Teses da Assembleia Nacional Constituinte

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Nota:. Nestes textos empregamos o qualificativo independentismo histórico para identificar a corrente sócio-política do nacionalismo galego que da década de 70 do século XX até hoje construiu os principais projetos independentistas e dinámicas de luita nacional desenvolvidos no país. Sentimo-nos legitimamente herdeir@s e continuador@s desta corrente graças à que, hoje, podemos falar da existência na Galiza dum independentismo galego contemporáneo e dumha reivindicaçom nacional que implica a procura dumha rutura total e absoluta com o Estado espanhol. Esta denominaçom nom encerra no entanto umha conceçom exclusivista ou patrimonialista da açom patriótica, nem nega a obviedade de existirem hoje no nosso país –em grande medida, como fruto desta luita de quase quarenta anos- outros independentismos em ativo, com os seus próprios perfis e historicidade.


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Índice temático 1. O contexto nacional e internacional

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1. 1. Contexto internacional: Capitalismo, o final dum ciclo histórico

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1. 2. Espanha: a tripla crise

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1. 3. Galiza: direito à sobrevivência

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1. 4. Situaçom no campo sócio-político nacionalista e independentista

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1. 5. O processo de liberaçom: fase atual

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2.Estratégia e tática da Organizaçom

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2. 1. Necessidade da plena autonomia política e organizativa do projeto independentista

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2. 2. Construir a organizaçom independentista de massas: umha tarefa pendente

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2. 3. Visom movimentista do processo de liberaçom nacional

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2. 4. Linhas de trabalho preferentes e funcionalidades da Organizaçom Política

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2. 5. As políticas de alianças

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2. 6. Os métodos de intervençom sócio-política

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2. 7. A intervençom nos movimentos e as organizaçons populares

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2. 8. A construçom e a defesa nacional numha fase longa sem estruturas estatais

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2. 9. Programa tático e programa estratégico

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2. 10. Necessidade de afortalar a consciência nacional galega

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1. O contexto nacional e internacional 1. 1. Contexto internacional: Capitalismo, o final dum ciclo histórico O capitalismo vive hoje a crise mais profunda da sua história e a circunstáncia de isto acontecer a poucas décadas da queda da URSS nom deixa lugar à dúvida sobre o fato de estarmos a viver o fim dum ciclo histórico. Isto explica-se porque o regime de produçom atualmente dominante no planeta esbara contra todos os seus limites internos, externos e sociais. Os limites internos do capitalismo A queda de LEhmAN BROthERS em 2008 deu o tiro de partida para que, perante a consciência burguesa que difundem os grandes meios de comunicaçom, reaparecesse a possibilidade dum colapso geral da economia mundial. Cinco anos após essa data, os mesmos meios que na altura falavam em “refundaçom do capitalismo” ou “necessidade de regularizaçom dos mercados” difundem agora ideias tranqüilizadoras como “os mercados recuperárom a tranqüilidade”, “a banca está saneada” e, portanto, “a crise esta controlada”. A realidade no entanto é que, sob essa aparente sensaçom de “recuperaçom”, estám os gigantescos pacotes de estímulo financeiro para as grandes potências mundiais e de resgate e inter- 7 vençom para os estados em risco de falência da UE. A expansom monetária irrefreável por parte dos bancos centrais é o jeito de as grandes potências privadas de receitas suficientes pola estagnaçom da economia real se financiarem com o endividamento público, persistirem nas políticas militaristas para gerir as suas relaçons internacionais e, irracionalmente, impulsionarem o regresso para umha economia suicida baseada nas bolhas financeiras e imobiliárias como antes da Grande Recessom. tanto é assim que nengumha das quatro grandes pontências do chamado G4 -EUA, UE, Reino Unido e Japom- renuncia ao emprego frenético e ininterrupto da “máquina de imprimir notas”. mediante a terceira rodada de expansom monetária, iniciada em setembro de 2012, a Reserva Federal, banco central dos Estados Unidos, comprometeu-se a adquirir mensalmente 65 mil milions de euros em dívida pública e obrigaçons hipotecárias. O BCE injetou nos últimos anos mais de um biliom de euros para dar liquidez à banca privada e supom-se que mercou 300 mil milions de euros em dívida soberana dos estados membros. A expansom monetária na Grá-Bretanha é calculada noutro meio biliom e, recentemente, o Banco do Japom iniciou mais umha manobra expansiva por valor dum biliom de euros. No atinente aos pacotes de resgate na UE, os dados som também assustadores. O Estado grego recebeu, desde 2010, um quarto de biliom de euros da UE e o FmI. Pacotes de 80.000 milions recebérom Portugal e a Irlanda e 10.000 Chipre. Espanha, para sanear a sua banca, foi resgatada com 40.000 milions. Entre injeçons de liquidez, compra de bônus e resgates, a UE leva posto quase dous


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“A prova de que o capitalismo na Europa segue a caminhar na corda frouxa é a repressom e a violência que os estados precisam para conter as perturbaçons políticas e sociais” bilions sobre a mesa para impedir a bancarrota de vários dos seus estados membros e a desapariçom da sua moeda. E óbvio que nada disto se precisaria se o modo de produçom capitalista fosse capaz de alcançar, na medida necessária, o seu objetivo principal: a geraçom contínua e crescente de mais-valor mediante a exploraçom do trabalho na produçom de mercadorias. A auto-percepçom que o sistema tem de si nunca vai reconhecer esta evidência. É característica do pensamento crítico e emancipador, porém, afirmar a natureza histórica e passageira que é inerente ao capitalismo. Por isso desenvolveu, ao longo da sua história, umha teoria da crise que infelizmente a esquerda social e política a miúdo esquece. Cumpre pois retomá-la e aplicá-la na prática. Os limites sociais do capitalismo Perante a crescente dificuldade que, no contexto tenológico atual, o capital tem para valorizar-se, isto é, perante a ameaça que supon8 hem os limites internos, o sistema produtivo opta muitas vezes por intensificar brutalmente a exploraçom do trabalho humano. É nessa estratégia de supervivência onde a globalizaçom e o imperialismo jogam o papel decisivo. Eis, por exemplo, a deslocalizaçom da produçom para poupar salários ou a importaçom de mao-de-obra barata imigrante, ou a desmontagem dos sistemas de bem-estar social nos estados europeus sob a égide do FmI ou o BCE. Nestes circunstancias, o remédio pode ser pior do que a doença e ao tentar iludir os seus limites internos o capitalismo pode encontrar-se de frente para os seus limites sociais. Os exemplos anteriores, o mesmo que outros que poderíamos trazer à tona, verificam esta realidade e, para mostrá-lo, avondam três exemplos: 1º Desde abril de 2012 as mortes nas fábricas do têxtil só no Bangladesh superam já as 2000 pessoas. A maioria mulheres. Cinco pessoas cada dia, vítimas das condiçons infra-humanas em que se trabalhava. Entres as cinças dos incêndios, ou entre o entulho das derrubas, aparecem sempre as etiquetas das marcas multinacionais para as que trabalham: ZARA, C&A, mANGO, CARREFOUR, EL CORtE INGLÉS, etc. 2º Ao mesmo tempo, os subúrbios das grandes cidades do mundo industrializado concentram quantidades enormes de populaçom imigrante, chegada como mao-de-obra em regime de quase escravatura. Excluíd@s económica e ideologicamente o mesmo que os seus pais e maes, @s filh@s e net@s d@s imigrantes vivem como alheio o país no que moram.


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3º Em Europa os cortes nos serviços sociais, na sanidade e segurança sociais fam parte das políticas de muitos governos. tenta-se assim compensar as medidas de expansom monetária com a reduçom da despesa pública com o fim de controlar o endividamento para nom comprometer o futuro da moeda comum. Com umha mao dá-se-lhe à “maquina de imprimir notas” e com a outra retiram‑se‑lhe direitos sociais à populaçom. Por outra parte, em troca dos pacotes de resgate, FmI e UE exigem a desvalorizaçom interna da economia, rebaixando salários e pensons e suprimindo ou reduzindo direitos laborais e sociais. Em relaçom aos três exemplos, a conflituosidade social estala violentamente -o mesmo que por toda a parte e a cada com maior frequência- como prova de que os limites sociais estám a ser atingidos: - Dous dias após a derrubada que causou a morte de 1.400 trabalhadoras e trabalhadores em 2012 no Bangladesh produzírom-se protestos que a polícia reprimiu duramente, com balas de goma e gases lacrimógenos. - Na Europa, por sua parte, som incontáveis as greves gerais e os distúrbios som habituais. Nos protestos da Grécia de 2012 incendiárom-se 17 prédios e a repressom causou centenas de pessoas feridas. 9 - Os distúrbios e os protestos violentos, com centos de viaturas incendiadas, danos por milions de euros, pessoas mortas, feridas e detidos, protagonizados por migrantes de segunda ou terceira geraçom, sucedem-se nos bairros periféricos de cidades como Paris (2005, 2009 e 2013) ou Estocolmo (2010 e 2013), ambas capitais de estados recorrentemente citados como exemplo de políticas sociais. Poderiam ser citados outros muitos exemplos dumha tensom social crescente cuja generalidade só se pode explicar polo fato de o capitalismo ter uns limites sociais além dos quais a sua supervivência é impossível. Os limites naturais A tendência do capitalismo para a acumulaçom é infinita, mas os recursos naturais do planeta som limitados. Esta contradiçom incontornável constitui o que aqui denominamos limite natural do capitalismo. O teito do petróleo, acidentes nucleares como o de Fukushima ou as mudanças climáticas mostram que este limite existe e que a sociedade industrial há tempo que o alcançou. Nesta questom o caso da energia é paradigmático. Um estadounidense médio consome cada dia a energia equivalente a 150 escravos a trabalhar seguido as 24 horas para ele. Além disso, nos últimos 150 anos o capitalismo gerou umha civilizaçom “detritívora”.


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Poderia-se dizer que as sociedades industrializadas comem petróleo: para obter umha caloria dos alimentos industriais que costumam consumir-se precisam-se 10 calorias fósseis. Por outra parte, a prática totalidade dos elementos que conformam a vida diária das pessoas neste tipo de sociedade depende da disponibilidade contínua de petróleo. Outro sintoma de o capitalismo estar a esbarar nos seus limites naturais som as mudanças climáticas que som consequência, principalmente, da emissom de gases de efeito estufa. O problema é que até as atividades mais habituais e triviais implicam a emissom deste tipo de gases: por exemplo, umha pesquisa no Google gera entre 1 e 10 gramas de CO2. Aliás, a maior parte dos gases de efeito estufa geram-se em atividades relacionadas com os combustíveis fósseis. Ao ser um recurso limitado, nalgum momento a extraçom de petróleo começará -já começou- a diminuir. A Agência Internacional da Energia (AIE), que nom é suspeita de anticapitalista, publicou em 2010 que o teito na extraçom de petróleo convencional (o de maior qualidade) já se alcançara em 2006. O mesmo vai acontecer, sem dúvida, com o resto dos combustíveis fósseis cuja extraçom é a cada menos rendível embora os avanços tenológicos. Evidentemente, os grandes centros de decisom políticos e económicos 10 estám cientes do problema e, por isso, cada vez há mais interesse em impulsionar a energia nuclear. Nas duas últimas décadas (19902010) a produçom nuclear de energia elétrica cresceu 30%. Nos países europeus da OCDE a produçom de eletricidade em centrais nucleares iguala à que se produz em centrais hidroelétricas ou mediante centrais termoelétricas de carvom ou gas. Só o acidente de Fukushima explica que a produçom nuclear de eletricidade volvesse desde 2011 aos níveis de 1998. Globalizaçom: feiçom atual do imperialismo Na fase atual da industrializaçom mundial, caracterizada pola hiperacumulaçom tenológica sem precedentes, a globalizaçom desenvolve a respeito do capitalismo a funçom da maromba a respeito do funâmbulo: constitui o contrapeso que permite ao sistema caminhar pola “corda frouxa” dos seus limites sem cair ao “abismo” dum colapso que doutro jeito decorreria das suas dificuldades para valorizar o capital, reproduzir as relaçons sociais ou alimentar energeticamente a sua maquinaria produtiva. Eis o caso do outsourcing, ou das deslocalizaçons, que aproveitam as diferenças que em termos de acumulaçom existem entre metrópoles e regions periféricas. Estamos, claramente, perante umha renovaçom do neocolonialismo, hoje configurado polas tecnologias da informaçom, comunicaçom e o transporte, que age sob o controlo do capital globalizado das bolhas financeiras, realimentadas incessantemente polas políticas monetárias expansivas do G4. Esta dinâmica excede os limites da capacidade regulativa dos es-


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tados convencionais, que cedem parte da sua soberania face instâncias internacionais e concentram numha grande medida o seu papel na gestom repressiva da crise. Em consequência, em toda a parte, mas a maior ritmo quanto mais periférico é o estado, o aparelho estatal dissolve-se, os serviços públicos desaparecem e as políticas repressivas tornam-se brutais. Fai-se precisa aliás a garantia da segurança nas transaçons capitalistas e o abastecimento de combustível para as sociedades industrializadas. Este é o papel que cumprem as intervençons militares dos EUA, a OtAN, ou as coligaçons internacionais formadas ad hoc para umha “operaçom” concreta. Som a “rede” por baixo do funâmbulo e sobre o abismo do colapso. Umha vez extinta a “ameaça soviética”, como álibi, os aparelhos ideológico‑mediáticos do sistema geram imagens de inimigos fantasmais e perigos irracionais: terrorismo internacional, jihadismo, islamismo, estados falidos, senhores da guerra, conflitos tribais, guerras seitárias, etc. tudo isto pode ser considerado, segundo as conveniências de cada momento, umha ameaça para a segurança das sociedades industrializadas e as metrópoles neocoloniais. Em realidade, as contínuas convulsons que se lhe atribuem a estes confusos “poderes malignos” som, longe disso, consequência da própria dinámica capitalista globalizada que, por vezes e a cada com mais frequência, vai contra as suas próprias leis. Por exemplo, a expansom do capitalismo face os territórios periféricos das econo- 11 mias emergentes implica desruralizaçom, proletarizaçom maciça e maior mercantilizaçom da vida das pessoas. mais isso, por umha parte, multiplica a procura energética e, sobretudo, por outra, implica umha equiparaçom no valor do trabalho a nível global. Procura energética e equivalência global do trabalho som incompatíveis com a situaçom crítica do sistema a respeito dos limites internos e naturais. Poderia chegar a por-se de manifesto na vida diária das pessoas nas metrópoles a insustentabilidade energética do capitalismo e desapareceriam as vantagens neocoloniais decorrentes das diferenças de renda entre centro e periferias, fundamentais para o sistema manter o equilíbrio funambulesco. Sobre este pano de fundo há que interpretar, por exemplo, o papel que os BRICS -Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul- jogam na reproduçom das práticas próprias da globalizaçom neocolonial com o fim de sustentar economicamente unhas mudanças sociais inevitáveis em países como Brasil ou a própria China. De facto, os BRICS anunciárom recentemente a criaçom dum Banco, com fundos dos seus membros, para financiarem infraestruturas na África e criarem as condiçons que permitam num futuro próximo a localizaçom naquel continente de projetos industriais com os que valorizarem o capital que os emergentes estám a acumular. Outro exemplo som os últimos casos de intervençons militares a grande escala no máli e na Líbia ou a ameaça sobre Síria protagonizadas pola França e os EUA. É inegável o interesse destas duas potências em controlar matérias primas estratégicas como o


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petróleo ou o uránio. mas, além disso, e por se o precário equilíbrio do sistema se rompe, a iminência da utilizaçom da força é um elemento chave e fundamental da ordem capitalista e, em interesse da sua sobrevivência, deve estar sempre presente no cenário internacional como rede baixo os passos cada dia mais trémulos do funambulista. Uniom Europeia: crise do Euro e também da economia real No último terço do século XX a Europa fordista nascida da pósguerra apresentava sinais evidentes de esgotamento. Por outra parte, naquela altura, generalizou-se um cenário marcado pola globalizaçom económica, o abandono do padrom ouro e a desregularizaçom dos mercados. Como resposta a esta situaçom nasceu em 1990 a Uniom Económica e monetária europeia (UEm). Pretendeu-se com ela tanto potencializar a livre concorrência no seio da UE, com a circulaçom irrestrita de mercadorias e capitais, quanto impedir que os estados europeus utilizassem a desvalorizaçom das taxas de cámbio das suas moedas para limitar os efeitos desta livre concorrência. Em maos das autoridades económicas dos estados ficou apenas a política fiscal, instaurando-se um banco emissor central para toda a UEm cuja funçom principal é o controlo da inflaçom. Em consequência desta nova situaçom as leis que regulavam o preço do dinheiro no mercado dos créditos deixárom de vigorar e, 12 da noite para a manhá, nas economias mais fracas da UE ofereceu-se crédito nas mesmas condiçons que na Alemanha. Esta sobre-estimulaçom da procura tivo no contexto da crise global do capitalismo três efeitos imediatos nos países periféricos da UE. Primeiro, um aquecimento da economia que nom arrefeceria até a Grande Recessom de 2008. Segundo, um enorme e profundo burato nas balanças comerciais. E terceiro, um endividamento insustentável das pessoas, as empresas e os estados, com consequências dramáticas para o sistema bancário. Continuou vigente, porém, a regra segundo a qual desde que ultrapassar certos limites a dívida privada torna-se pública. Finalmente, a desconfiança perante as grandes necessidades financeiras dalguns países provocou a crise das dívidas soberanas e alguns estados (Grécia, Irlanda, Portugal, Espanha, Itália, etc.) perdérom toda a sua capacidade para se financiarem nos mercados e ficárom á beira dumha falência que apenas foi evitada com a intervençom da UE, o FmI ou o BCE. Atualmente, os meios que participam da ideologia do sistema insistem em que a situaçom está sob controlo, mas esse alegado controlo é apenas aparente: as causas da crise do capitalismo nom mudárom e, de fato, a economia real continua estagnada. Dous son os instrumentos com os que Alemanha, assistida polos seus satélites (Áustria, holanda, Finlândia...) e polo BCE está a administrar a crise do capitalismo no seio da UE. Um deles é a compra de dívida polo BCE no mercado secundário. Quando a desconfiança na dívida soberana dum país do Euro provoca umha excessiva rendibilidade nos mercados, o BCE merca maciçamente títulos


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para reduzi-la. O segundo dos instrumentos mencionados que utiliza Alemanha é a imposiçom de duras medidas de austeridade aos países resgatados ou assistidos pola ajuda das instituiçons comunitárias. A passada crise do Euro, porém, apenas foi um sintoma. Os estados têm dificuldades para se financiarem porque é o sistema produtivo estagnado o que fecha a torneira da receita por impostos. E essa torneira segue fechada. mas os limites do capitalismo deixam-se ver na própria Alemanha. A precariedade no emprego nom deixa de crescer, a idade mínima de reforma elevou-se para os 67 anos e a dívida pública alcança 80% do PIB. Só a crise do euro, precisamente, permite ao estado e aos bancos financiarem-se em prejuízo das economias resgatadas quase sem juros. Destarte, embora o grande importe da dívida pública, o Estado alemám nom incorre em déficit, motivo polo qual a dívida segue a jogar o papel de valor refúgio com a conseguinte contençom dos juros a fechar um círculo que fai pensar erradamente que o capitalismo, na Alemanha, está fora de perigo. A prova de que o capitalismo na Europa segue a caminhar na corda frouxa é a repressom e a violência que os estados europeus estám a precisar para conter as perturbaçons políticas e sociais da ordem estabelecida. Na Grécia, Alemanha, França, Portugal ou na Espanha som a cada mais comuns as violaçons dos direitos humanos com fins repressivos: violência policial contra os protestos; tortura 13 e maus tratos nas esquadras policiais e nas cadeias, cumplicidade com grupos paramilitares de extrema direita responsáveis de diversos crimes e reformas legais para incrementar a repressom e reduzir os direitos civis. 1. 2. Espanha: a tripla crise O Estado espanhol sofre umha tripla crise. Em primeiro lugar, umha crise do modelo produtivo que se produz no marco da crise global mas agravada por ser o espanhol um capitalismo seródio e especulativo. A crise financeira de 2008 picou a bolha imobiliária e provocou o colapso do sistema bancário, a desapariçom de milheiros de empresas e um desemprego que alcança 27%. Com a economia produtiva nesta situaçom, as receitas por impostos diminuírom, mas as necessidades sociais crescérom dramaticamente. Déficit e endividamento colocárom o Estado à beira da suspensom de pagamentos. O Governo espanhol, com o Estado em perigo de falência, pediu ajuda a Europa e obtivo um resgate para o setor bancário e garantias de financiamento por parte do BCE. Em troca, a oligarquia europeia tem o controlo da política económica espanhola e impom medidas de austeridade que estám a deixar os direitos sociais do povo sistematicamente banidos do ordenamento jurídico e os orçamentos públicos. Em segundo lugar, a crise espanhola é também umha crise do régime nascido da Constituiçom de 1978. Este regime é questionado por amplos setores da populaçom estatal, mesmo daquela que


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“O fracasso do Estatut, o Plano Ibarretxe e o bipartido galego cancelárom toda esperança de implementar umha sorte de soberanismo progressivo” mora em territórios sem conflitos de soberania. As catastróficas consequências sociais da crise tornárom inaceitável a tradicional corrupçom do regime e debilitárom o reconhecimento das suas instituiçons fundamentais -Coroa, Governo, partidos, sindicatos espanhóis, Igreja, etc.-, de modo que a legitimidade social da democracia espanhola está em mínimos. Neste sentido, há que dizer que a conflituosidade social decorrente da crise apresenta as mais das vezes a fasquia dumha luita contra o regime mais do que um movimento anticapitalista. temos que concluir a este respeito que a consolidaçom dum movimento anticapitalista (e independentista no caso galego) deverá esperar a umha fase mais avançada do processo. Por último, em terceiro lugar, Espanha como projeto nacional vive umha profunda crise do modelo de Estado desenhado em 1978. Para desativar as legitimidades nacionais pré constitucionais (Catalunya, Euskal herria e Galiza) que a própria Constituiçom de 1978 reconhecia, Espanha generalizou o sistema autonómico a todas as suas regions. Paradoxalmente, agora, para contrapesar a 14 perda de soberania em favor da oligarquia transnacional, o Estado espanhol recorre à que ainda conserva para recuperar as competências autonómicas que antes “cedera”. Ao mesmo tempo, desde meios, think tanks e outros agentes ideológicos espanhóis divulga‑se o discurso chauvinista que responsabiliza da crise, principalmente, às autonomias. Em conclusom: o café para todos está a ser desacreditado polos mesmos que o concebérom. Ao mesmo tempo, o fracasso do Estatut, o Plano Ibarretxe e o bipartido galego cancelárom toda esperança de implementar umha sorte de soberanismo progressivo pola via do alargamento gradual dos teitos competenciais. O nacionalismo autonomista ficou sem discurso nem folha de rota e patenteou-se, mais umha vez, a verdadeira natureza assimilacionista e supremacista do projeto nacional espanhol independentemente do regime político no que se concretizar em cada momento. Por consequência, hoje, em Euskal herria sul e no Principat, estám-se a articular maiorias sociais para por em andamento processos independentistas em chave cidadanista que podem fazer colapsar o regime nascido em 1978. Cientes da profundidade da crise, a oligarquia espanhola nucleada nas empresas do IBEX35 prepara‑se para umha Segunda Transición que como em 1976-78 preserve o essencial do sistema, recupere a legitimidade, desative ou estagne os processos soberanistas basco e catalám e afonde na exploraçom e assimilaçom da Galiza. À frente da saída involutiva deve situar-se o independentismo galego em chave de construçom do poder popular para a defesa intransigente tanto da justiça social quanto dos direitos coletivos do Povo Galego.


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1. 3. Galiza: direito à sobrevivência Exausto e engavetado no beco sem saída dos seus limites, o capitalismo e o mundo que lhe é próprio agoniza, mas o Povo Galego, que já existia antes do capitalismo, deve sobreviver. Espanha como projeto nacional e o seu Estado como aparelho jurídico e governativo conformam na Galiza a concretizaçom histórica do capitalismo. Umha concretizaçom incompatível, de partida, com os direitos nacionais e sociais do Povo Galego. De fato, que a crise do capitalismo seja umha oportunidade para o movimento Independentista Galego depende de essa incompatibilidade de partida se manifestar num conflito real para a sociedade. Os esforços do independentismo devem, portanto, fazer patente esse conflito histórico nas suas dimensons política, social e cultural. Colonialismo e assimilaçom: a dimensom política As dificuldades e as demoras na consolidaçom da hegemonia real do modo de produçom capitalista numha sociedade compensa-se, quando as condiçons históricas o permitem, com a imposiçom dumha hegemonia formal mediante mecanismos políticos e jurídicos. Esta hegemonia nom espontánea da praxe social minoritária sobre a maioritária é o que entendemos por colonialismo. Essas condiçons históricas, sem as quais o colonialismo nom seria pos- 15 sível, som também as que naturalizam o submetimento mediante a inferiorizaçom moral e a vulneraçom dos direitos daquel Povo cuja praxe social nom se amolda, ipso facto, aos ditados do capital. Neste sentido, o caso galego apresenta diferenças históricas com outros conflitos nacionais persistentes no Estado espanhol. Nesses outros conflitos –nomeadamente, Catalunha e Euskal herria Sul- o progresso na modernizaçom capitalista foi precisamente o motor da consciência nacional. À Galiza, no entanto, a modernizaçom capitalista chega muito depois e desenvolve-se muito mais devagar porque encontra obstáculos e resistências de consideraçom na estrutura social maioritária. Portanto, os efeitos do processo vam-se orientar, sob as suas condiçons iniciais, mais á assimilaçom do Povo Galego do que á tomada de consciência dos seus direitos nacionais. Inverno demográfico e desterritorializaçom: a dimensom social historicamente a Galiza foi um país muito povoado, ocupando essa populaçom todo o seu território. Em 1900, a populaçom galega, que hoje nom chega a 6% da estatal, supunha 11%. Aliás, a Comunidade Autónoma da Galiza (CAG) está em saldo vegetativo negativo -mais mortes do que nascimentos- desde 1988 e estima-se que nesta primeira metade de século perderá um miliom de habitantes. Por outra parte, a populaçom rural que a começos do século XX alcançava 90% do total nom chega um século mais tarde a 34%. Esta questom é fundamental: inverno demográfico e desterritorializaçom


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“O Projeto Nacional deve construir-se sobre três elementos: a memória da origem colonial da situaçom jurídico-política, a referência territorial como eixo da luita anticapitalista do Movimento Independentista e a existência no país de dous sujeitos antagónicos enfrentados num conflito”

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som processos correlativos na Galiza. Enquanto, noutras sociedades próximas, a desruralizaçom ocorre nos períodos de forte crescimento demográfico1. Isto seria paradoxal, se interpretássemos ambos fenómenos como partes do processo espontâneo de modernizaçom capitalista, mas em realidade a desterritorializaçom e os obstáculos para a reproduçom física do nosso povo, ao daremse por junto, revelam-se como elementos basilares do projeto colonial e assimilador do capitalismo espanhol para a Galiza. No contexto do capitalismo maduro, o território, concetualizado como espaço contentor abstrato, tornou-se capital: infraestruturas energéticas, vias de transporte, matérias primas, urbanizaçom e turistificaçom, etc. mas para essa valorizaçom do espaço é fulcral o despovoamento do território e a desvinculaçom territorial das populaçons antes territorializadas. Despovoamento e desvinculaçom fam-se fatíveis especialmente sob o pano de fundo das sociedades colonizadas e em avançado estado de assimilaçom. Abatimento cultural e ameaças supremacistas: a dimensom cultural Costumes, horários, calendários, alimentaçom, hábitos quotidianos, visom do mundo, etc., em todos estes aspetos a espanholizaçom da populaçom galega é a cada mais evidente. O indicador mais estudado dos problemas que está a encontrar o povo galego para reproduzir a sua cultura é a língua e os dados de que dispomos som verdadeiramente aterradores. Além disso, qualquer tímido reconhecimento dos direitos linguísticos do nosso Povo é combatido com toda a sanha de que é capaz o supremacismo espanhol. A prova mais evidente foi o boicote à legislaçom educativa durante o período que vai de 2005 ao 2009, dirigido pola imprensa espanhola, seguida polos setores mais assimilados das classes médias urbanas, numha operaçom propagandística de clara motivaçom supremacista. Este fenômeno do supremacismo, explicitamente linguístico, mas realmente cultural e nacional, demostrou o caráter dual da sociedade galega formada por umha maioria assimilável, em que se reconhecem ainda elementos fundamentais da identidade nacional, e umha minoria totalmente assimilada e assimiladora radicalmente valedora da desvantagem sócio-económica da cultura nacional. Dualidade que, embora nom se traduz sistemati1. No caso espanhol, o período de maior desruralizaçom acontece entre 1960 e 1980 e coincide com a fase de maior expansom demográfica. E mesmo em Portugal, onde a desagrarizaçom e expansom demográfica correm simultáneos nas duas décadas entre 1970 e 1990. Na CAG, no período de maior deruralizaçom (1980-2000), onde a populaçom rural descende mais 35%, o número total de habitantes diminue também, embora ligeiramente, em quase 36.000 pessoas.


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camente em termos políticos, manifesta-se esporadicamente a cada que a minoria supremacista considera ameaçado o status quo, demostrando-se destarte a falsidade dumha suposta homogeneidade social galega. Quer dizer, seria imperdonável nom levar isto em conta e cair, mais umha vez, na ingenuidade de incluir à totalidade da sociedade existente na Galiza baixo o conceito de Povo Galego. O Projeto Nacional Galego deve pois construir-se política e socialmente sobre a base destes três elementos da consciência nacional: a memória da origem colonial da situaçom jurídico-política presente, a referência territorial como eixo da luita anticapitalista e anticolonial do movimiento Independentista e a existência no país de dous sujeitos antagónicos enfrentados num conflito que é, ao mesmo tempo, social e nacional. 1. 4. Situaçom no campo sócio-político nacionalista e independentista trataremos de perfilar a fotografia panorámica do campo nacionalista galego e, a partir dela, em sucessivos apartados, definir os nossos objetivos e reptos como independentistas: 1. 4. 1. Umha viragem soberanista no discursivo sem umha estratégia concreta de rutura que o acompanhe. O BNG aprova na XIII As- 17 sembleia Nacional de janeiro de 2012 e reafirma na XIV de março de 2013 umha viragem soberanista que se complementa com a intensificaçom do trabalho na rua e a conflituosidade. Este é um importante fator para valorizar e compreender as recentes evoluiçons da política nacionalista e a sua diagnose é fulcral para definir a tática e a estratégia acertadas. A sua implementaçom supujo, sotto voce, embora sem umha autocrítica da sua histórica evoluiçom autonomista, a assunçom informal da deriva em que a UPG mergulhara o nacionalismo hegemónico décadas atrás. Deriva que setores independentistas já diagnosticam em 1976, em plena Transición, mas que a posteriori sofre sucessivos e decisivos golpes de leme que a afundam e fam a cada mais notória. A título descritivo cabe assinalar a crise de 1981, os efeitos do acatamento formal da Constituiçom espanhola em 1985, a colaboraçom com o Estado na repressom do EGPGC, a reivindicaçom do Estado espanhol plurinacional da mao de CIU e PNV com a Declaraçom de Barcelona que assina X. m. Beiras (1998), o anti-independentismo como filosofia da açom político-social, a política de X. m. Beiras de pacto com o PP “em chave de país”, a atuaçom da direçom de Nunca mais quando decidiu repressar a mobilizaçom popular com a olhada posta nas Eleiçons municipais 2003, a assunçom da política de infraestruturas selvagens do Estado e das transnacionais espanholas da construçom no país, a etapa do bipartido autonómico, que eleva ao zénite contradiçons larvadas tempo atrás e, finalmente, como significativa coroa de loureiro, a reivindicaçom do Estatuto de Naçom “com encaixe constitucional” que, ainda em


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2011, abre o curso político do BNG, formalizando a posiçom autonomista. É significativo neste sentido que, numha recente entrevista2, o ex Secretário Geral da UPG Francisco Rodríguez admitisse que durante décadas a reivindicaçom soberanista foi para o BNG um “eslogam tópico”, carente de estratégia concreta e submetido a umha “tensom muito forte por essa ideia de governar”, já que, segundo Rodríguez, o Bloco chegara de fato à conclusom, em contradiçom com os presupostos teóricos fundacionais, de que o sistema autonómico era “um marco possível para executar umha política distinta”. No entanto, o próprio dirigente da UPG, se bem sugeria que esta posiçom pudo ser correta da década de 80 até 1996, “ao melhor”, reconhecia quase vinte anos depois que “hoje, isso é falso”, confirmando dum modo discreto a deriva autonomista do BNG. Além de que podamos rastejar os sintomas embrionários desta deriva e da conversom do Bloco numha imperfeita organizaçom sistémica na noite da Transición, esta, como estendida percepçom social, só se evidenciou em plenitude na etapa do bipartido autonómico (2005-2009) quando o Bloco já se apresenta como umha força institucional homologada. A evidência salda-se com o crescente distanciamento crítico dos setores mais conscientes e combativos da sua base eleitoral e social, a perda da Junta da Galiza 18 após a queda3 eleitoral de 2009, as cisons de signo independentista, que a diferença do passado se subordinam criticamente ao Bloco, a passagem à oposiçom e novos declínios em votos e legitimidade. Como pano de fundo, umha aposta estratégica autonomista da direçom histórica do nacionalismo que, a cámbio de reduzir a simples retórica a reivindicaçom da soberania nacional, renunciar ao conflito político e supeditar a auto-organizaçom popular ao objetivo eleitoral, pretendia tomar as instituiçons espanholas na Galiza e desde ai aplicar políticas para salvar o país com o engorde programado dum empresariado autótone que sempre se sentiu melhor defendido polos partidos turnantes da oligarquia espanhola. Esta estratégia, dada em chamar quintanismo, questionada por amplos setores nacionalistas e genericamente demonizada por próprios e alheios após a perda da Junta da CAG em 2009, foi, em realidade, umha construçom inteletual e material da UPG e dumha política de Salvaçom Nacional que tinha o seu pear básico na gestom das instituiçons autonómicas. Os réditos positivos da etapa, que os houvo, nom logram opacar no entanto as duas principais liçons negativas do fracasso colheitado polo BNG: primeira, é inviável aplicar um programa substancial de defesa do país desde um entramado institucional carente de poder real de decisom, com o agravante de depender para a tarefa de partidos comprometidos com o Estado e agir acatando os limites do quadro jurídico-político. O que foi desde sempre um axioma irrebatível, é hoje ainda mais 2. Capítulo 10 do programa “O Debate” em Irmandade TV 3. Perda de 44.323 votos e três pontos percentuais entre 2005 e 2009


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“A implementaçom do giro soberanista supujo, sotto voce, a assunçom informal da deriva autonomista em que a UPG mergulhara o nacionalismo hegemónico décadas atrás” evidente num país sem poder financeiro próprio, com instituiçons administrativas intervidas e submetido a intensos processos de recentralizaçom. Segunda, os setores burgueses autótones, que jamais fôrom burguesia nacional, mas apéndice subordinado da oligarquia espanhola no país, carecem de interesse no projeto nacional e, significativamente, rechaçam incluso as tentativas mais epidérmicas de galeguizaçom. Converte-los em sujeito principal para a construçom nacional galega é, para além dum erro estratégico e umha traiçom às classes populares do país, umha evidente perda de tempo incluso com o intuito de desenvolver a tarefa pretendida. Os custos da falida estratégia quintanista, que transformava já definitivamente o povo trabalhador galego na massa eleitoral de manobra da estratégia autonomista, e já fora aplicada tempo antes nos grandes concelhos do país, fôrom altísimos para a credibilidade social do BNG, estragárom a confiança depositada no nacionalismo e um valioso capital histórico de luita e encontram-se na base, por reaçom, do sucesso do fenómeno AGE. Afirmar portanto, com esta 19 perspetiva temporal, que o BNG “nunca se moveu de posiçons soberanistas”, como asseguram destacados dirigentes, quando apostou historicamente –quando menos, desde a década de 80- na gestom da institucionalidade espanhola na Galiza desde o respeito ao quadro legal e na reforma do Estado espanhol frente à estratégia de rutura e o independentismo, é pois um engano inacetável. Se esta estratégia institucionalista era irrisória como instrumento principal ou exclusivo de defesa do país quando se desenhou e aplicou, é-o ainda mais hoje, com um processo de recentralizaçom política, financeira e económica em curso e umhas instituiçons autonómicas maniatadas por teitos constitucionais de déficit público, invasom de ámbitos competenciais e a intervençom de fato por madrid e Bruxelas. Se nas atuais circunstáncias agravadas, o nacionalismo institucionalista pretendesse com a viragem soberanista reeditar a velha fórmula, mas empregando novos rostos e discursos e falsas aparências de radicalidade, quando aprofundamos num cenário de pauperizaçom generalizada, abstencionismo maciço e recentralizaçom, revelaria umha incapacidade preocupante para tirar as conclusons do sucedido e agir em consequência ou, o que seria ainda pior, umha indisposiçom genética e insuperável para assumir umha perspetiva unilateral de conflito e rutura com Espanha. Neste último caso, validaria-se a vigência da tese histórica, que assegura que a pequena burguesia nacional à frente do nacionalismo, devido à posiçom de relativa comodidade que desfruta no marco colonial, é um lastre absoluto para o desenvolvimento do processo de liberaçom nacional.


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“O BNG ainda nom pujo sobre a mesa umha nova estratégia independentista que vaia para além da retórica e assuma a perspetiva unilateral de rutura com Espanha”

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A XIII Assembleia Nacional do BNG tratará de ser o torniquete a esta prolongada sangria de votos e de legitimidade que o velho nacionalismo popular inicia em 2001 após alcançar históricos teitos eleitorais e tocar fundo, até agora, em 21 de outubro de 2012. Só o tempo confirmará se com a viragem soberanista aprovado neste conclave, que se reforça com a XIV Assembleia Nacional, o BNG pretendia resetear-se e perfilar umha estratégia soberanista unilateral de rutura com o Estado como asseguram os seus setores mais progressivos e, necessariamente, portanto, de confronto, ou se, como é provável, à vista de como a sua direçom perspetiva historicamente o conflito, se tratava apenas dum movimento tático para sortear um tempo de crise e deslegitimaçom social, reagrupar o nacionalismo reformista, recuperar a hegemonia sobre este -hoje debilitada após o surgimento do fenómeno AGE-, assimilar o independentismo minoritário e retornar, com o tempo, quando se alcançar umha hipotética nova fase de estabilizaçom económica e institucional, ao reformismo autonomista conhecido. Neste sentido, a experiência histórica nom convida ao otimismo. Que sejam os negativos resultados eleitorais de 21 de outubro de 2012, com a irrupçom de AGE no parlamento autonómico com nove deputadas e deputados, arrastando consigo parte da tradicional base eleitoral do BNG e do independentismo, os que acelerem a viragem soberanista, reforçando, de fato, a centralidade da reivindicaçom da soberania política na agenda do Bloco, nom é o melhor dos sintomas, mas para além das dúvidas razonáveis sobre se esta evoluiçom é tática ou estratégica, achamos que o passo dado, por volta do reconhecimento formal de que o quadro autonómico está esgotado e cumpre abrir vias face a independência, com as contradiçons, resistências e insuficiências reconhecíveis, é positivo para o país e para o independentismo e devemos fomentar a sua consolidaçom evitando que velhos juízos e prejuízos impedam reconhecer a existência de mudanças significativas e, sobretodo, novas possibilidades. Nesta radicalizaçom aparente, para além das convulsons do cenário eleitoral, joga também um papel fulcral o cenário de crise social e económica, de crise do modelo estatal, de crise de legitimidade democrática do Reino de Espanha e, em particular, de profunda crise da democracia representativa, que salpica umha força que como o Bloco apostou as suas cartas na política institucional. Neste contexto crítico o BNG enfrenta-se ao dilema de se minorizar ainda mais, sendo substituido no rol institucional tradicional por novos agentes que nom representam em absoluto a superaçom qualitativa da estratégia conhecida e, para além da sua vaga


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retórica antissistema, som também institucionalistas e retrocedem desde posiçons consolidadas como o princípio de auto-organizaçom, ou tratar de recuperar a iniciativa, e a razom de ser originária, situando a soberania no centro da sua agenda política. Intuimos que, se as eleiçons de 21 de outubro de 2012 se saldassem com resultados aceitáveis para o Bloco e reduzissem AGE a posiçons residuais, provavelmente a direçom daquel manteria os traços caraterísticos do seu comportamento timorato e hegemonista. Esta diagnose fai com que na nossa valorizaçom do viragem soberanista se imponha a cautela e, à espera de dados que confirmem o contrário, o ceticismo sobre o seu percorrido estratégico. No entanto, esta prudência necessária é compatível com a disposiçom plena a trabalhar nas presentes e futuras unidades de açom soberanistas, testando dia após dia a profundidade da mudança e compatibilizando esta tarefa com a construçom do projeto político e o movimento pola independência nacional e o socialismo. Em todo caso, rechaçamos posiçons expetantes que, desresponsabilizando o independentismo das suas próprias tarefas, cifram as possibilidades de desenvolvimento deste na qualidade da viragem soberanista e desvalorizam décadas de trabalho e luita que fôrom decisivas para que, hoje, o binómio independência e socialismo esteja acima da mesa de todas as formaçons nacionalistas e independentistas e debates que até há pouco eram tabu se encontrem agora abertos em canal. 21 Neste sentido, coincidimos com setores patrióticos hoje integrados no BNG en que, após décadas de reformismo e moderaçom, com umha militáncia –sobretodo, juvenil- educada no eleitoralismo, o acatamento do marco legal, a carreira política e a renúncia à conflituosidade como umha das forjas da naçom, a viragem necessita mais do que palavras, fotos e declaraçons mediáticas para se verificar. As evoluiçons dos últimos meses indicam a existência de distintas velocidades e resistências internas à sua implementaçom cuja fortaleza devemos contrastar. Além destas valorizaçons, achamos positivo, em chave de país e de politizaçom da sociedade galega, o corrimento geral do mapa político nacionalista face posiçons soberanistas produzido nos dous últimos anos e a crescente normalizaçom social que alcança hoje a posiçom independentista, com um peso sociológico muito superior ao que podem dar a entender os pírricos resultados no cenário eleitoral. É também um último elemento a destacar o fato de que o BNG ainda nom pugesse sobre a mesa umha nova estratégia independentista que vaia para além da mudança e radicalizaçom da retórica e ultrapasse a prática tradicional limitada a traduzir em maiores quotas de presença institucional o trabalho social e político diário como máxima expressom da política nacionalista. Isto, num contexto de indiferença geral face a política institucional, com processos maciços de deterioraçom das condiçons de vida e empobrecimento, com instituiçons autonómicas esvaziadas de poder de gestom e intervindas polo Estado e a troika, é umha deficiência gritante. Admitir


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o esgotamento da via estatutária é um fato positivo, mas faze-lo sem implementar estratégias substitutivas das que em teoria se abandonam e, portanto, ruturistas e unilaterais, pondo as bases para desennvolve-las, suporia ficar a meio caminho. É neste último ponto, no entanto, onde da nossa ótica reside o cerne da debate a respeito da condiçom tática ou estratégica da viragem soberanista: se este se limitar a umha radicalizaçom discursiva acompanhada da intensificaçom da conflituosidade social, mas sem implementar umha nova estratégia e sem revisar o papel que nela desempenha a presença institucional, estaremos ante umha mudança a médias desenhada apenas para salvar os móveis da queima à que som submetidas agora todas as formaçons com presença institucional. Seria previsível, neste cenário, que umha vez o Estado espanhol alcançasse umha nova fase de estabilidade económica e política, as águas retornassem ao rego da política autonomista e a gestom. Se, por contra, a viragem for estratégica, o BNG deveria definir umha nova estratégia irredutível a limar as suas aristas mais reformistas e a canalizar de novo face as instituiçons o descontentamento social. 1. 4. 2. O beirismo demonstrou de novo neste período a sua histórica indisposiçom para articular, para além do marketing radical e as declaraçons de aparência transgressora, um projeto superador do do nacionalismo hegemónico. Após a cisom do BNG, involuciona 22 face posiçons pré-nacionalistas com a aliança eleitoral com a filial galega de IU, particularmente espanholizada, com a que se pretendeu, e logrou, superar a barreira eleitoral imposta polo PP para ambas forças acederem ao parlamento autonómico, e com a desvalorizaçom da questom nacional, que é constrangida em palavras do antes designado delfim martinho Noriega a simples questom identitária, que se separa de modo metafísico e se subordina a umha questom social inexistente fora dum marco nacional concreto. O repetido alegato beirista de que a esquerda espanhola “respeita” -como, por outra parte, fijo sempre formalmente na história do país- o direito de autodeterminaçom, embora nunca desenvolveu umha praxe coerente4 neste sentido, é a coarctada utilizada para justificar o injustificável. Como pano de fundo das manobras, a modalidade 3.0 do complexo do colonizado que analisara Albert memmi: a injeçom no corpo social nacionalista da dúvida sobre a “capacidade galega” para, contando com as nossas próprias forças e potencialidades, fazer frente à Segunda Transición e a desconfiança elitista da direçom do beirismo nas potencialidades revolucionárias do nosso povo que, em verdade, jamais pretendeu materializar. É significativo que os máximos valedores desta cisom artificial de prioridades –“o social antes que o nacional”-, que se apresenta como novidosa e fruto do contexto excecional, sejam quem 4. Olhar a posiçom da Izquierda Plural espanhola ante a Proposta nom de Lei sobre o Direito de Autodeterminaçom apresentada por BNG, Amaiur e ERC no parlamento espanhol no passado 8 de outubro


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“O beirismo confirmou que é um outro “encoro de contençom” do processo de liberaçom nacional” patuárom no seu dia a transformaçom cosmética do fascismo em monarquia constitucional espanhola, quem levam décadas a vender a classe trabalhadora galega com os pactos sociais e a traiçom sindical, ou quem, em plena crise do Reino, recuperárom do seu faiado ideológico um suposto federalismo nunca defendido com fatos que em última instáncia nom é outra cousa que a última tábua de salvamento da Unidad de España e a negaçom do direito a decidir do Povo Galego, como evidenciam os discursos de dirigentes como Cayo Lara ou Francisco Frutos, que negam de modo explícito o caráter unilateral dos processos secesionistas no Estado, ou o infeliz papel de ESkER ANItZA no desenvolvimento do conflito basco. Assim, para além da sua teatralidade, sucesso eleitoral e notório déficit de músculo militante real, o beirismo confirmou mais umha vez –como já diagnosticara há anos o seu máximo lider sobre o BNG- que é um “encoro de contençom”5 do processo de liberaçom nacional, que opta pola estabilidade autonómica e a “dignificaçom” (?) da atual engrenagem institucional frente à temida perspetiva da “erupçom social volcánica”. Que ante a açom produzida em 7 de outubro contra a câmara municipal de Beade, ANOVA manifestasse, além da sua “condena” esperável, que se atacara a “casa do povo”, 23 confundindo umha instituiçom espanhola de democracia formal e representativa com umha sorte de poder popular, evidencia até que ponto chega a confusom e o oportunismo político-ideológico dos beiristas. Neste contexto, os apelos retóricos a umha desobediência que à hora da verdade nunca se traduz em fatos nem em estratégias concretas de insubordinaçom ao Estado, venhem confirmar que o que representa a figura de Xosé manuel Beiras fica mais perto da teatralidade insubmissa que dumha posiçom real de conflito e rutura com o regime e o sistema. Existe, por último, um aspeto que é necessário valorizar: o fato de que esta fraude que o passo do tempo já está a desvelar fosse capaz de motivar eleitoralmente milhares de nacionalistas e independentistas desiludid@s e convence-l@s de que o engendro parlamentarista AGE era umha opçom “revolucionária”, “ruturista” ou apenas superior à do BNG. Da nossa ótica, só a combinatória da indignaçom face as renúncias e traiçons do Bloco, a estendida falta de formaçom político-ideológica em amplos setores da militáncia e do corpo social soberanista e a incapacidade do independentismo para substituir o BNG na articulaçom dum espaço sócio-político ruturista pudérom possibilitar a confusom provocada por volta de 21 de outubro de 2012. A isto devemos engadir o poder evocador do histórico lider circense e a aposta impúdica da mídia em AGE frente ao Bloco, visto polo sistema como um inimigo mais solvente a meio prazo. Acontecimentos como o affaire Iglesias Sueiro, ou a pro5. “A estratexia dinamita”. Faro de Vigo, 1.11.2003


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“Os apelos a umha desobediência que nunca se traduz em fatos concretos de insubordinaçom ao Estado confirmam o que representa a figura de Xosé Manuel Beiras” jeçom mediática da conflituosidade interna da coligaçom começam fazer visível que, embora envolvido com novas formas e retóricas, o fenómeno AGE nom é mais do que a nova expressom da velha esquerda reformista incapaz de confrontar-se com o regime assumindo as consequências da sua insubordinaçom.

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Como aspeto positivo, apontar que a cisom beirista e a importante mudança produzida no cenário institucional possibilitárom a remoçom dos marcos e da dialética interna do nacionalismo galego, dando passo a outras cujo final é incerto mas ilusionante. Que, neste novo contexto, se liquidasse ou difuminasse a anterior polaridade entre um autonomismo hegemónico nucleado no BNG e um independentismo fracionado e minoritário que pretendia dotar-se de referente político comum, passando a um cenário onde se transversaliza e fai formalmente hegemónica a posiçom independentista, é valorizável como positivo, porquanto à margem de cálculos partidaristas o é para o madurecimento da consciência nacional do nosso país. 1. 4. 3. Integraçom da FPG, mPB e FOGA em ANOVA. Após dous anos a participar com OLN, PCPG e CNm na mesa de organizaçons reunida periodicamente em Cangas para construir unidades de açom que asentassem as bases objetivas e subjetivas imprescindíveis para criar um referente independentista supra-fracional e de massas, as três formaçons renunciam em 2012 a este processo e avalizam a Posición Luís Soto legitimando a aliança com o espanholismo de esquerda. A praxe dos três partidos confirmou as prediçons mais sinistras sobre o seu oportunismo e inconsistência ideológica, a falta de clarificaçom política que sempre subjazeu às suas decisons, a preminência dumha primária fóbia anti-UPG que leva a abraçar como aliada a esquerda espanhola e o oportunismo de preferir ficar sob o guarda-chuvas do reformismo antes que assumir a construçom do projeto para a liberaçom nacional e social do país. 1. 4. 4. NÓS-UP: A existência neste país de dous projetos independentistas minoritários e similares em aparência6, que se enquadram em parámetros ruturistas ou revolucionários, operam à margem do nacionalismo hegemónico e rivalizam a diário polo liderado do espaço sócio-político independentista é, para o expetador ou expetadora desprejuizada, um fato de difícil compreensom. mais se trazemos em conta que a divisom ou multiplicaçom da oferta política independentista se dá numha sociedade onde a hegemonia espanholista é sólida, onde a façom nacionalista dominante pratica his6. Referimo-nos à organizaçom resultante do atual processo constituinte e a NÓS-Unidade Popular


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toricamente a conciliaçom com o Estado e onde o independentismo está minorizado e submetido a umha intensa repressom. É um local comum afirmar o caráter insustentável desta diversificaçom, de modo que identificar as suas causas é essencial para encontrar lógica nesta situaçom e, eventualmente, procurar superála. Estas causas, que já provocárom em 2005 a implosom da tentativa de acumulaçom de forças chamada ProcESSo ESPIrAL e a inviabilidade dumha convivência produtiva entre a nossa fraçom e o partido PrImEIrA LINhA, som da nossa ótica as seguintes: 1ª A questom da contradiçom principal. Existe umha divergência entre a posiçom histórica independentista, partilhada com o nacionalismo popular, que estabelece como tarefa principal a luita contra o colonialismo espanhol e pola independência nacional, posiçom que aliás situa estas conquistas como garante dumha abordagem verdadeiramente resolutiva doutras contradiçons sociais. Sem que isto signifique a carência dum programa social e económico próprio dumha organizaçom de esquerda revolucionária. Enquanto NÓSUP valoriza que as contradiçons nacional, de classe e de género tenhem significaçom e peso similares, sem que exista entre elas qualquer ordem de prioridade ou cessura. As consequências práticas desta divergência teórica som notáveis na linha discursiva, as políticas de alianças, o grau de ideologizaçom do trabalho político, a releváncia prática outorgada à construçom nacional, etc. 25 2ª A questom da direçom política do movimento. Umha segunda frente de dissenso estabelece-se entre o apriorismo nom constatado na praxe nem aceite pola massa social independentista de que umha vanguarda partidária comunista –PL, neste caso- é a direçom do mLNG, por umha parte, e a posiçom que valoriza que a direçom política do movimento constrói-se a partir da praxe, coesom interna e o conflito com Espanha, evitando as auto-proclamaçons mecánicas. Esta segunda divergência derivou no ProcESSo ESPIrAL numha tensom permanentemente larvada que fijo inviável o trabalho político conjunto e frustrou as expetativas. Aliás, fijo com que NÓS-UP se configurasse finalmente apenas como a façom independentista que aceita o liderado de PL, mas sem capacidade de integraçom de novos setores. 3ª Certas consideraçons sobre modalidades de luita do nosso povo e o seu encaixe político estratégico, completou a tríade de causas que motivárom a existência de dous projetos a concorrer por um espaço sócio-político similar. Identificadas as causas profundas da divisom no independentismo fica pendente fazer avaliaçom das recentes evoluiçons de NÓSUNIDADE POPULAR e olhar até que ponto a capacidade de condicionamento da praxe neste contexto de crise pode dar lugar a novos cenários que ultrapassem as causas assinaladas. Neste sentido, rebobinando o passado recente, NÓS-UP abandona


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“Facultamos a nova direçom a estabelecer um canal de interlocuçom estável com NÓS-UP para contrastar análises de conjuntura e procurar a convergência lá onde for fatível” CAUSA GALIZA em 2011 após manter quatro anos dumha presença quase inerte na iniciativa. A saída é fruto de dous fatores concatenados: por umha parte, a existência dum acordo que compromete as restantes fraçons independentistas para proteger o espaço comum de estilos de trabalho dirigistas e seitários que associam a esta formaçom. Por outra, a hegemonia em CAUSA GALIZA da posiçom que coloca a questom nacional galega como cerna exclusiva da sua linha de atuaçom, desbotando a de NÓS-UP, mais favorável a um discurso e umha praxe formalmente esquerdista e classista. O abandono resolve-se com a renuncia a se implicar a curto prazo em processos de unidade de açom e o ensaio num breve período -até se plasmar a viragem soberanista do BNGdumha linha de açom centrada no próprio afortalamento orgánico e político que definem na VI Assembleia Nacional como Firmeza nos princípios. Como dixemos, a viragem soberanista trastornará este inicial isolacionismo voluntário: NÓS-UP, que pouco tempo antes equiparava 26 de modo ideologista o BNG com o PP, negava o caráter principal da contradiçom entre nacionalismo e espanholismo, ou postulava umha retórica insurreicional como resposta à crise múltipla do Estado, inicia agora políticas de aproximaçom e acordos com a UPG, relaxa o confronto sistemático que historicamente mantivo com o Bloco ao que erroneamente identificava como inimigo e evolui, num curto período de tempo, para posiçons que admitem de fato a centralidade da questom nacional. Embora estas mutaçons ser condicionadas pola deriva discursiva e prática do BNG e sugerir motivaçons conjunturais e de oportunidade mais do que umha autêntica rutura ideológica com as posiçons mantidas até o presente, valorizamo-las como positivas, porquanto abrem o horizonte a novas possibilidades de convergência no trabalho diário e situam esta formaçom, de fato, numhas posiçons de frenteamplismo independentista, com pluralidade ideológica interna e convergência de distintas classes populares que, na pura teoria, refuga. Por outra parte, parece óbvio afirmar que, além de velhas rivalidades e das causas antes resenhadas, o novo cenário político, com iniciativas e dinámicas unitárias do nacionalismo e o independentismo, gera condiçons ótimas para descongelar a relaçom com NÓS-UP e explorar as possibilidades que para a expansom das posiçons independentistas no nosso país tenhem os novos marcos de trabalho. Neste sentido, queremos validar duas reflexons: 1ª É inviável num país com um independentismo que está socialmente minorizado manter a meio prazo vários projetos políticos independentistas que concorrem polo liderado deste espaço


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sócio-político e mantenhem relaçons de rivalidade. Para além de que esta divisom tenha motivaçons objetiváveis, o cenário que dela resulta desmobiliza, desmotiva e é incompreensível para o grosso da base sociológica do independentismo galego. Superá-lo a meio prazo é umha tarefa a intentar. 2º O cenário político aberto trás o terramoto ocorrido nestes meses no campo nacionalista, com o corrimento geral face posiçons independentistas e políticas embrionárias de unidade de açom, abre as portas a colaboraçons pontuais produtivas com NÓS-UP que embora nom resolvam as divergências de fundo podam facilitar encontros e acordos mais produtivos do que os conhecidos no passado. Neste sentido, e com o intuito de explorar possibilidades concretas de colaboraçom, a Asssembleia Nacional faculta a direçom sainte do processo a estabelecer um canal de interlocuçom estável com NÓS-UP para contrastar análises de conjuntura e procurar a convergência pontual naquelas questons em que seja fatível. 1. 4. 5. CAUSA GALIZA, como tentativa de articular umha resposta soberanista ampla à reforma do Estatuto de Autonomía que em 2007 polarizava as contradiçons com o nacionalismo estatutista, finaliza o seu ciclo histórico no Dia da Pátria 2012 com o conhecido fiasco mobilizador. A progressiva perda de apoios das organizaçons políticas que, em princípio, com mais ou menos conviçom, avalizárom a iniciativa, é umha das causas da implosom, porquanto era 27 esta diversidade a que lhe outorgava a legitimidade e potencial mobilizador dos que na altura, e hoje, careciam as fraçons independentistas por separado. Além deste fator, que fijo com que afinal o independentismo histórico ficasse em solitário a sustentar o projeto inicialmente partilhado, produzírom-se outros acontecimentos que mutárom o panorama político e, portanto, a funcionalidade e capacidade de CAUSA GALIZA. temos que apontar aqui a implementaçom da viragem soberanista do BNG, que diluiu as contradiçons antes explícitas entre independentistas e partidários do Estatuto de Nación, ou a irrupçom do fenómeno AGE que torna mais complexo o cenário e evidencia a fraqueza político-ideológica de organizaçons e pessoas que, nalgum momento, se reconheceram em ou estiveram comprometidas com CAUSA GALIZA. A valorizaçom crítica do processo temporal de unidade de açom independentista que supujo CAUSA GALIZA nom pode obviar no entanto que, junto com os elementos objetivos resenhados, que motivárom a morte por inaniçom da iniciativa, existírom também na sua fase terminal fatores engadidos atribuíveis em exclusiva a quem estivemos na sua origem, desenvolvimento e manutençom. Neste capítulo merece especial destaque a análise da nossa participaçom inicial na gestaçom do Novo ProjETo comUm de Xosé manuel Beiras. Se bem, contra o que de modo interesseiro se dixo, é falso que a CAUSA GALIZA final acreditasse no perfil independentista e ruturista deste projeto, sim devemos admitir no entanto que desde a necessária exploraçom inicial daquel processo se passou em questom de semanas a acreditar na possibilidade da incorporar o


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independentismo num projeto amplo, e internamente contraditório, que oferecesse perspetivas a meio prazo dumha hegemonia ruturista na sua direçom. Obviamente, esta postura cimentava-se em premissas em excesso otimistas que sobre-estimárom as nossas forças e infra-valorizárom as capacidades do expeditivo comité central do ENCONtRO IRmANDINhO como o tempo demonstrou. Aliás, a participaçom neste processo fijo-se num momento de desbandada das façons que se alojaram em CAUSA GALIZA, sem um debate em profundidade sobre o momento político e com certa desorientaçom nos objetivos concretos e o condicionamento constante por ritmos impostos desde o exterior. O resultado, previsível, foi umha extensom da confusom e a desafeiçom em setores do nosso movimento o que, somado à perda dos voláteis e inconsistentes apoios de CAUSA GALIZA, derivou na photo finish. A nossa equipa dirigente sobre-valorizou as capacidades para gerir com sucesso correlaçons de forças tam desequilibradas como as que existiam entre os setores que, afinal, configurárom ANOVA e a fraçom independentista da que fazemos parte quando, aliás, existia umha falta notável de coesom no nosso universo político e social sobre os passos que se estavam a produzir. As conclusons a extrazer da experiência vivida derivam da crítica apontada:

28 1ª O independentismo histórico, apesar da franca vontade para aglutinar as fraçons independentistas galegas em unidades de açom rumadas a meio prazo a edificar um referente independentista de massas, pospondo em favor desta tarefa o seu afortalamento organizativo, veu-se impedido para fazer de CAUSA GALIZA algo mais do que o guarda-chuvas unitário de determinadas datas reivindicativas. Isto, embora permitiu visibilizar um pólo sócio-político ruturista e a contradiçom entre estatutismo e soberanismo no campo nacionalista, foi insuficiente para dar passos qualitativos na articulaçom deste referente dada a falta de vontade real dos nossos companheiros de viagem como o tempo demonstrou. A evoluiçom final destes evidenciou a sua falta de disposiçom e clarificaçom político-ideológica. 2ª A coesom político-ideológica interna e a fortaleza organizativa som fatores a cuidar com delicadeza no futuro. É impensável 0 sucesso no condicionamento de processos que ultrapassam o universo fracional só com voluntarismo e fraqueza orgánica e política e com o lastre da falta de coesom e esclarecimento. 3º O ciclo que supujo CAUSA GALIZA e décadas de luita independentista logrou a socializaçom da ideia elementar de que a conquista da soberania política é a chave do desenvolvimento do processo de liberaçom nacional e social. hoje, quando menos, formalmente, a totalidade do arco nacionalista galego assume o esgotamento do estatutismo e admite que a possessom dum Estado próprio é um elemento imprescindível para a defesa da naçom e a alfândega de passagem obrigada para transformar o modelo sócio-económico e


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“Destacamos o sucesso alcançado na socializaçom da ideia de que a soberania política é a chave do desenvolvimento do processo de liberaçom nacional e social” institucional. Aliás, com erros inevitáveis numha tarefa destas caraterísticas, a fraçom histórica demonstrou modestamente ser valedora teórica e prática dum frenteamplismo independentista, que se distancia tanto de posiçons reformistas como de radicalismos que constrangem o independentismo a ser umha inofensiva seita ideológica. 1. 4. 6. A política de unidade de açom soberanista é um fator importante a nível tático nas reflexons a analisar nesta Assembleia Nacional. Como critério guia, achamos que o frenteamplismo soberanista e a convergência na praxe de agentes nacionalistas e independentistas sob parámetros de rutura democrática é, em princípio, um fato positivo mais ainda no atual cenário de crise do Reino de Espanha e do sistema económico, porquanto supujo o abandono formal de teses estatutistas polo Bloco; o reconhecimento de que a conquista da soberania nacional, longe de ser um objetivo retórico e lonjano, é a cerna face a que encaminhar o trabalho social, sindical e político; a assunçom de que o campo 29 soberanista é irredutível ao BNG e, sobretodo, porque a unidade de açom entre distintos projetos e estratégias soberanistas tem um efeito multiplicador e pode permitir, se esta é a vontade dos distintos agentes e, em particular, devido à posiçom que ocupa, do BNG, articular um muro de contestaçom popular aos processos de recentralizaçom e empobrecimento, assim como levantar alternativas a umha eventual Segunda Transición. À margem da sua virtualidade final e das desconfianças que suscitam, estas mutaçons som positivas e achamos que o independentismo histórico deve participar de modo ativo nestas dinámicas procurando afortalar a consciência nacional e evitando ser um passivo companheiro de viagem. As concreçons práticas nestes 24 meses dos novos cenários de unidade de açom soberanista e independentista fôrom no entanto cativas, sempre sujeitas como era de esperar a desencaixes produto de desconfianças e distintos ritmos de trabalho e epidérmicas, no sentido de se reduzirem a atos pontuais e litúrgicos e nom facilitar, até o momento, umha mestizagem ou convivência na açom diária de façons soberanistas. Ao fio desta reflexom, e sem demérito da vontade de impulsionar estas unidades de açom, queremos destacar três questons: 1ª A continuidade nos setores hegemónicos nestas unidades de açom soberanistas dumha mentalidade que compreende a social-


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“Está por verificar ainda na praxe qual é a funcionalidade e o percorrido final que o setor hegemónico nestes processos pretende dar a estas embrionárias unidades de açom” izaçom da necessidade da soberania política como um mero processo didático de massas em que umha minoria ilustrada convence umha maioria desnacionalizada da superioridade da sua opçom estratégica através do discurso e da batalha ideológica – palestras, materiais, etc.-, mas sem fatos. Esta dinámica, embora positiva, é insuficiente, porque nom é só através do discurso e da batalha ideológica, mas, sobretodo, através da pedagogia dos fatos, da auto-organizaçom, do próprio conflito e, em concreto, do tensionamento dos limites, que se logra a socializaçom da posiçom soberanista. A persistência da falsa crença que sustenta que “primeiro educar [dum modo vertical] e logo agir” condiciona à baixa as potencialidades do trabalho a desenvolver. 2ª Está por verificar ainda sobre a praxe qual é a funcionalidade e o percorrido final que o setor hegemónico nestes processos pretende dar a estas embrionárias unidades de açom, e se superará, e de que modo, as contradiçons e resistencias internas à deriva independentista que anuncia. À vista dos fatos, é de assinalar como 30 dado preocupante que a viragem discursiva produzida junto à intensificaçom da presença na mobilizaçom social nom venha acompanhada dumha nova estratégia que supere a prática histórica que situa como finalidade última do trabalho social, sindical e político o engorde da presença institucional do nacionalismo. De se perpetuar a aplicaçom desta fórmula esgotada num cenário de esvaziamento da raquítica capacidade de decisom da institucionalidade espanhola na Galiza, e de abstencionismo maciço, constatariamos que as auto-limitaçons da viragem soberanista convertem este, mais umha vez, em insuficiente. 3ª Cientes da desequilibrada correlaçom de forças existente entre nacionalismo institucionalista e independentismos achamos que os setores ruturistas que concorremos nestas unidades de açom devemos fomentar a sua profundizaçom e radicalizaçom, evitando o formalismo e a litúrgia e a sua conversom no eventual acompanhamento dumha estratégia eleitoralista ou na re-legitimaçom de apostas políticas esgotadas. Assim, o nosso trabalho dirigirá-se a construir dinámicas de confiança e reptos comuns com outros independentismos sempre que for viável, assim como à comarcalizaçom efetiva destes processos, evitando que se limitem a atos super-estruturais. 1. 4. 7. Fortaleza social do nacionalismo vs. relativa debilidade política e ideológica. A visom panorámica do campo nacionalista galego ficaria coxa neste diagnóstico se se constranger à análise das forças e correntes políticas que nele concorrem e, ainda mais,


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se a valorizaçom da sua influência social se limitar à sua representatividade eleitoral ou institucional. Felizmente, a capacidade de condicionamento objetivável do soberanismo no país transcende estes indicadores, como demonstra a existência dum movimento sindical autótone sem parangom nas naçons europeias sem Estado, a participaçom popular nas luitas em defesa da sanidade, o ensino ou o direito à vivenda, a ampla e dispersa conflituosidade social por volta de luitas em defesa da terra frente à política de ordenaçom territorial e infraestruturas, a presença de centenas de patriotas galegas e galegos agindo dia após dia em distintas redes associativistas, o fenómeno dos centros sociais independentistas, etc. Neste sentido, a negativa visom do povo galego que construírom certas elites nacionalistas galegas ligadas à pequena burguesia, incidindo de modo suspeitamente reiterativo na ideia de que a nossa é umha sociedade com graves déficits de consciência nacional, incapaz para a auto-organizaçom, lastrada por complexos de inferioridade fruto da colonizaçom, etc., embora tivo e tem elementos objetivos, é também umha construçom ideal que reforça umha auto-perceçom coletiva negativa e, aliás, serviu e serve de perfeita coarctada ideológica aos seus desenhadores para se acomodarem na gestom do realmente existente e renunciarem a implementar umha estratégia independentista como é a que exige o discurso que denuncia o colonialismo espanhol. 1. 4. 8. Ausência dumha referência política legitimada pola base so- 31 cial independentista. O independentismo chega a 2013 numha situaçom paradoxal: logra fixar-se como a posiçom que é formalmente hegemónica no campo nacionalista após anos a caminhar em solitário8, estende o rechaço à via estatutária e a reivindicaçom do Estado próprio a setores antes autonomistas, atinge com o seu imaginário novas geraçons de militantes e concita amplas solidariedades com os presos independentistas, mas nas suas expressons políticas autónomas evidencia umha fraca influência social e debilidade organizativa. Embora é complexo analisar as causas últimas desta deficiência, cabe responsabilizar da estendida indisposiçom para solventá-la aos sinistros efeitos dos fracassos colheitados nas tentativas de articular o movimento como proposta global –FPG originária, APU, PROCESSO ESPIRAL, BDG, CAUSA GALIZA, etc.-. Este fator, engadido à viciada conflituosidade interna que padecemos, e à atomizaçom da oferta independentista no ámbito político e juvenil, desmotiva e dispersa a militáncia provocando a preferência geral de compromissos setoriais e relatos parciais que agem como alternativa, insuficiente, da nossa ótica, à inexistência do projeto político e à estruturaçom dum movimento e estratégia globais. Um outro fator a considerar é a transversalidade que alcançou a posiçom independentista nos dous últimos anos, que fijo com que se manifestasse em distintas opçons políticas –BNG, UPG, etc.-, tirasse músculo social e contasse formalmente com várias expres8. Olhe-se como exemplo temporal próximo o trabalho da geraçom AMI que, em ´solitário, sem referência política adulta, mantivo em pe a bandeira da independência durante um longo período


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sons que se reivindicam de modo explícito neste sentido (ANOVA, mGS, NÓS-UP e a nossa Organizaçom). Este cenário, do ponto de vista nacionalista, é superior ao de um independentismo minorizado e aquartelado numha ou várias opçons políticas residuais. No entanto, deixa irresolta a necessidade dum referente político de massas com estratégia própria. É previsível que, a curto ou meio prazo, os tabiques que dividem e separam as opçons independentistas mantenham vigência. No entanto, por parte da Organizaçom, junto à tarefa de construir um projeto independentista e ruturista imbricado no movimento popular, é necessário fomentar a mestizagem na rua entre os setores independentistas, o diálogo normalizado e o debate político-ideológico como contributos a que no futuro haja condiçons para convergências orgánicas. 1. 4. 9. Campo soberanista em processo de recomposiçom. A crise do campo nacionalista galego que precipita em 2012 move aparentemente os marcos tradicionais de referência9 e supujo um corrimento geral face posiçons independentistas cuja profundidade só o tempo demonstrará. No melhor dos cenários imagináveis, à fase atual de confusom sucederia umha outra de decantaçom de projetos e estratégias com o redesenho do campo nacionalista num novo projeto de nacionalismo institucionalista, um outro independentista de rutura com Espanha e fugas definitivas face o espanholismo. Neste sentido a nossa corrente deve agir simultaneamente 32 nas unidades de açom e na conflituosidade social e a construçom nacional, perfilando o seu próprio projeto e estratégia, para sair quantitativa e qualitativamente reforçada dos processos com independência da deriva final doutros agentes que intervenhem neles. 1. 4. 10. Perspetivas a meio prazo. A expensas das mudanças que se produzam nos próximos anos, o atual equilíbrio de forças entre nacionalismo e espanholismo nom convida a pensar numha saída soberanista à crise como horizonte realista a meio prazo como formula o BNG, nem na celebraçom dum processo nacional constituinte ou declaraçons unilaterais de independência, à diferença do que sim pode suceder no Principat de Catalunya ou em hego Euskal herria. A conformaçom específica da sociedade galega e o fato de o nacionalismo hegemónico renunciar há décadas a combater o quadro estatutário a cámbio da sua gestom figérom com que, hoje, o esgotamento deste seja mais fruto da sua ineficiência e ilegitimidade que da existência de poderosos atores políticos e sociais comprometidos na sua superaçom. Assim as cousas, caminhamos face cenários de generalizaçom do empobrecimento e a precariedade, recentralizaçom do Estado, perda de peso político, económico e demográfico da Galiza e aumento da repressom seletiva e ambiental que, no entanto, som umha oportunidade para o avanço do processo de liberaçom nacional. Neste contexto, as nossas expetativas devem centrar-se em construir e consolidar umha estratégia 9. Viragem soberanista, cisons do BNG que rematam em aliança com a esquerda espanhola, evoluiçom geral face posiçons independentistas, embrionária unidade de açom do nacionalismo institucionalista com o independentismo, fraçons independentistas avalizando acordos políticos com EU-IU, etc


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“É necessário fomentar a mestizagem na rua entre setores independentistas, o diálogo normalizado e o debate” independentista a longo prazo e afortalar o independentismo como projeto e alternativa de massas. O papel que deve aspirar a jogar a Organizaçom, além dos citados, é favorecer o madurecimento do debate político e ideológico no campo soberanista, fomentar as unidades de açom e a mestizagem dos setores nacionalistas, alimentar a radicalizaçom da auto-organizaçom e a mobilizaçom popular e configurar-se, através dos fatos, como a referência política legítima para @s independentistas que militam nos movimentos populares e rechaçam qualquer conciliaçom com o Estado espanhol. 1. 4. 11. Centralidade da batalha política e ideológica. Agir com efetividade nestes cenários, condicionando-os e, na medida do que for possível, orientando-os, requer organizaçom, liderado e estratégia, mas também capacidade comunicativa e militantes preparadas para o debate na sociedade e no nacionalismo, politicamente formadas e capazes de identificar e tensionar as contradiçons lá onde se encontrarem. Neste sentido, a batalha ideológica rumará-se a ganhar setores crescentes das classes populares para a superioridade tática e estratégica da posiçom independentista, combatendo o nen- 33 guneio ou relativizaçom da questom nacional assim como as perspetivas de fuga do sistema ou rechaço à construçom do Estado galego. Dar esta batalha em condiçons exige a curto prazo dotar a fraçom dum aparato de comunicaçom que ultapasse as deficiências atuais neste terreno. 1. 4. 12. O independentismo histórico chega a 2014 em situaçom como dixemos antes paradoxal: logrou, após décadas de caminho no deserto, situar o ideal independentista na agenda política do país, manter em pé umha radicalidade teórica e prática de base nacional e agir como um catalisador para a construçom nacional, mas chega muito debilitado para condicionar a evoluiçom dos novos cenários. Os negativos efeitos subjetivos que tivérom os fracassos nas tentativas de articulá-lo politicamente, a erosom interna que supujo o debate sobre o papel da política no movimento, a repressom, a falta de quadros, a expansom de certa cultura anti-organizaçom, o déficit formativo, as políticas de marginalizaçom ativa ou passiva ainda em vigor praticadas por outras façons nacionalistas, a falta de transmissom inter-geracional normalizada do projeto estratégico, etc. figérom com que, hoje, as potencialidades de desenvolvimento do nosso projeto estejam muito por cima da sua materialidade atual. Assim, numha primeira visom panorámica, é de destacar o valioso legado de luita e honestidade, de entrega militante e persistência na defesa dos objetivos estratégicos em contextos de repressom e forte minorizaçom social. Achamos que nom é exagero ou auto-


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“As organizaçons que se reclamam do independentismo revolucionário evidenciam neste novo ciclo claros sintomas de esgotamento” compracência tribal dizer que, se se configurou neste país um independentismo contemporáneo, é graças a este legado construido por homes e mulheres que, no seu dia, desouvindo as pragmáticas palavras-de-ordem do nacionalismo hegemónico, decidírom por toda a carne no assador. Por outra parte, é evidente o sucesso colheitado à hora de impregnar com o seu imaginário novas geraçons militantes, à margem da filiaçom concreta que ostentem, condicionando certas posiçons do BNG e normalizando umha reivindicaçom nacional de máximos após décadas de se confrontar com um nacionalismo reácio a fazer expressons claras da reivindicaçom nacional. Por último, é também constatável o sucesso alcançado por distintos projetos de construçom nacional que tivérom como matriz o independentismo histórico, como os centros sociais, o movimento reintegracionista, a reivindicaçom de seleçons desportivas nacionais, a prática da solidariedade contra a repressom, a luita contra a opressom colonial com todos os meios possíveis, etc. À beira das que já som achegas historicamente inegáveis, as estruturas e organizaçons que se reclamam do independentismo revolucionário evidenciam neste novo ciclo claros sintomas de esgotamento que 34 afetam a totalidade delas (AmI, OLN, CEIVAR, a própria CAUSA GALIZA, etc.). Esgotamento que se traduz nestes momentos em debilidade organizativa geral; fraqueza da nossa iniciativa política e setorial no momento em que é mais necessária, facilitando o passo a diversos radicalismos estéticos que, em ocasions, nem sequer partem de premissas independentistas; falta de orientaçom e coesom a respeito do caminho a seguir no imediato, etc. Da ótica das e dos militantes que participamos neste processo de debate é premissa inquestionada a ideia de que à margem das evoluiçons ocorridas neste biénio no campo nacionalista é imprescindível um projeto político independentista e ruturista, com vocaçom de massas, liberado dos lastres do seitarismo e do ideologismo esquerdista tam inflamados em retórica como cativos nos fatos, que trabalhe com perspetiva de movimento nacional e estratégia própria. Quem conhecer internamente o nosso universo sócio-político já estará ciente de que nom será com estilos imperativos nem verticalistas como se acadar o necessário resseteado coletivo, mas só através da construçom de novas condiçons subjetivas e objetivas, através do diálogo, o debate e a praxe, que superem velhos debates internos e nos situem com perspetiva de futuro. 1. 4. 13. Violência política, repressom e solidariedade. O desenvolvimento no país desde 2005 dumha violência política de baixa intensidade troujo, para além da sua própria existência, que evidencia umha continuidade histórica com breves interrupçons temporais de dinámicas de confronto ilegal com o Estado espanhol, dous elementos novidosos no cenário político-social galego.


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“A brutalidade da repressom gerou (...) a estendida perceçom social de que os retaliados nom som delinquentes, mas militantes ao serviço da causa galega” Por umha parte, a implementaçom polo Estado de níveis crescentes de repressom para o seu combate que batem com força n@s militantes retaliad@s e abrem as portas no futuro imediato para a maior criminalizaçom e pressom policial e penal sobre as organizaçons políticas, setoriais e sociais às que Estado deseje aplicar a Teoria da contorna. O auto 00024/2013 da Audiencia Nacional que formaliza a existência jurídica no país dumha organizaçom terrorista ativa, à vez que condena quatro militantes a penas desorbitadas e anuncia em breve novas sentenças exemplarizantes, poderia supor, sempre em funçom da evoluiçom do contexto sócio-económico e político nacional, a aplicaçom a meio prazo de novos desenhos repressivos que anunciam as tentativas do poder político de identificar a solidariedade com os presos com a apologia do terrorismo, ou a eventual aplicaçom num futuro do paradigma Todo é rESISTêNcIA GALEGA ao entramado associativo independentista. Neste último sentido, embora resultar estrambótica, é eloquente a difusom mediática de organigramas de autoria policial que assinalam o que para certos setores dos aparatos repressivos do Estado som os seus possíveis objetivos futuros. Além disto, nom se pode obviar o 35 marco geral de crise do Estado e incremento qualitativo e quantitativo da repressom contra a mobilizaçom e a conflituosidade social, que alenta medidas excecionais. É umha incógnita, contodo, a modalidade e ritmos com que se executará este processo, alviscando-se um abano de cenários que vai do seu constrangimento à luita ilegal até a hipotética ilegalizaçom de estruturas setoriais e políticas, passando por cenários mais prováveis, aparentemente, de repressom seletiva que procurem um estado permanente de alerta na militáncia. Constatar esta crudeza da realidade e a natureza fascista do regime mais que estimular a parálise deve servir para evidenciar os entraves que se oponhem ao processo independentista e fomentar a nossa determinaçom política e o reforço dos valores militantes, a necessidade de maior organizaçom, planificaçom e disciplina no nosso trabalho político e social e a socializaçom crescente da ideia de que temos à frente um Estado com um gravíssimo déficit democrático. Em segundo lugar, a repressom de militantes aos e às que o regime liga com a violência política estimulou no campo nacionalista, dum modo mais ou menos embrionário e pontual, mas inédito, dinámicas de solidariedade com variadas origens e motivaçons que ultrapassárom as fronteiras e filiaçons partidárias, alcançando forças políticas com presença institucional e organizaçons sindicais e sociais que denunciam as medidas de exceçom. Aliás, a brutalidade da repressom gerou umha ampla diversidade de reconhecimentos e apoios aos retaliad@s e certa perceçom social –alentada pola ilegitimidade atual do regime- de que estes nom som delinquentes,


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“Apenas o independentismo nascido das sucessivas cisons no nacionalismo popular assume o enfrentamento com o regime como parte incontornável do processo” mas militantes ao serviço da causa galega, enquanto os autênticos delinquentes se encontram nas instituiçons e poderes mediáticos e económicos espanhóis. Como positivo efeito colateral da repressom, estende-se em segmentos crescentes do Povo Galego a consciência da nula legitimidade democrática do Estado espanhol. Neste contexto de agudizaçom repressiva geral10, que nom afeta apenas o independentismo, mas o conjunto do povo, a Organizaçom contribuirá para afortalar as estruturas anti-repressivas tradicionais, fomentará as convergências amplas de setores políticos e sociais frente a repressom e reforçará o compromisso com tod@s @s retaliad@s polític@s, exigindo em particular o cumprimento dos direitos legais que cada mês reivindicam os presos independentistas –repatriaçom, reconhecimento como prisioneiros políticos, etc., demandando a sua liberdade e denunciando a aplicaçom polo Estado de políticas de exceçom e a nula legitimidade democrática do Reino de Espanha que carece das mínimas garantias exigíveis 36 para se caraterizar como umha democracia burguesa. Neste sentido cumpre o apoio sistemático à luita contra a repressom, avalizando dinámicas amplas e abrangentes que evitem o isolamento político e social, e umha pedagogia de massa que visibilice a natureza fascista do Estado espanhol, ative a mobilizaçom de autodefesa e contribua para construir a necessária maioria independentista enfrontada ao Estado espanhol neste país. 1. 5. O processo de liberaçom: fase atual O capitalismo industrial contemporáneo nom chega à Galiza até finais do século passado e nom se fai hegemónico até as suas décadas finais. três dados podem ilustrar as implicaçons deste facto. O primeiro é que a metade, aproximadamente, da populaçom galega atual nasceu antes de 1960, quando ainda nom existiam, ou acabavam de se fundar, a maioria das empresas emblemáticas do capitalismo na Galiza (PESCANOVA, COREN, CItRöEN, CAIXAGALICIA, ENCE, etc.). O segundo, que em 1990 a populaçom urbana na Galiza é apenas 30% do total. E o terceiro, que as pessoas que aprendiam a falar em Galego antes dessa época eram umha grande maioria, entre 1994 e 2003 estavam em 25% e hoje temos a certeza de que a realidade é ainda pior. Os dados anteriores falam claramente da etapa histórica atual desde a nossa perspetiva: só um capitalismo senil e em declínio 10. Novas Ley de Seguridad Ciudadana e Ley de Seguridad Privada em processo de tramitaçom, com corte geral de liberdades e privatizaçom da vigiláncia e a repressom; potencializaçom do emprego da vilolência policial como instrumento de disciplinamento social; projecto de nova Ley de Huelga


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conseguiu hegemonizar a atividade produtiva galega num momento no que o processo de assimilaçom da populaçom galega entra na sua fase definitiva. Esse capitalismo, porém, nom é suficientemente forte e estruturado como para gerar umha burguesia dirigente que seja quem de apresentar os seus interesses de classe como objetivos do projeto nacional galego. A conclusom é que, embora Galiza ser objetivamente umha naçom, nom apresenta a estrutura social habitual numha naçom capitalista normal e nom colonizada. Como consequência da ausência dumha elite burguesa dirigente do projeto nacional galego, a esquerda nacionalista, alicerçada nas camadas populares e na pequena burguesia, decide ocupar o seu lugar. Nom o consegue, pois essa substituiçom implica a via eleitoral como método principal de intervençom e o nacionalismo nunca deixa de ser eleitoralmente minoritário mas cresce notavelmente e, ao mesmo tempo, esse noutrora nacionalismo popular e revolucionário legitima o regime nascido da Constituiçom espanhola de 1978. De facto, o período de maior sucesso eleitoral nacionalista (1993-2009) coincide com os momentos de maior participaçom da populaçom nas eleiçons. Origina‑se deste jeito umha poderosa corrente política que poderíamos denominar nacionalismo autonomista ou institucional. Ao longo desta fase que decorre nas duas últimas décadas do século XX apenas o independentismo nascido das sucessivas 37 cisons no nacionalismo popular assume o enfrentamento com o regime como parte incontornável do processo de liberaçom nacional e social. Como resultado disto, este período é também umha fase de castigo e duríssima repressom sobre o independentismo por parte dum Estado espanhol legitimado socialmente com a participaçom política do nacionalismo autonomista. Durante o presente século abriu-se, porém, umha nova fase. O elemento chave que determina a sua fasquia é a consciência progressivamente estendida no independentismo de o Povo Galego estar em risco iminente de ser definitivamente assimilado e desaparecer. A crise do capitalismo coloca-se como pano de fundo deste período decisivo para o nosso Povo, favorecendo o rechaço do régime11 e a consciência social generalizada da gravidade do momento. Aliás, a agressividade antisocial e antipopular com que o Estado defende o sistema fai mais inteligível a determinaçom tradicional do independentismo de arrostá-lo por todos os meios. No momento atual, a repressom que sofrem os movimentos populares ao ser especialmente cruel e sanhuda com o independentismo fai com que o movimento Independentista Galego seja percebido por umha parte crescente da sociedade do nosso país como referente das luitas populares contra o regime. Nom se pode explicar doutro jeito a tomada de posiçom do nacionalismo institucional ‑nom 11. Tomando a participaçom eleitoral como síntoma de tenência na aceitaçom social do régime, podemos constatar que a abstençom em 2012, nas eleiçons autonômicas, volveu aos níveis dos anos 80


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“O independentismo deve fazer por necessidade e por honestidade intelectual umha actualizaçom das funçons para as que é precisa a organizaçom política” apenas nas organizaçons sociais e sindicais que lhe som afins, mas também nas políticas‑ em relaçom com a estratégia repressiva atual do Estado espanhol contra o independentismo. Umha posiçom completamente oposta à que conhecemos noutras épocas recentes. Esta referencialidade, que nom existiria sem um esforço titânico do nosso movimento, deveria ser aproveitada e encarreirada politicamente para avançar no processo de liberaçom. O primeiro passo neste caminho deveria consistir em tornar a evidente deslegitimaçom atual do Estado (repressor, agressivo e violento) em reconhecimento geral da existência dum conflito, real e irreversível, entre os direitos coletivos do Povo Galego e o ordenamento constitucional espanhol. Conflito decorrente dumha incompatibilidade que nom pode ser salvada, nem com reformas constitucionais, nem muito menos com os instrumentos políticos e institucionais que esse ordenamento pode oferecer.

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2. Estratégia e tática da Organizaçom 2. 1. Necessidade da plena autonomia política e organizativa do projeto independentista 2. 1. 1. As mudanças acontecidas no campo nacionalista nestes anos podem levar à perceçom errónea de que o projeto independentista ruturista, como projeto diferenciado dos dous nacionalistas hoje hegemónicos, que assumem formalmente o esgotamento da via estatutária e a possibilidade dumha estratégia independentista própria, já nom é necessário, ou de que avançamos numha pendente esbaradiça face a Casa Comum das partidárias e partidários da República Galega. Em sentido contrário, mas igualmente erróneo, da nossa ótica, o rechaço ao taticismo intuível nas evoluiçons gerais do campo nacionalista, assim como os rezelos à degluçom polo reformismo, podem estimular posturas isolacionistas e o questionamento de unidades de açom que, com as suas deficiências e contradiçons, som úteis e necessárias. 2. 1. 2. Embora podamos fazer previsons razonáveis sobre a sua evoluiçom, nom temos certezas sobre a resoluçom final da viragem soberanista em contato com umha realidade social crítica, nem muito menos expetativas de simplificaçom do mapa nacionalista a curto ou meio prazo. Aliás, o extremo dinamismo da situaçom social, económica e institucional neste período fai com que a resultante final dos processos de radicalizaçom discursiva e prática do nacionailsmo hegemónico nom seja predeterminável a priori, porque dependerá em grande medida de variáveis imponderáveis como a


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capacidade de condicionamento dos processos polos setores independentistas, a evoluiçom da situaçom no Estado espanhol, a evoluiçom das contradiçons no BNG e ANOVA, etc. O perfil coletivo e a trajetória histórica da direçom do nacionalismo hegemónico neste sentido nom alimenta esperanças positivas, polo que manter plena autonomia orgánica, política e de estratégia, convergendo ou confrontando-nos dialeticamente sempre que for necessário com outras estratégias e projetos nacionalistas, é umha necessidade à vez que a máxima garantia para testar e condicionar à alça esse viragem. 2. 1. 3. Enrocar-se ante a desconfiança que suscitam a evoluiçom histórica do BNG e os seus envites frustraria as potencialidades que tem para o independentismo participar em potenciais dinámicas de massas que como GALIZA POLA SOBERANIA se reclama de modo genérico como favorável à rutura com o regime e o Estado espanhóis e a soberania nacional. Embora desconfiemos de que num futuro indeterminado, umha vez alcançada umha nova fase de crescimento económico e um novo consenso institucional sobre o modelo de Estado que supere a crise atual, o BNG retorne a posiçons reformistas e de gestom, o mais significativo nom é isto, mas as possibilidades que a curto prazo se abrem ao se situar o campo nacionalista em posiçons independentistas, iniciar-se dinámicas unitárias de base e, sobretodo, a irreversibilidade da adopçom de certos posicionamentos políticos. 39 2. 2. Construir a organizaçom independentista de massas: umha tarefa pendente 2. 2. 1. As dificuldades objetivas e subjetivas existentes para articular o independentismo galego de modo estável como projeto político, assim como as sucessivas frustraçons colheitadas neste sentido, figérom com que prendesse na militáncia e as bases sociológicas do movimento um estendido ceticismo face a possibilidade da resoluçom positiva desta tarefa e, aliás, mais na praxe do que através da reflexom teórica, teses antipolíticas que legitimam estes estados de ánimo e contam com o amparo da ideologia dominante. Esta situaçom fijo com que dezenas de militantes refugassem nos últimos anos o compromisso político organizado e dirigissem os seus esforços face projetos locais e setoriais vistos como menos conflituosos ou mais gratificantes. mudou-se a vontade de construir um projeto e um relato globais, com o objetivo de se exprimir nas distintas frentes de intervençom, por projetos e relatos setoriais, que começam e rematam em si próprios, evitam preventivamente a integraçom em qualquer globalidade e, em ocasions, se apresentam como substitutivos impossíveis do projeto político. 2. 2. 2. Se bem tal evoluiçom tivo como fruto mais positivo a construçom dum entramado sociológico que tem como matriz o independentismo e é imprescindível para o crescimento do movimento de liberaçom nacional, também é certo que deixou irresolta ou adiada sine die a construçom da referência política do nosso movi-


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mento. 2. 2. 3. hoje, o independentismo que representamos deve fazer por necessidade e por honestidade intelectual umha actualizaçom das funçons para as que é precisa a organizaçom política de massas. Nós valorizamos que esta cumpre hoje papéis próprios e intransferíveis dos que nom pode ser relevada na construçom do movimento para a liberaçom nacional. Assim, por exemplo, o desenvolvimento sistemático e planificado da batalha política e ideológica, a auto-organizaçom de independentistas galeg@s para coordenar e impulsionar a luita política e social em paróquias, vilas e cidades, a presença ativa na mobilizaçom popular como fator de politizaçom e radicalizaçom das luitas, a participaçom e condicionamento da política de alianças com outras forças nacionalistas, a luita eleitoral e, no seu caso, institucional, a definiçom e socializaçom de alternativas táticas e estratégicas, etc. Embora é óbvio que nengumha destas funçons é privativa, também é evidente que nom se podem abordar adequadamente, com visom nacional e perspetiva sistemática, do ámbito local ou sectorial e que o conjunto do trabalho social, setorial e local que cada dia realizam centenas de independentistas precisa dumha expressom política hoje inexistente. 2. 2. 3. Necessitamos umha organizaçom política independentista com vocaçom de massas, pois além de ser a ferramenta impre40 scindível para intervir de modo sistemático no cenário social e político nacional com posiçons que, hoje, nom representa nengumha força política galega, é a fórmula mais adequada para evitar que se diluam os esforços militantes de centenas de independentistas e construir um constante feed back entre a intervençom social e política do independentismo. 2. 3. Visom movimentista do processo de liberaçom nacional e social 2. 3. 1. Entendemos o independentismo galego como um movimento socio-político de base popular no que participam distintas classes sociais objetivamente interessadas na liberaçom nacional do país, com vocaçom de massas, ideologicamente diverso, historicamente encravado na esquerda, com posiçons ruturistas no nacional e o social, irredutível ao enquadramento numha organizaçom ou partido político –de fato, é transversal a distintos projetos políticos e estratégias- e materializado num rico entramado associativista do que participam centenas de pessoas, assim como a expressom histórica da banda alta reivindicativa e prática do nosso movimento nacional. O independentismo histórico é umha parte deste magma sócio-político. 2. 3. 2. transversalidade, inexistência dumha estratégia independentista hegemónica ou reconhecida como principal ou legítima por amplos setores militantes e carência dumha direçom de conjunto conformam três das caraterísticas mais salientáveis dum movi-


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“É impensável desenvolver com sucesso o processo de liberaçom nacional num povo despolitizado, desorganizado e carente de capacidade ofensiva” mento que hoje é invertebrado e no que se desenvolve umha luita de linhas pola hegemonia da que deve surgir o mLNG futuro. 2. 3. 3. A organizaçom política por constituir reconhece-se em e sinte-se sucessora dos distintos projetos revolucionários de liberaçom nacional construidos no passado e aspira a ser, através da praxe e da legitimaçom subjetiva desta pola militáncia, a expressom política de massas do movimento Independentista Galego e a materializaçom da reivindicaçom dos seus objetivos estratégicos. 2. 3. 4. Nesta conceçom movimentista ampla, a organizaçom política aspira a perfilar a meio prazo, junto a outros agentes e individualidades implicados na perspetiva independentista e socialista de rutura com Espanha, umha estratégia compartilhada e multisetorial e umha estrutura organizativa de movimento. Definir a priori ambos desenhos é aventurado, dado que os colectivos, setores e individualidades chamados a configurá-los se acham transversalizados em distintos projetos, estruturas e estratégias. Desta óptica é necessário avançar desde o respeito à autonomia, na coorde45 naçom geral, na divisom setorial do trabalho e na participaçom massiva no projeto político e na sua legitimaçom polo movimento, assim como na implicaçom fática da militáncia do projeto político nas estruturas e dinámicas setoriais e locais. 2. 3. 5. Compreendemos o processo de liberaçom nacional como umha estratégia a meio e longo prazo irredutível à realizaçom dum trabalho pedagógico, ou de consciencializaçom nacionalista do povo galego, que logo revirta em força eleitoral e presença institucional num feed back eterno que pom o til na tomada e gestom final das instituiçons autonómicas como instrumento (impossível) de salvaçom nacional. Ao contrário desta conceçom assumida polas façons nacionalistas hegemónicas -BNG e ANOVA-, que é co-responsável da impotência do nacionalismo nestes 33 anos de autonomia para agir como fator de desgaste do regime estatutário, compreendemos este processo como a confluência de três fatores dos que a luita eleitoral e institucional, com a importáncia que poda revestir em cada fase, é um elemento complementar: primeiro, um processo geral de auto-organizaçom das classes populares, que gere formas embrionárias, mas fáticas, de poder ou contra-poder popular e de pulso quotidiano com os poderes políticos e económicos dominantes; segundo, a construçom dum conflito poliédrico de poder e soberania com Espanha que se exprima em todas as frentes da existência deste povo e, por último, umha estratégia independentista unilateral e, por soberanista, enfrontada ao marco jurídico-político espanhol, como estamos a comprovar dum modo empírico em países que partilham com nós a dominaçom da oligarquia espan-


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“Trata-se de construir umha estratégia independentista de massas que ultrapasse marcos partidários e se dirija ao conjunto da massa social nacionalista e do povo galego” hola e vivem processos de emancipaçom nacional em fases mais avançadas, porquanto o Estado espanhol cerra qualquer via de resoluçom democrática do conflito Galiza Espanha. 2. 4. Linhas de trabalho preferentes e funcionalidades da Organizaçom Política 2. 4. 1. Concretar as linhas de trabalho, funçons e objetivos imediatos da Organizaçom é essencial para apresentar à militáncia umha folha de rota capaz de estimular o compromisso e visibilizar a utilidade do projeto num cenário em que o ceticismo face a açom política organizada é geral. 2. 4. 2. Impulsionar a auto-organizaçom e a mobilizaçom como chaves da estratégia para a liberaçom nacional. É impensável desenvolver e culminar com sucesso o processo de liberaçom nacional num povo despolitizado, internamente desorganizado e carente de capacidade ofensiva tática e estratégica. Esta afirmaçom 46 determina umha parte substancial do que será o nosso trabalho futuro. Auto-organizaçom e mobilizaçom som, portanto, de modo permanente, elementos chave para o sucesso da estratégia independentista. Compreende-lo, interiorizá-lo e aplicá-lo na praxe diária é essencial porque, além de clarificar onde se situa a cerna do trabalho político, esta percepçom é a vacina certa contra as derivas institucionalistas. A Organizaçom perspetiva o binómio autoorganizaçom e mobilizaçom como empoderamento real e concreto do povo e modalidade embrionária de poder popular, superando visons que reduziam ambas à promoçom dum marco nacional de luita sem dependências externas. A Organizaçom situará como questom permanente da sua vida interna o conhecimento, seguimento e dinamizaçom de todas as modalidades possíveis de auto-organizaçom e mobilizaçom popular galega, intervindo nelas indiretamente, como proposta política independentista, ou através das redes associativas existentes em cada momento 2. 4. 3. Impulsionar as unidades de açom soberanistas com os objetivos de 1º socializar a necessidade da soberania; 2º estimular a evoluiçom das massas nacionalistas galegas, e do povo em geral, face posiçons independentistas explícitas no caminho da sua hegemonia social; 3º ganhar os setores mais avançados do nosso povo para a construçom dum projeto estratégico e umha praxe de rutura com Espanha e 4º construir, se esta é a vontade última de outros agentes que partilharám com nós estas unidades de açom, um muro de contençom, avanço e contraste de alternativas frente aos planos da oligarquia espanhola no nosso país para a Segunda Tran-


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sición. Neste sentido, a Organizaçom promoverá na medida da sua capacidade que estas embrionárias unidades de açom evoluam da condiçom de atos esporádicos ou litúrgicos com caráter nacional exclusivo para a geraçom de dinámicas locais e comarcais concretas que, fazendo parte de estratégias de país, facilitem a participaçom e ativaçom territorial de centenas de nacionalistas, o encontro na prática comum entre as distintas correntes soberanistas, a mestizagem e umha incidência real sobre o nosso povo. Esta atuaçom nas unidades de açom soberanistas parte de vários condicionantes e premissas: 1ª O caráter hegemónico e a maior capacidade de condicionamento e orientaçom que nelas tem o BNG, com o aspeto positivo de, se esta é a sua vontade real, dotá-las de estrutura, militáncia e capacidade de influência social, mas o negativo de subordiná-las em grande medida às auto-limitaçons e temores atávicos do nacionalismo hegemónico. 2ª A confiabilidade limitada que outorgamos à viragem soberanista do BNG e se testará, para bem, ou para mal, no desenvolvimento das unidades de açom. Da nossa ótica, trata-se de construir umha estratégia independentista e ruturista de massas que ultrapasse marcos partidários e se dirija ao conjunto da massa social nacional- 47 ista e do povo galegos. A finalidade, pois, ultrapassa largamente o objetivo tático de certos setores nacionalistas de despejar o PP das instituiçons autonómicas e dar passo a governos bipartidos ou tripartidos que, embora preferível à permanência da extrema direita nestas, seria igualmente impotente para dar soluçons às problemáticas que afetam o povo galego. 3ª A necessidade de opor à Segunda Transición um muro nacional e popular em chave de soberania e rutura democrática com o regime e o Estado. A construçom deste muro nacional e popular, com capacidade potencial de ativaçom de setores sociais, sindicais e políticos, é inviável de presupostos partidaristas exclusivos, tanto do BNG, que carece da legitimaçom necessária para situar sob o seu liderado o campo soberanista politicamente ativo e organizado, como das façons independentistas minoritárias que, além disso, nom possuem hoje o imprescindível músculo organizativo e influência social para a tarefa. 4ª A urgência de dinámicas de mobilizaçom e luita que possibilitem a superaçom da passividade e a reativaçom da sociedade galega, o aumento da consciência nacional e o fortalecimento paralelo do independentismo. O rol a jogar pola Organizaçom e, em geral, polo campo independentista tradicional, neste ciclo de unidades de açom, é maximizar a politizaçom independentista que resulte delas e possibilitar, se for o caso, que a deriva soberanista bascule face a sua consequência lógica –posiçons de rutura com o Estado, independência nacional como expressom fatível de soberania, con-


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struçom de contrapoder nacional, debate sobre estratégia, etc.-, estenda a presença social do independentismo e seja encoro de contençom real frente aos ataques do Estado e o capital. 2. 4. 4. Neste período de crise do Reino de Espanha, com perspetivas dumha involuiçom generalizada em matéria nacional e social e a mudança de ciclo histórico à vista, urge desenvolver e aprofundar a batalha política e ideológica com projeçom de massas. É preciso evidenciar ante setores crescentes das classes populares galegas e a partir da realidade concreta e dos conflitos concretos a superioridade das alternativas táticas e estratégicas soberanistas e, em especial, independentistas, destacando-as como única concreçom possível do soberanismo na situaçom criada polo Estado espanhol na Galiza. A batalha ideológica desenvolvida sistematicamente e com capacidade pedagógica para demonstrar à maioria social do país a superioridade da posiçom independentista, frente a qualquer versom forte ou descafeinada de espanholismo ou autonomismo, é umha das tarefas para a Organizaçom. Além do trabaho de consciencializaçom e constataçom desta superioridade, é imprescindível em paralelo um outro de dignificaçom da condiçom nacional galega e afortalamento da consciência nacional que, como evidenciam as recentes evoluiçons do mapa político, é fraca incluso em setores nacionalistas organizados. Lograr ambos objetivos é um esforço que implica a planificaçom e coordenaçom de recursos mil48 itantes, económicos e comunicativos e exige a construçom dum entramado mediático que, embora sem ter condiçom partidária, se enquadre numha estratégia independentista e ruturista. 2. 4. 5. A construçom da Organizaçom e a articulaçom do movimento. A posta a ponto dumha ferramenta política com capacidade e meios para intervir na conflituosidade social e a política é o objetivo imediato após o processo constituinte. Só umha Organizaçom com um núcleo militante e disciplinado será capaz de assumir umha intervençom com a necessária capacidade de influência e poder de clarificaçom. Neste sentido, a nova estrutura fará um esforço sistemático de acópio de recursos económicos, comunicativos e, sobretodo, militantes, que lhe permita estar à altura da sua responsabilidade. Por outra parte, desde a consciência de que o campo nacionalista continua submergido num processo de recomposiçom interna que ainda nom se decantou definitivamente, e de que a construçom do mLNG é, portanto, umha tarefa aberta que torna ridículos os exclusivismos, achamos que se deve avançar face dinámicas de diálogo, confiança mútua e definiçom de objetivos e folhas de rota comuns entre as organizaçons do campo independentista e visualizar a construçom do movimento de modo nom seitário ou excludente. Recorrendo à metáfora, diriamos que a confeiçom do movimento de Liberaçom Nacional Galego é similar à dum cesto onde parte dos vimes a empregar já som familiares e conhecidos, embora outros se encontram nos movimentos populares ou fam parte a dia de hoje de organizaçons e correntes que partilham com o independentismo histórico boa parte das nossas diagnoses e práticas mas respondem a outras estratégias. A tarefa


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“A organizaçom que constituimos deve ser particularmente cuidadosa com a problemática das mulheres galegas tanto nas estruturas organizativas como na sua praxe quotidiana” é pois ganhar progressivamente esses setores, com o veredito da praxe e dos fatos, para a estratégia independentista e a construçom do mLNG. A respeito do nosso próprio universo fracional, o independentismo histórico, achamos que é urgente restabelecer as pontes, a coesom e as dinâmicas de confiança entre as estruturas e militância da nossa corrente. Sem prefixar os tempos de semelhantes processos, @s militantes comprometidas na construçom dumha ferramenta política de massas do independentismo atrevemo-nos a apontar três tarefas imprescindíveis para superar a atual fase de impasse: - Formalizaçom dum foro de coordenaçom e diálogo entre as estruturas organizativas que, com caráter periódico e respeitando a autonomia de critério e praxe das partes identifique reptos e iniciativas partilháveis e coordene esforços e luitas. - Apoio mútuo e mútuo reconhecimento. A lealdade caraterística na 49 solidariedade anti-repressiva deve estender-se ao reconhecimento e o apoio mútuo entre as estruturas do nosso universo sóciopolítico. - Potencializaçom dos processos internos de debate e formaçom. O abandono da formaçom nas vertentes ideológica, política e ténica é umha fatura que a meio prazo sempre se paga. É preciso sistematizar e institucionalizar os nossos processos formativos e trabalhar na construçom dum corpus político-ideológico comum. 2. 4. 6. A formaçom ideológica, politica e ténica de independentistas. Após anos em que a formaçom foi estigmatizada como adoutrinamento vertical e passivo, por reaçom ao dogmatismo imperante, à vez que oposta de modo irreal à “prática”, as necessidades da luita pugérom negro sobre branco as limitaçons às que condena o seu abandono e a urgência de destinar recursos a fomentá-la sobretodo na militáncia nova. Neste sentido, a Organizaçom, superando a confusom entre formaçom e adoutrinamento, sistematizará um córpus ideológico e político independentista que, bebendo do conhecimento acumulado, se abra também a novos elementos e diagnoses da nossa realidade e conjuntura nacional e internacional. À elaboraçom teórica somará-se o debate coletivo na militáncia como principal estratégia formativa e de preparaçom de militantes e quadros para as tarefas projetadas. 2. 4. 7. A luita eleitoral e institucional. Queremos insistir aqui tanto na utilidade de abrir a frente eleitoral e, eventualmente, institucional,


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ao serviço da estratégia de geraçom de massa crítica independentista e rutura com o Estado, como na de distinguir entre eleitoralismo e institucionalismo e a luita eleitoral e, eventualmente, institucional, em chave independentista. Estando cientes da fraqueza orgánica atual, da ordem de prioridades que tem o nosso trabalho e da desequilibrada correlaçom de forças com outras façons nacionalistas, o projeto valorizará, em cada caso, à vista das condiçons, aliados e prioridades, a utilidade de intervir nesta via. Neste sentido, por proximidade e efetividade política e de auto-organizaçom, achamos de especial interesse afundar no desenvolvimento do trabalho local independentista compreendido nom só nem principalmente como trabalho eleitoral ou institucional municipal, mas como articulaçom diária e estratégica desde baixo de setores populares ruturistas numha praxe municipalista concreta. Por outra parte, no terreno da batalha política e ideológica, é necessário abrir e aprofundar no campo nacionalista o debate sobre qual é a funçom e objetivos da presença soberanista nas instituiçons espanholas no nosso país e como esta pode servir ou nom a objetivos de rutura. 2. 4. 8. A funçom da referencialidade pública. Além doutras funcionalidades expostas, achamos que numha sociedade como a galega é necessário um referente político que, sem as ambigüidades e submissons que caraterizam algumhas formaçons nacionalistas, exponha à luz do dia umha estratégia, umha praxe e um programa político de rutura com Espanha à vez que ganhe a 50 confiança de setores crescentes do povo. Se bem estas tarefas se podem desenvolver em paralelo desde distintas estruturas sociais, sindicais, juvenis, etc., num processo constante de mútua retro-alimentaçom, também é evidente que a organizaçom política possibilita realizá-las com a máxima sistematicidade. Neste sentido, a nova Organizaçom pretende ultrapassar a condiçom tradicional do independentismo como minoria ideológica para situá-lo progressivamente em posiçons de centralidade e referencialidade 2. 4. 9. Intervençom em políticas de gênero Umha organizaçom política que como a que estamos a construir tem como objetivo a liberaçom nacional deve ser particularmente cuidadosa com a problemática das mulheres galegas, tanto dentro das próprias estruturas organizativas como na sua praxe quotidiana no povo a liberar. Esta premissa deriva de duas conceçons elementares: primeira, que a opressom estrutural que, de modo direto, supom o patriarcado para mais da metade do povo galego e, de modo indireto, para todo o povo, mulheres e homes, é um estádio da evoluiçom social a superar e resulta incompatível com o modelo socialista que queremos construir na Galiza nacionalmente liberada. Segunda, que o desenvolvimento exitoso dum processo de liberaçom nacional que como o nosso é de base exclusivamente popular é impensável se nom integra a defesa dos interesses objetivos inmediatos e estratégicos dos setores sociais chamados a impulsioná-lo e nos que


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se constrói. Assim, a integraçom das reivindicaçons e valores feministas na nossa praxe interna e externa, como questom transversal a todo o trabalho político e social, é, para além dumha obriga, a garantia de fortalecimento do próprio processo de liberaçom nacional ao enriquece-lo com novas achegas e apoios. Neste sentido, admitindo o caráter epidérmico que tivo no passado a nossa praxe feminista, assim como a urgência de no futuro imediato aprofundar nela com factos, queremos situar o foco, com o intuito de erradicar confusons, sobre o debate aberto no campo independentista a respeito da ordem de prioridades existente entre as distintas contradiçons e opressons que percorrem o corpo social galego -nacional, de classe, de gênero, etc.-. Somos desde 1964 valedoras e valedores da tese de que a contradiçom principal que percorrre a sociedade galega é a que se estabelece entre nacionalismo e espanholismo, entre Galiza e Espanha ou, em formulaçom marxista, entre o conjunto das classes populares galegas objetivamente interessadas na liberaçom nacional e a oligarquia espanhola que, com apoios internos, rege os destinos do país e do Estado. A superaçom desta contradiçom principal, com a conquista da soberania política materializada na criaçom dum Estado próprio, é conditio sine qua non e alfândega de passagem obrigada para superar as restantes contradiçons. Dito de outro modo, nom é possível construir o socialismo na Galiza nem proceder à superaçom integral do patriarcado sem antes o povo galego dispor dumha estatalidade 51 própria ao seu serviço. As posiçons arriba expostas nom implicam, nem muito menos, como se afirma em ocasions, a “postergaçom” ou “trivializaçom” da luita feminista, ou da luita socialista, que devem participar do caudal diverso de luitas que convergem no processo de liberaçom nacional, nem a assunçom de posiçons “essencialistas”, mas umha perspetiva na que a superaçom de todas estas contradiçons nom é simultánea no tempo, mas necessita como condiçom prévia a conquista dumha estatalidade e dum poder popular galegos como fator para se produzir. A nível prático, implica que a conquista da independência nacional, embora situará o nosso povo em ótimas condiçons para resolver as contradiçons de classe e de gênero e seguir avançando no processo integral de emancipaçom, nom suporá instantánea nem mecanicamente a superaçom de ambas. Esta perspetiva resolve-se na prática quotidiana da Organizaçom na priorizaçom das alianças com os setores comprometidos com a superaçom do atual quadro jurídico-político, a incorporaçom e integraçom do movimento de liberaçom nacional das reivindicaçons e valores de classe e de gênero como garantia do seu sucesso e a transversalizaçom de ambas a toda a nossa praxe independentista. Embora liberaçom nacional e liberaçom social sejam duas caras da mesma moeda, a conquista da independência política após a fase de conflito com Espanha, afirmamos, nom supom mecanicamente a construçom do socialismo nem a extinçom simultánea do patriarcado. Som precisamente o fortalecimento prévio das posiçons de


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classe e feministas no movimento Independentista e a construçom neste de formas embrionárias do novo modelo social alguns dos fatores que possibilitarám que a evoluiçom socialista e feminista do nosso processo de liberaçom nacional se produza com maior celeridade. No século XXI a sociedade galega é sensivelmente diferente dos parámetros tradicionais nas questons de gênero por causa da aceitaçom geral embora contraditória e insuficiente de certos valores feministas: as mulheres foram introduzindo-se no mercado laboral, estám convenientemente formadas e, numha visom superficial, superaram os roles que lhes eram atribuídos. Neste sentido, parece preocupante o desequilíbrio entre o número de homes e mulheres militantes nas organizaçons políticas, também nas mais combativas e menos sistêmicas. Fai-se, portanto, imprescindível, incorporar à atuaçom política diária alguns parámetros que corrijam a presente situaçom e encorajem as mulheres para participarem. De entrada, as mulheres venhem sendo as mais afetadas pola crise econômica: na vida laboral, elas continuam a cobrar salários inferiores por igual trabalho, as cifras de desemprego feminino som espetaculares e mesmo na açom sindical deixa-se sentir o patriarcado (alguns EREs, por exemplo, negoceiam-se propondo que as que primeiro tenhem que ficar sem emprego sejam as mulheres). Aliás, a 52 crise do sistema político nom é apenas económica, também é umha crise de valores políticos e éticos, de maneira que as mulheres mais críticas demonstram a sua insatisfaçom afastando-se das estruturas que lhes exijam umha militância ativa, como os partidos políticos, que a seu ver nom dam resposta às suas reivindicaçons. Finalmente, a luita antipatriarcal apenas acaba de começar: os preconceitos e os mecanismos de poder que transmitem os meios de comunicaçom, a escola e outros relatos menos formais, como os implicados nos modos de nos relacionar, som ainda machistas. Nesse sentido, cumpre propor algumhas teses políticas. Teses políticas sobre políticas de género 1. O processo de liberaçom nacional nom se constrói em abstrato: é afinal umha liberaçom de pessoas. As mulheres, como resultado dumha educaçom obsoleta e das estruturas de dominaçom capitalistas, demandam atuaçons específicas. Nom se trata de apresentálas como vítimas, mas de assegurar a justiça que nos corresponde a tod@s. 2. A organizaçom independentista trabalha por definiçom em criar espaços de poder nacional que nom som contemplados do ponto de vista do Estado opressor. Em coerência com este postulado, a organizaçom pode e deve estimular o paralelismo entre a contradiçom de interesses Galiza/Espanha e a contradiçom de interesses mulher/home. Nom se trata de privilegiar as mulheres por o serem, mas de reconhecer que a identidade de gênero, que nom escolhemos ao nascermos, tende a causar umha discriminaçom e


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de agirmos para superá-la. 3. A questom de gênero nom é apenas a "questom das mulheres". Se elas se viram tradicionalmente abocadas a cuidar da família, eles igualmente padeceram outras mutilaçons, como a de nom poder expressar os seus sentimentos. Os roles e os estereótipos sexuais som limitativos para tod@s e a açom feminista libera-nos a tod@s. 4. A soberania política, como objetivo estratégico, deve materializarse em logros concretos na fase prévia à sua conquista. Um dos mais evidentes, da perspetiva feminista, é a soberania sobre o próprio corpo e sobre a existência. A soberania sobre o corpo vincula-se à defesa dos direitos de saúde, dos direitos sexuais e reprodutivos que as distintas administraçons do Estado na Galiza e as políticas neoliberais perseguem com crudeza e criminalizam (o caso mais obvio é o da legislaçom sobre o aborto mas nom é o único). Por outra parte, a soberania sobre a existência demanda a independência económica e, nas linhas de trabalho feminista mais dinámicas, aponta para a introduçom de medidas tam revolucionárias como a renda básica das iguais. 5. A política nom consiste apenas na administraçom do poder e na tomada de decisons coletivas. O feminismo estabelece que todo o que é pessoal é também político. Neste sentido, a organizaçom 53 nom pode convocar a liberaçom nacional sem reconhecer que todos os assuntos da vida íntima e individual tenhem um alcanço público. Estas teses desembocam numha série de intervençons que corrijam as eivas atuais: 1. Se a questom do gênero afeta a tod@s, a defesa de valores feministas e antipatriarcais torna um assunto tático de primeira magnitude que deve plasmar-se num tratamento transversal. Com independência de que poda existir umha comissom ou um grupo de trabalho especificamente feminista, toda a açom política deve ser inclusiva e reconhecer as peculiaridades do sujeito feminino em qualquer campo. 2. A intervençom feminista demanda umha soma agregada de vontades, de maneira que os homes vejam as reivindicaçons feministas, nom como a imposiçom feita por um lobby ou grupo que presiona pola defesa dos seus interesses, mas como um objetivo político sem o que nom se podem dar as condiçom para umha pátria liberada. 3. As responsabilidades devem ser partilhadas tanto no público como no privado. No público incidirá-se na presença de caras femininas como referentes, nunca na imagem de mulheres floreiro que às vezes implicam as listagens cremalheira. Isto quer dizer que, em vez de introduzir mulheres para dar umha falsa aparência de igual-


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“Da ótica independentista, ‘socializar a necessidade da soberania’ tem na açom prática, no conflito coletivo com Espanha em todas as expressons, a melhor escola imaginável” dade, importa incorporar o discurso alternativo que as mulheres achegam pela sua condiçom de “excluídas" historicamente. No privado importa realizar quantas açons de formaçom forem precisas para as tarefas do doméstico e do cuidado nom serem vistas como menores e para serem partilhadas por homes e mulheres. 4. toda a açom política há supor umha linguagem inclusiva, que evite o masculino genérico e, no entanto, resalte a presença feminina. Por escrito a medida idônea é a da arroba, a mais adaptada à realidade da nossa língua porque incorpora graficamente e ao tempo um "o" e um "a". Por oral procurará-se a inclusom de tod@s com fórmulas genéricas tipo o povo galego, o estudantado universitário, o pessoal sanitário, etc. Lá onde nom for possível, usarámse formas duplas (as galegas e os galegos), apesar de que a sua reiteraçom seja cansativa. Finalmente, nos âmbitos mais politizados podem usar-se femininos genéricos (tipo nós, galegas conscientes). Esta fórmula é claramente discordante com o apreendido na escola e, portanto, exige modulaçom porque nem se trata de inverter o 54 processo para agora excluir os homes, nem se pretende perseguir ou punir a masculinidade. 5. Um dos aspetos mais interessantes do debate feminista contemporáneo inclui a ética dos cuidados. Segundo esta perspetiva que, obviamente, nom é a única, mas é importante, muitas mulheres nom ocupam postos de poder, nom só por padecerem umha discriminaçom, mas como escolha própria se tiverem que decidir-se entre o sucesso no mundo social e o cuidado das pessoas que amam. A ética dos cuidados explica que umha mae prefira nom ascender laboralmente ou nom militar muito ativamente para ter @s filh@s bem atendid@s. Polo seu caráter dissidente do poder, a organizaçom política independentista, sem fomentar o que seria umha auto-exclusom das mulheres, deve considerar este aspeto. A implicaçom de muitos militantes, também homens, na tarefa de arroupar, acompanhar, considerar ou dedicar tempo e energia, por exemplo, a companheir@s pres@s, faz parte desta ética de cuidados. E como tal prática feminista pode e deve ser reivindicada. 6. Os estudos feministas demonstram que as mulheres e os homes nom conversam igual. mais ainda, nas grandes reunions da vida social, os homes tomam a palavra antes, mantenhem-se a falar mais tempo e interrompem as mulheres. Isso explica que nas reunions políticas falem muitos mais homes que mulheres. Para correge-lo conviria trabalhar em grupos reduzidos antes de chegar a um plenário (as mulheres falam mais se o auditório é pequeno e som mais ativas em grupos reduzidos). Porém, para as mulheres falarem e participarem mais, os homes devem falar um bocado


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menos. A democracia interna vê-se favorecida de evitarmos os oradores que se estendem muito tempo e tomam a palavra reiteradas vezes. Medidas práticas 1. As citas e horários para reunions políticas fam-se normalmente tendo em conta que existe umha jornada laboral e, por isso, tendem a ser na tarde-noite. Porém, umha atuaçom feminista exige flexibilidade nos horários e questiona as práticas habituais. muitas mulheres tenhem ao seu cargo várias pessoas dependentes e, portanto, nom se podem permitir militar. Revisar os horários para que se adaptem às necessidades reais das mulheres é objetivo ineludível. 2. Dada a dificuldade dum grande setor das mulheres para acudirem às reunions políticas por problema de horários e incompatibilidades com outras responsabilidades, parece necessário e urgente revisar o reparto de funçons de cuidado. Ainda que as organizaçons políticas habitualmente consideram que isso entra no território privado, só falando a questom e socializando-a pode solucionar-se. 3. Cumpre estimular a interlocuçom frequente com os grupos feministas organizados. Servirá para incorporar continuamente novas demandas e para visibilizar a própria organizaçom política entre se- 55 tores que com frequência rechaçam estruturas como os partidos. 4. Organizar umha campanha para estimular a militância feminina considerando que esta é ainda escassa. Cumpre motivar mulheres de todas as idades. Em Euskal herria, por exemplo, realizam-se frequentemente atos independentistas de mulheres e isto hoje seria impensável na Galiza. 5. No caso de organizarmos campanhas de desobediência civil contra Espanha, importa dar-lhe também a focagem de gênero. Assim, umha campanha contra o BI espanhol deve acrescentar-se rechaçando o facto de o Estado classificar-nos em hs e ms. 6. Promoçom da simbologia feminista e visibilizaçom na rua e nos atos de massa. A história nom se fai só com guerrilheiros, mas também com guerrilheiras. O independentismo nom só tem muitas caras masculinas e poucas femininas; é que historicamente adotou no discurso umha épica do herói com a qual muitas mulheres nom se identificam. 7. Fomentar o debate interno e a formaçom sobre as questons de gênero é fulcral, mas também manter as reivindicaçons como assunto de atualidade na comunicaçom social evitando que as práticas feministas se ajustem a umha agenda mediática que nos predispom na sua contra (Que o 25 de novembro se fagam muitas campanhas contra a violência de gênero, de todas as orientaçons e mesmo desde o Governo traduze-se socialmente na ideia de que


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"esse dia toca", nom transforma nada). 8. Rechaçar a violência de gênero, tanto nas agressons mais brutais com final trágico, como no caso menos dramático dos micromachismos da vida diária, consistentes em insultar, desconsiderar ou trivializar as mulheres polo simples feito de serem mulheres. 9. Elaboraçom de materiais próprios e divulgaçom dos mesmos entre a militância e fora. 2. 5. As políticas de alianças 2. 5. 1. A viragem soberanista supujo o convite a um novo cenário às forças nacionais galegas. A unidade de açom sob parámetros soberanistas e ruturistas formais, máxime num contexto de forte ofensiva capitalista e anúncios da Segunda Transición, é um envite necessário. O debate nom se situa pois em se participar ou nom nestas novas dinámicas, mas em como faze-lo para: 1º alargar a penetraçom social das teses independentistas; 2º construir linhas de contençom ante os processos de recentralizaçom e empobrecimento; 3º afortalar as posiçons políticas e ideológicas dos setores que historicamente trabalhamos em chave de rutura com o regime e o Estado espanhol e 4º inclinar as bases sociais do nacionalismo face posiçons independentistas.

56 2. 5. 2. A Organizaçom manterá umha interlocuçom permanente e alianças táticas e/ou estratégicas de colaboraçom com as forças sociais, sindicais e políticas comprometidas com a auto-organizaçom do nosso povo e o desenvolvimento das distintas fases do processo de liberaçom nacional e social, mantendo sempre a sua singularidade organizativa e estratégia própria. 2. 5. 3. A Organizaçom procurará a mais estreita relaçom de confiança, colaboraçom e coordenaçom com as organizaçons e estruturas setorais enquadradas no que tradicionalmente se denomina independentismo histórico, avançando com este e outros setores, face a construçom dum movimento de liberaçom nacional e social autónomo das grandes apostas nacionalistas e mantendo com elas as colaboraçons pontuais possíveis em cada momento. 2. 5. 4. A iniciativa popular Galiza pola Soberania, à espera de se despejarem a curto prazo as dúvidas e resistências à sua evoluiçom, materializa hoje um ámbito potencial de unidade de açom entre agentes sociais, políticos e sindicais e individualidades por volta da socializaçom da necessidade da soberania política similar ao que foi no seu dia CAUSA GALIZA –mas ampliado- que devemos potencializar porquanto cria condiçons favoráveis à tomada de consciência nacional do nosso povo e o desenvolvimento da estratégia independentista à margem de calendários eleitorais e estratégias partidárias. Junto a esta adesom ao projeto e a exposiçom da nossa vontade de apoiá-lo ativamente, apontar também a crítica da posiçom hegemónica no seu seio que, a respeito da socializa-


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“A Organizaçom considera legítimas todas as modalidades de luita que o Povo Galego escolhe em cada período histórico na defesa dos seus interesses” çom de necessidade da soberania política, insiste em disecionar umha fase didática dumha fase posterior de açom. Da ótica independentista, ambas som simultáneas e inseparáveis, sendo a açom, é dizer, o conflito coletivo com Espanha em todas as suas expressons, a melhor escola independentista imaginável. 2. 5. 5. A Organizaçom acha necessário que as políticas de unidade de açom soberanista, umha vez se ultrapasse a fase atual de aproximaçom formal e estabelecimento de canais básicos de comunicaçom entre agentes chamados a sustentá-las, se estendam além dos atos e mobilizaçons pontuais, alargando-se à definiçom de linhas de açom compartilhadas e possibilitando a implicaçom nacional e comarcal de nacionalistas e independentistas sem filiaçom no desenho e a execuçom destas linhas de trabalho. A nossa disposiçom neste sentido, respeitando as distintas estratégias, é plena. 2. 5. 6. A Organizaçom apoiará com militáncia e recursos GALIZA POLA SOBERANIA, favorecendo a deriva lógica face postulados independentistas como única expressom possível da soberania nacional 57 e do “direito a decidir” num Estado incapaz de reconhecer os direitos das naçons que submete, socializando o caráter unilateral do processo soberanista e a necessidade de construir mecanismos efetivos de empoderamento social ou contra-poder que, para além da necessária pedagogia de massas, permitam contrapesar os de dominaçom estatal. 2. 6. Os métodos de intervençom sócio-política 2. 6. 1. A Organizaçom desenvolve umha açom sócio-política diária rumada a fomentar a auto-organizaçom e a tomada de consciência nacional do povo galego, a construçom nacional, a batalha ideológica, a mobilizaçom e a luita populares, a construçom do movimento independentista e a luita eleitoral e institucional. 2.6. 2. A Organizaçom desenvolverá os seus métodos de intervençom tendo em conta os limites da legalidade espanhola. Esta decisom nom deriva de admitir a legitimidade do quadro constitucional estrangeiro que pretendemos superar mas da necessidade de preservar um espaço de intervençom pública imprescindível para ganhar o apoio social necessário para o avanço do projeto político. 2.6. 3. A Organizaçom acha legítimas as modalidades de luita que o Povo Galego escolher e desenvolver em cada período histórico na defesa dos seus interesses imediatos e estratégicos cara o avanço do seu processo de libertaçom nacional e social.


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“A auto-organizaçom popular é um fator chave para a estratégia independentista num contexto onde nom existem vias democráticas para conquistar os objetivos políticos” 2.6.4. A organizaçom solidariza-se com as mulheres e homes retaliados polo regime espanhol por participar no processo de libertaçom nacional e social e/ou nas luitas populares do nosso povo. 2. 7. A intervençom nos movimentos e as organizaçons populares 2. 7. 1. A desconfiança que tradicionalmente sinte a maioria das galegas e galegos face a política e as organizaçons políticas quase sem exceçons encontra-se hoje no seu zénite. As causas últimas deste distanciamento residem no crescente empobrecimento e precarizaçom do nosso povo, que fijo com que um risco identitário tam caraterístico do Estado espanhol como a corrupçom institucional se figesse insuportável a olhos das maiorias e forçasse a atual crise de legitimidade do regime. 2. 7. 2. Embora as causas profundas da ausência de legitimidade

58 do sistema político atual e, sobretodo, do divórcio da luita social e “a política”, som óbvias, ficariamos a meio caminho na compreensom deste fenómeno se acreditássemos que a deserçom de centenas de independentistas da açom política organizada se explica a partir da perversidade do sistema. De fato, esta foi sempre o estímulo ideal para a politizaçom e a organizaçom de militantes. 2. 7. 3. Indo a níveis mais cercanos e condicionáveis, temos que fixar a atençom na desmobilizaçom que provocou no país a instrumentalizaçom interesseira dos movimentos populares polo nacionalismo hegemónico –socialmente percebido até etapas historicamente recentes como “ruturista”- ao serviço de estratégias limitadamente eleitoralistas e institucionalistas. Esta supeditaçom da auto-organizaçom e a luita popular às necessidades e ritmos da política representativa, que foi a principal modalidade de intervençom política do BNG, é umha outra das causas explicativas da crescente desafeiçom de setores militantes da necessidade de construir umha pinça entre açom social e política e da escolha exclusiva da primeira como presunta vacina contra manipulaçons e interesses miseráveis. Assim, em versom forçosamente light, porquanto o BNG, a diferença do PNV e CIU nas suas respetivas naçons, nunca foi hegemónico na institucionalidade que Espanha instalou no país agás, parcialmente, no período do bipartido, contemplamos a pequena escada as contradiçons e misérias do nacionalismo institucional na relaçom com o movimento popular galego. Neste sentido, fôrom paradigmáticos nestas décadas o crescente abandono da rua, a ativaçom de conflitos e mobilizaçons sociais em épocas pré-


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eleitorais, a consolidaçom dumha perspetiva errada da luita nacional que cifrava todas as expetativas no controlo dos resortes institucionais da Junta, ou o acontecido em 2003 com Nunca mais, quando os setores situados à frente dumha das mobilizaçons de massa mais importantes da nossa história, para além de dedicarse à exclusom do independentismo com argumentários próprios da Delegaçom do Governo de Espanha, decidírom meter freio ante a proximidade dum novo processo eleitoral. 2. 7. 4. A subordinaçom, de fato, das luitas populares e a auto-organizaçom às necessidades da política institucionalista, esquecendo o valor fulcral e irrenunciável das duas primeiras no processo de liberaçom nacional, é o fruto podre dumha visom autonomista da construçom nacional que situa o centro da açom política nas instituiçons e esquece que, sem umha ampla auto-organizaçom popular, sem poder real na rua, é inviável umha estratégia nacionalista que vaia além da reforma cosmética e da gestom institucional da colonizaçom. Esta visom é a que imperou durante décadas neste país e umha das suas causas, se acreditamos numha explicaçom histórica plenamente vigente, é a preminência da pequena burguesia ou das chamadas classes médias acomodadas no nosso movimento nacional. 2. 7. 5. O movimento independentista tampouco pode botar balons fora à hora de explicar a desconfiança ou o distanciamento subje- 59 tivos. A umha escada obrigatoriamente inferior, a conflituosidade interna do movimento percebida nos movimentos e agentes sociais em que agimos também alentou as o divórcio artificial entre trabalho político e trabalho social que condena à inanidade o processo independentista. 2. 7. 6. Dado que nom acreditamos na existência de incompatibilidades ontológicas entre umha e outra instáncia, isto é, entre movimentos, organizaçons e projetos sociais e política e organizaçons políticas, mas na necessidade dumha complementariedade e interrelaçom fértil de ambas para impulsionar o processo de liberaçom nacional e social do país, torna-se umha exigência, após identificar as causas do divórcio, procurar a sua superaçom. Neste sentido, a nova Organizaçom deve ser extremadamente cuidadosa na relaçom com os movimentos populares, respeitar com fatos a sua autonomia relativa, caraterizar-se polo compromisso ativo da nossa militáncia na sua consolidaçom e evitar dinámicas erróneas que no passado fôrom inerentes ao nacionalismo hegemónico. 2. 7. 7. A auto-organizaçom popular é um fator chave para a estratégia independentista galega num contexto onde nom existem vias democráticas para conquistar os objetivos políticos. Compreendemos esta necessidade já nom apenas como a afirmaçom dum marco geográfico nacional de luita de classes, mas também e sobretodo como empoderamento efetivo e quotidiano das galegas e galegos na defesa dos nossos interesses como povo e principal fórmula de condicionamento e pressom sobre os poderes políticos,


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económicos e ideológicos que perpetuam a nossa opressom nacional e social. 2. 7. 8. Neste marco interpretativo geral, a auto-organizaçom popular adquire valor próprio como expressom da naçom em construçom, como escola e baluarte de resistência e manifestaçom do sujeito político que é o povo galego. Desta ótica, o valor e a significaçom da auto-organizaçom popular torna-se mais importante que o acompanhamento ou apoio dumha estratégia que, como a que predominou historicamente, estivo rumada à tomada e a gestom do entramado institucional outorgado, para se converter em conditio sine qua non do próprio processo de liberaçom nacional. Dito por outras palavras, é inviável desenvolver o processo independentista numha sociedade desestruturada organizativamente. Neste sentido, corresponde sem exclusividades ao independentismo assumir duas tarefas em constante retro-alimentaçom: construir o mLNG e impulsionar a auto-organizaçom do nosso povo, rechaçando qualquer cisom entre política independentista e movimentos sociais, defendendo a autonomia e necessária radicalidade destes e fomentando a sua condiçom de contra-poderes. 2. 7. 9. Consequentemente com esta afirmaçom, a participaçom da militáncia da Organizaçom nos movimentos populares rechaça a patrimonializaçom e procura o seu afortalamento organizativo e em60 poderamento, convertendo-os em muros de contençom para a defesa da naçom nos ámbitos em que intervenhem, à vez que persegue desde o diálogo o seu madurecimento político-ideológico. A velha e ainda vigente concepçom que olha nos movimentos sociais correias de transmissom sem valor próprio ao serviço de estratégias reformistas está em queda livre e devemos ajudar para que seja definitivamente apartada. 2. 8. A construçom e a defesa nacional numha fase longa sem estruturas estatais 2. 8. 1. Perspetivamos a liberaçom nacional como o processo sóciopolítico de massas que desemboca na constituiçom dum Estado independente sob a hegemonia da maioria social, no marco dumha sociedade auto-organizada e da existência de múltiplas modalidades de poder popular paraestatal. Se bem é óbvio que no mundo atual, dominado por poderosos entramados económicos, mediáticos, políticos e militares, o Estado nom tem capacidades ilimitadas de decisom política, como evidenciam os casos de Portugal, Espanha ou Grécia, também o é que neste mesmo contexto um Estado Galego auto-excluido da UE e da Zona Euro e em interaçom permanente com um povo auto-organizado, dotaria o país da máxima capacidade de decisom hoje imaginável na gestom das suas inter-dependências e, em qualquer caso, largamente superior à que outorga a condiçom de Comunidade Autónoma dum Estado que avança face se configurar como protetorado do BCE. O Estado Galego é pois da nossa ótica a ferramenta imprescindível, mas nom exclusiva, para a descolonizaçom e a transformaçom revolucionária


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“Um Estado Galego (...) em interaçom permanente com um povo auto-organizado dotaria o país da máxima capacidade de decisom hoje imaginável” da sociedade galega. A inexistência dumha burguesia nacional implicada no processo é a garantia de que este apenas se pode construir sobre a participaçom e a direçom da maioria social galega. 2. 8. 2. Abordar as tarefas da construçom nacional e a defesa dos interesses populares numha fase sem Estado próprio que se anuncia longa exige um alto nível de auto-organizaçom da maioria social galega, de modalidades de poder para-institucional e de mecanismos que contrapesem o poder coativo e narcótico da normalidade democrática. Desta ótica, achamos que a presença e intervençom institucional independentista mais do que se conceber como gestom ou cuidados paliativos para o país deve supeditar-se a estas exigências. 2. 8. 3. travar um conflito de soberania e de poder com Espanha, com carácter poliédrico e crescente participaçom de massa, é um dos peares nos que construir o processo de liberaçom nacional. Entendemos por conflito o confronto permanente entre os interesses objetivos da maioria social galega e os da oligarquia económica e financeira que rege os destinos do país. Conflito que, agudo ou lar- 61 vado, segundo ocasions, épocas históricas e frentes de atuaçom, possibilita a visibilizaçom das contradiçons em jogo, a tomada de consciência coletiva e o avanço das posiçons independentistas. 2. 9. Programa tático e programa estratégico 2. 9. 1. A Organizaçom tem por objetivo estratégico a conquista da independência e a construçom dum Estado, em forma de República Galega, submetido ao controlo da maioria social e dos contrapoderes gerados nos processo de liberaçom nacional. É a partir deste salto histórico, e só a partir dele, que perspetivamos a construçom do socialismo no país adaptado às condiçons territoriais, demográficas, sócio-económicas, históricas e identitárias da nossa formaçom social, assim como avanços qualitativos na extinçom do patriarcado. Assim, concebemos a conquista da independência como conditio sine qua non para o Povo Galego defender os seus interesses imediatos, transformar o modelo sócio-económico nacional e extinguir a opressom e a exploraçom das mulheres polos homes. Esta conceçom em absoluto implica postergar a luita da classe trabalhadora galega pola destruiçom do sistema capitalista, ou a das mulheres galegas para a destruiçom do sistema patriarcal. todo ao contrário, presupom que ambas se devem desenvolver e afortalar dentro do processo de liberaçom nacional, enriquecendoo, facilitando a incorporaçom de mulheres e classe trabalhadora ao caudal independentista com a consciência de que a conquista dum Estado próprio possibilitará saltos qualitativos na conquista de ambos objetivos. Desta ótica, a soluçom da nossa questom nacional


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“Defendemos a tese de que liberaçom nacional e liberaçom social som duas caras da mesma moeda, mas a conquista da independência é o imprescindível primeiro passo” é já nom apenas “um direito” nos termos da legalidade internacional, ou “umha necessidade coletiva”, mas a ponte que nos permitirá transitar face um sistema socialista de produçom e distribuiçom da riqueza –Socialismo- enriquecido com as achegas da luita feminista e as correntes que postulam a superaçom do produtivismo e o decrescimento. 2. 9. 2. A possível elaboraçom dum programa tático como proposta política ante umha hipotética Segunda Transición, se pretender ser algo mais do que um documento simbólico, nom seria estritamente “partidário”, mas construido com outras forças e setores soberanistas e independentistas no marco das unidades de açom em curso e desde as luitas sociais. A enunciaçom do horizonte independentista como única possibilidade real de soberania e a reivindicaçom da Amnistia para @s independentistas pres@s som com certeza algumhas das principais achegas qualitativas que podamos fazer a esse eventual programa para além de que procuremos condicioná-lo à alça num sentido patriótico e socialista em 62 todos os aspectos. 2. 10. Necessidade de afortalar a consciência nacional galega 2. 10. 1. O afortalamento da consciência nacional do nosso povo como comunidade etnocultural e sujeito político da sua soberania é conditio sine qua non do processo de liberaçom nacional. Se afirmamos que neste país é inviável um processo de liberaçom social que nom transite previamente pola alfândega da soberania, com igual contundência proclamamos que a sua conquista é impossível sem potencializar os níveis atuais de consciência nacional e autoestima e elevá-los à condiçom de hegemónicos. 2. 10. 2. A importáncia desta tomada maciça de consciência nacional, que é combatida, relativizada ou devaluada historicamente polo espanholismo nas suas versons de direita e esquerda e, incluso, paradoxalmente, por setores que se proclamam formalmente “nacionalistas” ou “independentistas”, reside em que neste país é inviável desenvolver um processo de auto-organizaçom e liberaçom nacional e social sem fazer, em paralelo, um trabalho político e psicossocial de dignificaçom e potencializaçom da auto-estima da maioria social. Paradoxalmente, o Estado espanhol é mais ciente da significaçom deste fator do que setores proclamados progressistas e destina políticas e recursos ingentes para a nossa espanholizaçom, o enfraquecimento da nossa consciência nacional e a culminaçom do processo de substituiçom identitária. A aprovaçom da LOmCE é, neste sentido, o último passo dado nesta estratégia


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de fundo. Do mesmo modo, a sociedade de consumo moderna que, dum modo imperfeito e contraditório, se impujo na Galiza, opera como fator de espanholizaçom no sentido de desvestir os indivíduos de identidades e laços de pertença e sumi-los na condiçom atomizada e solitária de consumidor, votante, televidente ou cidadám, dado que a atomizaçom social é o cenário onde o Capital se torna mais efetivo e reduz o risco da conflituosidade. 2. 10. 3. tanto a extrema direita governante na Galiza administrativa como a esquerda espanhola reduzem a reivindicaçom nacional galega a umha questom identitária, limitando a sua significaçom e alcanço prático. Para os primeiros, “o importante é saír da crise num pais onde as duas identidades convivem em harmonia”. Os segundos, apesar de se destacarem historicamente por trair os interesses populares galegos, promover políticas de pacto com o Estado e o patronato e desmobilizar a sociedade, convocam-nos agora para que nos ocupemos dos “problemas reais da gente”, que desligam debalde da questom identitária, isto é, da reivindicaçom da soberania política, como se esta nom tiver a ver com os nossos problemas sócio-económicos, laborais, de ordenaçom territorial, etc. e a abordagem resolutiva destes fosse fatível no raquítico quadro autonómico. 2. 10. 4. As evoluiçons contempladas no ámbito político-partidário nacionalista nestes dous últimos anos seriam incompreensíveis 63 sem referirmo-nos à debilidade da consciência nacional de importantes setores sociais e políticos que, paradoxalmente, se proclamam “nacionalistas” ou “independentistas”. Assim, observamos como quem foi historicamente remisso a desenvolver umha explícita aposta independentista mostra agora, de novo, quando as condiçons objetivas e subjetivas para o avanço desta som especialmente favoráveis, sintomas da tradicional indecisom para falar claro pensando no cálculo eleitoral curto-prazista porque “o povo nom entende”. De deixarmo-nos levar por estes prejuízos que delatam os medos da pequena burguesia, a presunta incapacidade da populaçom nacional para interiorizar e assumir o programa e a estratégia independentista se manterá sine die, porquanto é impossível ganhar a hegemonia social dum objetivo político que nunca se formula de modo explícito. Por outra parte, descendendo ainda mais numha degradaçom de tonalidades soberanistas, encontramo-nos com quem, à vista da crise atual do Estado espanhol, anunciam “soluçons excecionais”, que em realidade nada tenhem de novidoso, como a desvalorizaçom da questom nacional galega e o retorno a posiçons pré-nacionalistas materializando a alianças eleitorais e, no futuro, se calhar orgánicas, com a esquerda espanhola. Como pano de fundo, o questionamento da capacidade do povo galego para desenvolver desde as suas forças e potencialidades endógenas o processo de liberaçom nacional, o recurso como aliado a umha esquerda espanhola sempre reácia a ir para além do “respeito” (sic) às nossas reivindicaçons nacionais e o abraço por façons que se reclamam


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“independentistas” da Posición Luis Soto, que abre as portas à convergência com o espanholismo. 2. 10. 5. O apoio de forças e militantes formalmente independentistas a alianças orgánicas e eleitorais com forças espanholas; o questionamento oportunista da centralidade da contradiçom principal12 por históricos dirigentes e organizaçons nacionalistas, pondo em questom a sua própria trajetória; a confusom generalizada sobre as relaçons entre questom nacional e questom social, que levou a aparecer como ruturistas forças políticas que reduzem de modo gratuito a primeira a umha questom identitária ou alheia aos problemas reais da gente, etc. som fatos objetivos que delatam o oportunismo de quem adoptárom estas estratégias, mas também deficiências mais preocupantes como a desorientaçom e falta de formaçom das bases sociológicas do nacionalismo e do independentismo. O projeto político a constituir, para além do ámbito político-partidário, deve trazer em conta a urgência de potencializar a consciência nacional galega por todas as vias possíveis como vacina certa contra este tipo de derivas e elemento fundamental do nosso movimento. 2. 10. 6. O nosso movimento, que defende a tese de que liberaçom nacional e liberaçom social som na Galiza duas caras da mesma moeda, é valedor também da tese A independência, primeiro, porque a aplicaçom de políticas sócio-económicas, laborais, de 64 género, de ordenaçom do território, identitárias, etc. que tenham como destinatária a maioria social e, ainda mais, a mudança do modelo económico e produtivo e a superaçom da opressom de género, som inviáveis no atual quadro estatutário –menos, ainda, na arquitetura institucional que resultará do processo de recentralizaçom- e demandam marcos de plena soberania política e económica. Esta perspetiva compatibiliza-se com o fato de, nas organizaçons independentistas, na formaçom militante, na intervençom social e política diária, se desenvolver umha luita sistemática contra a opressom de classe e a opressom de género que afortale estas posiçons no seio do povo galego e ganhe apoios populares para o projeto e a estratégia independentista. 2. 10. 7. Nós nom plantejamos um processo revolucionário que supere magicamente todas as contradiçons que atravessam a naçom galega, sejam de classe, género, etc., mas um processo de liberaçom nacional liderado e hegemonizado pola maioria social em chave de esquerda que numha primeira fase substraia a naçom ao poder absoluto do império e nos situe como povo em melhores condiçons para avançar face o Socialismo. Neste marco interpretativo geral, o nenguneio ou relativizaçom da significaçom política da questom nacional som objetivamente valedores da unidade de mercado espanhola e, em última instáncia, a derradeira trincheira na defesa do status quo. 2. 10. 8. A potencializaçom da consciência nacional galega é irre12. Entrevista a X.M Beiras em El País de 3 novembro de 2013


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dutível ao trabalho a desenvolver desde a política organizada: exige aliás umha atuaçom capilar e de proximidade sobre todo o corpo social galego, que se exprima na reivindicaçom lingüística, desportiva, associativista, cultural, sindical, etc. A unidade de açom soberanista em gestaçom nestes meses tem neste aspecto umha das suas possíveis linhas preferentes de atuaçom.

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