Toponímia LX - 7.ª Jornadas Toponímia

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determinada propriedade/edifício conhecido, a um local onde habitualmente se realizava uma determinada atividade profissional, podia também resultar da indicação de um acidente geográfico ou, ainda, dever a sua origem a edifícios religiosos. O tombo do Hospital de Todos os Santos mostra isto mesmo. Vejamos alguns casos entre as dezenas de referências possíveis: Na freguesia da Madalena encontramos o Beco de João Cotrim e a Rua de Martim Alho; em S. Nicolau o hospital tinha propriedades numa rua «Ao pé da Calçada de Paio de Novais» e na «Travessa da Sombreiria chamada de Maria Pinheira que vai para o Anjo»; na freguesia da Sé o tombo menciona umas propriedades que se localizavam «defronte das Casas de Lucas quando vai para a Câmara na Rua de João Fogaça». Havia, ainda, o «Beco de Martim Vaz» na Mouraria ou o «Beco de Pedro Rodrigues» na freguesia de Nossa Senhora dos Mártires. Verificamos, portanto, que os nomes de proprietários, certamente os mais importantes, e indivíduos de grande respeitabilidade eram uma das formas normalmente usadas para assinalar os espaços. A origem espontânea da toponímia de quinhentos podia resultar também da indicação da atividade que se desenvolvia num determinado local. Os nomes refletiam muitas vezes a força económica de uma determinada zona. Neste sentido, também encontramos nas fontes do hospital referências a ruas onde se desenvolviam determinadas atividades, por exemplo, a Rua das Cristaleiras. Cristaleiras era o nome dado às mulheres que se dedicavam a dar os clisteres. No Hospital de Todos os Santos era uma atividade muito bem remunerada. A mulher que dava clisteres aos doentes tinha um ordenado mensal fixo que era acrescido de um determinado valor por clisteres aplicado, o que a tornava numa das pessoas mais bem pagas na instituição. 15 Podia ainda receber um acréscimo de ordenado se deitasse as sanguessugas e ventosas aos doentes. 16 O tombo também menciona imóveis localizados em ruas próximas de outras bem conhecidas como na «Sombreiraria, em uma Travessa que vai do Anjo para a Rua dos Ourives do Ouro» na freguesia de São Julião ou à «entrada da Ourivesaria da Prata» na freguesia da Madalena. Os edifícios mais importantes da cidade também serviam de referência. A cadeia do Tronco era uma dessas situações. Na freguesia de S. Julião, próximo da prisão, o hospital tinha casas na «Rua da Amoreira, na Sombreiria defronte do Tronco» e na «Rua da Amoreira que vai do Tronco para a Rua dos Fornos». O Palácio dos Estaus que se localizava no topo Norte da Praça do Rossio e junto do Hospital de Todos os Santos também servia para sinalizar umas casas na «Rua dos Estaus, em uma travessa junto ao Chafariz onde foi cozinha do Infante» e que pertencia à freguesia de Santa Justa. No entanto, o maior grupo toponímico referia-se aos hagiotopónimos fruto da proliferação de igrejas, capelas e mosteiros na cidade. Muitas das artérias não tinham nomes e as casas religiosas eram pontos de localização por excelência. Nos Anjos as propriedades tinham como pontos de referência a Ermida de Nossa Senhora do Monte, Santa Barbara, Santo André ou o Mosteiro de Nossa Senhora da Graça. Aparecem citadas casas «ao pé de Nossa Senhora do Monte», na «Calçada que vai para Nossa Senhora do Monte», na «Rua Direita de baixo que vem da Porta de São Vicente para Santa Bárbara», na «Rua Direita que vai da Porta de São Vicente da Mouraria para Santa Bárbara», na «Rua Direita que vai da Calçada de Santo André para Santa Bárbara» e «ao pé de Nossa Senhora da Graça». O Mosteiro do Salvador também serviu para situar umas casas em Alfama, na «Rua que vai do Mosteiro do Salvador para o Chafariz dos Cavalos» ou a Igreja de Nossa Senhora da Conceição para indicar imóveis que se encontravam «defronte da porta principal de Nossa Senhora da Conceição» e «junto

(15) Maria da Silva recebia de ordenado anual 12.000 réis. No ano de 1564 aplicou mais de 2000 clisteres pelo qual recebeu mais de 10.000 réis. Juntamente com o material fornecido (1 cristal, 2 foles e carvão) e a ração diária, a cristaleira custou ao hospital mais de 27.000 réis anuais. AN/TT, Hosp. S. José, liv. 567. (16) Em 1664, era-lhe dado 300 réis para além dos 2.500 réis que recebia por mês de ordenado. AN/TT, Hosp. S. José, liv.831, f. 54. 106


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