Sam Domingos.

[10] Ao decimo digo que de veram he mui cálida e de inverno muito fria.

[11] Ao undecimo digo que nela se cria alguma caça meuda como perdizes e coelhos.

[12] Ao duodecimo digo que não tem lagoa alguma nem fojos notaveis.

[13] Ao decimo terceyro digo que não tem mais couza alguma digna de memoria.

[Rio]

[1-20] Para satisfazer aos últimos vinte interrogatórios respondo que nesta terra e freguezia não há rio algum. E só há huma rebeyra ha que chamão a rebeyra de Chança, que devide Portugal de Castela, que tem o seo naçimento em huma fonte do lugar de Cortegana, Reino de Castela, que dista desta freguezia treze legoas. E vai feneser no rio de Guadianna, na distancia de duas legoas desta aldeya , que corre do norte ao sul e que de Verão se seca ficando só alguns pegos em algumas partes dela, excepto onde entra nela a maré do rio de Guadianna. Cria algum pexe e o que tem em mais abundançia se chamão picois, que na Primavera se pescam com algumas redes, cujas pescarias são livres e não consta que em tempo algum tiveçe outro nome. E no sitio desta freguezia tem hum pizam, sinco moinhos de rodizios , e não tem mais couza algua digna de memoria. //

Esta a noticia que posso dar sobre os interrogatórios incluzos na ordem de Vossa Excellencia Reverendissima que o Nosso Senhor guarde. Sancta Anna, 12 de Abril de 1758. O Paroco Manoel Chanoia

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Transcrição: Joaquim Ferreira Boiça e Maria de Fátima Rombouts Barros

BOIÇA, Joaquim Ferreira; BARROS, Maria de Fátima Rombouts – As Terras as Serras os Rios: As Memórias Paroquiais de 1758 do Concelho de Mértola. Mértola: Campo Arqueológico, 1995.

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1758 Maio 25 - Corte do Pinto Memória Paroquial de Corte do Pinto, Mértola [ANTT, Memórias Paroquiais, vol. 11, n.º 387, pp. 2617 a 2625]

Resposta ha noticia que Sua Majestade que Deus guarde pede desta aldeya da Corte do Pinto , termo da villa de Mertolla, cuja refiro pella forma seguinte.

[Terra]

[1] Fica esta aldeya na província do Alentejo, junto à raya de Castella, no sitio a que chamão Destricto de Cambas que he entre o rio Guadiana e a ribeira de Chança, que serve da divizão dos Reinos de Portugal e Castella. He arcebispado de Evora, comarca de Ourique e termo da villa de Mertolla.

[2] Como a dicta villa de Mertolla he de El Rey Nosso Senhor, o he tãobem esta aldeya, como tãobem as mais deste termo.

[3] Tem esta aldeya outenta vizinhos, que compoem trazentos e dezanove pessoas: homens sento e dezouto, mulheres sento e duas; menores varões vinte e quatro; fêmeas vinte e duas; creanças varões vinte e outo, fêmeas vinte e sinco, que fas o dicto numero de trazentos e dezanove pessoas.

[4] Está situada em serra, e ocupa sua situação parte de montes e parte de valle, e terá de circuyto a quinta parte de huma legoa. E desta aldeya se descobrem duas povoações do Reyno de Castella, huma a que chamão Puebla de Gusman e dista esta aldeya quatro legoas pequenas e a outra se chama Santa Barbara, e dista outras quatro legoas mas grandes. E antes de esta, na distancia de duas legoas, está outro lugar tãobem de Castella a que chamão Paymogo, mas não se descobre desta aldeya por estar situado em hum

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valle. //

[5, 6] Está a parochia dentro da mesma aldeya, e não tem esta freguezia mais povoação que a dicta aldeya, nem monte algum, e só tem huma orta a que chamão Val de Ovelha, que dista desta aldeya a duodesima parte de huma legoa.

[7] He o orago desta freguezia Nossa Senhora da Concepção, cuja imagem está collocada em hum nicho na cappella maior. Tem mais dous altares para os lados, hum dentro de huma cappella que he da Senhora do Rozário, outro à face que he das Santas Almas. He a dicta igreja de doze varas de comprido e mais de quatro de largo, não tem naves nem arcos mais que o que devide a cappella maior e a cappella da Senhora do Rozário, cujas são de abobedas e tudo o mais he forrado de madeyra. Tem três irmandades, huma do Santissimo Nome de Jesus, outra da Senhora do Rozário e outra das Santas Almas.

[8, 9] O parocho desta aldeya e freguezia he cura, cuja aprezentação he de Sua Excellencia Reverendissima. Tem de próprio sento e outenta alqueres de trigo, pagos pellos mesmos freguezes e adeantados pello São João de cada hum anno. O contigente a que chamão pé de altar renderá huns annos por outros sincoenta mil reis. Não tem beneficiados nem cappellão algum a mais que o dicto parocho.

[10, 11, 12, 13, 14] No destricto desta freguezia não há convento algum, nem nesta aldeya há hospital ou Caza de Mizericordia. // Há nesta freguezia duas ermidas, ambas destruhidas há mais de cem annos, e ainda conservão as paredes principais dellas, ambas fora desta aldeya: huma na distancia de meya legoa que era a Santa Luzia e a outra na distancia de meyo quarto de legoa que era São Simão. E há tradição que esta fora antiguamente a parochia por se acharem próximos à tal igreja varios edeficios demolidos de obra muito tosca.

[15] Os fructos que recolhem os moradores desta aldeya são trigo, sevada, senteyo, porque não vivem de outra couza senão de suas lavouras com seus rebanhos de gados, tanto de lam como de cabello. Tãobem recolhem fructos de mel e sera, por tractarem muitos dos moradores de colmeias, que os fructos que as terras tem proprios são de azinho e louro, e todos os fructos são sem muita abundancia.

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[16] Não tem esta aldeya mais justiça que hum Juiz vintaneyro e hum escrivão sujeitos à justiça de Mertolla, como factura sua.

[17, 18] Não he couto, cabeça de conselho, honra ou behetria, nem há memoria de que desta aldeya sahissem ou florecessem senão alguns homens desulutos com pouco temor de Deus.

[19, 20] Não tem feyra nem correyo, e se vallem do correyo de Mertola que dista desta aldeya tres legoas grandes.

[21] Desta aldeya à cidade de Évora cappital deste arcebispado, há dezacette legoas, e da côrte de Lisboa dista trinta legoas. //

[22] Os priveligios que tem não só os moradores desta aldeya mas tãobem todos os mais moradores deste Destricto de Cambas, que comprehende outra freguezia que há neste destricto chamada de Santa Anna e alguns montes da freguesia da Villa de Mertola, he de desfructarem toda a serra, assim do que nella semeyão como dos fructos das arvores que são sovreiras, sem pagarem mais que o dizimo dos fructos do que semearão, dizem que per (...) ley que os Senhores Reys antigos lhe fizerão. Verdade que elles abuzão de tal sorte deste privilegio que o vão destruhindo de tal sorte que não só cortão as arvores que querem ainda as queymão com tanto prejuizo do bem comum.

[23, 24] Meya legoa distante desta aldeya está hum pego cujas agoas curão os enfermos da sarna. Chamace o tal pego de São Dominguos por estar próximo a huma ermida do dicto Santo que he da freguezia de Santa Anna. Será prencipalmente por virtude do santo, mas a tal agoa tem sabor de enchofa.

[25, 26] Não há nesta aldeya e seu districto torre, castello, ou couza digna de memoria. E no terremoto de mil e settecentos e sincoenta e sinco não houve mais ruinas que a da igreja desta aldeya que em breves annos virá de todo a cahir pellas poucas posses e menor zelo que há para se reparar. //

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[Serra]

[1, 2] Fica esta aldeya próxima à serra a que se chamão de Mertola, só com a distancia de hum quarto de legoa, cuja lhe fica pella parte do Norte, e tem de comprimento três legoas e de largura legoa e meya. Prencipia a tal serra no sitio de Val Covo, e finaliza na foz dos Alcaydes que he hum ribeyro que entra em a ribeyra de Chança.

[3] A tal serra comprehende alguns valles, sendo os prencipais Val de Paredes e Val de Pereyro.

[4] Não tem em si rio algum, mas vários barrancos, sendo o prencipal o barranco dos Alcaydes, cujo corre do Norte para o Sul athé entrar na dicta ribeyra de Chança, que he a que vay devedindo os Reynos.

[5] Não há na dicta serra povoação alguma, tendo somente algumas malhadas de colmeyas. [6] Tãobem não há fontes especiais, antes sim muitas faltas de agoa.

[7] E ainda que na dicta serra senão achão minas de qualidade alguma, próximo à mesma serra, em terras de particulares, junto á ribeyra de Chança, estão várias minas e há tradição que dellas se tirava ouro.

[8] Há na dicta serra várias ervas de que os montanhezes se aproveytão pera várias enfermidades, como erva arcar para inflamações, tasneyras para curar chagas, e alecrim pera várias enfermidades. De plantas excecto sovreyras, que se a não cortacem se via abundante, só tem mattos infrutiferos. He cultivada o mais della semeandoce de trigos,// sevadas, senteyos, que deste género he mais abundante.

[9] Não há na dicta serra igreja ou mosteyro, ainda que nella se encontrão alguns edifficios muito toscos.

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[10] O temperamento da dicta serra he frio, ainda que não muito desmaziado.

[11] Na dicta serra creão o moradores deste destricto os seus gados, prencipalmente de cabello e tem em si bastante caça de coelhos e perdizes, algumas lebres e rezes servuas.

[Rio]

[1] Próximo a esta aldeya, porque só dista meya legoa, corre o rio de Chança, o qualnasce em huma povoação de Castella chamada Corteganna, de huma fonte que está em huma rua da tal povoação de cuja fonte toma o tal rio o nome.

[2] Não nasce caudaloso, nem o he em parte alguma, ainda que em suas enchentes arebatado pello despenhado de suas correntes. Mas em annos secos a maior parte do Verão em várias partes nem corre.

[3] Neste tal rio ou ribeyra de Chança entrão vários regattos ou barrancos que só correm enquanto chove. Entre todos, os principais são três: he o primeiro, o barranco de Alcaydes, que prencepia dentro da serra e em parte devide a serra da terra dos particulares, e entra em Chança no sitio aonde chamão as Varges Largas. Corre o tal barranco de Norte para o Sul athé entrar na dicta ribeyra pella parte de Portugal. // O segundo se chama Chumbeyro e tãobem corre do Norte pera o Sul, e vay meterce em Chança aonde chamão o Moinho de Nossa Senhora, tãobem pella parte de Portugal. O terceyro se chama Malagão, cujo entra na tal ribeyra pella parte de Castella, e corre de Nascente pera o Poente. Entre os três este tal Malagão he o maior e corre a maior parte do anno.

[4, 5] O tal rio de Chança não he navegavel nem o pode ser, não só pellas poucas agoas que conserva mas tãobem pello apertado do rio, porque o mais delle corre entre

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rochedos, e por esta cauza tanto mais cheyo quanto mais arebatado.

[6] Corre o tal rio do Nacente ao Poente.

[7] Cria muita abundancia de peches a que chamão barbos, e desta espece maior abundancia dos pequennos, tãobem cria algumas eirós. Como o tal rio se vay meter em o rio de Guadianna, do tal rio lhe entrão vários muges e alguas (sic) solhos, mas não podem subir por Chança acima pelos açudes que tem de alguns moinhos.

[8, 9] Não há noticia que na tal ribeyra de Chança haja mais de hum caneyro de madeira, que no tempo da vazante de qualquer cheya apanha abundada de barbos, picões e algumas eyrós, cuja pescaria he de hum sujeyto de Portugal senhor de hum moinho a cujo açude está acima do tal caneyro. De Inverno uzão muitos de pescaria de canna e de Verão uzão alguns de redes que são rojos, tresmalhas e atarrafos. // As tais pescarias são livres sem pensão alguma pera todos os que quizerem uzar dellas.

[10] Em alguns citios fás suas vargens e estão (sic) se semeyão de trigo, sevada e senteyo; outras vezes as rezervão para se semiar nelas meloais e alguns milhos grossos e aboberas. E não há nas dictas vargens arvores algumas mais que hum grande romeyral que fica no fim da tal ribeyra próximo à entrada de Guadianna, cuja fazenda he da confraria do Santissimo Sacramento da freguesia de Santa Anna destte destricto de Cambas.

[11] Não há notica (sic) de que suas agoas tenhão virtude alguma.

[12, 13, 14] Sempre teve o mesmo nome desde que nasce da tal fonte de Chança athé se meter no rio de Guadianna.

[15] Não há notia (sic) de que tenha ponte alguma e os mesmos açudes dos moinhos lhe servem de ponte.

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[16] Desde que a tal ribeyra de Chança prencepia a servir de divizão dos dous Reynos, Portugal e Castella, athé se meter no rio Guadianna, tem em si vinte moinhos e hum pizão, cujos são de particulares de hum e outro Reyno porque estão de huma parte e outra, todos com seus açudes.

[17] Não há memoria que de suas areas se tirace ouro em tempo algum.

[18] Conservace a posse de se poderem uzar de suas agoas sem pensão alguma. //

[19, 20] Tem tal ribeyra de Chança vinte e huma legoas desde que nasce athé que entra no rio Guadiana aonde fenece. Passa pelo lugar de Aroche, lugar de Castella, muito próximo à tal povoação; passa com meya legoa de distancia de Ficalho, lugar de Portugal; passa com outra meya legoa de distancia desta aldeya de Corte de Pinto e outra meya legoa de distancia da aldeya de Santa Anna deste destricto de Cambas. Desde Corteganna aonde nasce, athé Aroche, fazem duas legoas, desde Aroche athé Ficalho, aonde prencepia a devidir os Reynos, fazem sette legoas; desde Ficalho athé ao Carril, que hé no direyto desta aldeya, fazem outo legoas; desde o Carril athé ao direyto da aldeya de Santa Anna, fazem duas legoas, e athé se meter no rio Guadianna fazem outras duas legoas, que todas fazem vinte e huma desde que nasce athé que morre. Chamace este citio aonde entra a tal Ribeyra de Chança em o rio Guadianna, o citio da Mesquita, em cujo já chega agoa de maré, e athé ao mar aonde se sepulta o rio Guadianna fazem outo legoas.

São as noticias que poude descobrir desta aldeya e freguezia, da serra e rio.

Corte do Pinto, 25 de Mayo de 1758.

O Parrocho Silvestre António Martins Gonçalo

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Transcrição: Joaquim Ferreira Boiça e Maria de Fátima Rombouts Barros

BOIÇA, Joaquim Ferreira; BARROS, Maria de Fátima Rombouts – As Terras as Serras os Rios: As Memórias Paroquiais de 1758 do Concelho de Mértola. Mértola: Campo Arqueológico, 1995. 7

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