DeteriorAÇÃO de Bino Sousa

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ROSA I

Intervenção urbana: fragmento de grade sobre parte de uma balsa de ferro, 100 cm de diâmetro. Porto das Mangueiras. Marabá – PA, 2015.


DETERIORAÇÃO Bino Sousa

BOLSA DE CRIAÇÃO, EXPERIMENTAÇÃO, PESQUISA E DIVULGAÇÃO ARTÍSTICA – 2015 GOVERNO DO ESTADO DO PARÁ FUNDAÇÃO CULTURAL DO ESTADO DO PARÁ CENTRO DE EXPERIMENTAÇÃO E PESQUISA ARTÍSTICA E CULTURAL

ÁS DE COPAS

Objeto/instalação: fragmento de grade sobre placa de ferro. 100 cm x 80 cm.


Grade: armação de ferro feita pelo homem para um exclusivo fim: limitar. Sua composição está sujeita a ação do tempo à DeteriorAÇÃO.


Liberto do carrasco tempo. Liberto da necessidade de separar. Liberto de suas obrigaçþes. L i v r e.


Ação efêmera, Orla de Marabá, 2015.

“Fronteira de recortes. Tudo que vejo está recortado, recortado por linhas de ferro, por moldes repetidos, moldes rígidos e frios, moldes que são apenas moldes. Um recorte que moldura minha paisagem.” BINO SOUSA


BINO SOUSA

E O ESPAÇO INTERSTICIAL Desconstrução do discurso genealógico da grade de ferro

Inculca-se com a metáfora da proteção e nessa fronteira

pensa

existir

uma

dicotomia

entre

o

significado do interior e exterior das casas, entre a Bino Sousa parte de uma interrogativa simples:

propriedade privada e seus moradores. Suas reflexões

Seria a grade de ferro, presentes nas fachadas das

são

residências, uma forma de proteção aos moradores? À

deflagrar uma espécie de mundo fenomenal que o

medida que se debruça na pesquisa sobre o objeto

desafia e interessa-se em desconstruir o discurso da

grade de ferro, o artista envolve-se numa trama

grade de ferro para então penetrar em outras

complexa de indagações subjetivas que

vai da

concepções da ordem de um espaço intersensorial;

preocupação social a plasticidade, do estilo urbano a

resultando em aprendizagem do fenômeno, movido

tecnologia do ferro, da pintura em tela e do grafite a

por uma plasticidade intersticial na fronteira do saber

corrosão de metais, a forma adquirida pelo ferro etc.

fazer e do saber pesquisar arte.

provocadoras,

quer

ir

além

dos

conceitos,


Nessa tessitura, Bino transforma o fenomenal em indicial, uma referência aos seus anseios comprometidos com o fabricar das coisas. A premissa é de que enquanto fabrica uma ideia, inventa um modo de fazer coisas, que somente através da experimentação é que

resulta em formas artísticas que o satisfaçam, pelo fato de ter encontrado um dado conteúdo no modo de fazer. Nessa condição, num espírito próprio de ser, algo lhe passa a dizer o que ela (a forma) é e, ao mesmo tempo, o que pode significar em forma da matéria formada. Isso diz respeito ao corpo (matéria/ ferro/ condição do material/ oxidação/ vestígio/ desgaste) que em constante transformação passa a ser o que o artista busca. Porém, há de se considerar que, nesse método, existe uma matéria formada que quer ser algo na mente do artista, e que não será somente o que ele observa em seu corpo abandonado no repositório: antes de tudo, a forma em sua captura corporal erguer-se como uma imagem formada e autônoma.


Por esse motivo é que consegue captar o valor artístico do objeto ferroso, e então, parte para a dinâmica do exercício com a estrutura encontrada: a forma visual se apresenta à sua percepção, e esta, enquanto formada, atua nele (o artista) como formante, ao mesmo tempo em que estabelece o seu processo de elaboração sem que o artista o saiba conscientemente; daí a forma formada age nele (artista) e ele pensa que está agindo, ele mesmo, sobre ela. O que resta ao artista é apoderar-se do processo de formação e, junto com a forma dialética, deixar o diálogo para o espectador. Este irá resolver se a imagem formada pelo artista nesse embate, é o fim em si ou se ele (espectador) irá completar o processo de formação através da intelecção – interpretá-la, penetrá-la, representá-la e tomá-la reveladora para si.



Discutir tal processo de criação na construção . poética e estética em Bino é enveredar pelo fascínio do exercício de suas construções bidimensionais – instalações – e encontrar percursos que o levem a diferentes caminhos: da pintura ao environment, ao ready-made, ao assemblage, à performatividade gráfico-visual. Tais percursos contribuem para o amadurecimento do artista, que se deleita em explorar as possibilidades do espaço que percorre e do material fruto dessa dialogia. Aliás,

a

dedicação

ao

ensaio

criador,

incursiona-o do campo das coisas inservíveis à

urbanidade, por isso as visitas aos ferros velhos, estaleiros e repositórios de metais recolhidos. Encontra artefatos invisíveis ainda exalando efeito estético. É ali que Bino se oferece ao ferro (forma encontrada), adota a matéria instável do metal abandonado ao ar livre, e faz construções, idealiza percursos,

narrativas,

deslocando

o

artefato

encontrado para a sua percepção, promovendo a ênfase

no

DeteriorAção.

discurso

estético

com

base

na


Não é à toa que Bino contracena com o metal e, em outra entrega instigadora, opera nesse encontro criador, posto que isso irá exigir-lhe um gesto, um drama a ser vivido a partir de uma intensa paixão pela forma viva do “arabesco coração de ferro”. Intrigado pelo metal oxidado, símbolo da memória urbana da cidade de Marabá, quer desvendar um saber e

o que ele representa nessa procura. Todavia, há uma busca que não se explica, mas é evidente o pulsar do desejo de conhecer o material que o desafia. A melhor tradução a tudo isso é significado

pelos

conceitos,

um

sinal

do

percurso mental do artista sobre a construção da obra: ferrugem, marca do tempo, memória, croqui, esboço, ensaio, anotação, registro, resto, rastro, projeto e tantos outros.


Como bem disse Tessler (2013, p.19), na apresentação da obra “Gesto inacabado: processo de criação artística”: “um gesto inacabado não finda. Um gesto gesta. [...] Por menor que seja o intervalo entre a intenção e a realização, é ali que a criação

tem lugar”. Além do mais, a metáfora inicial passa a ser a da materialidade formante no espaço limiar do repositório, do interstício da forma deixada, largada e abandonada ao tempo, na qual Bino - antes que a matéria ferrosa se consolide em performance da ferrugem - age, interrompe e adiciona o coração de ferro e, nesse processo, a interação simbólica é o interstício da transformação da placa, por exemplo, que se constrói pela diferença entre o pobre ferro abandonado no repositório – a grade que teve seu

status na residência dos homens e mulheres marabaenses – agora dorme no atelier do artista sob o paramento da ressignificação, do experimento

ensaístico como obra de arte.


Enfim, é a passagem do intersticial entre identificação e possibilidades híbridas que se dimensionam no legado e importância da pesquisa de Bino com suas instalações bidimensionais, faz pulsar o coração de ferro na obra. É como em Renée Green (artista negra norte americana) que tira do interstício suas metáforas para falar de sua identidade, nos espaços e materiais de menor importância social para o mundo e dalí ergue signos que discursam sua etnia. Bino, é assim, explode o momento de seu tempo como um tempo do agora, sem que o tempo pedagógico se apresente como limite

do

seu

fabricar

coisas,

mas

que

seu

tempo

performático signifique a temporalidade de todo o processo do seu ato dinâmico de diálogo com a forma formante

formada – à DeteriorAção.

ALIXANDRE SANTOS FILHO, 2015


DIÁLOGOS

Objeto/instalação: fragmentos de grades sobre mesa de ferro. 100 cm x 80 cm


RUMOS

Objeto/instalação: fragmentos de grades sobre placa de ferro. 170 cm x 70 cm


imagem: natacha barros

ROSA II

Intervenção urbana: fragmento de grade sobre bobina de madeira, 130 cm de diâmetro. Praça Duque de Caxias. Marabá - PA


ROSA III

Objeto/ instalação: fragmentos de grades sobre placa de ferro. 100 cm x 100 cm


imagem: natacha barros


pág. anterior

ROSA IV Intervenção urbana: fragmentos de grades sobre grade de ferro. Praça no bairro Santa Rosa. Marabá-PA

FLEXAS

Objeto/instalação: fragmentos de grades sobre placa de ferro 110 cm x 40 cm


imagem: natacha barros


GIRASSOL

Objeto/ instalação: fragmentos de grades sobre placa de ferro 60 cm x 60 cm


S/ TÍTULO

Objeto/instalação: fragmentos de grades sobre placas de ferro. 100 cm x 80 cm


AGRADECIMENTOS Em especial, a Deus e á minha família, em particular a minha esposa Suzana Sampaio Sousa e meu filho Cristofer Bino V. Sousa que estiveram sempre presentes nos processos de pesquisa, ao amigo Leonardo Heikmam que fez parte da construção ideológica do projeto, a Vitória Barros, responsável Geral da Galeria de Arte Vitória Barros na qual sou artista residente. Agradeço ao artesão Evandro Felix Mourão que participou diretamente da construção dos objetos de ferro.


CATÁLOGO DETERIORAÇÃO Bino Sousa

Bino Sousa

arte e design

Natacha barros diagramação

BOLSA DE CRIAÇÃO, EXPERIMENTAÇÃO, PESQUISA E DIVULGAÇÃO ARTÍSTICA – 2015 GOVERNO DO ESTADO DO PARÁ FUNDAÇÃO CULTURAL DO ESTADO DO PARÁ CENTRO DE EXPERIMENTAÇÃO E PESQUISA ARTÍSTICA E CULTURAL

APOIO Galeria de Arte Vitória Barros Av. Itacaiúnas, 1519 Novo Horizonte, Marabá-PA 94 3324 1258

Alixandre Santos Filho (Alixa) texto

Natacha Barros imagem de capa

VÍDEO Thiago Torres

captação e Edição

EXPOSIÇÃO Natacha Barros

curadoria e fotografia

Natacha Barros e Bino Sousa expografia e montagem


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