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Ponto de Vista

Minha 42ª safra José Mario Paro Diretor Adjunto da Canaoeste

Q

uando tinha dois anos de idade, meu avô adquiriu um pequeno engenho de aguardente. De lá para cá, a cana-de-açúcar passou a fazer parte de minha vida. Em janeiro de 1967, iniciei minhas atividades profissionais no setor, de sorte que a presente safra (08/09) é a 42ª de que participo. Como esperado, ao longo deste percurso presenciei e vivi momentos bons e ruins, mas esta safra está sendo particularmente difícil. A conjunção de fatores adversos, como a quebra da produtividade agrícola, a redução da quantidade de açúcar por tonelada de cana, os baixos preços vigentes e a contaminação geral da economia pela crise mundial, que ora vivemos, configuram um quadro de quase impasse, sem soluções fáceis a curto prazo. A produção de etanol, ao mesmo tempo em que está criando janelas de oportunidades, trouxe também uma complexidade até então desconhecida aos negócios. As carências começam a ficar evidentes: escalas de produção nem sempre satisfatórias, capitalização inadequada na maioria das empresas da cadeia produtiva, questões de logística ainda não resolvidas, dificuldades e diferenças tarifárias nas diversas regiões produtoras do País, capacitação inadequada da mão-de-obra, etc, são partes das atuais dificuldades. Uma conseqüência lógica dessa situação geral será a forte concentração que se vislumbra para a atividade. Historicamente, o setor tem convivido com períodos de expansão, seguidos por outros de contração e, por tudo o que se tem observado, a temporada de aquisições e fusões, que se avizinha, promete ser movimentada. Para nós, produtores independentes de cana-de-açúcar, a situação é ainda mais difícil e complicada por sermos o elo mais fraco de toda essa cadeia

produtiva. Sendo essa nossa segunda safra deficitária consecutiva e acrescentando-se aqui as restrições ambientais vigentes e a rigidez das normas trabalhistas, tem-se uma percepção clara do tamanho do problema. Em minhas andanças pelos Estados de São Paulo e Minas Gerais, tenho sentido os produtores descapitalizados, fragilizados, em boa parte incapacitados de sustentar seu negócio em níveis mínimos de eficiência e, por isso mesmo, desmotivados. A primeira questão que se coloca neste momento resume-se em saber como nós, produtores, faremos para atravessar essa crise, que passará como outras tantas já passaram. A resposta não é fácil, mas passa necessariamente por aumento de eficiência, tomando-se aqui o conceito de eficiência num sentido bastante amplo e é certo que muitos de nós deixarão a atividade. A segunda questão trata da sustentabilidade econômica de nosso negócio. Para melhor explicitar meu raciocínio, tomo a liberdade de propor àqueles que continuarão produzindo cana e que estejam lendo este artigo, um roteiro básico de ação: 1 - avaliar o grau de satisfação para com as indústrias às quais vendem sua matéria-prima, bem como verificar se existem outras alternativas de comercialização; 2 - avaliar se a região onde atuam não está congestionada, com preços de terras, arrendamentos, mão-de-obra, etc, acima de limites aceitáveis para uma atividade minimamente lucrativa; 3 - avaliar a possibilidade de acompanhar a expansão do setor para as novas fronteiras da cana-de-açúcar, onde se possa atingir economia de es-

cala com mais facilidade e onde se tenha segurança mínima de sustentabilidade na atividade; 4 - buscar uma alternativa de receita. O cultivo de grãos desponta como uma das opções mais viáveis. Definitivamente, é prudente não depender exclusivamente das receitas da cana-deaçúcar. Por outro lado, também as entidades representativas, cooperativas e bancos cooperativos dos produtores de cana-de-açúcar não passarão imunes pela crise, como é óbvio. Precisarão se ajustar aos novos tempos. De minha parte, gostaria de vê-las caminhando, igualmente, para as novas fronteiras da cana, onde têm papel essencial a ser desempenhado em apoio aos seus associados. E para que não se pense que estou aqui pregando o fim dos tempos, tal qual um profeta do apocalipse, julgo importante afirmar que minha família continuará plantando cana-de-açúcar e grãos. Revista Canavieiros - Outubro de 2008

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