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Bruno BarnabĂŠ



“A conquista do supérfluo provoca uma excitação espiritual maior que a conquista do necessário. O homem é uma creação do desejo, não uma criação da necessidade.” Gaston Bachelard


É a partir da collage1 e da monotipia que materializo minhas pesquisas epistemológicas e imagéticas. Faço isso através da sobreposição dos resíduos 2 gráficos e fotográficos que coleto na cidade onde vivo ou nos lugares em que já estive. Sinto-me principalmente atraído pelas questões da antropologia da imagem 3 e, assim, procuro pelos resíduos gráficos com potencial simbólico, como fotografias de família, cartões postais, selos, ilustrações e desenhos para as minhas composições. Considerando o entendimento descrito por Robert Avens 4, de que a imaginação “é de alguma forma um lugar intermediário entre o consciente e o inconsciente”, e que de acordo com Barfield5 , “constitui a matriz comum do mito e da linguagem”, pretendo investigar como as representações semânticas se relacionam com as memórias afetivas daqueles que as veem. Os signos, ícones e símbolos presentes nas collages propõem relações infinitas entre os seus significados, significantes e, logicamente, os sujeitos que as olham. Estas collages podem ser imagens mnemônicas, em seu sentido mais clássico, assim como narra Cicero 6 na história de Simonides de Ceos ou como escreve Sergio Lima7: “Toda imagem é representação de uma vivência, memória de uma experiência. É a projeção visual ou simulacro da ‘fisionomia’ ou configuração daquele momento único, vide instante, que a memória apreendeu e viveu como presença. E se faz imagem mental pela imaginação que a produz.” Se o observador se permitir, afirma J.H Matthews 8 “...o espectador pode acompanhar a viagem imaginativa da própria experiência do artista” e, completa Sergio 9 que “...a collage estabelece a atração que havia entre duas imagens (pela identificação rítmica com


a forma ‘interior’) antes delas se encontrarem, e permite a sua justaposição ou convivência pela ‘dinamização polivalente’...” Além disso, proponho que ao nos depararmos com qualquer resíduo material podemos indagar sobre sua procedência e tentar compreender se este é fruto de um processo natural ou produto de trabalho humano. Sendo o resíduo um produto do trabalho humano, embute-se em sua constituição a memória plástica e estética da sociedade ou do individuo que o criou. Carrega em seu corpo as marcas de sua temporalidade. Assim, incluo em minha obra os materiais que explicitem características e deformidades que dificilmente seriam simuladas, como manchas de bolor, envelhecimento ou decomposição. Essas marcas são como as cicatrizes, rugas ou feridas no corpo de um animal. Minha atração pela monotipia aconteceu a partir dessa mesma tendência de observar as marcas presentes na matéria. As impressões são únicas e apresentam certo nível de aleatoriedade nos resultados obtidos. Prefiro as formas básicas como as silhuetas quando imprimo essas gravuras, explorando o limite da representação visual que encontra o complemento de sua aparência na imaginação de quem as vê. A variação do potencial estético que esses resíduos assumem são limitadas somente pelas referências do observador e, em último estágio, pelos títulos das obras. Por isso recomendo que as imagens sejam vistas antes de serem lidas10. Com essa combinação de elementos tento construir cenas que ecoem no mundo imaginal de cada um, e que apelem para o conhecimento e reconhecimento simbólico, para a memória, para a matéria enquanto corpo e, principalmente, para o olhar.


Libido


1

2


3

4



6

7


8

9


ReligiĂŁo



12

13


14

15



17

18


Epistemologia


19

20


21

22


23

24


25

26



Alquimia


28

29


30

31


32

33


1 - M áquina incessante de desejos

18 - A Virgem

2 - Flesh made

19 - Transtornos emocionais

collage collage

| 30x 41cm | 2013

| 26x 34 cm | 2013

collage e monotipia collage e monotipia

| 29x 42cm | 2011 | 25,5 x 35cm | 2016

3- Antes de tudo um animal

20 - O texto e o fim da imagem

4 - Shame on you little monkeys

21 - Agnata Fides

5 - M aldito vivo

22 - M ais um passo e a tartaruga vence

collage collage

| 22 x 30 cm | 2016

collage e monotipia

6 - Waterfall

| 22 x 30 cm | 2015

collage

| 31,5 x 23cm | 2016

| 21x 28 cm | 2015

collage

| 21x 29 cm | 2013

collage e monotipia collage e monotipia

collage

| 21x 28 cm | 2013

24 - Leftovers left behind

8 - O ito ou oitenta

25 - Watchtower

10 - Fisherwoman

26 - H ippocampus

11 - Precisamos de uma cruz maior

27 - My brain

12 -São J orge

28 - E mpédocles sabia

collage collage collage collage

| 21x 25cm | 2016 | 32,5 x 47cm | 2015 | 43 x 32,5cm | 2015

| 44 x 36 cm | 2013

collage e monotipia

13 - Pray little prey

collage e monotipia

| 25 x 37cm | 2016 | 21x 29 cm | 2016

| 24 x 30 cm | 2016

23 - O amor é um salto triplo

7 - A cobra é pega pelo rabo

| 26x 34 cm | 2016

collage collage

| 21x 26 cm | 2013

collage e monotipia collage e monotipia collage

29 - A fonte

| 23 x 26 cm | 2016

collage

| 23 x 32cm | 2016 | 43 x 27cm | 2016

| 21x 26 cm | 2016 | 23,5 x 31cm | 2016

14 - O homem em busca do O riente

30 - I n cavernis et tenebrosis locis

15 - Forget not

31 -L apis philosophorum

collage collage

| 16x 21cm | 2008 | 21x 29 cm | 2011

collage collage

| 22,5 x 26,5cm | 2016 | 22,5 x 26,5cm | 2016

16 - Um D eus, três verdades , incontáveis guerras

32 - O que os anjos sussurram para você

17 - E xcuse me

33 - E m busca do sol negro

collage collage

| 43 x 30 cm | 2013

| 19x 39 cm | 2014

collage collage

| 21x 24 cm | 2014

| 21x 24 cm | 2014


Notas 1- LIMA, Sergio. Collage, sobre a re-utilização dos resíduos (impressos) do registro fotográfico em nova superfície São Paulo: Editora Parma, 1984. 2- SALGADO, Marcus. A arqueologia do resíduo: Ossos do mundo sob o olhar selvagem. São Paulo: Editora Antiqua, 2013, p. 90. 3- BELTING, Hans. An Anthropology of Images: Picture, Medium, Body. Woodstock: Princeton University Press, 2014. 4- AVENS, Robert. Imagination is Reality. Dallas: Spring Publications, 1979, p. 28-29. 5- BARFIELD, Owen. The Rediscovery of Meaning and other essays. Middletown: Wesleyan University Press, 1977, p. 16. 6- CICERO, de orat. 2.86.351-3, cited by D. Campbell, Greek Lyric III, Loeb Classical Library, 1991, p. 375. 7- LIMA, S. – op. cit, p. 7. 8- MATTHEWS, J.H. The imagery of surrealismo. New York: Syracuse University Press, 1977. 9- LIMA, S. – op. cit, p. 41. 10- NÖTH, Winfried; SANTAELLA, A semiótica da imagem no signo do linguocentrismo. In: Imagem: Cognição, Semiótica, Mídia. São Paulo: Iluminuras, 1998, p. 47 e 48.


Bruno Barnabé é formado em design de multimídia pelo Centro Universitário Senac, estudou desenho experimental e gravura na Central Saint Martins e no London College of Communication. Para construir suas imagens, Bruno mistura a collage surrealista com gravura, pintura, manipulação digital e projeção. Há mais de quinze anos o artista garimpa publicações antigas, resíduos de registro fotográfico e material gráfico de diversas partes do mundo.



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