ReBEQ v.4 n.1 - Revista Brasileira de Ensino de Química

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ISSN 1809-6158

VOLUME 04 | NÚMERO 01 | JAN./JUN. 2009


VOLUME 04 | NÚMERO 01 | JAN./JUN. 2009

Coordenação Editorial Pedro Faria dos Santos Filho – UNICAMP Robson Fernandes de Farias – UFRR Wilon Mazalla Jr – Editora Átomo Conselho Editorial Adriana Vitorino Rossi – UNICAMP Gláucia Maria da Silva – USP|RP Marcelo Carneiro Leão – UFRPE Mário Sérgio Galhiane – UNESP Osvaldo Antonio Serra – FFCLRP-USP Ótom Anselmo de Oliveira – UFRN Ricardo Ferreira – UFPE Sérgio Melo – UFC Yassuko Iamamoto – USP

Revista Brasileira de Ensino de Química (ReBEQ) é uma publicação semestral da Editora Átomo e colaboradores. Dentro do espírito maior da editora, que é a difusão do conhecimento por meio da democratização das valiosas pesquisas e avanços científico-educacionais, quase sempre em latência nas boas universidades, e pelo intercâmbio de ideias e experiências daqueles que participam do processo ensino/aprendizagem, a ReBEQ inaugura novo espaço, abrindo suas páginas para pesquisadores, docentes (ensino médio e superior), alunos de graduação e pós-graduação, com a visão de que o conhecimento deve ser construído e compartilhado coletivamente. O conhe­ cimento contemporâneo deve ser apresentado de forma inter/ transdisciplinar trazendo preocupações como a ética, o meio ambiente e a humanização dos processos e serviços. Centrada nas questões ensino/aprendizagem, visa contribuir para a atuali­ zação e otimização do Ensino de Química.

Conselho Ad hoc Marlon Herbert F. B. Soares – UFG Nidia Franca Roque – UFBA Viviani Alves de Lima – UFU Revista Brasileira de Ensino de Química rebeq@atomoealinea.com.br www.atomoealinea.com.br/rebeq Revisão

Ficha catalográfica elaborada pelo Sistema de Bibliotecas e Informação PUC-Campinas Revista Brasileira de Ensino de Química Campinas, SP: Editora Átomo, 2006 v. 1, n. 1, jun./jun. 2006 Semestral Publicação científica-educacional 1. Química – Periódicos. 2. Ciências exatas – Periódicos.

Helena Moysés Capa e Editoração Eletrônica

CDD 540

Fabio Diego da Silva Indexada

Índice para Catálogo Sistemático 1. Química

540

Pede-se permuta. - Pide-se cange. We ask for exchange. - On demande l’echange. Si sollecita intercambio. Wir bitten un aurstausch un publikationen.

Rua Tiradentes, 1053 - Guanabara - Campinas-SP CEP 13023-191 - PABX: (19) 3232.9340 e 3232.2319 www.atomoealinea.com.br


VOLUME 04 | NÚMERO 01 | JAN./JUN. 2009

Sumário

7

Editorial

Artigos

9

15

A Influência da Diferença de Eletronegatividade na Força da Ligação Covalente Pedro Faria dos Santos Filho e Samira Faria Câmara Sales

Planejamento da Disciplina “Cosméticos e Produtos de Higiene Pessoal – Alguns Conceitos e Aplicações” Hugo B. Suffredini e Paulo Alves Porto

Relatos de Experiência

23

Modelo Estruturante como Organizador de Ciclos de Estudo de Conteúdos Temáticos de Química no Ensino Médio Regular Dirceu Donizetti Dias de Souza e Agnaldo Arroio

37

Ivoneide de C. L. Barros, Vanuza O. dos Santos e Allana Christina S. de Oliveira

45

Análise do Conhecimento das Funções Orgânicas Utilizando Estruturas Químicas de Polímeros Comerciais

Oficina de Química: experimentação para alunos do ensino médio

Ana Paula Lima Pacheco e Kátia Aparecida Silva Aquino

55

Estudo da Implementação de um Curso Introdutório ao Software ACDLabs ChemSketch a Graduandos em Química Wilmo E. Francisco Junior, Welington Francisco, Maurílio A. de Morais, Carolina von Atzingen Manocchio Miguel Ruiz


Instrumentos e Criatividade

65

Produção de um Agitador Mecânico Alternativo para o Ensino de Química Carlos Alberto Fernandes de Oliveira, Evandro Ferreira da Silva, Inakã Silva Barreto, Jacqueline Cristina Bueno Janice de Jesus, João Batista Moura de Resende Filho, João Jarllys Nóbrega de Souza, Liliane Rodrigues de Andrade, Umberto Gomes da Silva Júnior e Yasmine Ísis Fernandes do Nascimento

História da Química

71

RFF

73

Memória Fotográfica Os pioneiros da química de produtos naturais

75 77

Você Conhece o Erlenmeyer ?

Resenhas Normas para Publicação


Contents

7

Editorial

Articles

9

15

The Influence of Electronegativity Difference on the Covalent Bond Strength Pedro Faria dos Santos Filho e Samira Faria Câmara Sales

Planning the Discipline “Cosmetics and Personal Hygiene Products - Some Concepts and Applications” Hugo B. Suffredini e Paulo Alves Porto

Experiences Account

23

Dirceu Donizetti Dias de Souza e Agnaldo Arroio

37

Ivoneide de C. L. Barros, Vanuza O. dos Santos e Allana Christina S. de Oliveira

45

55

Structuring Model as Organiser of Study Cycles of Thematic Content in High School Chemistry Set

Chemistry Workshop: tests for the high school students

Analysis of Knowledge of Organic Functions Using Chemical Structures of Commercial Polymers Ana Paula Lima Pacheco e Kátia Aparecida Silva Aquino

Implementation Study of an Introductory Course to the ACDLabs ChemSketch Software to Students of Chemistry Wilmo E. Francisco Junior, Welington Francisco, Maurílio A. de Morais, Carolina von Atzingen Manocchio Miguel Ruiz

Tools and Creativity

65

Production of an Alternative Mechanic Shaker for Chemistry Teaching Carlos Alberto Fernandes de Oliveira, Evandro Ferreira da Silva, Inakã Silva Barreto, Jacqueline Cristina Bueno Janice de Jesus, João Batista Moura de Resende Filho, João Jarllys Nóbrega de Souza, Liliane Rodrigues de Andrade, Umberto Gomes da Silva Júnior e Yasmine Ísis Fernandes do Nascimento


Chemistry History

71

RFF

73

Photografic Memory The Pioneers of the Natural Products Chemistry

75 77

Do you Know Erlenmeyer?

Reviews Editorial Standard


Editorial

Em sua curta existência a ReBEQ vem se consolidando como um importante veículo de divulgação de pesquisas em ensino de Química realizadas nas diferentes regiões do país. É importante destacar que muitos dos trabalhos já publicados são de pesquisadores ainda em início de carreira, ou mesmo estudantes de pós-graduação engajados em algum programa de ensino de suas instituições. Isso mostra que a proposta da ReBEQ, de oferecer espaço e oportunidade a todos aqueles que se dedicam ao ensino, vem encontrando respaldo em nossa comunidade acadêmica. Destaque especial deve ser dado à seção Instrumentos e Criatividade, onde percebemos a capacidade de superação de nossos alunos e professores em encontrar maneiras simples e baratas de contornar os problemas de falta de insumos para realizar atividades práticas. Destaca-se o fato de já terem sido propostos agitadores magnéticos e mecânicos, buretas e chapas de aquecimento, construídos a partir de insumos encontrados em qualquer região do país. E o mais importante é que todos estes equipamentos, fruto da criatividade de nossos professores, têm sua eficiência comprovada segundo critérios rigorosos de avaliação. Por isso mesmo, convocamos, mais uma vez, professores, alunos e técnicos que atuam em laboratórios de ensino, a divulgarem para toda a comunidade as estratégias que encontram para contornar a falta de insumos de laboratório, e propiciar a realização de experimentos de baixo custo, sem perder a qualidade na informação que é passada aos alunos. A ReBEQ, cumprindo seu papel de divulgação na área de Ensino de Química, se compromete a investir na divulgação desta iniciativa e convoca todos os profissionais de química que atuam em atividades práticas a relatarem suas experiências e iniciativas neste sentido.

Coordenação Editorial



Artigo 01 | Volume 04 | Número 01 | Jan./Jun. 2009

p. 09-14

A Influência da Diferença de Eletronegatividade na Força da Ligação Covalente The Influence of Electronegativity Difference on the Covalent Bond Strength Pedro Faria dos Santos Filho Samira Faria Câmara Sales Universidade Estadual de Campinas - Instituto de Química pfaria@iqm.unicamp.br

Resumo No estudo da ligação covalente, a análise e a comparação entre os valores de entalpia de ligação são muito importantes, uma vez que eles podem auxiliar tanto no entendimento das propriedades físicas, quanto do comportamento químico das espécies. Neste trabalho, apresentamos uma série de comparações entre valores de entalpia de ligação, associando-os às diferenças de eletronegatividade entre os átomos que participam das ligações. Estas comparações nos permitem afirmar que a diferença de eletronegatividade é importante e deve ser levada em conta na análise da força da ligação covalente. Além disso, elas nos permitem, também, constatar que a diferença de eletronegatividade contribui para a força da ligação covalente, de forma mais efetiva, quando os átomos que participam da ligação são pequenos. Finalmente, a influência da diferença de eletronegatividade só pode ser levada em conta quando a comparação for feita entre ligações em que todos os átomos se encontrem, mais ou menos, nas mesmas regiões da tabela periódica. Palavras-chave: eletronegatividade; força da ligação; ligação covalente. Abstract In the covalent bond study, the analysis and comparison among bond enthalpy values are very important once they can help to explain physical properties as well as chemical behavior. In this work we present a series of comparisons between bond enthalpies values, relating them to the difference in electronegativity among the atoms. These comparisons enable us to state that the difference in electronegativity is important and must be taken into account on the analysis of the covalent bond


strength. Besides this, the difference in electronegativity contributes more effectively to the bond strength when the participating atoms are lighter. Finally, the infl uence of the electronegativity difference can only be taken into account when the comparison is between bonds where all the atoms are in the same region of the periodic table. Key-words: electronegativity; bond strength; covalent bond.

Introdução Na formação acadêmica do químico, assun-

uma consequência da natureza da ligação química entre os átomos que compõem estas moléculas.

tos como estrutura atômica, ligação química e forças intermoleculares são estudados logo no início do curso de graduação e, normalmente, não são retomados posteriormente. Apesar de sua importância na formação dos profi ssionais de química, esses assuntos acabam não sendo consolidados porque são discutidos muito prematuramente. Da mesma forma, nos livros utilizados nos cursos de graduação (Shriver; Atkins, 2003; Mahan, 1972; Norman, 1994; Huheey; Keiter; Keiter, 1993), tanto nos antigos quanto nos mais atuais, a abordagem esclarece os modelos disponíveis para se interpretar e entender a natureza da ligação química, mas não evolui sufi cientemente para se comparar compostos dos mais variados, a ponto de se perceber a infl uência da eletronegatividade na força da ligação covalente. Neste trabalho, pretendemos avaliar a força da ligação covalente entre átomos dos elementos dos blocos s e p, tanto em ligações homonucleares quanto em heteronucleares, para verifi car a infl uência da diferença de eletronegatividade na força desta ligação. Devido à abrangência deste tema, nos limitaremos-nos apenas à discussão das ligações sigma. Esta avaliação é muito importante porque os vários aspectos inerentes à atividade do químico, em particular o entendimento das transformações que ocorrem em compostos moleculares, estão intimamente relacionados à força com que os átomos são mantidos unidos. Da mesma maneira, as propriedades físicas destes compostos moleculares também são interpretadas à luz do entendimento das forças intermoleculares que, na realidade, acabam sendo

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REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 04 | Número 01

Ligações Sigma Homonucleares O modelo a ser utilizado nesta discussão, que permite um raciocínio mais fácil e rápido, e que também é facilmente imaginável, é a Teoria da Ligação de Valência. Devido a sua simplicidade, este modelo apresenta a grande vantagem de poder ser utilizado rotineiramente, baseado em pressupostos bastante simples, quanto à localização de pares de elétrons em determinadas regiões da molécula. Além disso, todas as observações serão baseadas em valores de entalpias de ligação descritos na literatura (Huheey; Keiter; Keiter, 1993). Comparando-se os valores de entalpia de ligação (Huheey; Keiter; Keiter, 1993) (kJ mol-1) para ligações homonucleares dos elementos do bloco p, no segundo período da tabela periódica, temos: B-B(295), C-C(345), N-N(167), O-O(142) e F-F(155). A comparação entre esses valores indica que, em uma primeira análise, não existe qualquer regularidade ou tendência entre eles. O que se pode dizer é que o que determina a força da interação é o overlap ou a atração simultânea dos dois núcleos pelos mesmos elétrons. Diante disto, o que pode impedir uma maior aproximação entre os átomos que interagem, é a repulsão que se estabelece entre os elétrons não compartilhados existentes em cada átomo, além do tamanho dos átomos envolvidos. Desta maneira, o que podemos afi rmar para o segundo período da tabela periódica é que, comparando-se as ligações sigma entre átomos de boro ou carbono, em ambas, não existem elétrons


A Influência da Diferença de Eletronegatividade na Força da Ligação Covalente

não compartilhados, ao passo que o número de elétrons compartilhados ao redor do carbono é maior, provocando uma maior atração simultânea, e uma maior aproximação entre os átomos. Além disso, não podemos esquecer que o átomo de carbono é menor que o de boro, o que facilita uma maior aproximação entre os mesmos. Desta maneira, a ligação entre os átomos de carbono é mais forte. Quando comparamos as ligações subsequen­ tes, observamos que os átomos vão se tornando cada vez menores, ao passo que o número de elétrons não compartilhados vai se tornando cada vez maior. Desta maneira, comparando-se as ligações entre os átomos de carbono e os de nitrogênio, observamos que a ligação N-N é bem mais fraca. Isso é atribuído à repulsão entre os elétrons não compartilhados em ambos os átomos, o que inibe uma maior aproximação entre eles. O mesmo pode ser dito da ligação O-O, que se torna mais fraca ainda. Por outro lado, quan­ do observamos o valor da entalpia de ligação flúor­ ‑flúor, verificamos que esta ligação é mais forte que a ligação entre dois átomos de oxigênio, mesmo apresentando um maior número de elétrons não compartilhados. Na verdade, o que ocorre aqui é que esta maior repulsão acaba sendo compensada, em parte, pela maior eletronegatividade do átomo de flúor, que traz consigo uma maior atração simultânea e uma maior tendência a uma aproximação mais acentuada entre os átomos. É óbvio que isso não pode ser previsto! Só podemos fazer esta afirmação conhecendo os valores de entalpia de ligação. Os valores das entalpias de ligação homo­ nucleares para os elementos do bloco p dos outros períodos da tabela periódica são mostrados no Quadro 1. Quadro 1. Valores de entalpia de ligação (kJ mol-1) para ligações s homonucleares dos elementos do bloco p.

*

B-B (293)

C-C (345)

N-N (167)

O-O (142)

F-F (154)

Al-Al*

Si-Si (222)

P-P (201)

S-S (226)

Cl-Cl (239)

Ga-Ga (113)

Ge-Ge (188)

As-As (146)

Se-Se (172)

Br-Br (190)

In-In (100)

Sn-Sn (146)

Sb-Sb (121)

Te-Te (126)

I-I (148)

Valor não descrito na literatura.

A comparação entre os valores mostrados no quadro 1 indica que, excetuando-se o segundo período, em geral, as ligações entre os átomos vão se tornando mais fracas à medida que aumenta o período (3p → 4p → 5p). A explicação mais simples para isso é que, conforme aumenta o valor do número quântico n, os átomos vão se tornando cada vez maiores; com isso, a superposição, ou sobreposição, entre os orbitais atômicos vai se tornando cada vez menos efetiva porque os orbitais se tornam cada vez mais difusos à medida que o seu tamanho aumenta. Além disso, como os átomos vão se tornando cada vez maiores, a repulsão entre os elétrons não compartilhados dos dois átomos vai se tornando cada vez menos importante. É interessante observar que os mesmos argu­ mentos utilizados na comparação das entalpias de ligação homonucleares para os elementos np, são igualmente válidos para aquelas dos elementos ns. O Quadro 2 mostra uma comparação destes valores. Quadro 2. Valores de entalpia de ligação (kJ mol-1) para ligações s homonucleares dos elementos do bloco s. Li-Li (105)

Be-Be (208)

Na-Na (72)

Mg-Mg (129)

K-K (49)

Ca-Ca (105)

Rb-Rb (45)

Sr-Sr (84)

Cs-Cs (43)

-

Estas comparações que acabamos de estabe­lecer são relativamente simples de serem feitas e os efeitos operantes em cada uma delas (atração simultânea, repulsão entre os pares não compartilhados, tamanho dos átomos envolvidos) são fáceis de serem interpretados. Além disso, o número de ligações homo­ nucleares que podem se formar a partir dos ele­ mentos ns e np é limitado a 30. Por outro lado, quando estendemos estas ideias para ligações heteronucleares, a situação se torna bem mais complicada porque, além dos efeitos operantes que já mencionamos anteriormente, passa a existir outro parâmetro, talvez até mais importante que os anteriores: a eletronegatividade. Esse parâmetro REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 04 | Número 01

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Pedro Faria dos Santos Filho e Samira Faria Câmara Sales

é defi nido como a habilidade de um átomo (núcleo) atrair em sua direção a densidade eletrônica situada entre dois átomos (núcleos) em uma molécula (Huheey; Keiter; Keiter, 1993).

Ligações Sigma Heteronucleares A natureza das ligações químicas pode ser decisiva na determinação do comportamento de uma molécula, ou mesmo na comparação de sua reatividade com moléculas correspondentes. É interessante, por exemplo, tentar comparar o comportamento de moléculas que envolvem átomos do segundo período da tabela periódica, com o dos compostos correspondentes envolvendo elementos do terceiro ou quarto períodos. Em muitas situações, a força da interação entre os átomos acaba tendo um papel decisivo nestas comparações. Diante disto, fi ca evidente que é importante entendermos as diferenças entre as interações envolvendo átomos diferentes. Quando comparamos ligações puramente sigma entre átomos, a primeira dúvida que surge acaba sendo se as ligações homonucleares são mais fortes ou mais fracas que aquelas heteronucleares. A constatação é muito simples de ser feita, bastando apenas comparar os valores determinados experimentalmente, descritos na literatura (Huheey; Keiter; Keiter, 1993). O Quadro 3 indica os valores observados para as ligações entre o carbono e os átomos dos halogênios, com as respectivas diferenças de eletronegatividade (Classifi cação Periódica dos Elementos, 1996), segundo a escala de Pauling. Quadro 3. Valores de entalpia de ligação (kJ mol-1) para ligações s onde um dos átomos é de carbono.

12

Ligação

Entalpia de ligação

Diferença de eletronegatividade

C-F

485

1.43

C-Cl

327

0.61

C-Br

285

0.41

C-I

213

0.11

C-C

345

0

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A partir destes dados fi ca evidente que, se compararmos as ligações do carbono com os halogênios, quanto maior a diferença de eletronegatividade entre os átomos envolvidos, mais forte será a ligação. Em outras palavras, podemos dizer também que à medida que o halogênio varia de 2p → 5p, a interação com o orbital p mais externo vai fi cando cada vez mais fraca porque o orbital se torna cada vez mais difuso. Aparentemente, a diferença de eletronegatividade é importante, só que ela é mais importante entre elementos pequenos. Esta mesma constatação pode ser feita comparando-se os valores para os compostos de hidrogênio e halogênios, como mostrado no Quadro 4. Destas duas comparações que acabamos de fazer, podemos observar que a comparação entre as ligações heteronucleares segue, nitidamente, a mesma tendência, ou seja, quanto maior a diferença de eletronegatividade, mais forte a ligação. Entretanto, em ambos os casos, as ligações homonucleares C-C e H-H não se inserem neste contexto, uma vez que seria de se esperar que elas fossem as mais fracas nos respectivos grupos de compostos. Na verdade, o que se observa é que estas ligações só são mais fracas que aquelas onde existe a maior diferença de eletronegatividade. Quadro 4. Valores de entalpia de ligação (kJ mol-1) para ligações s onde um dos átomos é de hidrogênio. Ligação

Entalpia de ligação

Diferença de eletronegatividade

H-F

569

1.78

H-Cl

431

0.96

H-Br

366

0.76

H-I

298

0.46

H-H

435

0

Devemos observar, ainda que a grosso modo, como o hidrogênio e o carbono são átomos pequenos, a maior importância da diferença de eletronegatividade se manifesta mais pronunciadamente só até o terceiro período da tabela periódica. Se fi zermos esse mesmo tipo de comparação, mas fi xando agora um átomo de


A Influência da Diferença de Eletronegatividade na Força da Ligação Covalente

um elemento 5p, observamos os dados mostrados no Quadro 5. Quadro 5. entalpias de ligação (kJ mol-1) para ligações s onde um dos átomos é do quinto período da tabela periódica. Ligação

Entalpia de ligação

Diferença de eletronegatividade

Sn-F

414

2.02

Sn-Cl

323

1.20

Sn-Br

272

1.00

Sn-I

205

0.70

Sn-Sn

146

0

Estes dados indicam que é possível que duas ligações que apresentam quase que a mesma diferença de eletronegatividade entre os átomos envolvidos, possam apresentar entalpias de ligação completamente diferentes. Isso ocorre porque os dois átomos envolvidos na ligação CO são “pequenos”, enquanto que os dois envolvidos na ligação In-I são “grandes”. Assim, parece que a diferença de eletronegatividade só pode ser utilizada para justi­ ficar a diferença na força da ligação covalente entre duas moléculas apenas quando, em ambas, os átomos guardam entre si, aproximadamente, a

Observamos esse mesmo tipo de variação ao compararmos as ligações do silício com todos os halogênios, com a diferença de que as ligações com o silício são todas mais fortes que as correspondentes com estanho. Esses valores mostram agora uma perfeita tendência referente à relação entre a entalpia de ligação e a diferença de eletronegatividade. No último quadro podemos, claramente, fazer a “generalização” que quanto maior a diferença de eletronegatividade entre os átomos envolvidos, maior a entalpia de ligação e/ ou mais forte a ligação sigma. Devemos observar que em todos os exemplos anteriores, as ligações são essencialmente sigma, não tendo qualquer con­ tribuição π. Do que observamos até aqui, fica claro que a diferença de eletronegatividade é importante na consideração da força de uma ligação heteronuclear. Entretanto, ela não é o parâmetro decisivo, que determina a força da interação. Esta afirmação pode ser constatada comparando-se as ligações simples C-O e In-I, como mostrado no Quadro 6. Quadro 6. Comparação entre os valores de entalpia de ligação (kJ mol-1) para ligações s diferentes com, aproxi­ madamente, a mesma diferença de eletronegatividade entre os átomos envolvidos. Ligação

Entalpia de ligação

Diferença de eletronegatividade

C-O

357

0.89

In-I

225

0.88

mesma relação de tamanho. Isso quer dizer que uma ligação puramente sigma, entre dois átomos pequenos e do mesmo elemento, pode muito bem ser mais forte e apresentar uma entalpia de ligação maior que uma ligação entre dois átomos que apresentam uma diferença de eletronegatividade razoável, mas que os dois átomos envolvidos sejam grandes. Isso pode ser verificado no Quadro 7. Quadro 7. Comparação entre os valores de entalpia de ligação (kJ mol-1) para ligações s diferentes, com diferentes valores de diferença de eletronegatividade entre os átomos envolvidos. A ligação com maior dife­ rença de eletronegatividade é a mais fraca. Ligação

Entalpia de ligação

Diferença de eletronegatividade

H-H

432

0.00

In-I

225

0.88

Assim, pode-se perceber que mesmo não havendo diferença de eletronegatividade entre os átomos na molécula de hidrogênio, esta acaba apresentando uma entalpia de ligação que é aproximadamente o dobro daquela para a ligação In-I, que apresenta uma diferença de 0.88. Por outro lado, esta mesma diferença de eletronegatividade pode ser a maior responsável pela ligação sigma C-O muito mais forte que a O-O, como mostrado no Quadro 8.

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Pedro Faria dos Santos Filho e Samira Faria Câmara Sales Quadro 8. Comparação entre os valores de entalpia de ligação (kJ mol-1) para ligações s diferentes, onde aquela que apresenta maior diferença de eletronegatividade tem a maior entalpia de ligação. Entalpia de ligação

Diferença de eletronegatividade

O-O

142

0.00

C-O

357

0.89

Ligação

É claro que na ligação O-O existe a contribuição por parte da repulsão entre os pares de elétrons não compartilhados nos dois átomos, que inibe uma aproximação maior entre os átomos e não permite uma superposição tão efetiva entre os orbitais dos dois átomos. Contudo, este efeito não pode ser o determinante para que a entalpia da ligação C-O seja, aproximadamente, 2,5 vezes aquela da ligação O-O.

pode ser utilizada nas comparações. Do contrário, as comparações acabam sendo errôneas. É claro que esta discussão pode ser muito mais ampla e abrangente, dependendo da necessidade e da formação desejada para os alunos. Infelizmente, ela não aparece nos livros didáticos e nem é feita em aulas expositivas. Por isso, acreditamos que nas disciplinas iniciais dos cursos de química e áreas afi ns, as discussões sobre ligações químicas do tipo sigma, devam ser acompanhadas destas comparações. Isto torna a discussão muito mais abrangente e permite racionalizar, de forma efi ciente, não somente algumas propriedades físicas, mas também o caráter ácido/base e a reatividade dos compostos. Do contrário, se isso não for feito, os valores de entalpia de ligação que aparecem nos livros tornam-se, apenas, um conjunto de dados descritivos, dissociado do raciocínio químico.

Comentários fi nais Este conjunto de dados, e as correspondentes comparações entre eles, nos indicam que, da mesma forma que, em muitas outras situações, as generalizações de certas afi rmações acabam não sendo convenientes. Neste caso específi co, de se associar diferenças nos valores de entalpia de ligação à diferença de eletronegatividade entre os átomos envolvidos, isto nem sempre é fácil de ser feito. Aparentemente, quando todos os átomos das duas ligações que se está querendo comparar se encontram, mais ou menos, na mesma região da tabela periódica, a diferença de eletronegatividade

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REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 04 | Número 01

REFERêNCIAS SHRIVER, D. F.; ATKINS, P. W. Química inorgânica. 3. ed. Porto Alegre: Bookman, 2003. MAHAN, B. H. Química um curso universitário. 2. ed. São Paulo: Edgar Blucher, 1972. NORMAN, N. C. Periodicity and the p-Block Elements. Oxford: Oxford University Press, 1994. HUHEEY, J. E.; KEITER, E. A.; KEITER, R. L. Inorganic chemistry: principles of structure and reactivity. 4. ed. New York, HarperCollins College Publishers , 1993. CLASSIFICAÇÃO PERIÓDICA DOS ELEMENTOS, Sociedade Brasileira de Química, São Paulo, 1996.


Artigo 02 | Volume 04 | Número 01 | Jan./Jun. 2009

p. 15-22

Planejamento da Disciplina “Cosméticos e Produtos de Higiene Pessoal – Alguns Conceitos e Aplicações” Planning the Discipline “Cosmetics and Personal Hygiene Products” Some Concepts and Applications Hugo B. Suffredini

Universidade Federal do ABC – Centro de Ciências Naturais e Humanas E-mail: hugo.suffredini@ufabc.edu.br

Paulo Alves Porto

Universidade de São Paulo – Instituto de Química

Resumo Esta experiência mostra como foi realizada a implementação da disciplina “Cosméticos e Produtos de Higiene Pessoal – Alguns Conceitos e Aplicações” na Universidade Federal do ABC (UFABC), possibilitando ao alunado um contato com algumas técnicas de manipulação, controle de qualidade e princípios químicos relacionados. A disciplina visa ser um contato inicial dos alunos de bacharelado em química com a fabricação e entendimento dos aspectos químicos fundamentais envolvidos com a fabricação de cosméticos e produtos de higiene pessoal. Em termos de competências e habilidades a serem desenvolvidas pelo aluno incluem-se a capacidade de utilizar vidrarias e equipamentos de forma correta, a seleção de matérias primas adequadas – prevendo possíveis alterações de qualidade e possíveis fontes de contaminação em cosméticos, bem como a observação das práticas de fabricação. Nesse processo, espera-se propiciar a integração dos conhecimentos químicos fundamentais, no contexto da temática aplicada. Palavras-chave: Aula prática, conhecimento químico, fabricação de cosméticos. Abstract This experience shows the implementation of the discipline “Cosmetics and Products of Personal Hygiene - Some Concepts and Applications” at the Federal University of ABC (UFABC), enabling students to have contact with some manipulation techniques, quality control and related chemical principles. The course aims to be an initial contact


of students with bachelor’s degree in chemical manufacturing and understanding of fundamental chemical aspects involved in the manufacture of cosmetics and toiletries. In terms of skills and abilities to be developed by the students it includes the ability to use glassware and equipment correctly, the selection of adequate raw materials - forecasting possible changes in quality and possible sources of contamination in cosmetics, as well as the observation of manufacturing practices. In this process, it is expected to facilitate the integration of fundamental Chemical knowledge in the context of the applied theme. Key-words: Pratical classes, chemical knowledge, cosmetics manufacturing.

Introdução Os profi ssionais formados em química com opção tecnológica podem, por lei (lei no. 2800 de junho de 1956), assumir a responsabilidade técnica em relação à fabricação de produtos de higiene pessoal e cosméticos.1 Este fato é alvo de diversas discussões entre os conselhos federais e regionais de química e farmácia. Por trás dessas discussões está a questão: Qual o profi ssional mais indicado para assumir a responsabilidade técnica de uma indústria de cosméticos e produtos de higiene pessoal? Um possível argumento dos conselhos de farmácia é que não existe nenhuma disciplina obrigatória nos currículos de química que tratem deste assunto. Por outro lado, os químicos podem ser capacitados para elaborar formulações, inclusive de cosméticos, podendo prever com maior rigor as interações e transformações químicas ao se misturarem diferentes substâncias químicas. Esta discussão, desta forma, aponta para uma importante lacuna na formação dos químicos, referente à manipulação destes tipos de produto. Assim, seria bastante relevante para sua formação que o profi ssional de química interessado na indústria de cosméticos pudesse cursar uma disciplina relacionada a esse tema. Andrade et al. (2004) comentam em seu artigo, intitulado A formação do químico, sobre a importância de que os novos currículos contemplem atividades que visem estabelecer correlações entre áreas, ampliando o caráter interdisciplinar. Além disso, sugerem também que as disciplinas também se ocupem de temas presentes no dia a dia das indústrias e dos cidadãos, destacando a importância da indústria química no cenário econômico do Brasil. 1. <http://www.crq4.org.br>. Acesso em: jun. 2007.

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REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 04 | Número 01

A indústria química é um setor em franco crescimento no Brasil, respondendo por uma parcela signifi cativa do produto interno bruto nacional. Segundo informações da Associação Brasileira da Indústria Química (ABIQUIM), os números de 2006 mostram que o faturamento líquido da indústria química brasileira, considerando todos os segmentos que a compõem, alcançou 177,7 bilhões de reais, valor 2,3% superior ao de 2005.2

Participando desse número, a indústria de cosméticos e produtos de higiene pessoal atingiu a marca de 9,6 bilhões de reais de faturamento líquido nesse mesmo ano. As grandes empresas têm procurado internacionalizar suas funções corporativas, em uma estratégia de busca de oportunidades de mercado em todo o mundo. Na indústria de cosméticos, esta tendência aparece descrita em trabalho realizado por Garcia (2005). O mercado de trabalho, seguindo esta tendência positiva, possibilita o aumento de vagas e de postos de trabalho no setor. Assim, percebe-se a importância, em termos de mercado de trabalho, da existência de alguma formação nessa área para os químicos que nela desejarem atuar.

Histórico da proposta da disciplina No segundo semestre de 2000, foi estabelecida no Instituto de Química de São Carlos (IQSCUSP), por sugestão da CAPES, uma disciplina 2. <http://www.abiquim.org.br/conteudo_print.asp?princ =ain&pag=estat>. Acesso em: jun. 2007.


Planejamento da Disciplina “Cosméticos e Produtos de Higiene Pessoal – Alguns Conceitos e Aplicações”

denominada “Prática de Ensino de Química para o Nível Superior”, ministrada pelo profs. Paulo Alves Porto e Francisco Carlos Nart. Essa disciplina tinha por objetivo suprir uma eminente carência dos cursos de pós-graduação stricto sensu em Química no que se refere à formação dos pós-graduandos para uma futura docência nessa área.3 A etapa fi nal de avaliação deste curso foi pensada de forma que os alunos (dentre os quais, um dos autores, H. B. Suffredini) propusessem a implementação de uma disciplina, pensando em todos os aspectos relevantes, desde a ementa até a carga horária e conteúdo programático. Deste trabalho, surgiu a proposição da disciplina “Cosméticos e Produtos de Higiene Pessoal – Características e Aplicações”. Sete anos após a elaboração do trabalho, foi proposta a disciplina “Cosméticos e Produtos de Higiene Pessoal – Alguns Conceitos e Aplicações” (nome ligeiramente alterado do original) como disciplina optativa, ou de livre escolha, no curso de bacharelado em Química da Universidade Federal do ABC, instituição esta na qual atua o ex-aluno citado. Esta disciplina foi incluída no projeto pedagógico do curso de licenciatura e bacharelado em química da UFABC, mas ainda não foi ministrada. Oportunamente, será interessante verifi car o impacto da proposta didática com relação ao que foi proposto neste trabalho. Assim, o objetivo deste artigo é o de mostrar como foi realizada a proposta da disciplina “Cosméticos e Produtos de Higiene Pessoal – Alguns Conceitos e Aplicações” na Universidade Federal do ABC (UFABC), possibilitando ao alunado um contato com algumas técnicas de manipulação, controle de qualidade e princípios químicos relacionados à fabricação deste tipo de produto.

3. Seguindo a mesma preocupação demonstrada pela CAPES, Maldaner (2005) apontou a necessidade de aprimoramento do ensino em química, tanto em nível médio como superior, em artigo publicado no ano de 1999.

objetivos e competências esperadas A disciplina foi baseada em aulas práticas e teóricas, de maneira intercalada. A cada ponto teórico estudado, um experimento em laboratório deve ser executado. Após cada aula de laboratório, devem ocorrer discussões a respeito dos conceitos adotados, estabelecendo conexão entre a química aprendida em sala de aula e as aplicações tecnológicas. A disciplina visa ser um contato inicial dos alunos de bacharelado em química com a fabricação e entendimento dos aspectos quí micos fundamentais envolvidos com a fabricação de cosméticos e produtos de higiene pessoal. Em termos de competências e habilidades a serem desen volvidas pelo aluno, incluem-se a capacidade de utilizar vidrarias e equipamentos de forma correta, a seleção de matérias-primas adequadas – prevendo possíveis alterações de qualidade e possíveis fontes de contaminação em cosméticos, bem como a observação de boas práticas de fabricação. Nesse processo, espera-se propiciar a integração dos conhecimentos químicos fundamentais, vistos em outras disciplinas e também nesta, no contexto de uma temática aplicada.

Carga horária A disciplina foi concebida, originalmente, com carga horária de 4 horas por semana, para um curso semestral (16 semanas), totalizando 64 horas. A distribuição teve que ser alterada para os moldes da UFABC, cuja distribuição de disciplinas segue um esquema trimestral. Assim, tendo em vista que um trimestre é constituído por 12 semanas, a carga total do curso é de 48 horas, mantendo-se 4 horas por semana de aulas. Deste total, 24 horas são relativas às aulas teóricas e 24 horas para experimentos de laboratório. Caso se deseje implantar uma disciplina como essa em uma instituição que adote o regime semestral, sugere-se que sejam utilizados os tempos extras para a

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elaboração de seminários em que sejam abordados temas relacionados ao escopo da disciplina, mas que não foram contemplados durante as aulas.

Condições de matrícula A disciplina, conforme mencionado anteriormente, tem caráter optativo (na UFABC, a denominação adotada é “disciplina de livre escolha”), podendo ser cursada preferencialmente por alunos que escolherem a ênfase tecnológica no curso de química. Vale salientar que todos os cursos da UFABC compartilham um ciclo básico, denominado Bacharelado em Ciência e Tecnologia (BC&T), seguindo uma tendência inovadora. Informações mais detalhadas podem ser encontradas no projeto pedagógico da UFABC, disponível no sítio eletrônico da Universidade.4 Sugere-se que o aluno tenha cursado duas disciplinas deste núcleo básico: Base “Experimental das Ciências Naturais” e “Transformações Químicas”. Nestas duas disciplinas, o aluno realiza o primeiro contato com a parte experimental, conhecendo alguns equipamentos e técnicas de manuseio de vidrarias e reagentes químicos. Recomenda-se, ainda, que o aluno já tenha cursado duas disciplinas do curso de Bacharelado em Química: “Funções e Reações Orgânicas” e “Química Orgânica Experimental”. Nelas, o aluno teve contato com as principais funções orgânicas, sendo capaz de prever, em muitos casos, as principais interações químicas possíveis entre os compostos orgânicos. Em nosso caso, particular atenção poderá ser dada ao fabrico de cosméticos e produtos de higiene pessoal.

Ementa do curso Defi nições de “cosmético” e “produtos de higiene pessoal”, química de surfactantes e suas aplicações na indústria cosmética, saúde da pele 4. <http://www.ufabc.edu.br/editais/projetopedagogico. pdf>. Acesso em: jun. 2007.

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e medidas antienvelhecimento, microrganismos e o corpo humano, controle microbiológico em cosméticos, boas práticas de produção. Todas as aulas experimentais foram elaboradas adaptandose as propostas que constam nas referências bibliográfi cas apresentadas no fi nal deste artigo (Bezerra, 2001; Campos, 2000; Guia de Produtos, Croda do Brasil, 2000; Surfactantes e Especialidades para Cosméticos, 1999; Barata, 2002; Apostila da disciplina, 2006).

Conteúdo programático Aula Teórica 1 – O que é um cosmético? Conceitos gerais e diferenças com relação a produtos de higiene pessoal. Neste item, são abordados os itens fundamentais que servirão de suporte para o resto do curso. Algumas defi nições e contextualizações devem ser discutidas. Aula Prática 1 – Fabricação de um sabão comum. Os reagentes necessários para este experimento são: 1. Hidróxido de sódio 2. Óleo de coco ou similar (babaçu, milho, dentre outros) 3. Cloreto de sódio 4. Ácido cítrico Procedimento experimental Em um béquer de 500 mL, adicionar 200 mL de óleo vegetal. Colocar o béquer com óleo em um tripé com tela de amianto e aquecer o óleo até cerca de 120 oC (este procedimento pode ser realizado em aquecedor magnético com agitação). Preparar 200 mL de uma solução 3,0 mol L-1 de NaOH (lixívia sódica, no jargão industrial) e reservar. Quando o óleo atingir a temperatura desejada, adicionar lentamente a lixívia sódica, numa proporção de aproximadamente 5 mL/min, agitando sempre o meio reacional com um bastão de vidro ou barra magnética, caso seja utilizado um aquecedor magnético.


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Será, então, formado o sabão. Ao perceber o final da reação, ou seja, quando não ocorrer mais formação do sabão, adicionar cerca de 3 g de NaCl ao sistema, já fora do aquecimento. Isso fará com que o sabão flutue. Retire o sabão com o auxílio de uma espátula e reserve em outro béquer. Adicione cerca de 100 mL de água destilada e meça o pH. Goteje lentamente uma solução 1,0 mol L-1 de ácido cítrico até que o pH esteja próximo de 8. Coloque novamente 3 g de NaCl e recolha o sabão em uma forma de cubos de gelo, ou molde similar. Espere esfriar, recolhendo em seguida o sabão.

agitação com o auxílio de uma barra magnética. Será então formado um “sabão a frio”, com pH próximo de 7. Adicione 200 mL de água desionizada, mantendo a agitação. Após abaixar a espuma, adicionar 5 mg de metil-parabeno e 3 mg de propilparabeno. Preparar uma solução saturada de NaCl e adicionar lentamente até obter a viscosidade desejada (q.s.p.). Adicionar corante e essência. Embalar o produto em frascos previamente esteri­ lizados.

Aula Teórica 2 – A química de surfactantes e sua aplicação em produtos de higiene pessoal (defi­ nição de surfactante, interação água-óleo, propriedades dos tensoativos catiônicos e aniô­ nicos). Nesta parte do curso, serão abor­dados os aspectos relacionados à polaridade e às proprie­ dades diferenciadas de compostos que podem formar micelas. Toda estruturação do curso será dirigida às propriedades de lim­peza e de benefícios à pele produzidos por estas substâncias químicas.

Aula Teórica 3 – A saúde da pele e ações antienve­ lhecimento (cuidados com a pele, prevenção de problemas na pele, uso de ácidos em cremes antissinais). Serão abordados, nesta etapa, os processos químicos de envelhecimento, como a ação de oxidantes e radicias livres no corpo. As medidas preventivas serão estudadas para o embasamento de ações saudáveis e corretivas que os produtos cosméticos podem causar no organismo.

Aula Prática 2 – Manipulação de uma fórmula de xampu.

Aula Prática 3 – Manipulação de um creme hidra­ tante.

Os reagentes necessários para este experi­ mento são: 1. Lauril-éter sulfato de sódio 2. Lauril sulfato de sódio 3. Cocoamidopropilbetaína 4. Dietanolamina de ácido graxo de coco 5. Cloreto de sódio 6. Corante aquoso 7. Conservantes (metil e propil parabenos) 8. Essência

Os reagentes necessários para este experi­ mento são: 1. Álcool ceto-estearílico 2. Sais quaternários de amônio 3. Vitamina E 4. Óleo mineral 5. Óleo de Amêndoas 6. Queratina hidrossolúvel 7. Colágeno e elastina 8. Metil e propil-parabeno 9. Corante aquoso 10. Essência

Procedimento experimental Em um béquer de 500 mL, adicionar uma mistura de 80 mL de lauril-éter sulfato de sódio + 50 mL de lauril sulfato de sódio + 30 mL de cocoamidopropilbetaína. Misture bem. Adicionar vagarosamente 30 mL de dieta­ nolamina de ácido graxo de coco, sempre sob

Procedimento Experimental Em um béquer de 1000 mL, dissolver 100 g de álcool ceto-estearílico em 100 mL de água. Adicionar 0,7 g de queratina hidrossolúvel e 80 mL de sais quaternários de amônio (Mistura 1). REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 04 | Número 01

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Em outro béquer de 500 mL, adicionar 5 mL de óleo mineral, 10 mL de óleo de amêndoas, 0,5 g de colágeno, 5 mg de metil-parabeno e 3 mg de propil-parabeno (Mistura 2). Adicionar as duas misturas (1 e 2) em mesmo recipiente, sempre sob agitação. Espere a perfeita homogeneização do meio reacional e adicione o corante e a essência (q.s.p.). Aula Teórica 4 – Os microrganismos e o corpo humano (bactérias patogênicas e não patogênicas, uso de bactericidas e fungicidas, uso de conser­ vantes). Aula Prática 4 – Fabricação de um desodorante. Os reagentes necessários para este experi­ mento são: 1. Álcool etílico de cereais 2. Cloridróxido de alumínio 3. Triclosan (Irgasan, nome comercial) 4. Essência 5. Ureia padrão USP (United States Pharmacopeia) Obs.: O cloridróxido de alumínio foi investigado em estudo feito pela ANVISA e a conclusão foi a de que pode ser utilizado como antitranspirante.5

Procedimento experimental Em um béquer de 500 mL, adicionar 100 mL de álcool etílico de cereais e agitar, com o auxílio de um bastão ou barra magnética. Dissolver 1 g de ureia padrão USP e 0,05 g de Triclosan. Adicionar 20 mL de uma solução a 20 % de cloridróxido de alumínio. Vagarosamente, adicionar água até que o cloridróxido de alumínio comece a precipitar. Serão adicionados cerca de 150 mL de água nesta operação. Adicionar a essência e embalar o produto em frasco pré-esterilizado.

5. <http://www.anvisa.gov.br/divulga/informes/ antitranspirante.htm>. Acesso em: ago. 2007.

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Aula Teórica 5 – Microbiologia – Aspectos básicos (controle microbiológico, legislações sanitárias, boas práticas de fabricação) (Apostila da disciplina, 2006; Vermelho et al., 2006).6 Esta aula terá a finalidade de realizar um experimento micro­biológico, com o objetivo de determinar se o controle microbiológico está sendo realizado de maneira correta. Este é um ponto imprescindível para a adoção das boas práticas de fabricação em escala industrial. Aula Prática 5 – Crescimento de micro-organismos em meios contendo cosméticos. Os reagentes necessários para este experi­ mento são: 1. Caldo LB 2. Metil e propil-parabenos 3. Glicose 4. Água desionizada 5. Ágar bacteriológico 6. Creme hidratante sem conservantes Procedimento experimental7 Calcular a quantidade de reagentes para preparar 20 mL de meio de cultura por placa de Petri. Pesar cada reagente separadamente, juntando-os em um béquer, com exceção do ágar. Transferir o ágar e 3 g de creme hidratante manipulado sem conservantes para uma garrafa de vidro. Acrescentar ao béquer um volume de água menor do que o volume final do seu meio (i.e., se você for preparar 100 mL de meio, acrescente 80 mL de água). Agitar a solução contendo água + reagente até dissolver totalmente. Passar a solução para uma proveta de 100 mL. Completar com água até o volume desejado. Transferir o meio líquido para a garrafa com ágar. Escrever o nome da 6. <http://www.mip.ufsc.br/apostila%20de%20 microbiologia.doc>. Acesso em: 10 mai. 2009. <http://www.nlm.nih.gov/medlineplus/antibiotics. html#relatedissues>. Acesso em: 10 mai. 2009. 7. Roteiro adaptado da apostila da disciplina “Base Experimental das Ciências Naturais”, da UFABC (experimento “Microbiologia e Saúde”).


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solução, a data e o nome de quem fez o meio em um pedaço de fita crepe. Colar a fita na garrafa. Autoclavar por 15 minutos.

Preparação das placas de Petri Enquanto espera a autoclavagem, anote na parte de baixo da placa se o meio terá conservante ou não, o seu nome e a data. Divida a parte de baixo da placa em quatro partes iguais com uma caneta de retroprojetor. Após o meio de cultura ter sido autoclavado, esperar esfriar até conseguir encostar a garrafa no antebraço. Acenda o bico de Bunsen. A partir deste ponto, toda a manipulação deverá ser feita na zona de segurança do bico de Bunsen. Verter 20 mL de meio em uma das placas, deixando a placa semiaberta. Verter outros 20 mL em um tubo falcon ou proveta estéril, adicionando o conservante. Verter o meio com conservante na placa de Petri, deixando a placa semiaberta. Esperar o meio solidifi car. Fazer os testes da seguinte forma: 1) Quadrante Controle Negativo: não passe nada; 2) Quadrante Controle Positivo: adicione algum contaminante conhecido, que será fornecido na aula; 3) Quadrantes Teste 1 e Teste 2: esfregue um cotonete em alguma superfície que queira testar, verifi cando se há microorganismos. Utilizar o mesmo tratamento nas duas placas (com e sem conservante). Assim que terminar, fechar a placa de Petri colocando-a de cabeça para baixo. Colocar na estufa para crescimento durante toda a noite. Retirar a placa e verifi car o que ocorreu.

Avaliação O método de avaliação adotado para esta disciplina foi a entrega de relatórios uma semana depois de concluídos os experimentos. Os relatórios têm peso parcial, ou seja, não são

os únicos responsáveis pela nota fi nal do aluno. O comparecimento às aulas teóricas e experimentais é de fundamental importância para a avaliação fi nal. Sugere-se a possibilidade de uma aula de reposição a ser realizada na última semana do trimestre, caso o aluno tenha perdido alguma aula prática durante o período. Solicita-se que os alunos elaborem relatórios sucintos, apresentando os resultados obtidos de maneira clara e objetiva. O relatório deve conter: 1) Introdução 2) Objetivos 3) Parte Experimental 4) Resultados 5) Conclusões 6) Bibliografi a

Segurança no laboratório Os experimentos propostos apresentam reagentes e materiais simples e de fácil obtenção. A segurança no laboratório deverá ser seguida de acordo com as normas vigentes em seu laboratório. É de suma importância a utilização de equipamentos de proteção individual (EPIs), como óculos de segurança, sapatos fechados, calças compridas e avental.

Considerações fi nais A disciplina Cosméticos e Produtos de Higiene Pessoal – Características e Aplicações, tal como foi descrita neste artigo, constitui-se em uma tentativa de buscar novas abordagens para a formação do profi ssional de química. Insere-se na proposta da UFABC, na medida em que procura imprimir um caráter tecnológico ao curso de bacharelado, sem perder de vista a qualidade da fundamentação conceitual. Para isso, a disciplina introduz alguns conceitos fundamentais e retoma outros (já trabalhados em disciplinas anteriores), no sentido de aplicá-los a um contexto tecnológico, visando desenvolver a integração dos conteúdos. REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 04 | Número 01

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Referências APOSTILA DA DISCIPLINA Base experimental das Ciências Naturais, UFABC, set. 2006. Disponível em: <www.ufabc.edu.br>. ANDRADE, J. B.; CADORE, S.; VIEIRA, P. C.; ZUCCO, C.; PINTO, A. C.; Quim. Nova, v. 15, 358-62, 2004. BARATA, E. A. F. A. Cosmetologia. São Paulo: Tecnopress, 2002. BEZERRA, S. V. Guia de produtos cosméticos. São Paulo: São Paulo, 2001.

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CAMPOS, P. M. Formulário dermocosmético. São Paulo: Tecnopress, 2000. GARCIA, R. Prod., v. 15, 158-71, 2005. GUIA DE PRODUTOS. Croda do Brasil, 2000. MALDANER, O. A. Quim. Nova, v. 26, 289-92, 1999. SURFACTANTES E Especialidades para Cosméticos, Rhodia, 1999. VERMELHO, A. B. et al. Práticas de Microbiologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006.


Relato 01 | Volume 04 | Número 01 | Jan./Jun. 2009

p. 23-36

Modelo Estruturante como Organizador de Ciclos de Estudo de Conteúdos Temáticos de Química no Ensino Médio Regular Structuring Model as Organiser of Study Cycles of Thematic Content in High School Chemistry Set Dirceu Donizetti Dias de Souza Faculdade de Educação – USP E-mail: baumcima@yahoo.com.br

Agnaldo Arroio

Faculdade de Educação – USP E-mail: agnaldoarroio@yahoo.com

Resumo Este relato de aula discute a elaboração, construção e aplicação de um modelo estruturante para (sequência didática) aula de química, em uma escola estadual de ensino médio, localizada na cidade de São Paulo. A partir de um tema foram organizadas atividades experimentais e/ou a construção de um aparato escolar científico, com foco na produção de discurso escolar-científico. Neste caso, em particular, os esforços foram orientados para a produção escrita de um artigo escolarcientífico, com ênfase nas operações epistêmicas do projeto de construção e operação de um espectroscópio. É discutido passo a passo o processo de implementação do modelo estruturante, os resultados obtidos e suas implicações para o professor e para os estudantes. Palavras-chave: Modelo estruturante, Ensino de Química, Escrita, Gêneros do Discurso. Abstract This report discusses classroom design, construction and implementation of a structural model in chemistry classrooms in a high school, at São Paulo. Based on an experimental subject some activities are organized and/or an educationalscientific apparatus is constructed, focusing on the production of discourse genresschool science. In this particular case, efforts were directed to the production of an


article with emphasis on design, construction and operation of a spectroscope. It is discussed step by step the process to implement an structural model, it’s results and implications to teacher and students. Key-words: Structural model, Teaching Chemistry, Writing, Speech Genres.

Introdução O processo ensino-aprendizagem tem como principal objetivo o desenvolvimento de certas capacidades no grupo de estudantes sujeitos desse processo e essas capacidades desempenham muitas vezes papéis simultâneos assumindo por um lado o caráter procedimental e por outro o caráter de instrumento mediador de outros tipos de conteúdos. A decisão do professor de Ciências da Natureza na tarefa de promover a circulação da ciência em optar por uma abordagem no processo formativo de jovens estudantes na escola pública é sempre carregada de incertezas e posições ideológicas destacando-se o fator de impacto para que essa opção possa contribuir na formação do cidadão. Uma possível resposta em relação a esta questão é tomar a decisão considerando a abordagem que nos remete ao aprendizado e à prática do maior número possível de habilidades e competências e sob essa perspectiva, a abordagem de trabalhar as capacidades dos estudantes relacionadas à modalidade linguagem escrita parece atender de maneira satisfatória este desafi o. Entre essas capacidades podemos destacar as que se relacionam com as habilidades cognitivolinguísticas, nas quais para construir o conhecimento científi co é necessário aprender a escrever sobre os conteúdos de ciências. Dentro desse processo de produção escrita é possível refl etir sobre as características de alguns gêneros do discurso escolar-científi cos, sobre as difi culdades dos estudantes em produzi-los e como ensinar-lhes a superar essas difi culdades. Uma segunda pergunta que nesta sequência imediatamente afl ora, diz respeito a como utilizar

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esta capacidade humana de maneira a cumprir a decisão tomada e em resposta a esta indagação, é considerável a opção pela estratégia de envolver o estudante com a produção textual escrita de gêneros do discurso correlato à área de atuação. As ideias expostas apresentam um contexto basicamente associado à sala de aula em seu cotidiano e nos apropriamos de Freitas (1994), quando justifi camos a questão da opção do processo dialógico abordado em seu livro tendo como fundamentos as propostas de Vigotski e Bakhtin diz, “Fui aos seus textos, a partir das questões colocadas por meu contexto”. Provavelmente a história se repete, pois de forma assemelhada a ausência de modelos cognitivo-linguísticos que pudessem constituir um alicerce que subsidiasse a opção de uma abordagem coesa e coerente com certas concepções tornavam nossa prática pedagógica parcial e incompleta. Dentro do complexo quadro do processo ensino aprendizagem decidimos considerar a relação entre a função linguagem escrita, gêneros do discurso escolar-científi cos, conteúdos procedimentais de mediação da forma composicional e o desenvolvimento do nível de aquisição de conhecimento, fundamentando-se nesses mesmos autores. Em paralelo a conduzir essas relações, um modelo estruturante tornou-se necessário de ser constituído e consolidado ao largo do tempo instigando a compreensão e a manipulação pelo estudante, das convenções do pensamento e escrita do campo escolar-científi co. Nessa óptica, este relato objetiva socializar a experiência associada a um modelo estruturante para organizar uma sequência didática em aulas de


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química. Como foco principal a aplicação desse modelo visa a produção de textos escritos de comunicação em ciências como meio complementar na construção do conhecimento escolar-científi co. Este modelo estruturante foi projetado e aplicado na perspectiva de organizar os processos de mediação de experimentos de laboratório, para construção de um aparato científi co e para a produção escrita de gêneros do discurso escolar-científi co. A escrita como instrumento cultural tem a natureza de organizar as operações psicológicas internas permitindo ao homem ao invés de confi ar mecanicamente as coisas à memória, as escrever, constituindo o uso funcional de linhas, pontos e outros signos para recordar e transmitir ideias e conceitos (Vygotsky et al., 1991), compondo um instrumento a serviço da memória.

A comunicação discursiva escrita de gêneros escolar-científi cos como objeto real no processo ensino-aprendizagem Nosso foco neste texto é discutir o planejamento para a inserção em sala de aula da disciplina de química de um modo de circulação de ciência por meio da produção de gêneros escolar-científi cos escritos. No planejamento anual de aulas de ciências da natureza há sempre uma discussão entre os professores, que perpassa diversas possibilidades e necessidades e o resultado costumeiro é adesão ao que tradicionalmente é denominado de conteúdo temático (matéria). Talvez isto seja explicado por fatores tais como supervalorização do que se costuma denominar de “matéria”; desconhecimento dos educadores no uso de outras alternativas que envolvam a comunicação discursiva; ou atribuição a outras disciplinas desta obrigação específi ca da área de ciências. Frente a esta situação são escassas as oportunidades para inserir a comunicação discursiva escrita como objeto de aprendizagem específi co

complementar, notadamente na disciplina de química e no ensino médio. Rojo e Cordeiro (2004) afi rmam que para tal inserção adquirir o status de real objeto de ensino reconhecido pela comunidade escolar, dentro de uma perspectiva didática, é necessário defi nir claramente as características da escrita a ser ensinada. Distante de uma aceitação natural e incondicional, a inserção da comunicação discursiva escrita carece de respostas signifi cativas para questões de ordem tanto psicológicas quanto operacionais. Estas questões normalmente aparecem dentro de um processo sócio-histórico comparativo no qual a instituição escolar e os estudantes estão mergulhados pela prática social. Em função desta constatação cabe aos professores de ciências desenvolverem um currículo adequado e que contribua com a noção do que a Ciência produz e como é feita, desenvolvendo em relação à mesma a criação de uma atitude, um estado de espírito, independentemente da carreira escolhida pelo cidadão (Reis, 2007). Ao professor também cabe o desenvolvimento de projetos e aplicação de modelos pertinentes os quais promovam aprendizagem signifi cativa e criativa, e que a melhoria da qualidade do ensino está relacionada com o comprometimento dos sujeitos que aprendem, participando ativamente do processo de construção de sua aprendizagem. Na perspectiva do uso da linguagem especializada da ciência Lemke (2005) ancora o seu uso sob a óptica de produção cultural que permite a expansão da leitura e interpretação do mundo. O desenvolvimento de competências nesse domínio envolve: O reconhecimento, a utilização e a interpretação de seus códigos, símbolos e formas de representação; a análise e a síntese da linguagem científi ca presente nos diferentes meios de comunicação e expressão; a elaboração de textos; a argumentação e o posicionamento crítico perante temas de ciência e tecnologia (PCN + 2002). REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 04 | Número 01

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Agnaldo Arroio e Dirceu Donizetti Dias de Souza

Após esse breve recorte onde contemplamos uma visão complementar de atividades para o ensino médio, podemos retornar e completar a discussão sobre as questões de ordem psicológicas e operacionais que normalmente surgem no processo de implantação da comunicação discursiva escrita na área de Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias. Sensação de perda, ser enganado, de não fazer sentido por parte do estudante, de quantidades imensas de enunciados a serem corrigidos, de como “fazer” para os alunos produzirem enunciados por parte do professor ou de cobrança por parte da administração da escola, estão sempre presentes no cotidiano da comunidade escolar que se desafi a a implementar a produção da comunicação discursiva escrita. As questões a que nos referimos quanto às difi culdades de inserção da comunicação discursiva escrita em sala de aula e as sensações que descrevemos de ordem psicológica e operacional são contempladas em gênero, número e grau pelos textos ofi ciais (PCN + 2002) sendo que nos cabe, como construtores de uma nova realidade, estabelecer o prólogo de um grande processo de diálogo e negociação que se traduza em benefício reconhecido para todas as partes envolvidas.

Planejando o ensino em aulas de química com gêneros escolar-científi cos O ensino de gêneros escolares escritos de comunicação em ciências, principalmente nas aulas de química, devem ser pautados pela perspectiva de não ser possível supor que os estudantes os aprendam naturalmente. Marcuschi (2002) indaga sobre a possi bilidade de haver gêneros escritos ideais para serem ensinados, porém entende como plausível a identifi cação de gêneros com difi culdades progressivas, do estágio menos formal para o mais formal, do mais privado ao mais público. Dolz (2004) identifi ca algumas exigências que devem ser satisfeitas para o ensino de gêneros

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escolares escritos e orais ao mesmo tempo e sugere uma coleção fundamentada no postulado de que: é possível ensinar a escrever textos e a exprimir-se oralmente em situações públicas escolares e extraescolares. Neste relato aceitamos o postulado citado como factível, especialmente em relação à escrita, e disponibilizamos alguns critérios que podem guiar a organização de uma sequência didática, ou seja: • Permitir a atividade intelectual com o conceito científi co (conteúdo temático) objeto de estudo em qualquer fase do currículo escolar; • Oferecer a possibilidade de organizar os gêneros em padrões orientativos; • Ser modular, porém com difi culdades progressivas do mais simples para o mais complexo; • Possibilitar a prática da escrita progressiva com os diversos gêneros do mais simples para o mais complexo; • Mediar a produção de enunciados por meio das articulações composicionais; • Estender sua aplicação a outras disciplinas de Ciências da Natureza. A sequência didática a qual chamamos de modelo estruturante (DIAS de SOUZA; ARROIO, 2008) deve ter seu foco no processo ensino-aprendizagem do conteúdo temático, ou seja, a prioridade de ensino é direcionada para a apreensão do conceito científi co. Esse modelo estruturante terá o papel de organizador no ensino com gêneros escolares discursivos escritos de comunicação em ciências, com foco no conteúdo temático (conceito) da disciplina escolar. Por agregar um conjunto de atividades bastante extenso, consequentemente o cronograma para sua execução deve ser distribuído ao longo de um ano letivo e muito se aproxima da proposta discutida por Dolz (2004) em sua organização, porém não em sua função. Dolz (2004) defi ne como uma sequência didática um conjunto de atividades escolares


Modelo Estruturante como Organizador de Ciclos de Estudo de Conteúdos Temáticos... organizadas, de maneira sistemática, em torno de um gênero textual escrito. Em nosso modelo estruturante, definimos a organização da produção escrita de gêneros escolares em torno de uma sequência de atividades de conteúdo temático na qual se estrutura um projeto, construção, montagem e operação de um aparato científico. Além disso, convém relembrar que não é objeto de nosso estudo o ensino dos gêneros discursivos escolares e, sim, a utilização dos gêneros discursivos escolares como mediadores no processo de ensino aprendizagem do conteúdo temático (conceito). Postulamos que a prática da escrita de gêneros escolar-científicos contribui para a apropriação do conteúdo temático (conceito), porém como parte do processo os estudantes devem se apropriar das noções, das técnicas e dos instrumentos necessários ao desenvolvimento das habilidades da produção escrita em situação de gêneros diversos. Para que essa suposição se concretize, as noções, técnicas e instrumentos necessários ao de­ senvolvimento das habilidades de produção escrita em situação de gêneros escolar-científicos diversos, devem ser mediados por padrões orientativos e ao se utilizar desses padrões os estudantes encontrarão a ressonância orientativa necessária para a produção escrita em situação de gêneros escolar-científicos diversos. Para projetar e construir um modelo estru­ turante que traduzisse a maneira de concretizar a produção final de um artigo científico, baseado na construção de um aparato científico, como proposto em nosso modelo estruturante, foi necessário a busca de unidades que pudessem expressar a complexidade do sistema sem reduzi-lo a simples elementos. Elegemos desta forma as unidades cons­ tituintes de um artigo científico NBR 14724 (2006), mas que pudessem ser trabalhadas em outras formas de comunicação discursiva em ciências, tais como resenha, protocolo, pré-relatório, relatório de experimentos didáticos e artigo escolar-científico, sem prejuízo dessa primeira. Como estratégia inicial os estudantes devem ser informados sobre o tema do projeto escolar­‑científico

a ser desenvolvido, as atividades sequenciais previstas associadas a um cronograma anual e os gêneros de discurso escolar-científicos que deverão ser produzidos. Como pontuado por Dolz (2004) essa estratégia expõe aos estudantes o que será realizado “verdadeiramente” e é o momento em que a turma constrói sua primeira representação da situação de atividade proposta e as futuras comunicações que serão produzidas. Naturalmente, é um momento obscuro, aflitivo e árduo, pois as questões que se conformam no diálogo interno da turma oscilam entre o “não entendi nada” e “esse professor está em órbita”. Como já argumentado, mesmo com um amplo processo de diálogo e negociação, até o momento da apresentação da forma “real” da inserção da comunicação discursiva escrita em sala de aula de química, o tema não passa de retórica, que povoa o imaginário coletivo. Para a apresentação geral aos estudantes, bem como para o detalhamento da proposta, os conteúdos temáticos (conceitos) já deverão estar selecionados de acordo com o currículo escolar previsto. Cabe então ao “projetista” do modelo estruturante associar os conteúdos temáticos (conceitos) a cada gênero discursivo previsto para ser desenvolvido como réplica dos enunciados escritos a serem produzidos nas aulas ao longo do ano letivo; ainda, já deverão estar disponíveis os critérios gerais de avaliação que serão utilizados como fonte de acompanhamento do desenvolvimento do processo ensino aprendizagem. A dimensão inicial do modelo estruturante proposto deverá ser bastante detalhada em suas partes para que os estudantes tenham uma noção sistêmica do projeto a ser desenvolvido e as comunicações discursivas que deverão ser produzidas. As indi­ cações devem ser claras quanto aos conteúdos e os desafios que serão envolvidos com suas respectivas comunicações, a disponibilidade de padrões orien­ tativos para cada gênero de comunicação discursiva e o apoio em suas diversas modalidades que serão oferecidos, sendo fundamental esclarecer os critérios REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 04 | Número 01

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que serão adotados para a avaliação do processo ensino aprendizagem. Freitas (1994) chama a atenção de que para Bakhtin, a produção das ideias, do pensamento, dos textos, tem sempre um caráter coletivo, social, o qual podemos também expandir para os pressupostos de Vygotsky (2001) na formação do conceito científi co. Isso pode representar para o professor uma interpretação peculiar durante a estruturação da metodologia adotada em sala de aula, que privilegie a organização da(s) aula(s) considerando a produção dos enunciados de gêneros escolar-científi cos sob determinadas condições, dentre as quais citamos algumas abaixo: • Estímulo à formação de grupos heterogêneos de estudantes; • Cessão de textos orientativos ao grupo de estudantes; • Discussão dos textos orientativos com o grupo de estudantes; • Estímulo à preparação de enunciados pelo grupo de estudantes; • Avaliação do grupo de estudantes em relação ao enunciado produzido; • Feedback e discussão dos itens a serem revisados pelo grupo de estudantes; • Reavaliação do enunciado revisado pelo grupo de estudantes; • Feedback sobre o novo enunciado produzido para o grupo de estudantes. Dessa maneira é possível instituir um caráter grupal à produção e discutir/rediscutir por diversas oportunidades a produção de maneira a socializar os resultados do trabalho grupal e posteriormente solicitar uma produção individual baseada na produção grupal. Como referencial inicial do processo de produção escrita a partir do conteúdo temático, o professor pode inserir a produção do gênero resenha descritiva, e sucessivamente o professor pode introduzir os demais gêneros previstos. As primeiras comunicações serão a expressão da representação das competências e habilidades

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do domínio escrito, bem como a compreensão do conceito discutido, com o objetivo de estabelecer o nível das habilidades e competências dominantes. Do estabelecimento da relação entre o conjunto de enunciados produzidos pelos estudantes e os critérios defi nidos como padrão de avaliação, aquilo que deve ser trabalhado na zona de desenvolvimento imediato, se encaminha a forma e o ritmo que será impresso para que o modelo estruturante seja modulado em sua implementação. As devolutivas da produção escrita pelos estudantes dos gêneros do discurso escolar-científi cos são um marco especial no processo ensino-aprendizagem que auxiliará a superação das não conformidades encontradas. O instrumento fundamental que mediará o restante do processo, os padrões, deve ser fornecido, comparado e comentado decompondo um a um as suas articulações composicionais com especial atenção para a organização dos enunciados, as suas inter-relações internas e sua relação com o conteúdo temático (conceito), e esse procedimento deve fazer parte de todas as fases do desenvolvimento do modelo estruturante previsto para ser implementado ao longo do ano letivo. A Figura 1 mostra a proposta de organização de um modelo estruturante.

Metodologia para organização das atividades Após a defi nição dos temas e conteúdos a serem abordados na proposta pedagógica, o professor organiza as atividades baseando-se no modelo estruturante (Dias de Souza; Arroio, 2008). A Figura 1 mostra uma proposta de modelo estruturante que pode ser utilizado como guia para o professor e para a discussão da totalidade do projeto com os estudantes envolvidos, sendo que do lado esquerdo estão organizadas as atividades quando o professor decidir montar um aparato científi co e ao lado direito experimentos didáticos. A seta indica que em ambos os casos o produto fi nal, que são os registros do processo, serão


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Figura 1. Modelo estruturante para organizar as ativi­dades de construção de um aparato científico ou experi­mentos didáticos de laboratório.

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elaborados na forma de comunicações discursivas escritas utilizando os gêneros de discurso escolar-científi cos. Neste padrão estruturante, as atividades são organizadas ao longo de um ano letivo onde o estudante é estimulado a participar de aulas nas quais experimentos didáticos são executados e/ ou um aparato científi co é construído. Como meio de acompanhamento do processo de criação dos textos, os documentos produzidos em todas as suas revisões devem ser coletados e negociados com os estudantes a montagem de um portfólio o qual permitirá a avaliação fi nal, bem como todo o desenvolvimento ao longo do tempo. Como complemento de apoio o professor poderá criar uma comunidade virtual ou organizar um e-mail coletivo tornando o uso das TICs um atrativo no qual o estudante poderá recorrer, em caso de dúvidas, durante o processo ensino-aprendizagem, bem como fornecer orientações complementares principalmente ligadas ao estilo da escrita científi ca. O modelo estruturante foi planejado e projetado baseado em textos que sustentam a ideia de modelos, das diversas formas de comunicação, do uso da linguagem escrita e de um método científi co usualmente aceito e reconhecido pela comunidade científi ca (Krapas et al., 1997) e (Pereira, 2006).

Metodologia para operacionalização das atividades Após a organização das atividades e a defi nição dos gêneros do discurso escolar-cien tífi cos que irão compor os registros de todo o processo, é necessário estabelecer os parâmetros para a operacionalização de forma a criar condições para o seu acompanhamento. Como atividade preliminar o professor defi ne o tema a ser desenvolvido. Após a defi nição do tema, a partir de um texto de divulgação científi ca associado ao tema, propõe aos estudantes a produção de uma resenha descritiva, introduzindo, assim, os primeiros passos para a organização do trabalho fi nal.

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Objetivando defi nir o marco zero, o professor discute um conteúdo e propõe uma atividade experimental de caráter individual, de baixa complexidade e solicita aos estudantes a preparação de um relatório de experimento didático, sem, no entanto, fornecer qualquer subsídio para sua execução, sendo essa primeira comunicação discursiva a expressão das competências e habilidades dominantes da escrita do gênero do discurso escolar-científi co, mais próximo a um artigo escolar-científi co. Da relação entre as características do conjunto de enunciados produzidos pelos estudantes e dos critérios defi nidos como padrão para avaliação que compõe os desafi os do professor para trabalho na zona de desenvolvimento proximal, serão constituídos os passos subsequentes, bem como o ritmo de aplicação da modulação do padrão estruturante. Dessa fase, é iniciada a constituição do conjunto de registros que o professor irá se apropriar durante todo o ano letivo para organizar o portfólio dos estudantes. De forma semelhante, ao longo do tempo, desenvolvem-se outros temas explorando-se ao máximo todas as articulações composicionais do gênero relatório de atividades e preparando os estudantes para os gêneros do discurso protocolo de experimentos e pré-relatório de experimentos. Estas atividades têm o objetivo de preparar os estudantes para a elaboração do artigo científi co, cujo desenvolvimento ocorre concomitantemente. Após a devolutiva do registro inicial do experimento onde as atividades foram desenvolvidas individualmente, o professor inicia a introdução dos demais gêneros, porém, inicialmente, dentro de um caráter coletivo de produção e para fi nalizar as atividades do ano letivo com a produção do artigo científi co e seu respectivo pôster. Este ciclo permite que os estudantes inte rajam de maneira individual e com o profes sor inicialmente, coletivamente com os demais integrantes do grupo reforçando as eventuais soluções de difi culdades e novamente individualmente buscando retornar sua própria construção responsiva ao fi nal dos trabalhos letivos.


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As atividades que serão relatadas nos resultados foram produzidas por estudantes do 2º ano do ensino médio regular (16 anos) de uma escola pública estadual na cidade de São Paulo.

Resultados e discussão Em função da restrição de espaço, nesse relato iremos apresentar parte das atividades executadas, as quais consideramos sufi cientemente relevantes para seduzir os leitores em sua viabilidade. As produções linguísticas que compõem o corpus deste relato foram documentos produzidos pelos estudantes, durante o processo de ensino-aprendizagem no ano escolar letivo de 2007. Apresentaremos apenas os resultados relativos aos suportes de comunicação de elementos linguísticos constituídos por resenhas descritivas, diários de bordo, artigos científi cos e fragmentos de uma entrevista. O tema geral do projeto referia-se ao estudo da estrutura da matéria por meio da decomposição da luz sob a infl uência de rede de difração e para tanto haveria a necessidade de projetar, construir, coletar dados por meio de um espectroscópio e analisá-los. No primeiro bimestre do ano letivo foi solicitado aos alunos que preparassem uma resenha descritiva a partir do capítulo 1 do livro Tio Tungstênio (Sacks, 2002). O Quadro 1 mostra a

transcrição conforme o original de fragmentos da resenha produzida por um estudante. Essa primeira atividade tinha como objetivo utilizar um texto de divulgação científi ca atual, no qual se discutia o desenvolvimento de uma criança e a sua paixão pela ciência. Porém, fundamentalmente, a proposta era a de iniciar os estudantes na forma composicional de gêneros do discurso escolar-científi cos, neste caso, a resenha descritiva, e de prepará-los para o capítulo 17 do mesmo livro que trata, especifi camente, do aparato espectroscópio, o qual deveria ser construído futuramente. A princípio houve certa incredulidade por parte dos estudantes, pois não estavam acostumados a produzir textos escritos na disciplina de química, registrada durante uma pequena entrevista ao fi nal do período segundo o texto transcrito no Quadro 2. Quadro 1. Fragmentos de entrevista com uma estudante. Profº

Agda

Agda

Quando começou no começo do ano mesmo...

Profº

Cê também me odiava (risos)

Agda

Não, eu pensava acho que ele bebe.

Na sequência foram desenvolvidos alguns expe rimentos em laboratório e solicitado aos estudantes que produzissem, sob orientação e supervisão, protocolos de experimentos, pré-relatórios de experimentos e relatórios de experimentos.

Quadro 2. Fragmentos de resenha (1) descritiva produ zida por um estudante. Nome Arnaldo

Nº xxxxx

Turma xxxxx

Data 12/04/2007

OLIVER W Sacks Título da obra: “Tio Tungstênio: Memórias de uma Infância Química” Editora: Companhia das Letras Título Original da obra: “Uncle Tungsten: Memories of a Chemical Boyhood” Língua da Versão Original: Inglês Tradução de Laura Teixeira Motta Gênero: Biografia Capítulo 1. Tio Tungstênio Neste 1º capítulo, percorremos uma viagem longa, onde Sacks relembra sua infância, uma infância diretamente ligada ás primeiras descobertas de um grande cientista químico. Como toda criança, Sacks se questionava... Entre todos os elementos químicos sua maior paixão, sua obsessão eram os metais... ... Questionava-se e gostava de tudo que tinha química no meio, tudo mesmo, o sol, as estrelas, para onde ia o açúcar no chá? Por que a água fazia bolhas...

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Agnaldo Arroio e Dirceu Donizetti Dias de Souza Quadro 3. Fragmentos de resenha (2) descritiva produzida por um estudante. Nome Arnaldo

Nº xxxxx

Turma xxxxx

Data 25/05/2007

OLIVER W Sacks Título da obra: “Tio Tungstênio: Memórias de uma Infância Química” Editora: Companhia das Letras Título Original da obra: “Uncle Tungsten: Memories of a Chemical Boyhood” Língua da Versão Original: Inglês Tradução de Laura Teixeira Motta Gênero: Biografia Capítulo 17. Tio Tungstênio Neste capítulo, Sacks aborda novamente, suas intermináveis curiosidades de quando criança, uma criança diferente das outras... ... Como vimos no primeiro capítulo sua família foi e continua sendo a sua fonte de informação ... Ainda nesse primeiro capítulo ele cita os fogos de artifício, e explica que cada cor é proveniente de um tipo de determinado elemento químico. ... a descoberta que mais o maravilhou foi quanto o espectro do sangue, com o espectroscópio era possível identificar uma tênue mancha de sangue de mais de cinqüenta anos e distingui-lá de uma mancha de ferrugem. ... Sacks pode ver que os elementos químicos não eram somente terrestres, mas sim cósmicos que eram de fato as unidades constitutivas do Universo. ... Em uma de suas muitas lembranças, ele relembra a história que mais o fascinou, e estava relacionada com a descoberta do hélio, o hélio que descobriu-se ser o principal constituinte do nosso astro rei: o Sol.

A produção destes gêneros do discurso tinha como objetivo fundamental iniciá-los na escrita de operações epistêmicas consolidando uma visão geral sobre as principais articulações composicionais que iriam norteá-los na produção de um artigo científico. Essas atividades foram desenvolvidas ao longo do primeiro semestre do ano letivo. Conco­ mitantemente, foram distribuídos textos que discu­ tiam o projeto, a construção e a operação de um espectroscópio. Complementando essa fase, ao final do pri­ meiro semestre foi solicitado aos estudantes que produzissem uma resenha descritiva sobre o capítulo 17, Espectroscópio de Bolso do livro Tio Tungstênio (Sacks, 2002). O Quadro 3 mostra a transcrição conforme o original de fragmentos da resenha produzida por um estudante. No início do segundo semestre foram dis­ tribuídos aos estudantes um modelo de produção de artigo científico baseado nas normas ABNT NBR 17724 e solicitado aos grupos de estudantes a produção da revisão 0. Simultaneamente, foram disponibilizados textos complementares em uma

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comunidade especificamente desenvolvida para essa finalidade na internet, utilizando a plata­ forma Educarede, da Fundação Telefônica.1 Nessa plataforma os estudantes podiam consultar modelos, orientações, debater em fóruns ou mesmo enviar e-mails com questões particulares de cada grupo. Todos os grupos foram orientados a produzir um diário de bordo com todas as informações técnicas ou pessoais que fossem relevantes no processo de desenvolvimento das atividades, o qual deveria ser entregue juntamente com o produto ao final do ano letivo. O Quadro 4 mostra a transcrição conforme o original de fragmentos do diário de bordo produzido por um grupo de estudantes. Pelo extrato do texto é possível observar a inestimável contribuição dos estudantes o que permite ao professor acompanhar como foi o desenrolar das atividades e quais foram as principais dificuldades encontradas, fornecendo um rico subsídio para a análise e reorganização das atividades do ano seguinte. 1. Optamos pelo ambiente Educarede que pode ser acessado por meio do link <http://www.educarede. org.br/educa/index.cfm>, comunidade Comunicação em Ciências e pelo uso de email coletivo.


Modelo Estruturante como Organizador de Ciclos de Estudo de Conteúdos Temáticos... Quadro 4. Fragmentos de diário de bordo produzido por um grupo de estudantes. Diário de bordo de química

Grupo 2C

Diário de bordo Para dar início a construção do espectroscópio, todos os integrantes do grupo se reuniram em uma quarta feira, na área de estudo do SESC Pompéia. Neste primeiro encontro todos fizeram uma leitura do material fornecido pelo orientador onde se tinha todas as instruções para a construção do espectroscópio e do artigo científico. ... Uma dificuldade encontrada Elaboração da justificativa Não sabíamos como elaborar a justificativa, pois nela deveria ter as justificações que levaram o autor a escolher o tema, e não conseguíamos fazer algumas relações necessárias que deveria conter.

Paralelamente, os estudantes construíram o espectroscópio e com o auxílio de um roteiro de apoio coletaram os dados que sustentariam a construção do artigo científico. As Fotos 1 e 2 revelam momentos em que o professor e os estudantes coletam dados utilizando uma mesa de lâmpadas especialmente construída pelo laboratório de pesquisa e ensino de física – LAPEF – USP para uso com espectroscópios.

Foto 1. Professor orienta os estudantes na coleta de dados.

Foto 2. Professor e estudantes na coleta de dados com destaque para o roteiro à direita.

Após a finalização e entrega do artigo os estudantes foram orientados dentro da mesma metodologia a organizar o pôster para um futuro seminário e exposição final. O Quadro 5 mostra a transcrição, conforme o original, de fragmentos do artigo científico pro­ duzido por um grupo de estudantes. Após a produção e entrega da revisão 0 do artigo científico os estudantes foram organizados em grupos e o professor discutiu etapa por etapa com base no modelo instrucional fornecido anteriormente. Ao todo foram executados 3 procedimentos até a revisão final do artigo científico. Como demonstrado, os estudantes desen­ volveram todas as atividades previstas no modelo estruturante até a escrita final do artigo confirmando a capacidade dessa ferramenta cultural para organizar as operações psicológicas internas (Vigotski et al., 1991). Neste caso em particular o artigo apresentado possui 30 páginas mais os anexos contendo o projeto do espectroscópio e fotos com detalhes de montagem e operação do aparato. A partir do artigo científico os estudantes participaram de um seminário e apresentaram as suas atividades em conjunto com um pôster e publicaram na comunidade Comunicação em Ciências do portal Educarede. Assim como discutido por Rojo e Cordeiro (2004) foi possível acompanhar, pelos resultados apresentados, que a escrita ao final dos trabalhos ganhou um status de real objeto de ensino, o qual foi amplamente reconhecido pelos estudantes que participaram de todas as etapas em maior ou menor grau de envolvimento. REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 04 | Número 01

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Agnaldo Arroio e Dirceu Donizetti Dias de Souza Quadro 5. Fragmentos de artigo escolar-científi co produzido por um grupo de estudantes. Identificação dos estudantes Título : Espectroscópio: Estudo de linhas espectrais Artigo científico apresentado à disciplina de química sob a orientação do professor xxx EE xxxxxxxxxxxxx São Paulo – mês – 2007 Sumário Abstract

Key- words

Resumo

Palavras-chave

Introdução Objeto do estudo: Decomposição da luz por uma rede de difração = Compact Disc (CD) Justificativa: Durante o primeiro e o segundo bimestres, realizamos experimentos, produzimos relatórios e resenhas envolvendo o modelo de partículas e os modelos atômicos – entre eles o modelo atômico de Bohr e as principais idéias sob o espectroscópio a partir do livro Tio Tungstênio. Essas atividades foram realizadas como preparação para a produção deste artigo científico. O espectroscópio é utilizado para observar os espectros de uma determinada fonte luminosa... Problema da pesquisa: O olho humano não possui a capacidade de visualizar... Hipótese de estudo: Todos os elementos químicos e todas as substâncias possuem a capacidade de emitir um espectro na forma de luz... Objetivos: Construir um espectroscópio... Compreender o processo de redes... Metodologia proposta: Leitura e interpretação da..... Procedimento: Para a iniciação dos trabalhos o grupo de... Roteiro de observação usando o espectroscópio Procedimento: Escolha um tipo de lâmpada e observe-a através do espectroscópio... Materiais e Método de Montagem Resultados: Coleta de dados: Os estudantes apresentam um quadro com as fontes, suas características, cor observada, cores que se destacam, e se estão contínuas ou não. Discussão de resultados: Os estudantes discutem a construção e operação do aparato. Conclusão: Os estudantes relacionam os dados obtidos com o modelo atômico e comentam sobre desafios a serem vencidos. Referências Bibliográficas: De acordo com a ABNT

Todas as atividades foram acompanhadas por procedimentos de avaliação com critérios específi cos para cada caso. Esses critérios consideravam o conteúdo temático, a forma composicional e os aspectos tipológicos. Independentemente do grau de profundidade, todos os grupos que compunham as turmas foram capazes, em menor ou maior escala, de construir o espectroscópio e produzir os textos fi nais.

como é feita, permitindo um novo olhar sobre o mundo que rodeia todo cidadão. Neste relato de aula discutimos o projeto, construção e aplicação de um modelo estruturante que responde a essa demanda de maneira criativa e sistêmica. É explícita a associação dos resultados apresentados com a organização do modelo estruturante partindo dos gêneros do discurso mais simples para os mais complexos (Marcuschi, 2002), isto é, iniciam-se os trabalhos com resenhas

Considerações e implicações Reis (2007) apontou que é responsabilidade do professor construir um currículo adequado e que contribua com a noção do que a ciência produz e

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descritivas e fi nalizam-se com artigo científi co. A principal implicação do uso do modelo estruturante pelo professor é o de situá-lo em um cenário mais desafi ador, o que exige uma perspectiva de atuação próxima à tutoria. Para os estudantes


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é uma grande oportunidade de preparação para seus futuros estudos ou atuações profissionais, pois eles se deparam com um constante cenário de desvelamento de novas oportunidades para aplicação de suas competências e habilidades. Neste cenário com o foco na produção de comunicação escrita em ciências, os estudantes são diretamente beneficiados no desenvolvimento das capacidades do pensar e agir de forma sistêmica. Contribui ainda para o aprofundamento de conteúdos temáticos e incremento na compreensão dos textos que tratam de ciências, além de desenvolver a per­cepção de variáveis da esfera da química e a capacidade de raciocínio. Sob a perspectiva da construção do conhe­ cimento também é explícita a evolução no uso da linguagem especializada da ciência (Lemke, 2005), com o desenvolvimento das competências de reco­ nhecimento, utilização e interpretação de seus códigos, símbolos e formas de representação (PCN + 2002), as quais são observadas nos extratos do artigo escolar-científico apresentado. Muito além de um simples guia, o modelo estruturante implica em fortes nuances de mudança e inovação no ambiente escolar.

Referências ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR-14724: informação e documentação – Trabalhos acadêmicos – Apresentação. Rio de Janeiro: ABNT, 2006. BRASIL, Ministério de Educação/Secretaria de Educação Média e Tecnológica. PCN+ Ensino Médio: Orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília: MEC, 2002. 294p.

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Relato 02 | Volume 04 | Número 01 | Jan./Jun. 2009

p. 37-44

Oficina de Química: experimentação para alunos do ensino médio Chemistry Workshop: tests for the high school students Ivoneide de C. L. Barros Vanuza O. dos Santos Allana Christina S. de Oliveira1 Universidade Federal do Amazonas E-mail: ibarros@ufam.edu.br

Resumo Em razão da dificuldade de aprendizagem que os alunos da educação básica têm apresentado com relação à disciplina química, os alunos do curso de Bacharelado em Química da Universidade Federal do Amazonas idealizaram um projeto intitulado “Oficina de Química”, com o intuito de promover o interesse dos estudantes de Ensino Médio pela química, já que esta tem sido mal-vista pela classe estudantil, sendo considerada, muitas vezes, cansativa, perigosa e maléfica ao meio ambiente. Durante as demonstrações públicas realizadas nos eventos: III Encontro dos Profissionais da Química na Amazônia Ocidental e XXII Semana de Química da UFAM, respectivamente, foi aplicado um questionário que serviu como base para um diagnóstico preliminar de como está sendo oferecida esta disciplina nas escolas de Ensino Médio no município de Manaus, bem como verificação do interesse dos alunos pelas atividades experimentais apresentadas. Palavras-chave: oficina de química, ensino médio, experimentação. Abstract Considering the learning difficulties that students of basic education have with the chemical study, the students of Chemistry Bachelor of the Federal University of Amazonas devised a project entitled “Chemistry Workshop”, in order to develop the 1. Agradecemos aos alunos de bacharelado da disciplina Química Inorgânica Experimental (ano 2008) que participaram do projeto “Oficina de Química”, à UFAM e CRQ/XIV Região.


interest in chemistry in the high school students, since it has been unpopular with them, and often considered tiring, dangerous and harmful to environment. During demonstrations held in public events: Third Meeting of the Chemical Professionals in the Western Amazon and XXII UFAM Chemistry Week, it was applied a questionnaire that served as basis for a preliminary diagnosis of how this course is being offered in high schools of the Manaus city, as well as a verifi cation of students’ interest to the experimental activities. Key-words: Chemistry Workshop, high school, tests.

Introdução A realidade do ensino de química, nos níveis fundamental e médio, mostra que muitos alunos apresentam difi culdades de aprendizagem (Zanon; Palharini, 1995). Os alunos da educação básica, de maneira geral, veem a química como uma disciplina complicada, pois acabam tendo mais aulas teóricas e não têm a oportunidade de presenciar experimentos que poderiam despertar a curiosidade, a criatividade e o interesse por assuntos e temas relacionados à Química, que é uma ciência construída sobre resultados experimentais (Farrarezi et al., 2006; Valadares, 2001). Segundo Perna et al. (2007), uma das maneiras de motivar o interesse dos alunos é por meio da experimentação, é uma forma de mudar a consciência do aluno em relação à Química, despertando a importância do ensino de química experimental para educação básica. Ou seja, a existência de uma prática comprovando a teoria poderia atuar como uma importante ferramenta no processo de compreensão dos conceitos de química e, do mesmo modo, uma forma de motivação para os alunos. Nesse sentido, as apresentações públicas de demonstrações podem ser utilizadas, visto que ilustram os mais variados conceitos relativos à Química, tornando-se uma ótima alternativa para que os alunos desenvolvam e fi xem os conteúdos vistos em sala de aula (Perna et al., 2007). O presente trabalho propõe um despertar para o ensino experimental de química nas escolas de Ensino Médio do município de Manaus, por meio da infl uência do trabalho experimental desenvolvido no Departamento de Química da Universidade Federal do Amazonas – UFAM. Com

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esse intuito, foi realizada a “Ofi cina de Química” pelos alunos de Bacharelado em Química da UFAM, que tiveram a oportunidade de fazer demonstrações públicas de experimentos de química, tanto no III Encontro dos Profi ssionais da Química na Amazônia Ocidental, como na XXII Semana de Química da UFAM, visando, sobretudo, despertar o interesse dos estudantes de Ensino Médio pela área de química.

Aspectos metodológicos O projeto “Ofi cina de Química” foi idealizado pelos alunos do curso de Bacharelado em Química da Universidade Federal do Amazonas – UFAM, que fi zeram sua primeira apresentação nos dias 18 e 19 de junho de 2008, em comemoração ao dia do Químico (18 de junho), durante o III Encontro dos Profi ssionais da Química na Amazônia Ocidental, realizado pelo Conselho Regional de Química – CRQ-XIV Região. A segunda apresentação do projeto deu-se nos dias 8, 9 e 10 de outubro de 2008, quando da realização da XXII Semana de Química da UFAM. O público-alvo eram alunos do Ensino Médio de escolas da rede pública e privada. Todos os experimentos selecionados para a abordagem do projeto foram baseados nas aulas experimentais da disciplina de Química Inorgânica Experimental. Para facilitar as demonstrações dos experimentos, estes foram divididos em três categorias, envolvendo as temáticas: cores, eletroquímica e cristais. Cerca de vinte e um alunos participantes do projeto se organizaram em três grupos, cada um responsável por um dos temas citados. Eles se detiveram na sua temática, escolhendo


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os experimentos que mais se aproximassem do cotidiano e pesquisando a teoria relacionada aos temas, bem como a viabilidade destes. No Quadro 1 são listados os experimentos relacionados a cada uma das três temáticas da “Oficina de Química”.

O projeto também apresentou como proposta a confecção de painéis com imagens fotográficas das reuniões e dos ensaios experimentais no laboratório de química da UFAM, a fim de mostrar ao público externo como foram realizadas as etapas do projeto e motivá-lo a conhecer os laboratórios de graduação da UFAM, especialmente os estudantes que assistiram ao projeto no III Encontro dos Profissionais da Química na Amazônia Ocidental, posto que foi realizado em um Centro de Convenções do Shopping Studio 5, da cidade de Manaus. A cada quarenta minutos, era feita uma demonstração dos experimentos, sempre para um número de trinta alunos, sendo dirigido cerca de dez alunos a cada uma das temáticas e depois fazendo rodízio até completarem as três. Além disso, a Oficina utilizou os recursos de filmagem, reproduzindo em tempo real os experimentos que estavam sendo demonstrados. Ao final das apresentações, os estudantes responderam um questionário (Quadro 2) para verificar o interesse pelos experimentos da “Oficina de Química”, sua motivação pela química, bem como obter a opinião destes para o aprimoramento do projeto.

Quadro 1. Experimentos realizados pela “Oficina de Química” I. CORES 1. Teste de chama* 2. Evidenciando o efeito do número de ligantes sobre a cor dos compostos de coordenação* 3. Complexos de íons negativos e positivos** 4. Pigmentos inorgânicos** II. ELETROQUÍMICA 1. Obtenção de Hidrogênio por meio da eletrólise* 2. Reações de deslocamento*** 3. Pilha de Daniel**** 4. Bateria de refrigerante*** 5. Relógio eterno*** 6. Pilha de batata*** III. CRISTAIS 1. Jardim de cristais, Doce de Pedra, Árvore de cristais e decorando com cristais*** 2. Agrupamento dos átomos ou íons nos cristais*** 3.Condutibilidade das soluções iônicas e moleculares*** * Farias (2004); **Bessler e Nader (2004); Silva e Donate (2004).

Mateus (2001);

***

Constatino,

****

Quadro 2. Questionário aplicado aos alunos de Ensino Médio. Questionário 1. Sua escola possui algum laboratório experimental? ( ) sim ( ) não. Se sim, diga qual laboratório (química, física ou biologia). 2. Você já visitou um laboratório de química? ( ) sim ( ) não 3. Você já teve a oportunidade de realizar algum experimento químico? ( ) sim ( ) não. Relate este fato. 4. Qual dos experimentos apresentados mais lhe chamou atenção? Por quê? Você pode sugerir outro tema que seria de interesse? 5. Para você a demonstração da Oficina de Química foi (assinale quantas achar conveniente): ( ) Cansativa ( ) Motivadora ( ) Esclarecedora ( ) Longa ( ) Rápida ( ) Adequada 6. Diante das temáticas dos experimentos apresentados atribua a nota de 0 a 10 para: ( ) Eletroquímica ( ) Compostos Iônicos e Moleculares ( ) Cores 7. Você se sente motivado a fazer opção por uma graduação na área de química? ( ) sim ( ) não. Justifique. 8. Você gostaria de receber a nossa visita em sua escola? ( ) Sim ( ) Não. 10. Se desejar, deixe aqui seu comentário ou pergunta que entraremos em contato com você. REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 04 | Número 01

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Ivoneide de C. L. Barros, Vanuza O. dos Santos e Allana Christina S. de Oliveira

Resultados e discussão Durante a participação no III Encontro dos Profi ssionais da Química na Amazônia Ocidental cerca de 200 pessoas visitaram a Ofi cina de Química, e apenas 110 assinaram o Livro de Visita, sendo estes, alunos da Universidade Federal de Roraima, da Universidade Federal do Amazonas de Itacoatiara e do Ensino Médio. Quanto à participação no evento da XXII Semana de Química da UFAM, a Ofi cina de Química realizada no laboratório de química do ICE foi visitada por cerca de 400 estudantes de Ensino Médio, pertencentes a escolas do município de Manaus, entre pública e privada. Após a execução das atividades experimentais, apenas aos alunos do Ensino Médio (público-alvo) foi entregue o questionário para ser respondido. De acordo com o questionário, foram elaborados gráfi cos para avaliar as respostas dos alunos e tentar gerar um diagnóstico preliminar das condições em que estão sendo ministradas e se estão sendo ministradas atividades experimentais de química nas escolas de Ensino Médio dos alunos entrevistados. Ademais, buscou-se relacionar este fato com o interesse que os estudantes apresentaram em relação à área de química. Conforme observado na Figura 1, no universo das escolas participantes, mais de 50% não possui laboratório nas suas instalações, e que naquelas em que há laboratório, este foi identifi cado ou como laboratório de biologia, ou um misto de biologia-física-química, e ainda, uma única escola tem um laboratório especifi camente para química. Por outro lado, foi constatado que são as escolas da rede pública as que mais oferecem laboratório.

Figura 1. Percentual das Escolas de Ensino Médio que possuem laboratório.

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Dos alunos entrevistados, poucos são os que já fi zeram visita a um laboratório de química. Isto está relacionado na Figura 2, onde 72% dos alunos responderam que nunca visitaram um laboratório e somente 28% estiveram em um laboratório, ainda que apenas em uma única visita realizada pelo seu professor, não necessariamente de química.

Figura 2. Percentual dos Alunos do Ensino Médio que já visitaram algum laboratório de química

Segundo Gerson Mol et al. (2004), ainda que se tenha a consciência de que a experimentação é importante para facilitar a aprendizagem dos conceitos das ciências, a maioria dos professores não utiliza esse recurso. A alegação é de troca de professor, laboratório e reforma, carência de pessoal técnico e condições para a realização de atividades experimentais.

A falta de laboratório também é alegação comum, mas de acordo com o questionário aplicado no projeto, foi constatado que a existência deste também não garante a realização das atividades experimentais. Dentre os temas desenvolvidos nos experimentos, a eletroquímica foi a que chamou mais atenção, com 50% de votação (Figura 3), especialmente em razão da confecção de pilhas utilizando batatas, refrigerantes e o relógio digital, materiais do cotidiano dos alunos associados à química. Esse interesse foi confi rmado pelos alunos que participaram no III Encontro dos Profi ssionais da Química na Amazônia Ocidental, com os seguintes comentários: “Eu não sabia que uma reação química podia gerar eletricidade, é bem impressionante como simples compostos conseguem essa transformação”, e ainda: “o experimento com a batata chamou mais atenção, pois é interessante o fato de uma batata servir de bateria para o funcionamento de um relógio”.


Oficina de Química

Figura 3. Gráfico que ilustra o interesse dos alunos por temática apresentada no III Encontro dos Profissionais da Química na Amazônia Ocidental

Por outro lado, o grupo de alunos que assistiu à Oficina de Química na XXII Semana de Química da UFAM optou pelos experimentos desenvolvidos na temática “cores”, tendo votação majoritária de 60% (Figura 4). Isto se deve ao fato de os alunos do projeto responsáveis pelo tema fazerem uso de fogo (bico de Bunsen) e capela, tendo maior aproveitamento dos seus experimentos. O experimento que mais chamou atenção foi “o teste de chama”, justificado pelas diversas cores emitidas pelos sais de metais alcalino e alcalinoterrosos: “as cores; é fascinante, pois está presente em nosso cotidiano”.

Figura 4. Gráfico que ilustra o interesse dos alunos por temática apresentada na XXII Semana de Química da UFAM.

O experimento que mais se destacou no tema “cristais” foi: condutibilidade elétrica de soluções iônicas e moleculares, mediante o funcionamento da lâmpada, que pôde ser confirmada pelo relato: “é incrível como essas soluções conseguem fazer a lâmpada acender”. Quando os alunos atribuíram notas para os temas apresentados, ficou confirmada a preferência pelo tema “Eletroquímica” que recebeu a média 9,0 (Figura 5), “Cores” e “Cristais”, médias 8,7 e 8,5, respectivamente, reforçando assim que todos os experimentos foram bem apreciados pelos alunos.

Figura 5. Gráfico das notas atribuídas pelos alunos para cada temática apresentada.

Todos os alunos que responderam ao ques­ tionário demonstraram interesse em conhecer o laboratório onde foram realizados os ensaios e experimentos e gostariam de receber a visita da Oficina de Química na sua escola, com a motivação de despertar os professores da área a se dedicarem nesse sentido. Contudo, sabe-se que são muitos os professores que não utilizam a experimentação com a frequência que gostariam, quase sempre se justificam pelo simples fato de não terem desenvolvido um bom domínio de laboratório durante a formação inicial. Por isto, este trabalho também se junta a outros sons na educação em química, fazendo um apelo para a necessidade cogente de incluir, na formação inicial e continuada do professor de química do Ensino Médio, estudos sobre a experimentação para a construção de conceitos mais fundamentados. Por fim, na conclusão do questionário, foi ainda revelado que são poucos (28%) os alunos interessados em eleger a graduação em química como curso superior (Figura 6), sendo reforçado pelo seguinte comentário: “a disciplina de química em minha escola é desinteressante e decorativa”. Isso pode retratar a maneira como ela é abordada nas salas de aula, chegando a influenciar na difusão de ideias distorcidas dessa ciência, vindo a causar desinteresse nos alunos.

Figura 6. Percentual ilustrativo do interesse dos alunos do Ensino Médio pela opção por um curso de graduação em química. REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 04 | Número 01

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Diante de todas essas considerações, fi cou explícito que apesar dos esforços empreendidos pelos alunos bacharelandos para despertar o interesse dos alunos do Ensino Médio para a ciência química, a maioria, cerca de 70% dos entrevistados, respondeu que não optaria por uma graduação em química.

Relatos dos alunos de bacharelado em Química, participantes da ofi cina de Química Após o término das apresentações, os alunos do projeto fi zeram um trabalho escrito relatando a experiência vivenciada e os resultados alcançados com o projeto. Alguns desses relatos estão listados a seguir: “...esses experimentos podem ser realizados em sala de aula para contextualização dos assuntos e um meio alternativo para suprir a falta de laboratório”; “...analisando os resultados, a química ainda é muito mistifi cada, porém os alunos foram muito receptivos aos experimentos e gostaram muito de ver na prática aquilo que é repassado em sala de aula. Na tentativa de mudar esse quadro é que foi realizada a exposição, para que essa realidade possa ser diferente daqui a algum tempo e através de pequenas apresentações possa abrir novos horizontes”; “...vale ressaltar ainda que através das demonstrações experimentais os alunos puderam resgatar a curiosidade pela química, a ciência da transformação, que para muitos deles não passava de uma matéria chata e decorativa”; “...viu-se que o interesse na química aumenta quando o próprio aluno vê na prática o que se é estudado em sala de aula. A curiosidade foi marcante nos olhos de cada aluno que assistiu à apresentação, pois ali foi mostrado

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algo simples e que ocorre naturalmente ao nosso redor, cotidianamente”; “...muitos alunos mostraram interesse pelos experimentos que envolviam conhecimentos do cotidiano, pois, isso demonstra como a Quimica está próxima deles. E essas demonstrações experimentais os ajudam a compreender melhor a matéria dada em sala de aula e faz com que o interesse deles aumente”.

Conclusão Com base na análise dos resultados, foi observado que os experimentos apresentados pela “Ofi cina de Química” possibilitaram a um grupo representativo de alunos do Ensino Médio da rede pública e privada um contato diferenciado com a química, pois a maioria nunca tinha entrado em um laboratório ou vivenciado qualquer tipo de experimentação em química na sua escola. Desta forma, pode-se avaliar que a Ofi cina de Química teve um nível de aceitação elevado por parte dos estudantes que se apresentaram receptivos em relação às demonstrações dos experimentos, evidenciando maior entusiasmo e curiosidade naqueles experimentos associados ao cotidiano. Além disso, foi constatado que a maioria das escolas de Ensino Médio destes alunos não oferece experimentação em química, ainda que possuam laboratórios, sendo este um dos principais motivos de poucos alunos se interessarem por uma graduação em química. E apesar dos esforços empreendidos pelos alunos bacharelandos para despertar o interesse dos alunos do Ensino Médio para a ciência química, foram poucos os alunos entrevistados que responderam positivamente, elegendo a química como curso superior. Aliado a isto, os questionários de pesquisa revelaram também que as atividades experimentais têm acontecido muito pouco nas salas de aula, contribuindo, também, para a desmotivação do estudante pela opção na área de química.


Oficina de Química

Referências BESSLER, K. E.; Nader, A.V. F. Química em Tubo de Ensaio: Uma Abordagem para Principiantes. Ed. Edgard Blucher, São Paulo, 2004.

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CONSTATINO, M. G.; SILVA, G. V. J.; DONATE, P. M. Fundamentos de Quimica experimental. São Paulo: Editoa Edusp, 2004.

PERNA, F. et al. O Show da Química como instrumento pedagógico. Anais da 30ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Química, Águas de Lindóia - SP, 2007.

FARIAS, R. F. Práticas de Química Inorgânica. Campinas, SP: Ed. Átomo, 2004.

VALADARES, E. C. Experimentos de baixo custo. Química Nova na Escola, 13, p.38. 2001.

FARRAREZI, J. G. et al. Show da Química: ensinando de forma divertida e interativa. Anais da 29ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Química, Águas de Lindóia-SP, 2006.

ZANON, L. B.; Palharini, E. M. Aprendizagem Real. Química Nova na Escola, 2, p.15, 1995.

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Relato 03 | Volume 04 | Número 01 | Jan./Jun. 2009

p. 45-54

Análise do Conhecimento das Funções Orgânicas Utilizando Estruturas Químicas de Polímeros Comerciais Analysis of Knowledge of Organic Functions Using Chemical Structures of Commercial Polymers Ana Paula Lima Pacheco

Centro Regional de Ciências Nucleares (CRCN) E-mail: apclima@gmail.com

Kátia Aparecida Silva Aquino

Colégio de Aplicação da Universidade Federal de Pernambuco(CAp/UFPE) E-mail: aquino@ufpe.br

Resumo Nossa proposta envolve a utilização de estruturas de polímeros comerciais, para promover uma atividade de associação entre essas estruturas e suas funções orgânicas e nomenclaturas. O objetivo da atividade foi avaliar o conhecimento em funções orgânicas de 39 alunos do primeiro semestre de um curso agrário de uma universidade pública. Um texto introdutório, contendo informações sobre polímeros comerciais, suas estruturas moleculares e nomenclaturas usuais, foi utilizado como ferramenta de estudo e um questionário foi aplicado. A associação entre a estrutura e a nomenclatura de polímero foi realizada por menos de 10% dos estudantes, ao passo que aproximadamente 70% puderam identificar as funções orgânicas presentes nas estruturas poliméricas. Baseando­ ‑se nesse resultado, pôde-se concluir que o uso do texto enfocando as estruturas de polímeros do dia a dia, como ferramenta de estudo, foi considerado eficaz para associar as estruturas poliméricas com as funções químicas orgânicas e o grau de polimerização. Esse resultado significa que os alunos conseguem distinguir uma função orgânica, mesmo quando ela é representada de uma forma agregada, não tradicional, como em estruturas poliméricas, o que exige uma articulação maior de conhecimentos por parte do aluno. Por outro lado, dificuldades na associação de nomenclatura e estrutura foram notadamente observadas no grupo de alunos estudados. Palavras-chave: funções orgânicas; polímeros; ferramenta de aprendizagem. Abstract This work aimed to use of a commercial polymeric structures to promote an association activity between these structures and organic functions and nomenclature. The objective


of the activity was to assess knowledge on organic functions of thirty-nine freshmen students from a Brazilian public university. Introductory text containing molecular structures and nomenclature of commercial polymers was used as educational tool and the students answered one questionnaire. The association between polymer nomenclature and structure were made by less than 10% of students, while. 70% of students were able to identify organic functions present in the polymeric structure. Based on this result, we concluded that the use of the text was effi cient for structural identifi cation of polymers. However, the students had diffi cult in the association between nomenclature and polymeric structures. Key-words: organic function; polymer; educational tool.

Introdução Atualmente, os alunos que chegam à universidade vêm de um sistema de ensino que canalizou os esforços de seus três últimos anos escolares na direção de um exame de seleção: o vestibular. Na grande maioria das vezes, observase que a memorização foi a principal forma utilizada pelas escolas, no intuito de destacar seus alunos na classifi cação geral do vestibular, o que é característico de um ensino tradicional. O ensino tradicional segue um ritual rotineiro em que são apresentados defi nições, consequentemente alguns exemplos e, posteriormente, extensas listas de exercícios com aspectos que não exigem relação com a realidade, construindo um quadro de ciência como algo pronto e infalível (Lima; Silva, 1995). Essa prática forma cidadãos pouco críticos, sem criatividade e, em alguns casos, apenas aguça o sentimento de competitividade com ênfase na quantidade e não na qualidade. O trecho a seguir, extraído de Carvalho e Perez (1995), resume o que pensamos sobre a prática de resolução de exercícios no ensino tradicional:

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Oliveira, 1997; Cardoso; Colinvaux, 2000). Assim, o educador deve interagir com os alunos e mostrar a importância das diversas áreas do conhecimento nos seus cotidianos. Para Beltran e Ciscato, por exemplo, os alunos devem aprender que quando um indivíduo come, respira ou pensa está realizando processos químicos (Beltran; Ciscato, 1998). Esse aprendizado possibilita ao aluno não só a compreensão dos processos químicos em si, mas a construção de um conhecimento científi co com estreita relação com as aplicações tecnológicas e suas implicações ambientais, sociais, políticas e econômicas. [...] a existência de um referencial que permita aos alunos identificar e se identificar com as questões propostas. Essa postura não significa permanecer no nível de conhecimento que é dado pelo contexto mais imediato, nem muito menos para o senso comum, mas visa gerar a capacidade de compreender e intervir na realidade, numa perspectiva autônoma e desalienante (PCNEM, 2002).

A proposta pedagógica apresentada no documento do PCNEM (Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio) (MEC, 2002) se apoia na

A didática habitual de resolução de problema costuma impulsionar a um operativismo abstrato, carente de significação que pouco contribui para uma aprendizagem significativa.

contextualização, dando signifi cado aos conteúdos e

Os últimos anos têm sido marcados por mudanças signifi cativas no discurso sobre a educação, o ensino e, particularmente, sobre o ensino médio. Nas atuais propostas educacionais foi introduzido um novo vocabulário, que inclui palavras como contextualização, interdisciplinaridade, competências e habilidades (Mizukami, 1986; Vygotsky, 1988;

com os temas e conteúdos das diversas áreas do

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facilitando o estabelecimento de ligações com outros campos de conhecimento. Oportunizando, assim, o desenvolvimento de competências e habilidades conhecimento. Uma das atividades no magistério é levar os alunos a uma formação de um indivíduo ético, intelectual autônomo, que apresente pensamento crítico para exercer a sua cidadania (Chassot, 2003). Um professor bem atualizado é capaz de


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dialogar com os alunos fazendo com que estes venham a observar a escola como um lugar em que possam aprender, desenvolver seus conhecimentos científicos e interagir não só com o professor, mas com a sociedade em que vivem. Quando um aluno se depara com um novo corpo de informações, ele pode decidir observar esse conteúdo de maneira literal e, desse modo, a sua aprendizagem será mecânica, pois ele só conseguirá simplesmente reproduzir esses conteúdos de maneira idêntica àquela que lhe foi apresentada. Nesse caso, não existe uma compreensão da estrutura de informação que lhe foi apresentada e o aluno não conseguiria transferir o aprendizado da estrutura dessa informação apresentada para solução de problemas equivalentes em outros contextos (Tavares, 2008). Por outro lado, quando o aluno tem um corpo de informações e consegue fazer conexões entre esse material que lhe é apresentado e o seu conhecimento prévio em assuntos correlatos, ele contruirá significados pessoais para essa informação, transformando-a em conhecimentos, em significados sobre o conteúdo apresentado. Essa construção de significado não é uma apreensão literal de informação, mas é uma percepção substantiva do material apresentado, e, desse modo, configura-se como uma aprendizagem significativa (Tavares, 2004). A teoria de aprendizagem de Asubel (2003) propõe-se a lançar bases para a compreensão de como o ser humano constrói significados e, assim, apontar caminhos para a elaboração de estratégias de ensino que facilitem uma aprendizagem significativa. Costuma-se dizer que com a aprendizagem signi­ ficativa acontece a transformação do significado lógico de determinado material em significado psicológico, na medida em que o aluno internaliza o saber de modo peculiar, transformando-o em um conteúdo idiossincrático. Desse modo, é consumada a aprendizagem significativa de maneira que a nova informação será incorporada na estrutura cognitiva do aluno, usando o seu modo pessoal de fazer isso. O conhecimento anterior do aluno será alterado com essa incorporação, tornando-se mais inclusivo; e o

novo conhecimento também será modificado pela maneira específica como se dará a absorção do aluno (Tavares, 2008). Professores podem encorajar os alunos com a aprendizagem significativa, usando tarefas que visam engajar o estudante na busca de conexões entre o seu conhecimento, usando o conhecimento prévio e o novo conhecimento, utilizando estratégias de avaliação que premiam a aprendizagem signi­ ficativa. Não é possível ao estudante alcançar altos níveis de aprendizagem significativa até que uma estrutura de conhecimentos relevantes seja construída. Neste estágio, a aprendizagem passa a ser um processo interativo ao longo do tempo até atingir a proficiência na área desse conhecimento (Novak; Gowin, 2000). Estratégias de ensino são de fundamental importância na construção do conhecimento. Araújo expõe a necessidade do educador ter acesso ao conhecimento prévio do aluno na direção de compreender a linha de construção de suas ideias e, a partir daí, propor estratégias para o processo ensino-aprendizagem (Araújo, 1986). Nossa proposta envolve a utilização de estruturas poliméricas, cujos polímeros são encontrados no cotidiano dos alunos, para promover uma atividade de associação entre essas estruturas e as funções orgânicas com o intuito de avaliar como os alunos articulam esses conteúdos. O assunto relacionado com polímeros foi escolhido para essa intervenção, pois a indústria desse material constitui, hoje, um dos pilares do estilo de vida contemporâneo. É enorme a quantidade de bens que nos cercam produzidos de material polimérico, uma vez que eles são utilizados em quase todas as áreas das atividades humanas, especialmente nas indústrias automobilísticas, de embalagens, de revestimentos e de vestuário, e se incorporaram de forma permanente ao cotidiano de nossas vidas. Isso se deve também ao fato de que os polímeros sintéticos vêm conquistando muitos mercados por meio da substituição de outros materiais, como papel, madeira e metais. Podemos destacar, como exemplo da presença dos materiais poliméricos no nosso cotidiano, Polietileno (PE), utilizado REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 04 | Número 01

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Ana Paula Lima Pacheco e Kátia Aparecida Silva Aquino

na confecção de baldes, sacos de lixo e sacos de embalagens; o Polipropileno (PP), que é utilizado em cadeiras, poltronas, parachoques de automóveis; o Politereftalato de etileno (PET), muito utilizado na confecção de garrafas e utensílios em geral, dentre outros (Billmeyer Jr., 1975). Os conteúdos relacionados às funções orgânicas e polímeros são geralmente estudados no último ano do ensino médio. Nosso trabalho visa analisar o conhecimento prévio sobre funções orgânicas de alunos do primeiro ano de graduação de uma universidade pública. Tal conteúdo é o conhecimento mínimo que o graduando de primeiro período deve ter para cursar disciplinas como Química Biológica I e Química Orgânica A. Para essa atividade, foi utilizada como ferramenta uma produção textual cujo enfoque foi a importância dos polímeros no dia a dia.

condensação por eliminação. Neste texto, o leitor encontrava, também, as estruturas apresentadas na Figura 1. Vale salientar que não foram informadas as nomenclaturas dos polímeros apresentados. Por outro lado, foi fornecida a nomenclatura de alguns polímeros comerciais que se encontram na Tabela 1 e que, não necessariamente, estão relacionados com as estruturas da Figura 1. Foram escolhidos os polímeros que são mais comuns no dia a dia do consumidor.

Metodologia A pesquisa apresenta as características de uma abordagem qualitativa, uma vez que se investigaram as respostas, na forma escrita, dos alunos frente a um conjunto de perguntas.

Produção textual e aplicação Em face das metodologias educacionais mais utilizadas no Ensino Superior, a leitura é um dos elementos essenciais para o ofício do aluno (Perrenoud, 1995), pelo fato de exigir metodologia individual e efi ciência no estudo. Do aluno espera que seja assumida a posição de coautor na construção dos conhecimentos legitimados nessas instituições (Pozo, 2002). Nessa direção, primeiramente foi produzido pelas autoras um texto baseado nas recomendações dos PCNEM (MEC, 2002), especialmente das relações dos polímeros com aspectos do meio ambiente, aplicações tecnológicas, sociais e políticas. Na grande maioria das vezes, o tema (Polímeros) é trabalhado apenas como um apêndice do assunto relacionado com as reações orgânicas de adição e

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Figura 1. Estruturas de alguns polímeros comerciais. Tabela 1. Nomenclaturas e siglas de polímeros utilizados neste estudo. Nomenclaturas

Siglas

polietileno

PE

polipropileno

PP

poliestireno

PS

poli (metacrilato de metila)

PMMA

poli (óxido de etileno)

PEO

poli (óxido de propileno)

PPO

poli (tereftalato de etileno)

PET

poli (hidroxi butirato)

PHB

poli (cloreto de vinila)

PVC

Instrumentos de análise Duas categorias foram utilizadas para compreensão do nível de habilidades de conexão manifestadas pelos alunos. A primeira refere-se às questões propostas pelo professor e estão


Análise do Conhecimento das Funções Orgânicas Utilizando Estruturas Químicas de Polímeros Comerciais

apresentadas na Tabela 2, e a segunda contém as respostas elaboradas pelos alunos. As perguntas propostas pelo professor foram idealizadas conforme conjuntos de categorias descritas na Tabela 3. Para esse trabalho, as questões foram adaptadas valendo-se das categorias desenvolvidas por Shepardison e Pizzini (Shepardson; Pizzini, 1991), que investigaram o nível de exigência cognitiva requerido pelas questões propostas em livros didáticos do ensino médio de química. Tabela 2. Questões aplicadas nos grupos de alunos. N° da pergunta

Pergunta

1

Associe as estruturas poliméricas (A, B, C, D, E, F, G, H, I) de acordo com suas funções orgânicas, indique a função orgânica apresentada e justifique suas respostas.

2

Agrupe as nomenclaturas de acordo com suas funções orgânicas e justifique suas respostas.

3

Associe as nomenclaturas apresentadas na Tabela 1 com as estruturas poliméricas (A, B, C, D, E, F, G, H, I), quando for o caso

4

O que são funções orgânicas?

5

O que são polímeros?

6

O que significa o “n” que aparece na representação das estruturas poliméricas?

Tabela 3. Classifi cação do nível das perguntas aplicadas nos grupos de alunos. Nível

Descrição

P1

Requer que o aluno recorde uma informação partindo dos dados obtidos

P2

Requer que o aluno desenvolva atividades como sequenciar, comparar, contrastar e aplicar conceitos para a resolução do problema

P3

Requer que o aluno utilize os dados obtidos para propor hipóteses, fazer inferências, avaliar condições e generalizar.

Com relação às respostas dos alunos, foram atribuídos os conceitos NS (não consegue articular o tema abordado nem identifi car as funções químicas nas estruturas poliméricas), TC (tem conhecimento, mesmo que não totalmente correto, sobre as funções orgânicas envolvidas nas estruturas poliméricas) e S (consegue articular o tema polímeros e identifi car corretamente as funções orgânicas nas estruturas poliméricas).

Os estudantes Foram analisados 39 alunos do primeiro ano de graduação de uma universidade pública em curso da área de tecnologia agrária. Também foram avaliados 5 alunos de pós-graduação que realizavam, quando na coleta de dados, sua formação em mestrado na área de Ciência de Polímeros. Os alunos de pós-graduação também eram de uma universidade pública. Foram formados os seguintes grupos de alunos: • A – Estudantes que receberam o texto como ferramenta de consulta e responderam as questões de 1 a 6. Participaram deste grupo 21 alunos. • b – Estudantes que não receberam o texto informativo e responderam apenas as questões de 4 a 6. Participaram deste grupo 18 alunos. • C – Estudantes de pós-graduação que não receberam o texto e responderam apenas as perguntas de 3 a 6. Participaram deste grupo 5 alunos.

Resultados e análise dos dados Em sistemas poliméricos, a unidade que se repete é chamada de ‘mero’. O mero possui a função química do composto polimérico. Os alunos do ensino médio, em geral, têm contato com as funções orgânicas em estruturas simples, sem repetição na molécula, diferente do que ocorre com uma estrutura polimérica. Ao analisar a Figura 2, é possível observar que a maioria dos alunos conseguiu, de alguma forma, associar as estruturas poliméricas com uma função química, conforme podemos observar nos percentuais de TC (57%) e S (14%) para a questão 1. Esse resultado mostra que os alunos conseguiram distinguir uma função orgânica, mesmo quando ela foi representada de uma forma agregada, não tradicional, como em estruturas polimérica, o que exige uma articulação maior de conhecimentos por parte do aluno. REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 04 | Número 01

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Por outro lado, analisando ainda a Figura 2, é notório que o grupo não conseguiu agrupar os polímeros na mesma função química, utilizando apenas a nomenclatura, dado o alto índice de erro das respostas para questão 2 (86%). Também é possível observar que o grupo não conseguiu associar a nomenclatura com as estruturas, dado o elevado percentual de NS apresentado, em torno dos 71%, para a questão 3. Questões relacionadas com nomenclatura de compostos químicos são tradicionalmente trabalhadas no intuito de levar o aluno a reconhecer uma função orgânica a partir de seu nome e vice-versa. Nossos resultados podem levar a duas vertentes de discussão. A primeira é que os resultados podem não ser reflexo do real conhecimento do aluno em nomenclatura, uma vez que a nomenclatura dos polímeros não segue o mesmo padrão seguido para os outros tipos de moléculas, ou seja, a nomenclatura de alguns polímeros se dá pelo nome do monômero que deu origem ao polímero com o prefixo poli. Assim, por exemplo, o Poli (cloreto de vinila) (PVC) não tem na sua estrutura ligações duplas, como indica o nome do radical (vinila), as duplas ligações foram quebradas na reação de polimerização do mero (cloreto de vinila). A associação da estrutura polimérica com a nomenclatura torna-se mais difícil, pois enfoca-se no ensino médio, principalmente, as nomenclaturas oficiais dos compostos orgânicos. Outra discussão é sobre como os conteúdos das diversas áreas são trabalhados no ensino médio e como as lacunas deixadas podem interferir no processo de construção do conhecimento nos diversos estágios de aprendizagem na vida do indivíduo. Isso nos faz pensar que um dos determinantes fundamentais dos processos educativos é a construção de relações entre conceitos que favoreça a socialização, a apropriação e a construção do conhecimento e o desenvolvimento das potencialidades do aluno. Para Maldaner (Maldaner; Piedade, 1995), o conhecimento químico, ou o que se faz com o conhecimento químico, começa a ser formado quando se faz um intermédio de discussão do que há na produção de materiais do cotidiano do

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aluno como os plásticos (que são polímeros), por exemplo. Vale salientar ainda que as questões 1, 2 e 3 foram classificadas neste trabalho com os níveis P1, P2 e P3, respectivamente. Esses níveis de pergunta exigem do aluno uma articulação maior dos conhecimentos prévios com as informações que o texto trazia.

Figura 2. Percentual de acertos para as perguntas 1, 2 e 3 aplicadas ao grupo A.

As questões 4, 5 e 6 foram respondidas por dois grupos de alunos. O grupo A, que recebeu o texto sobre polímeros, e o grupo B, que respondeu as três questões sem o auxílio de nenhum recurso. O objetivo dessa atividade foi verificar se a utilização de um texto informativo, com discussões sobre a importância social de polímeros, bem como estruturas e nomenclaturas de polímeros comerciais, facilita a articulação de conhecimentos. Nós nos baseamos nos princípios apontados por Saviani (1994) ao expor a importância do educador em buscar nortear sua ação a partir da identificação de formas mais desenvolvidas em que se exprime o saber objetivo socialmente produzido. A trans­formação desse saber objetivo em saber escolar, assimilado pelo conjunto de alunos, é a garantia das condições necessárias para que estes não apenas se apropriem do conhecimento, mas, ainda, possam elevar seu nível de compreensão sobre a realidade (Araújo, 1986). Analisando as Figuras 3 e 4, podemos observar que o texto não foi uma ferramenta que contribuiu significativamente para uma associação mais estreita entre as estruturas poliméricas e as funções orgânicas. O percentual


Análise do Conhecimento das Funções Orgânicas Utilizando Estruturas Químicas de Polímeros Comerciais

de respostas corretas (S) não apresentou diferenças apreciáveis para as questões 4 e 5 nas Figuras 3 e 4. Vale destacar que o maior percentual de erro ao responder a questão 4 (71%) foi observado para o grupo que recebeu o texto. Contudo, observa-se que, na questão 6, o texto pode ter contribuído para o número significativo de acertos nessa questão (cerca de 33%), como mostra a Figura 3. Para os alunos que não receberam o texto, o percentual de acerto foi de apenas 6%, com um percentual significativo de respostas erradas para a questão (83%). As perguntas 4, 5 e 6 podem ser classificadas como P1, P2 e P3, respectivamente. Assim, como as perguntas 4 e 5 só exigiram do aluno a memorização de um conceito, fica nítido que o aluno que memoriza não guarda informações essenciais para a resolução de uma situação problema. Como o texto não trazia informações conceituais, foi pouco eficiente para a ajudar o alunos a responder as questões 4 e 5. Por outro lado, para a questão 6 (P2), que exigia um nível maior de associação de dados, o texto foi uma ferramenta que o aluno soube usar para fazer uma associação da informação que continha no texto com a sua resposta. Sabe-se que dificuldades na aprendizagem de química se devem, dentre outras, à não contextualização dos temas com a vida do aluno (Maldaner; Piedade, 1995). Existe uma dissociação entre o que é ensinado nas aulas de química, as questões do cotidiano e a não integração de assuntos relacionados à ciência, tecnologia e sociedade. Tal dissociação foi reforçada por Zanon e Palharini, quando detectaram a dificuldade demonstrada por alguns professores de química em relacionar conteúdos específicos com eventos da vida cotidiana (Zanon; Palharini, 1995). Fica claro nos resultados comparativos, entre os grupos A e B, que o conhecimento prévio foi fundamental para se estabelecer conexões entre conceito e realidade, o texto só foi importante para auxiliar na compreensão do grau de polimerização dos compostos poliméricos (questão 6), que é um termo muito específico e nada tem a ver com o cotidiano. Os resultados mostrados na Tabela 3 reforçam a ideia do quanto a vivência com um determinado conteúdo acarreta associações

mais efetivas, dado o elevado percentual de acerto para as questões 4, 5 e 6, respondidas pelo grupo C.

Figura 3. Percentual de acertos para as perguntas 4, 5 e 6 relacionados ao grupo A.

Figura 4. Percentual de acertos para as perguntas 4, 5 e 6 relacionados ao grupo B.

Os resultados mostrados nas Figuras 3 e 4 para as questões 4 e 5, provavelmente, poderiam se apresentar de forma diferente se a atividade fosse proposta em grupo (Maldaner; Piedade, 1995). A associação entre pensamento e linguagem é atribuída à necessidade de intercâmbio dos indivíduos durante o trabalho, atividade especificamente humana. O trabalho é uma atividade que exige, por um lado, a utilização de instrumentos para a transforma­ ção da natureza e, por outro, o planejamento, a ação coletiva e, portanto, a comunicação social (Vygotsky, 1988). Processos comunicativos na apren­dizagem têm sido cada vez mais privilegiados nas pesquisas em ensino de Ciência. A construção de um determinado conhecimento também pode REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 04 | Número 01

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ser feita simultaneamente por mais de uma pessoa e aquele que circunstancialmente domina melhor um conteúdo ampliará os horizontes da aprendizagem do seu companheiro, tal como indica Vygotsky, quando defi ne a Zona de Desenvolvimento Proximal (Oliveira, 1997). Nossos resultados mostram a necessidade de os alunos se relacionarem com os fenômenos sobre os quais se referem os conceitos. Utilizando um conteúdo como polímeros como ferramenta na contextualização, demos a oportunidade aos nossos alunos de conhecerem materiais que mudaram a face da indústria química. Os alunos precisam de oportunidades para expressar suas concepções dos fenômenos de forma direta, experimental, ou de forma indireta, por meio de registros desses fenômenos. Assim, propomos a utilização da associação de estruturas poliméricas com as funções orgânicas pelo entendimento das razões e objetivos que justifi cam e motivam o ensino que poderá ser alcançado. Abandonando-se assim as aulas baseadas na simples memorização de nomes e fórmulas, tornando-as vinculadas ao conhecimento e conceitos do dia a dia do aluno (Lopes, 2002).

na área de polímeros, também foi analisado para comparação e sem receber o texto. O uso do texto enfocando os polímeros do dia a dia, como recurso didático, foi considerado efi caz para associar as estruturas poliméricas com as funções químicas e o grau de polimerização. No entanto, o texto não foi efi ciente para a associação de nomenclaturas com as estruturas poliméricas. Por outro lado, os percentuais das respostas às perguntas que exigiam apenas a memorização de um conceito não apresentaram diferenças apreciáveis entre os dois grupos (A e B). Esses resultados demonstram que os alunos que saem do ensino médio apresentam certas difi culdades em articular os conhecimentos ditos acadêmicos em situações mais abrangentes de aplicação de tal conhecimento. O alto percentual de respostas erradas e/ou meio certas para as questões que dependiam de uma conexão ou entre nomenclaturas ou entre estruturas de funções químicas e polímeros reforçam essa conclusão. Existe a expectativa de serem obtidos resultados diferentes se a atividade for proposta em grupo, pois a associação entre pensamentos e linguagens durante o intercâmbio dos indivíduos sugere um melhor desempenho.

Tabela 4. Resultados referentes aos alunos de pósgraduação na área de polímeros (grupo C). N° da pergunta

NS (%)

TC (%)

S (%)

4

20

20

60

5

0

0

100

6

0

0

100

REFERêNCIAS ARAÚJO, C. Aprender pensando, 2 ed., Petrópolis: Vozes, 1986. ASUBEL, D. Aquisição e retenção de conhecimentos: Uma perspectiva cognitiva. Lisboa: Plátano, 2003.

Conclusões Dois grupos de estudantes do primeiro semestre de graduação foram analisados nesse estudo. Um grupo (A) recebeu um texto baseado nas recomendações do PCNEM, com informações e estruturas de alguns polímeros comerciais, e outro grupo (B) não recebeu o referido texto. Um questionário com três níveis distintos de perguntas foi aplicado aos estudantes dos dois grupos. Um terceiro grupo, com estudantes de pós-graduação

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Relato 04 | Volume 04 | Número 01 | Jan./Jun. 2009

p. 55-64

Estudo da Implementação de um Curso Introdutório ao Software ACDLabs ChemSketch a Graduandos em Química Implementation Study of an Introductory Course to the ACDLabs ChemSketch Software to Students of Chemistry Wilmo E. Francisco Junior1

Departamento de Química, Universidade Federal de Rondônia E-mail: wilmojr@bol.com.br

Welington Francisco Maurílio A. de Morais Carolina von Atzingen Manocchio Miguel Ruiz

Grupo PET-Química, Instituto de Química, UNESP

Resumo O presente estudo descreve e analisa a proposta de um curso introdutório ao software ACDLabs ChemSketch a graduandos em Química de uma universidade estadual paulista. O curso foi desenvolvido por membros do grupo PET-Química (Programa de Educação Tutorial) em um total de 8 horas. Informações sobre o curso foram coletadas por meio de um questionário respondido pelos participantes, bem como por registros de campo. Os dados obtidos demonstraram uma boa receptividade dos participantes em relação ao curso e ao programa. Além disso, o ChemSketch parece ser uma importante ferramenta para utilização em aulas. Palavras-chave: ChemSketch, computadores, Ensino de Química. Abstract This paper describes and analyses an introductory course to the ACDLabs ChemSketch software developed with Chemistry students from a Sao Paulo University State. The 1. Agradecemos à Prof. Dra. Júlia Tanaka, responsável pelo LDI, por disponibilizar o espaço para a realização do curso. Aos participantes do curso, que se disponibilizaram a responder o questionário. Aos membros do grupo PET-Química, por auxiliarem a viabilização do curso. Ao MEC-SESU, pelo suporte financeiro concedido aos bolsistas do PET.


course was conducted by members of the PET-Química (Programa de Educação Tutorial) in a total of 8 hours. The results were obtained by questionnaires and observations. The participants demonstrated a great interest and enthusiasm on software as well as on activities realized. Besides, the ChemSketch seems to be a main tool in science classrooms. Key-words: ChemSketch, Computers, Chemistry Teaching.

Introdução O desenvolvimento de tecnologias ligadas à comunicação é um dos aspectos mais marcantes dos últimos anos. Quem imaginaria, cerca de 20 anos atrás, que seria possível o envio de uma mensagem para o outro lado do globo terrestre em, no máximo, alguns minutos? Nessa conjuntura, a informática tem sido uma das responsáveis pela revolução nas relações humanas, auxiliando em muitos aspectos as atividades de professores e pesquisadores, por exemplo. A produção científica e bibliográfica sofreu uma ampla expansão, especialmente nas duas últimas décadas, em razão da aceleração tanto da obtenção de resultados (instrumentos com medidas mais rápidas e precisas) quanto da divulgação dos mesmos (processos de arbitragens via internet e revistas eletrônicas). No tocante ao uso da informática na educação, especialmente no ensino superior de Química, registros remontam à década de sessenta (Casanova Jr.; Weaver, 1965; Bard; King, 1965). Ademais, uma breve análise dos periódicos de educação em ciências permite vislumbrar que tal tema tem sido crescentemente propalado. Uma das principais áreas de cobertura está associada às simulações e modelagens computacionais, como aponta revisão de Ribeiro e Greca (2003), pois, com o advento da tecnologia, tornou-se viável a representação de sistemas dinâmicos na exploração de fenômenos e processos abstratos, o que antes não era possível. Witnell et al. (1994) reportam outras fun­ções da informática na educação; dentre elas, a visualização de figuras, esquemas e gráficos inaces­síveis com o uso do quadro negro. Também pode ser encontrado um grande número de traba­lhos que apontam para a função

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de busca, armazenamento e troca de informações, sobretudo via Internet, como forma de apoio, aumento da interatividade e promoção da educação à distância (Carpi, 2001; Murov, 2001; Boschmann, 2003; Eichler; Del Pino, 1999; Ribeiro; Nascimento; Queiroz, 2005; Santos; Firme; Barros, 2008). De maneira geral, parece consenso de que as tecnologias, dentre elas, os computadores, possam proporcionar oportunidades de ampliação dos ambientes de aprendizagem, viabilizando troca de informações, de experiências e de conhecimentos, funcionando, assim, como mediatizadoras da cons­ trução de novos conhecimentos. Não obstante das potencialidades, vale destacar que a informática não é a solução para os problemas educacionais e, sim, mais uma ferramenta que deve se adequar à Educação (Esquembre, 2002). No presente trabalho, pretende-se apresentar uma visão geral do software ACD Labs ChemSketch, entendido como uma importante ferramenta aos profissionais da Química de um modo geral (Francisco Junior et al., 2004), assim como discutir a implementação e avaliação de um curso introdutório ao referido programa a graduandos em Química de uma universidade estadual paulista.

O software O ACD Labs ChemSketch é um pacote inte­ grado ao software Advanced Chemistry Development Inc., que inclui uma base da dados de espectros de RMN e de infravermelho para uma série de compostos orgânicos. Esse pacote espec­troscópico inclui as constantes de acoplamento, os módulos para diferentes núcleos, como por exemplo, 13C, 31P, 15N, 19F;


Estudo da Implementação de um Curso Introdutório ao Software ACDLabs ChemSketch...

Figura 1. Interface principal do ACD ChemSketch mos­trando algumas de suas ferramentas e opções.

além de elucidar os espectros de quaisquer moléculas que forem desenhadas com o programa. Esta função é de extrema valia para os químicos de um modo geral, uma vez que, valendo-se da comparação entre os espectros obtidos de uma molécula desconhecida com os espectros apresentados pelo programa, podem-se predizer estruturas moleculares (Stefani; Nascimento; Costa, 2007). Especificamente em relação ao ACD ChemSketch, ele pode ser usualmente empregado no desenho de estruturas químicas (orgânicas e inorgânicas), mecanismos de reações, diagramas esquemáticos como aparatos e aparelhagens utilizados em laboratórios de Química e outros fatos gerais na área Química. O programa apresenta as opções de: i) modelo estrutural, para desenhar estru­ turas químicas e calcular as suas proprie­ dades (massa molar, composição em porcentagem, volume molar, índice de refração, tensão superficial, densidade, constante dielétrica e polarizabilidade); ii) modelo estrutural; para textos e proces­ samento de gráficos; iii) um ACD Dictionary com quase 48.000 nomes sistemáticos e não sistemáticos

das substâncias químicas frequentemente mais usadas. Os profissionais da Química podem utilizar o software de distintas formas. Em relação aos estudantes, eles podem utilizar o programa para a elaboração de relatórios, trabalhos e artigos científicos. Por sua vez, professores e pesquisadores podem empregá-lo para o preparo de avaliações, listas de exercícios, apresentações de trabalhos em congressos e periódicos, além de poderem utilizálo em suas próprias aulas. O domínio de softwares de edição de estru­ turas, como este, proporciona praticidade e melhoria nas atividades acadêmicas que são desenvolvidas durante a graduação, sobretudo relatórios, semi­ nários e elaboração de painéis, além de um aprendizado que, futuramente, poderá ser de grande utilidade, visto que muitas dessas funções podem ser usufruídas durante a vida profissional, tanto em indústrias, escolas ou institutos de pesquisa. Embora outros programas tenham funções similares, a facilidade de manuseio, além da disponibilidade de forma livre pela internet, contribui para a opção por este programa em específico. REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 04 | Número 01

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Desenvolvimento do curso e coleta de dados O curso foi planejado e executado por membros do Grupo PET-Química (Programa de Educação Tutorial), também graduandos em Química, realizado no Laboratório Didático de Informática (LDI) do Instituto de Química da Universidade Estadual Paulista, Campus de Araraquara (IQ-UNESP). Todas as atividades foram extracurriculares, sendo desenvolvidas aos sábados, durante o mês de outubro do ano de 2007. A carga horária foi de 8 horas. As vagas foram destinadas aos alunos de graduação em Química da referida instituição, sendo preenchidas por inscrições prévias, de acordo com interesse dos estudantes em participar das atividades. O número de vagas foi limitado em razão da quantidade de microcomputadores disponíveis no LDI. Participaram um total de 18 pessoas, sendo 17 alunos de graduação em Química e um docente da instituição atuante, na área de Matemática e Computação. Dos 17 alunos participantes, 13 pertenciam ao curso de Bacharelado em Química (período diurno) e 4 cursavam Licenciatura em Química (período noturno). Dos treze alunos do curso de Bacharelado em Química, dois alunos cursavam o primeiro ano de graduação; oito, o segundo ano; dois, o terceiro e apenas um era aluno do quarto ano. Em relação aos alunos do curso de Licenciatura em Química, participaram dois alunos do segundo ano, um do terceiro e um do quarto ano.

No total, 9 participantes eram do sexo masculino e 8 eram do sexo feminino. A faixa etária média era próxima aos 23 anos. Os dados foram coletados por meio de um questionário (Quadro 1), respondido pelos parti­ cipantes ao final do curso, bem como por registros de campo. O questionário elaborado almejou avaliar o curso, de um modo geral, sob a ótica dos participantes. Esse instrumento foi composto de seis questões, contendo perguntas fechadas, para que fossem quanti­ ficadas, acompanhadas de justificativas, pro­piciando, assim, uma análise mais profunda da avaliação feita pelos participantes. Os registros de campo visaram analisar, de uma forma genérica, o comportamento dos participantes durante o curso, considerando aspectos relacionados à motivação e às atitudes, destacados como importantes na avaliação de programas educacionais (Behar, 1993; Nascimento et al., 2005).

Resultados e discussão O Quadro 2 apresenta de forma resumida os principais tópicos abordados.. A versão do software empregada durante o curso foi a ACDLabs ChemSketch freeware 12.0, URL http://www.acdlabs. com/download/chemsk.html. Tal versão pode ser obtida gratuitamente por meio da internet, além de não exigir uma configuração especial dos microcomputadores. Máquinas mais antigas executam o programa com relativa facilidade e velocidade.

Quadro 1. Questionário aplicado aos participantes após o desenvolvimento do curso de introdução ao ACD ChemSketch. Questionário 1. Você já tinha conhecimentos de informática? ( ) Sim ( ) Não 2. Você já tinha tido contato com o ACD Labs ChemSketch? ( ) Sim ( ) Não 3. O curso atendeu às suas expectativas? ( ) Completamente ( ) Parcialmente Justifique. 4. Qual sua avaliação do curso? ( ) Ótimo ( ) Bom ( ) Regular Justifique.

( ) Não

( ) Ruim

5. Você acha que o curso foi suficiente para que você possa, futuramente, usar o programa por conta própria? ( ) Sim ( ) Não Justifique. 6. Na sua opinião, o programa poderia ser inserido no cronograma de aulas da disciplina de Orgânica? ( ) Sim ( ) Não Justifique.

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Estudo da Implementação de um Curso Introdutório ao Software ACDLabs ChemSketch... Quadro 2. Conteúdo Programático abordado durante o curso. • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • •

Desenhando estruturas simples; Modo de estrutura e modo de desenho; Barra de ferramentas geral; Utilizando o mouse para fazer estruturas; Utilizando o comando clean; Utilizando as ligações stereo, de coordenação e as indefinidas; Rearranjo de ramificações (label) em átomos; Inserindo etiquetas e usando a opção amplie (expand) em desenhos de estruturas; Utilizando a ferramenta Draw chains; Rearranjo de estruturas; Rotação e rotação em 3D; Limpando a tela; Desenhando estruturas mais complexas; Utilizando a tabela de radicais; Utilizando estruturas de anel; Excluindo átomos e fragmentos; Excluindo e substituindo átomos individualmente; Excluindo todos os átomos simultaneamente; Representando ligações múltiplas e cargas; Demonstrando as propriedades dos átomos; Calculando propriedades macroscópicas; Criando objetos gráficos; Desenhando aparatos de laboratório; Construindo reações simples e mecanismos de reações.

Os registros de campo foram conduzidos tomando como base o trabalho de Behar (1993), propondo assim, a avaliação de programas educa­ cionais em termos da Qualidade Pedagógica, com adaptações para o contexto do presente estu­ do. Ainda que para avaliar tais questões fosse recomendável um quadro de participantes mais extenso, bem como um maior tempo de contato entre os participantes e o programa, importantes considerações puderam ser tecidas. Tal proposta destaca dois itens como essen­ ciais quando da utilização de computadores: a motivação e as atitudes do aluno. No que concerne ao item motivação, são considerados aspectos de atenção/dispersão do aluno para a realização de uma tarefa, a flexibilidade e o interesse do aluno na utilização dos trabalhos com o programa. A atenção/dispersão pode ser notada por decisões de parar ou não constantemente uma atividade em desenvolvimento no computador. Raramente ocorreu algum tipo de dispersão dos participantes durante as atividades solicitadas. Eles paravam de realizar as tarefas apenas para auxiliar algum colega ou discutir eventuais dúvidas/ curiosidades com os monitores. Assim, de um modo

geral, todos demonstraram muita atenção durante as tarefas realizadas. Aflexibilidade, que está associada à adequação que o aluno faz do uso do computador frente a uma necessidade, poderá ser mais bem discutida com base na análise dos questionários. Já o interesse é um estado de motivação, guiando o comportamento de modo a satisfazer certos objetivos. Isso é observado quando o estudante busca conhecer novos comandos, ferramentas e informações mediante o desconhecido. A maioria buscou por si o manuseio de novas ferramentas e o desenho de estruturas não solicitadas no material de apoio, sempre buscando o auxílio dos monitores quando necessário. Estes, por sua vez, estiveram sempre atentos, atendendo às solicitações dos participantes, o que engendrou uma relação de confiança e satisfação grande por parte de ambos os lados, fato manifestado nos ques­ tionários respondidos. Isso possivelmente levou a manifestação altamente positiva no tocante à avaliação do curso, como será visto pela análise dos questionários. Aliás, a satisfação/insatisfação é um dos aspectos tangenciados pelo item atitudes, sendo refletido por um estado de prazer ou bem estar. As

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observações mostraram que todos os participantes tiveram um grande entusiasmo pelas atividades solicitadas. Isso pode ser atribuído ao fato do curso ter requerido um interesse pessoal, com inscrições em datas e horários previamente estabelecidos, além da realização aos sábados. Ou seja, todos que ali estavam realmente queriam participar do curso. Esse, provavelmente, tenha sido outro fator preponderante na receptividade dos participantes ao curso. No que diz respeito ao item atitudes, cabe assinalar que a atitude é um tipo de reação afetiva, em maior ou menor grau (Behar, 1993). Além da satisfação/insatisfação, foram avaliadas as seguintes atitudes: autonomia/independência, iniciativa/falta de iniciativa, segurança/insegurança e desinibição/retraimento. A autonomia/dependência é um comporta­ mento no qual o indivíduo manifesta sua capacidade de auto governar-se. Em contraposição está o conceito de dependência, a partir da qual o sujeito sente necessidade de ser orientado. A iniciativa/ falta de iniciativa pode ser vista como a habilidade de tomar as próprias decisões, de agir por si. No uso de computadores isso se manifesta pela espera em relação ao que fazer e como proceder. Por sua vez, a segurança/insegurança pode ser vista como o receio em experimentar pelo medo de errar. A desinibição/ retraimento é evidenciada pela curiosidade em experimentar, realizar, executar tarefas explorando comandos de forma independente. Por outro lado, o retraimento é um estado de bloqueio mental e/ou comportamental perante alguma ação que deve ser realizada. No que concerne à segurança/insegurança frente o software, observou-se que no início do curso, dificilmente os participantes começaram as atividades por si, mas, à medida que foram se familiarizando com o programa, sentiram-se mais livres, ou até mais capacitados para a construção de moléculas e para o uso de outras funções sem a orientação dos monitores. A segurança em realizar determinada tarefa está diretamente associada à capacidade de realização. Ao passo em que foram

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aprofundando suas habilidades no manuseio do ChemSketch, os participantes sentiram-se mais capazes e, por conseguinte, mais seguros em iniciar tarefas ainda não solicitadas e/ou não programadas. Não obstante das limitações referentes ao tempo de observação para a coleta de dados do presente estudo, pôde-se depreender, de um modo geral, que todos os participantes demonstraram bastante autonomia, segurança, iniciativa, desini­ bição e descontração durante as tarefas realizadas. Alguns participantes solicitavam novas informações e realizavam as tarefas ainda não compreendidas em discussões. Nesses casos, sempre que possível, os monitores auxiliavam, no entanto, era dada mais atenção aos participantes que ainda não haviam cumprido as tarefas já solicitadas. Assim, quando eram requeridas atividades de fixação, parte dos estudantes já havia terminado. Esse é mais um aspecto que destaca o desenvolvimento de forma favorável, da iniciativa, da autonomia e da desinibição, todos os aspectos concernentes às atitudes dos participantes. Uma das principais dificuldades depre­ endidas refere-se ao modo desenho, no qual é necessária certa habilidade para a construção de setas e mecanismos de reação. Tal modo de utilização é muito sensível ao movimento do mouse, e o desenvolvimento dessa perícia requer prática e paciência. Alguns, por serem mais impacientes e inquietos, se irritam com maior facilidade, tendo que repetir a tarefa por algumas vezes. Contudo, o tempo de manuseio e de contato com tais operações diminui gradativamente essas dificuldades. Outro aspecto que pode ser desfavorável ao emprego desse programa é a inexistência de versões em língua portuguesa. Porém, no caso específico do curso aqui relatado, isso não chegou a se configurar como barreira ao seu uso. O fato de a ferramenta ter um elevado grau de iconicidade, além do razoável domínio da língua inglesa necessária ao uso adequado do programa por parte dos participantes, auxílios a compreensão das funções. Além disso, o material de apoio continha instruções bem claras, que permitiam o acesso às funções da ferramenta com facilidade, sem que o


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idioma causasse barreiras ao uso. Vale assinalar, no entanto, que esse é um cuidado especial a ser tomado em casos cujo público-alvo desconhece o idioma inglês (ou outro idioma do programa) e não domina recursos de informática. O uso de um material de apoio (apostila) que identifique os ícones e suas respectivas funções é uma alternativa para não incorrer nesses problemas. O questionário aplicado possibilitou abs­ trair as impressões que os participantes tiveram acerca do curso, bem como quais as expectativas correspondidas, tanto em relação ao curso quanto à utilização do programa. As duas primeiras questões apenas mapearam brevemente o conhecimento dos participantes no que tange o uso de computadores e do software ACD ChemSketch. Todos os participantes já possuíam conhecimentos básicos de informática, mesmo porque consta na grade curricular do curso de Química a disciplina de Computação, oferecida logo no primeiro semestre da graduação. Em relação ao contato prévio com o software ACD ChemSketch, apenas 2 participantes reportaram já conhecerem o programa. Todavia, ambos destacaram que o domínio do programa era muito superficial. Em relação à questão 3, todos os participan­ tes assinalaram que o curso correspondeu às expec­ tativas. Quanto à justificativa, quase todos apontaram para o desenvolvimento de noções fundamentais e abrangentes do software, capacitando-os a utilizar o programa na construção de moléculas, mecanismos de reação entre outras funções. Alguns exemplos de impressões dos alunos foram: “Aprendi a usar de forma muito abrangente o programa”; “Foram ensinadas noções básicas para que o programa possa ser utilizado com facilidade”; “Esperava conseguir montar as reações fazer os mecanismos e com as aulas agora é possível”; “Passou os comandos básicos para que pudés­ semos criar moléculas, elaborar reações etc.”;

“Até superou minhas expectativas. A abor­ dagem foi objetiva a atendeu as minhas demandas”. Um participante aponta também aspectos con­ cernentes à aprendizagem em Química. Embora esse não fora o foco do curso, essa é uma possibilidade a ser vislumbrada e olhada com mais atenção, visto que o uso de recursos multimídias em salas de aula propicia não só o desenvolvimento de habilidades importantes aos profissionais da Química, mas pode auxiliar a compreensão de conceitos. “Aprendi orgânica de uma forma diferente: dinâmica, interativa e criativa”. A questão 4 refere-se à qualidade do curso oferecido, na opinião dos participantes. Quatorze participantes consideram o curso ‘ótimo’, enquanto quatro participantes avaliaram o curso como ‘bom’. As justificativas para tais escolhas puderam ser divididas em duas categorias: i) o aprendizado no uso da ferramenta (10 participantes); ii) a organização do curso de um modo geral (7 participantes), incluindo a atenção dispensada pelos monitores, o material de apoio fornecido e a iniciativa de empreender este tipo de atividade. iii) um dos participantes não justificou a escolha. Abaixo podem ser vistas algumas das justificativas apresentadas no questionário para a questão 4. Categoria 1: “O curso forneceu noções básicas e alcançou o objetivo de ensinar o uso de tal programa”; “Pois assim é possível aplicar a teoria em um computador, que nos dá um melhor aprendizado”; “Aprendi e consegui usar todas as infor­ mações que foram passadas”. Categoria 2: “O PET está de parabéns pela iniciativa, principalmente os bolsistas que ministraram o curso”; REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 04 | Número 01

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“O material estava muito bom, os alunos muito interessados e o mais importante os professores souberam passar o conteúdo”;

“Ele foi bem explicado, a apostila é fácil de entender e porque fizemos alguns exercícios para fixar o que aprendemos”;

“Gostei do programa, da explicação, da aula em geral”.

“Pois com as noções básicas ensinadas, além de fazer o ensinado, pode-se explorar o programa e fazer mais coisas”.

O uso do computador como recurso didático apresenta-se como alternativa no ensino de Química, uma vez que permite a participação ativa dos estudantes nas atividades e a exploração de novas estratégias de ensino. Via de regra, os exercícios empregados em aulas teóricas, na busca de uma melhor compreensão dos conceitos, são centrados em resoluções mecânicas de lápis e papel. Tratando-se de Química Orgânica, sabe-se que grande parte do conteúdo programático gira em torno das reações e dos mecanismos propostos para as reações de compostos orgânicos. Sendo assim, o uso do ChemSketch pode proporcionar maior interatividade, estímulo e compreensão dos conceitos, sobretudo aqueles relacionados às configurações espaciais e estereoquímica, pela possibilidade de rotação das moléculas, representações em três dimensões entre outras funções. É nesse contexto que os softwares de simulação e as ferramentas de modelagem configuram-se como alternativas para o desenvolvimento da compreensão conceitual, não mais de forma mecânica. A sexta questão foi referente à possibilidade dos participantes em utilizarem o programa indivi­ dualmente com base nas informações discutidas duran­ te o curso. Todas as respostas acenaram positivamente para isso, sendo as justificativas calcadas na fácil utilização do programa, no bom material de apoio fornecido e no aprendizado das funções básicas. “Foi demonstrado que o programa é fácil de se utilizar e o conhecimento avançado fica por conta do interesse individual”; “O programa é fácil de usar e a apostila pode ajudar caso eu esqueça de algo”; “Com os comandos que aprendi, posso com o tempo desenvolver meu aprendizado no programa por conta própria”;

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Realmente, como se percebe pelos próprios registros, o ACD ChemSketch é um software de fácil execução, exigindo apenas conhecimentos básicos para que se possa avançar em seu uso. O material de apoio fornecido também continha um resumo das principais noções do programa, o que certamente facilita o uso posterior. Colaborando com esses fatores, a participação intensa de todos durante o curso proporcionou a discussão ampla das funções básicas, muitas vezes em pequenos grupos, visto o número relativamente reduzido de participantes e a presença de dois monitores. Outrossim, a própria disposição dos computadores no LDI viabilizou que os próprios participantes se ajudassem. Quando interrogados sobre a possível introdução deste software em aulas de Química Orgânica, seis participantes manifestaram uma posição contrária. A justificativa de todos foi baseada no conteúdo programático dessas disciplinas, que é geralmente extenso. Além disso, alegaram que o interesse em utilizar o programa é intrínseco a cada um, mas, como atividade extracurricular, o curso deve ser oferecido mais vezes. “Não, pois o cronograma é muito pesado, mas o curso paralelo deve ser ministrado mais vezes”; “Já tem muita matéria e deve ser interesse de cada aluno”; “O programa é útil para tal disciplina, porém a grade curricular já é extensa e, portanto, nas condições atuais, o curso sendo extracurricular é suficiente”. Embora se concorde com a justificativa dos estudantes, utilizar o ChemSketch não impli­


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ca, necessariamente, em aumentar a grade curricular. Seu uso, nesse caso, deve estar atrelado aos objetivos educacionais, os quais podem ser o ensino e aprendizagem de conceitos ou o manuseio do programa. Por outro lado, onze participantes acenaram positivamente para a introdução desta ferramenta em aulas de Química Orgânica, sob o argumento de facilitar a visualização de moléculas, auxiliar o aprendizado e a vida acadêmica, além do caráter dinâmico e interativo que as aulas assumiriam. “Acredito que sim, é muito mais fácil a visualização das moléculas no programa do que nos slides dos professores”; “Eu acho que as aulas poderiam ficar mais dinâmicas e não tão teóricas”; “Para que outros alunos possam desfrutar do programa e aprender com ele para a vida acadêmica”; “Ajuda a compreender melhor o conteúdo em sala”; “Acredito que ajudaria em muito, principalmente para usar em trabalhos, painéis, relatórios...”. Um dos participantes não assinalou nenhuma das opções. Tais opiniões demonstraram a flexibili­ dade do software e sua adequação á necessidade do aluno. Deste modo, este é mais um fator que contribuiu para a motivação dos participantes durante o curso, contribuindo igualmente na avaliação que fizeram e na satisfação que tiveram após o curso. Ademais, a satisfação em relação ao curso e ao programa pode ser um fator que leve os participantes a se aprofundarem e conhecerem mais sobre o software. Como recurso didático, o uso do ChemSketch em sala de aula indubitavelmente desdobra-se em outros fatores, como o conhecimento e o domínio desse software pelos professores, fato não muito comum, além do domínio, em âmbito pedagógico, do uso de recursos tecnológicos no processo de ensino e aprendizagem, aspecto ainda mais incomum em institutos e departamentos de Química. Waddick[16] salienta a necessidade do acesso de professores

a suportes teóricos e técnicos para viabilizar o uso de novas tecnologias na Educação. A relação aluno-computador-aprendizagem é governada por aspectos técnicos computacionais, pedagógicos e psicológicos, cuja mediação deve ser dada pelo professor. Essa relação deve contemplar atividades que abarquem além dos aspectos técnicos, a pertinência ao currículo, a acessibilidade de alunos e professores às ferramentas computacionais, e, finalmente questões concernentes à aprendizagem. Em nada, ou muito pouco, as aulas se modificariam caso os professores trocassem somente o ambiente de projeção de seus slides, saindo dos painéis dos auditórios e salas para as telas dos computadores dos Laboratórios de Informática. Em outras palavras, a utilização de computadores em salas de aula necessita, além de seu uso de forma adequada, da integração com os objetivos educacionais, previamente estabelecidos e devidamente delineados. A tecnologia deve se enquadrar à Educação, visto que ela não constitui um fim em si, nem tampouco funciona automaticamente como promotora da aprendizagem (Eichler; Del Pino, 2000). Trata-se de um meio para proporcionar uma melhor aprendizagem. Para tanto, Eichler e Del Pino (2000) subli­ nham que a escolha de um software educacional, por exemplo, leve em conta as intenções e as características do professor, a possibilidade de desencadear vários tipos de aprendizagem, o apro­ veitamento das potencialidades do computador como a interatividade e o controle do usuário sobre a aprendizagem. A integração dessas questões pode contribuir para um uso mais adequado da informática na Educação de maneira geral.

Considerações finais Diante dos resultados apresentados, pode-se argumentar que o curso obteve boa receptividade dos participantes, o que justifica seu desenvolvimento e oferecimento aos alunos de graduação em Química. Como foi percebido pelas impressões pessoais dos

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participantes, corroborado pela observação de campo realizada durante o desenvolvimento do curso, todos demonstraram entusiasmo pelas atividades solicitadas. Isso pode ser atribuído tanto aos parti­ cipantes, que demonstraram bastante empenho, quanto à atuação dos monitores, os quais estiveram sempre atentos e atenderam às solicitações, o que engendrou uma relação de confiança e satisfação por parte de ambos os lados, fato manifestado nos questionários respondidos. Ademais, o ACD Chemsketch e os softwares de edição de estrutura, de forma geral, são importantes ferramentas aos profissionais da Química, pois auxiliam diversas atividades, seja de cunho acadêmico, na indústria ou em aulas. Aliás, essa última aplicação pode ser mais bem explorada por professores de Química, sobretudo em tópicos cingidos pela Química Orgânica, em razão das potencialidades anteriormente assinaladas. Embora possa ter mais vantagem para as aulas de Química Orgânica, o uso do ChemSketch em sala de aula também pode ser útil no estudo de Química Inorgânica, especialmente na abordagem estrutural dos compostos de coordenação, facilitando o entendimento da geometria e isomeria desses com­postos. A disponibilidade de forma gratuita e a facilidade de uso do programa são aspectos vanta­ josos no tocante ao ChemSketch em específico.

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REFERÊNCIAS BARD, A. J.; KING, D. M. J. Chem. Educ., v. 42, 1965. BEHAR, P. A. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil, 1993. CARPI, A. J. Chem. Educ., v. 78, 2001. CASANOVA JR., J.; WEAVER, E. R. J. Chem. Educ., v. 42, 1965. BOSCHMANN, E. J. Chem. Educ., v. 80, 2003. EICHLER, M.; DEL PINO, J. C. Química Nova na Escola, v. 9, 1999. EICHLER, M.; DEL PINO, J. C. Quim. Nova, v. 23, 2000. ESQUEMBRE, F. Comput. Phys. Commun., v. 147, 2002. FRANCISCO JUNIOR, W. E. et al. Rev. Ciên. Ext., 1 (suplemento), 2004. MUROV, S. J. Chem. Educ., v. 78, 2001. NASCIMENTO, F. B. et al. Atas do V Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências, Bauru: Brasil, 2005. RIBEIRO, A. A.; GRECA, I. M. Quim. Nova, v. 26, 2003. WHITNELL, R. M. et al. J. Chem. Educ., v. 71, 1994. RIBEIRO, A. C. C.; NASCIMENTO, F. B.; QUEIROZ, S. L. Atas do V Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências, Bauru, Brasil, 2005. SANTOS, A. R.; FIRME, C. L.; BARROS, J. C. Quim. Nova, v. 31, 2008. STEFANI, R.; NASCIMENTO, P. G. B. D.; COSTA, F. B. Quim. Nova, v. 30, 2007. WADDICK, J. Educ. Train. Tech. Int. v. 31, 1994.


Instrumentos e Criatividade 01 | Volume 04 | Número 01 | Jan./Jun. 2009 | p. 65-70

Produção de um Agitador Mecânico Alternativo para o Ensino de Química Production of an Alternative Mechanic Shaker for Chemistry Teaching Carlos Alberto Fernandes de Oliveira, Evandro Ferreira da Silva, Inakã Silva Barreto, Jacqueline Cristina Bueno Janice de Jesus, João Batista Moura de Resende Filho, João Jarllys Nóbrega de Souza, Liliane Rodrigues de Andrade, Umberto Gomes da Silva Júnior e Yasmine Ísis Fernandes do Nascimento Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Paraíba E-mail: umbertojunior@yahoo.com.br

Introdução As aulas práticas de Química no Ensino Médio são de suma importância, visto que a referida ciência é, basicamente, experimental. Todavia, deve-se ter em mente que, só pelo fato de ser experimental, ela não deve estar intrinsecamente ligada a um laboratório constituído de equipamentos de elevada precisão, obtendo como conclusão errônea o seguinte pensamento: “se não há laboratório, não há aulas práticas e/ou experimentais!”. A carência de aulas práticas no ensino de Química difi culta o processo de ensino-aprendizagem, visto que são excelentes fontes motivadoras para a efetivação da aprendizagem. Em última instância, a produção de equipamentos alternativos surge como um caminho de contorno para que tais atividades possam ser fi nalmente difundidas durante as preleções. Sob essa perspectiva, o presente projeto objetivou montar um agitador mecânico a partir de materiais alternativos, que propiciasse aulas práticas de Química no Ensino Médio, incentivando os professores (e também os alunos) das instituições

de ensino que não possuem laboratórios de Ciências a desenvolverem experimentos com equipamentos construídos com materiais secundários e, por conseguinte, montarem um laboratório alternativo.

Pressupostos teóricos O presente estudo tem como respaldo teórico, as concepções educacionais sobre o conceito de aprendizagem e motivação, tendo como instrumento norteador a disseminação de aulas práticas no ensino de Química, pela produção de equipamentos de laboratório a partir de materiais convenientes e acessíveis.

Visão geral sobre o ensino de Química Segundo Gil, a aprendizagem é defi nida como um método sistemático de cognição, desenvolvimento de capacidades e transformação de comportamentos em decorrência de experiências educativas, como, por exemplo, aulas pragmáticas e teóricas, leituras, contendas, pesquisas e outras. 1


Carlos Alberto Fernandes de Oliveira et al.

No decorrer do processo de ensino-apren­ dizagem, os agentes do conhecimento e do processo envolvidos sofrem a influência de vários fatores. Dentre esses fatores, podemos citar o tipo de metodologia, a motivação, o ambiente social (Gil, 2006). Em meio a esses vários fatores que dificultam o processo de ensino-aprendizagem, destacamos a metodologia utilizada durante as preleções que, raramente, atende às necessidades do corpo discente. As metodologias de ensino utilizadas pelos professores nas instituições de ensino, sejam elas públicas ou privadas, encontram-se fundamentadas, geralmente, nas chamadas ‘aulas expositivas’. Conforme Brown (apud Godoy, 2003), uma exposição consiste numa pessoa que fala para muitas sobre um tópico ou tema. A fala pode ser complementada pelo uso de recursos audiovisuais e por perguntas ocasionais.

Por conseguinte, pode-se inferenciar que, em alguns casos, as aulas expositivas não assistem às vicissitudes do seu público-alvo, sendo necessário uma modificação da epistemologia metodológica adotada. A ausência de aulas práticas no ensino de Química (e de Ciências, em geral) indica para um quadro desanimador, apesar das perspectivas propostas pela LDB (Lei de Diretrizes e Bases Nacional), e torna, por conseguinte, o sistema de ensino-aprendizagem vigente empobrecido.

Aulas práticas como instrumento motivador Observamos também que a maioria dos alunos do Ensino Médio não possui afinidade com a disciplina Química, acham-na difícil demais ou desinteressante, ignorando completamente a importância da disciplina, desvinculando-a de suas atividades habituais. Será que o que está faltando são bons professores ou motivação para aprender? E para ensinar, também falta motivação por parte do professor? Assim, entendemos que o método adotado no ensino­ ‑aprendizagem de Química necessita ser repensado

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e reformulado e, para tanto, são imprescindíveis a realização de atividades práticas como instrumentos motivadores tanto para professores quanto alunos. A Química é, antes de mais nada, uma ciência experimental, portanto, sua vinculação com experimentos é de suma importância para uma melhor compreensão por parte dos alunos. A própria natureza das Ciências (Física, Química, Matemática etc.) revela o valor consubstancial da realização de atividades experimentais com a participação ativa dos alunos. Como já foi discutido anteriormente, é de consenso genérico que o ensino tradicional está baseado em aulas meramente expositivas, descartando ou fazendo pouco uso de experimentos que auxiliem na efetivação da aprendizagem. A simples memorização de fórmulas, simbologias, equações, propriedades, sem refletir sobre sua importância e sem relacioná-las com o cotidiano do aluno e apenas contribui para o desinteresse. A introdução de aulas práticas no ensino de Química, além de demonstrar a relação da disciplina com o cotidiano, funciona como instrumento motivador que auxilia no decurso da concretização da aprendizagem. É de conhecimento de todos que o exercício de tais atividades reforça o significado do conteúdo teórico que os alunos estudam, cons­ truindo pontes de compreensão que interligam a prática à teoria. A partir do momento em que o aluno par­ ticipa de uma aula prática e/ou experimental, ocorre o despertar de sua curiosidade na busca pela compreensão dos fenômenos presenciados. Por consequência, ele fica motivado a saciar sua curiosidade a respeito destes acontecimentos, ou seja, a estudar e a aprender.

Produção de equipamentos alternativos A realização de experimentos nas aulas sempre foi tida como inviável em instituições de ensino com poucos recursos pois se acredita requerer um investimento elevado (Alves, 2008).


Produção de um Agitador Mecânico Alternativo para o Ensino de Química

Porém, tal afi rmação só é válida para a realização de atividades empíricas que requerem rigor científi co, ou seja, para experiências que tenham um fi m divergente do educacional e necessitem de um aparato de equipamentos e métodos sofi sticados. Didaticamente, as aulas práticas no ensino de Química visam à elucidação fenomenológica dos assuntos teóricos trabalhados em salas de aula, e os métodos alternativos também se apresentam de modo a aumentar a interação entre os alunos e o conhecimento em questão. O desenvolvimento de um Laboratório com Materiais Alternativos (LMA) consiste na execução de aulas experimentais na disciplina Química, com experimentos que exijam o mínimo possível de aparelhos sofi sticados e reagentes analíticos presentes em um laboratório de Ciências, tendo em vista que os experimentos possuem apenas uma fi nalidade didático-pedagógica. Para tanto, pode-se recorrer à reciclagem de materiais para a confecção de equipamentos alternativos de laboratório, como também à utilização de objetos (copos de geleia, funil, fi ltro de papel etc.) e substâncias/ misturas “caseiras”, ou seja, compostos químicos comumente encontrados no dia a dia do aluno como, por exemplo, vinagre, sal de cozinha, frutas, água sanitária etc. O LMA contempla alguns anseios propostos nos Parâmetros Curriculares Nacionais, tais como a incitação da curiosidade dos estudantes com os experimentos (e, consequentemente, pelos assuntos abordados), fazendo com que eles fi quem motivados a compreender os processos envolvidos durante o respectivo experimento. Outro ponto que o LMA contempla é a possibilidade da abordagem de um dos temas transversais: o meio ambiente. Além da aplicação de aulas práticas, o Laboratório com Materiais Alternativos pode se tornar um elemento de mediação importantíssimo na questão ambiental, em que, inicialmente, os alunos são orientados e conscientizados da realidade, abordando e trabalhando, especialmente, problemas com o lixo, com base na fi losofi a dos “três erres”: redução, reutilização e reciclagem.

Procedimentos metodológicos Os procedimentos metodológicos aqui relatados são referentes à produção de um equi pamento de laboratório alternativo e à sua aplicação e utilização no ensino de Química.

Materiais Os materiais utilizados para a produção de um agitador mecânico alternativo são: • folha de compensado de 10 mm (25 cm × 15 cm); • folha de compensado de 15mm (área: 9 cm2); • suporte de madeira (34 cm de altura); • dois coolers de computador; • haste metálica (com características inoxidáveis, preferencialmente); • carregador de celular (9 volts); • interruptor; • parafuso sem cabeça e presilha; • copo de vidro de 250 mL; • pregos; • furadeira e martelo; • resina epóxi.

Procedimentos para a montagem do aparelho Inicialmente, foi recortada uma folha de compensado de 10 mm de espessura, em uma marcenaria, com as referidas medidas (25 cm ×15 cm). No mesmo local, foi recortada a folha de compensado de 15mm, obtendo uma área de aproximadamente 9 cm2. A necessidade de se utilizar a folha de compensado de 15mm deve-se ao fato de que esta espessura apresenta um bom acoplamento ao cooler de computador utilizado. As determinadas medidas das demais peças de compensado estão correlacionadas a questões técnicas e estéticas do agitador mecânico alternativo. À base do agitador foi fi xado o suporte de madeira com o auxílio de prego e martelo. O suporte foi serrado verticalmente até uma elevação REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 04 | Número 01

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conveniente à agitação, tendo em vista a altura do recipiente que será usado. Com o auxílio de uma furadeira, foram feitas quatro aberturas com a fi nalidade de conceder variados níveis (alturas) para o deslocamento da folha de compensado de 15mm, a fi m de propiciar a utilização de diversos recipientes de alturas variadas. À folha de compensado de 15mm, foi acoplado ao cooler de computador e, no lado oposto, inserido um parafuso sem cabeça. Este, por sua vez, se encaixa perfeitamente em cada uma das quatro aberturas do suporte de madeira. A alternância da elevação é feita com a assistência de uma presilha, responsável pela fi xação do parafuso ao respectivo suporte. Ao cooler de computador, foi incorporada uma haste metálica, feita com uma chave de fenda quebrada, utilizando-se resina epóxi. É preferível que a haste metálica seja inoxidável para que o equipamento possa ser utilizado em um número mais diversifi cado de soluções e misturas químicas, e também para aumentar a vida útil do equipamento. Durante a aplicação da resina epóxi, deve-se ter o cuidado para que a haste metálica fi que posicionada ortogonalmente à superfície do cooler. Deve-se também deixar a massa epóxi em repouso, a fi m de se garantir boa fi xação. No fi nal da haste metálica, foi colada, com resina epóxi, a ventoinha do segundo cooler, com função de hélice como em um agitador mecânico comercial. Foram feitos testes de reatividade do material constituinte da hélice em vários solventes, verifi cando-se que o sistema não deverá ser utilizado para agitação de reações que usem bases fortes e soluções com viscosidade elevada. Finalmente, conecta-se os fi os do cooler de computador aos fi os de uma fonte de 9V (carregador de celular). Para maior comodidade, pode-se anexar um interruptor, para a função ligadesliga do equipamento.

agitação. Como proposta para a sua aplicação, indicamos a produção de sabão ecológico a partir de materiais domésticos.

Proposta de aplicação para o equipamento

O agitador mecânico foi apresentado para uma turma do último ano do Ensino Médio durante uma aula de introdução ao laboratório de Química. No decorrer da aula, o equipamento foi utilizado para

O agitador mecânico (Figura 1) pode ser utilizado em atividades experimentais que envolvam

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Figura 1. Agitador mecânico alternativo.

Esse experimento exemplifi ca/contextualiza as reações de saponifi cação além de procurar despertar a conscientização ambiental nos estudantes, pois a produção do sabão ecológico usa óleo advindo de frituras, que seria possivelmente descartado de modo incorreto no meio ambiente, trabalhando, assim, o conceito de reuso e reciclagem. Para a execução desse experimento é necessário fazer a adição da soda cáustica (hidróxido de sódio) ao óleo de cozinha, evitando o contato direto da hélice com o hidróxido de sódio. Lembramos que o material da hélice do agitador mecânico reage com solução de hidróxidos fortes após certo tempo de contato.

Resultados e discussões


Produção de um Agitador Mecânico Alternativo para o Ensino de Química

a produção de sabão ecológico, que é apenas uma das alternativas para a aplicação desse instrumento no Ensino Médio. Na aula experimental mostramos como é possível reutilizar materiais, desde as sucatas, utilizadas para a confecção do equipamento, até o óleo de cozinha que seria descartado na pia, causando danos ao meio ambiente. Após a aula de introdução ao laboratório de Química, os estudantes responderam um questionário sobre a produção de equipamentos para laboratório de Química com materiais alternativos, com destaque para o Agitador Mecânico, e com enfoque ambiental. A análise desses questionários nos permitiu perceber que 85% dos alunos indicaram que a aula contribuiu para a conscientização ambiental no que tange ao descarte de materiais, bem como o reaproveitamento destes. Além disso, cerca de 50% dos alunos se sentiram motivados a construir algum equipamento (de laboratório ou não) a partir de materiais encontrados no “lixo”. Com a análise desse questionário verifi camos que a maioria dos estudantes fi cou interessada pelo desenvolvimento e trabalho de equipamentos baseados na fi losofi a do Laboratório com Materiais Alternativos. A utilização do agitador mecânico durante a aula de Química para a respectiva turma do Ensino Médio proporcionou um caminho para que os alunos se sentissem motivados a aprender a disciplina de Química, assim como trabalhar conceitos relacionados à problemática social.

Considerações fi nais O intuito maior da iniciativa foi apresentar a inserção de aulas práticas no ensino de Química em instituições de ensino com poucos recursos e que não oferecem infraestrutura adequada para o funcionamento de um laboratório de Ciências. Experimentos que podem ser feitos com o auxílio de equipamentos de laboratório alternativos, são facilmente fabricados e, por conseguinte, utilizados nos mais variados ambientes.

O agitador mecânico alternativo apresentou excelente funcionamento, podendo ser aplicado durante as aulas, permitindo a muitas instituições de ensino a realização de experiências. A junção do laboratório alternativo com as aulas teóricas de Química proporciona, certamente, uma maior compreensão dos conhecimentos abordados em sala de aula e, consequentemente, uma aprendizagem mais signifi cativa. Segundo Piaget (apud Gioppo et al., 1998), [...] a incrível falha das escolas tradicionais, até estes últimos anos inclusive, consiste em haver negligenciado quase que sistematicamente a formação dos alunos no tocante à experimentação.

Assim como afi rma o renomado epistemólogo, retomamos nesse trabalho, a importância da realização de experimentos durante as aulas.

REFERêNCIAS ALVES, L. Laboratório alternativo. Brasil Escola – Canal do Educador. Disponível em: <http://educador.brasilescola. com/estrategias-ensino/laboratorio-alternativo.htm>. Acesso em: jul. 2008. BRASIL. Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília: MEC, SEMTEC, 1999. BRASIL. Secretaria de Educação Média e Tecnológica. Parâmetros Curriculares Nacionais. PCN+ Ensino Médio. Brasília: MEC, SEMTEC, 2002. GIL, A. C. Como utilizar estratégias para facilitar a aprendizagem. In: Didática do Ensino Superior. São Paulo: Atlas, 2006, p. 79-93. GIOPPO, C.; SCHEFFER, E. W. O.; NEVES, M. C. D. O ensino experimental na escola fundamental: uma refl exão de caso no Paraná. Educar em Revista, Curitiba (PR), v. 14, n. 3, p. 39-57, 1998 GODOY, A. S. Revendo a aula expositiva. In: MOREIRA, D. A. (org.). Didática do Ensino Superior: técnicas e tendências. São Paulo: Pioneira Thomson Learing, 2003, p. 75-82.

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História da Química 01 | Volume 04 | Número 01 | Jan./Jun. 2009 | p. 71-72

Você Conhece o Erlenmeyer? RFF

Se, com relação à pergunta colocada no título, você respondeu: “Mas é claro!”, provavelmente você está se referindo ao conhecido frasco de laboratório:

Erlenmeyer

Contudo, você sabia que o nome dado ao frasco, Erlenmeyer, é o sobrenome do alemão Richard August Carl Emil Erlenmeyer (1825-1909), o químico que o inventou? Assim como Bunsen, que se tornou mais conhecido pelo queimador que leva seu nome, Erlenmeyer teve seu nome diariamente repetido em laboratórios pelo mundo afora, em razão do frasco que inventou. Como muitos outros químicos de destaque do séculos XVIII e XIX, Erlenmeyer teve uma formação inicial em Medicina, tendo atuado durante alguns anos como farmacêutico. Entretanto, assim como Bunsen, Erlenmeyer não restringiu sua contribuição para a química à criação de um utensílio de laboratório. Dentre suas contribuições está a chamada regra de Erlenmeyer (formulada em 1880): “todos os álcoois nos quais o grupo hidroxila está diretamente ligado a um carbono de dupla ligação, torna-se um aldeído ou cetona”. Erlenmeyer deu significativas contribuições à química orgânica, dentre elas a síntese do ácido isobutírico. Tendo sido um dos primeiros a empregar a teoria da valência, foi ainda Erlenmeyer quem propôs a atual fórmula para o naftaleno. Tendo vida relativamente longa, Erlenmeyer inventou o frasco que celebrizou seu nome em 1861, aos 36 anos. Richard August Carl Emil Erlenmeyer



Memória Fotográfica OS PIONEIROS DA QUÍMICA DE PRODUTOS NATURAIS

Cortesia do NPPN-uFRJ

A foto foi tirada em Juazeiro na Bahia, ao lado de um avião que deveria levar os cientistas para uma excursão para coleta de espécies vegetais aromáticas e alcaloídicas. O voo acabou não acontecendo e os pesquisadores seguiram de jipe. Excursões deste tipo eram fi nanciadas pela APPA (Associação dos Produtores de Produtos Aromáticos), da qual o Prof. Taveira era representante, enquanto chefe do setor de Produtos Naturais da Embrapa. Esta viagem aconteceu menos de um mês da chegada ao Brasil do Prof. Gilbert, quando foi sugerido participar de um evento na Bahia pela Profa. Eloísa Mano. Nesta excursão, ele coletou duas espécies de Apocynaceae, orientado por registros de um grupo de pesquisadores belgas, que lá haviam excursionado em 1917. Eles descreveram estas espécies ocorrendo na margem da estrada de ferro Salvador-Juazeiro – e lá foram efetivamente encontradas pelos cientistas da foto.

Da esquerda para à direita: Benjamin Gilbert; Walter Baptist Mors; Benjamin Gilbert; Piloto do avião; Otto Richard Gottlieb; Mauro Taveira Magalhães.


No início da década de cinquenta, o Dr. Carl Djerassi, que pouco antes havia obtido o seu grau de Ph.D. na Universidade de Wisconsin, nos Estados Unidos, trabalhava na Companhia SYNYRX S.A., no México. A síntese da cortisona a partir de matéria-prima vegetal, desenvolvida nessa empresa sob sua direção, projetou-o enormemente no cenário da química internacional. Apesar da sua pouca idade, o Dr. Djerassi foi contratado pela Wayne State University, na qualidade de Professor Assistente. Esse professor, que se tornou um dos químicos mais importantes de nossa época, veio a ser um grande incentivador da moderna química de produtos naturais no Brasil. Em visita ao Rio de Janeiro em 1954, o prof. Djerassi conheceu o Dr. Walter Mors, então químico do instituto de Química Agrícola (IQA) do Ministério da Agricultura, convidando-o a realizar um estágio nos Estados Unidos visando o seu aperfeiçoamento nas técnicas analíticas e de isolamento e purificação de produtos naturais desenvolvidas e em uso em seu laboratório. No I.Q.A., já existia, então, um pequeno grupo de químicos que se dedicava ao estudo os produtos naturais. Após o regresso do Dr. Mors, e contando com o apoio do professor Djerassi, o grupo original cresceu e se desenvolveu. Deste grupo saiu a semente do que seria, poucos anos depois, o Centro (hoje Núcleo) de Pesquisas de Produtos Naturais, o CPPN. Em 1962, no bojo de uma reforma do Ministério da Agricultura, o instituto de Química Agrícola foi extinto, por razões até hoje não compreendidas. Inconformados, vários dos seus pesquisadores procuraram firmar-se em outras instituições. Alguns deles atenderam a um chamado do Dr. Paulo da Silva Lacaz, Professor Catedrático de Química Orgânica e de Bioquímica das Faculdades de Medicina e de Farmácia da então Universidade do Brasil. Foi por sua iniciativa que se iniciaram as gestões para a criação do CPPN, que se deu em setembro de 1963 por um ato da Congregação da Faculdade de Farmácia. O novo Centro contou em sua formação, além do prod. Lacaz, com os Drs. Walter Mors, Joaquim Martins Ferreira Filho, Benjamin Gilbert, Bernard Tursch e Keith S. Brown Jr., mantidos inicialmente com bolsa de agências de apoio a pesquisa norte-americanas, por indicação do Dr. Djerassi. Incorporam-se também ao grupo o Prof. Affonso do Prado Seabra, da Faculdade de Farmácia, recémchegado de um estágio na Inglaterra e, pouco depois, os Drs. Hugo J. Monteiro e Paul M. Baker. Até o início dos anos setenta, este grupo teve suas pesquisas financiadas por um convênio com a Universidade de Stanford, para onde o Prof. Djerassi se tinha transferido em 1959. Esse convênio possibilitou o acesso à espectrometria de massas e à espectrometria de ressonância magnética nuclear na referida universidade, técnicas analíticas não disponíveis no Brasil naquela época. Essas facilidades permitiram ao grupo o desenvolvimento de trabalhos pioneiros em nosso país. No primeiro período de sua existência (1963-1972), o CPPN ocupou parte das dependências da Faculdade e Farmácia no campus da Praia Vermelha: não somente as pertencentes à cadeira de Bioquímica, mas também laboratórios e salas de aula do Departamento de Farmacognosia, cedidos com grande espírito de colaboração pelo seu chefe, o Prof. Jaime Pecegueiro Gomes da Cruz. Os trabalhos desenvolvidos compreenderam o estudo fitoquímico e avaliação biológica de plantas brasileiras. Em particular, o estudo do gênero Aspidosperma conduziu ao isolamento e identificação estrutural de numerosos novos alcaloides. Esses resultados representaram um marco para a Fitoquímica brasileira, tendo sido publicados em revistas nacionais e internacionais, incluindo três revisões na obra de R.H.F. Manske, “The Alkaloids”, coleção de referência para quem estuda este importante grupo de produtos naturais. Foram lançadas também nesse período as bases para o desenvolvimento de trabalhos de natureza interdisciplinar, através do estudo fitoquímico associado à avaliação biológica de diversos produtos naturais e extratos de plantas brasileiras, estudos esses desenvolvidos em cooperação com os Drs. José Pellegrino, da Faculdade de Medicina da UFMG, Lauro Sollero, Nuno Álvares Pereira e Enio Garcia Gouiart, e outros professores dos departamentos de Parasitologia, Microbiologia e Farmacologia da UFRJ. Em 1969 o CPPN foi credenciado pelo CNPQ como Centro de Excelência. Naquele ano foi criado o mestrado em Química de Produtos Naturais, o primeiro curso de pós-graduação em Química de Produtos Naturais do Brasil. No período seguinte (1972-1976), o CPPN mudou-se para o campus da Ilha do Fundão, ocupando o espaço físico no andar térreo e subsolo do bloco H do Centro de Ciências da Saúde. Com a vinda para o campus da Ilha do Fundão e a consequente expansão do espaço físico, a multidisciplinaridade das linhas de pesquisa foi acentuada pela criação de um laboratório de Biologia e um laboratório de Síntese e Transformações de Produtos Naturais. Estas diretrizes colocaram a Instituição em consonância com as tendências observadas nos melhores grupos de produtos naturais da Europa e EUA. Em 1976, o CPPN atingiu o status de Órgão Suplementar do Centro de Ciências da Saúde da UFRJ ao se transformar no Núcleo de Pesquisas de Produtos Naturais (NPPN), e em março de 1990 foi implantado o programa de doutoramento no Núcleo.


Resenhas

OLIVEIRA, A. F. de. Equilíbrio em solução aquosa orientados à aplicação: sistemas ácido-base de bronsted e outros equilíbrios. Campinas: Átomo, 2009. O equilíbrio químico, principalmente em solução aquosa, é fenômeno presente em inúmeros sistemas químicos, sendo de grande interesse das áreas da química analítica, química ambiental, química farmacêutica, tecnológica etc. O livro foi elaborado para atender a estudantes no processo de ensino-aprendizagem do seu conteúdo. Pode, também, ser considerado um bom guia prático – para profi ssionais de várias áreas da Química – na busca por soluções de problemas reais.

CAMPOS, M. L. A. M. Introdução à biogeoquímica de ambientes aquáticos. Campinas: Átomo, 2010. Este livro se destina a profi ssionais e alunos de graduação das mais diversas áreas das ciências em que a formação ambiental se faz presente, como a Química, Biologia, Oceanografi a, Geologia, Engenharia Ambiental, dentre outras. O fi o condutor desta obra são as trocas de matéria e energia entre os compartimentos da Terra, de forma a proporcionar ao estudante uma visão inter-disciplinar dos processos que ocorrem no meio ambiente. Os ambientes aquáticos são tratados como ponto de partida para abordar a interação entre os compartimentos Hidrosfera, Atmosfera, Geosfera e Biosfera, enquanto que os conteúdos específi cos são tratados de forma que possam ser compreendidos e utilizados por públicos de diferentes formações. A estrutura do livro parte do estudo da dinâmica dos oceanos, contextualizada no cenário das mudanças climáticas, e fl ui para estuários, rios e lagos. Nos capítulos fi nais, a temática da qualidade das águas e as propostas de experimentos consagrados na área de química ambiental, visam subsidiar os cursos que optam por utilizar metodologias baseadas em estudos de caso.

REVISTA BRASILEIRA DE ENSINO DE química | Volume 04 | Número 01

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