Monografia Furmann Assessoria

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existe pronta em alguma legislação. O vazio da proposta de ‘assistência intelectual’ se encontra no conceito de cidadania, o qual se resume a um amontoado de direitos. Se assim se considerar, educar não conferirá cidadania a ninguém, mas somente a aperfeiçoará e a tornará consciente. Cidadania não seria uma conduta desejável, porém apenas um conjunto de direitos concedidos.227 A ‘assistência intelectual’ figura-se como uma das expressões do assistencialismo. Alguns (pre)conceitos sobre a atividade de extensão universitária levam à referida metodologia. O primeiro se relaciona com a perspectiva de superioridade do conhecimento universitário. Esse leva à invasão cultural e à supressão do diálogo. “O diálogo verdadeiro só é possível entre iguais ou entre pessoas que desejam igualar-se”228. Logo, para a assistência o conhecimento universitário, por ser superior, deve ser levado à comunidade como dádiva que solverá seus problemas. A experiência histórica do sujeito comunitário de nada vale. Outro (pre)conceito se relaciona com a idéia de vanguarda da universidade. Essa, intitulando-se centro de excelência e crítica, pretende conferir a todos um conhecimento crítico e puro (mito da neutralidade do conhecimento científico)229. A crítica reflexiva, entretanto, nem sempre está presente na Universidade. Por fim, relacionando-se em especial com as universidades públicas, a perspectiva de retribuir a gratuidade do ensino leva a universidade a oferecer um ‘serviço’ a sociedade. Na perspectiva de ‘serviço’ se oferece o conhecimento universitário na forma de ‘mercadoria’, mesmo que gratuita.230 O assistencialismo é criticado em diversos aspectos pelo prof. Paulo Freire: Opúnhamo-nos a estas soluções assistencialistas, (...) Em primeiro lugar, contradiziam a vocação natural da pessoa – a de ser sujeito e não objeto, e o assistencialismo faz de quem recebe a assistência um objeto passivo, sem possibilidade de participar do processo de sua própria recuperação. Em segundo lugar, contradiziam o processo de ‘democratização fundamental’ em que estávamos situados. (...) O grande perigo do assistencialismo está na violência do seu antidiálogo que, impondo ao homem o mutismo e passividade, não lhe oferece condições especiais para desenvolvimento ou a ‘abertura’ de sua consciência que, nas democracias autênticas, há de ser cada vez mais crítica. (...) O assistencialismo (...) é uma forma de ação que rouba ao homem as condições à 227

“(...) desconhecer, por exemplo, que temos direito à saúde, não significa deixar de ter (ou perder) o reconhecimento formal desse direito. Ocorre que a ignorância pode nos impedir de exercitar esse direito ou de reclamar por seu cumprimento. Por isso, a educação entendida como o mecanismo de difusão dos direitos existentes, não forma ou concede a cidadania, embora a faça mais consciente.” ALENCAR, Chico; GENTILI, Pablo. Educar na esperança em tempos de desencanto. Petrópolis: Editora Vozes, 2001, p.72. 228 BORDENAVE, Juan E. Díaz. O que é participação. São Paulo: Editora Brasiliense, 1983, p. 51. 229 Sobre o tema Vide: LÖWY, Michel. As aventuras de Karl Marx contra o Barão de Münchhausen. Marxismo e positivismo na sociologia do conhecimento. 6ª ed.. São Paulo: Cortez, 1998. 230 Vide: MALISKA, Marcos Augusto. O Direito à Educação e a Constituição, p. 282.


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