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Giorgia Prates e o olhar que resume todos os sonhos

Arepulsa ao uso de vestidos já na primeira infância e o desconforto ao imitar as poses feitas por sua irmã, numa tentativa de ser mais feminina nas fotografias de família, são alguns dos pontos que justificam a frase emitida com tanta firmeza, demonstrando que Giorgia Prates nunca teve dúvidas quanto a ser quem é.

Giorgia nasceu em 1978, em um ano conturbado para a História do Brasil. Naquele período, a ditadura militar intensificava as regras e impunha mais restrições às liberdades individuais e coletivas. O conservadorismo era violentamente estimulado em termos morais.

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Cláudia Kanoni No ano de seu nascimento, LGBT’s eram alvos “privilegiados” da repressão, um cenário com prenúncio de desafios adicionais à sua orientação sexual. Porém, sua história também é marcada pela esperança. Não à toa, a data de seu nascimento, 23 de setembro, coincide com o início da primavera, estação que traz consigo uma promessa de renovação. Libriana, recebeu dos astros a diplomacia para construir sua militância sob o aspecto do diálogo e da temperança.

Giorgia Tais Xavier Prates é a quarta filha de um casal de trabalhadores. O pai, seu Francisco, era um baiano, negro retinto e metalúrgico. A mãe, dona Yara, uma mulher branca, paulista criada em Curitiba e liderança comunitária que dividia o tempo entre os afazeres do lar com “bi- cos” de auxiliar de limpeza e atendente do varejo.

Ao narrar sua infância, não esconde a nostalgia que sente ao lembrar da comunidade em que cresceu, na cidade de São Paulo, onde foi vizinha de uma ocupação em que as ruas eram de terra batida, com casas espaçadas entre si. Despretensiosamente assistia, ainda pequena, a luta por moradia. Atravessou a adolescência inteira vendo seus pais serem “padrinhos” do bairro.

O afeto coletivo parece ser característica marcante de seus pais. A sua mãe é descrita como uma mulher discreta, afetuosa e maternal que aglutinava crianças em torno de si, sempre promovendo risos, brincadeiras e festejos em todas as datas comemorativas. A alegria da vila. Giorgia, por sua vez, era adepta das brincadeiras mais descoladas, renuncia- va a bonecas e não nutria interesse pelo sonho das meninas de sua época. Embora não tivesse um discurso organizado, não via graça nas assistentes de palco da Xuxa Meneghel, as famosas paquitas. Havia até um certo incômodo, mas essa era uma questão que perpassava aspectos de gênero e seu olhar ainda não tinha as lentes racializadas para problematizar a questão.

Fase Dif Cil De Lembrar

Ao ser questionada sobre a fase escolar, Giorgia se move para dentro, quase numa hipnose regressiva. O gesto anuncia um exercício de preparo emocional para a confissão “Eu nunca dei sorte com a escola, foram os anos mais difíceis da minha vida”, inicia substituindo a nostalgia pela tensão. É que embora se reconhecer lésbica tenha sido relativamente fácil, ser respeitada como tal foi o seu maior desafio.

Na escola, era vista como uma ameaça à inocência. As professoras temiam a presença de uma menina negra retinta e visivelmente lésbica entre as demais estudantes. Diante do temor de todos ao desconhecido, recebeu como principal incumbência se manter em silêncio, afastada de tudo e principalmente, de todas. Até os estímulos visuais foram proibidos e sua convivência foi interditada.

“Na época, ser LGBT era ser vista como aidética, drogada e no meu caso, traficante. As professoras achavam que eu seduzia as meninas e passava drogas para os meninos. Essa é uma fase difícil até de lembrar”.

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