Caderno de Educação Popular em Saúde - volume 2

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experiências com arte aparecem, sob o olhar do jovem, como grandes oportunidades: o hip-hop, os grupos de teatro e dança, o esporte, entre outras. A partir do diálogo das Cirandas da Vida com o MNMMRCE, foi feito um processo de escuta com os atores que dele fazem parte. Uma das coisas fortes no relato de Del, que é o coordenador geral do MNMMRCE, é que o grafite e o rap são duas linguagens que aglutinam esses jovens e que a oportunidade de acesso à profissionalização é uma das estratégias de superação ao envolvimento com o crime, que atualmente é o único espaço onde eles têm oportunidade, porque não se necessita ter 2º grau e nem ter boa aparência e sim ser malandro, articulado e acima de tudo não ser viciado em crack. O tráfico só aceita os viciados em crack como clientes e não como trabalhadores, pois quem é viciado na pedra, como popularmente é conhecido, vende tudo o que tem para sustentar o vício do crack. Já se tem até um dito popular entre a malandragem de que quem é noieiro, como é chamado quem fuma crack, fica igual a medusa, o ser mitológico que tudo o que vê vira pedra; algumas vezes já aconteceu de alguns quererem se adiantar no tráfico, mas acabaram foi fumando as próprias pedras ao invés de vendê-las. Como observa o cirandeiro Thyago, o grafite e o rap, bem como a profissionalização, aglutinam os jovens e funcionam como estratégias educativas para a superação do crime e do que se inscreve como práticas de juventude vida loka. Na realidade, a violência ou a paz são formulações que acontecem em um universo

relacional, mas têm sua base. Assim como se trabalham políticas afirmativas, se parece dever trabalhar-se com o aspecto propositivo da cultura de paz, ganhando espaços novos de reflexão-ação e não apenas desconstruindo práticas, parece oportuno trabalhar com a ideia de cultura de paz – assim, se admitem aspectos estruturais, e não se deixa de lidar com uma dimensão relacional (a que é constituída na relação com o Outro). Há que se reconceituar a palavra paz, muitas vezes deteriorada ao longo da história, como algo conveniente ao poder e aos que estão acumulando as riquezas sociais. No atual estádio de globalização, além dos fatores econômicos, é preciso dar visibilidade aos processos de exclusão, lutar contra eles e aperceber-se de que há aspectos mais amplos da necessidade social de justiça, como a afirmação da cultura de paz, a afrodescendência, a questão de gênero, da agroecologia, espiritualidade, das juventudes, entre outros, que envolvem dimensões subjetivas junto às da economia. Estudos sobre periferia urbana e favelização mostram, por seu lado, que as formas com que as pessoas falam de pobreza são associadas ao modo de se falar da transgressão, da criminalidade e da vagabundagem. As categorias que descrevem a criminalidade se confundem com as que descrevem as condições de vida pobre. Nas palavras de Linhares (2007), em trabalho feito no percurso da Escola que Protege: A pobreza acaba por ser algo que se lê como desvantagem absoluta – algo do que


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