TEATRO DO PARQUE, RECIFE, PE., BRAZIL

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Silvia Bessa


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Prefeito Geraldo Julio de Mello Filho Vice-prefeito Luciano Roberto Rosas de Siqueira Secretário-chefe de Gabinete de Projetos Especiais Otávio Calumby Fernandes Secretária de Cultura Leda Alves Presidente da Fundação de Cultura Diego Rocha Gerente Geral do Projeto Simone Osias Diretora de Engenharia do Gab. de Projetos Especiais Maria Carolina Azevedo A ficha completa de projetistas encontra-se na página 136.

Publicado pela Prefeitura do Recife Partes deste livro podem ser reproduzidas, desde que sejam citadas a fonte e autoria. Autora Silvia Bessa Direção de arte e capa Simone Freire Projeto gráfico e diagramação Amanda Torres Revisão Eugenio Jerônimo Revisão técnica Simone Arruda Foto de capa Daniela Nadler Impressão Gráfica e Editora Liceu Os créditos das fotos encontram-se na página 138.

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1929, uma de suas fases de auge. Porém considero que o projeto atingiu muito mais do que isso. O trabalho feito aqui teve a capacidade de recontar a história do Teatro do Parque, encontrando detalhes encobertos pelo tempo e, literalmente, centímetro a centímetro, abrindo as portas para o novo Teatro do Parque. E essa é uma história escrita a muitas mãos. Desde a obra, profissional-trabalhador, técnico de restauro que dedicou tanto empenho e cuidado com o Teatro do Parque, aos artistas, produtores e público que vão, a cada apresentação, a cada dia, dar vida ao novo Teatro do Parque.

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alar do projeto de restauro do Teatro do Parque é, para mim, falar de cuidado e atenção. Quando assumimos a Prefeitura do Recife, estávamos determinados a dar vida e devolver o “Parque” ao Recife. Era uma demanda da classe artística e da cena cultural, uma necessidade da população e um gesto de respeito com a nossa história e patrimônio. Porém um equipamento como o Teatro do Parque precisava de um projeto capaz de fazer jus a sua história, sem perder a capacidade de olhar para o futuro e manter a importância central que o Parque sempre teve na vida cultural do Recife.

Parabéns a todos! Viva o Parque!

Então, foi elaborado o atual projeto de restauro, baseado nas características do edifício em 11




te de filas quilométricas para vendas de ingressos, seu Joaquim se apressava para intervir: “Eduardo (o porteiro da época), ajeita os meninos aí. Todo mundo precisa trabalhar”. No dia seguinte, risos sobre a noite anterior enquanto esperavam as luzes do Parque reacenderem. No turno de seu Manoel, outro funcionário lendário, era igual. Seu Joaquim Argemiro nunca abusou da boa vontade alheia – garantem os amigos.

O olhar do cidadão comum e o novo teatro das pautas populares

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porteiro e chefe da bilheteria do Teatro do Parque estabeleceu uma praxe: o comerciante Joaquim Argemiro de Araújo é convidado ilustre. Sem formalidades e autorização por escrito, ele e a família têm acesso livre para estreias de artistas consagrados e repetecos de espetáculos populares de menor pompa. A equipe de produção aporta no Recife e não o conhece? Alguém da casa que cuide de mandar um ingresso para seu Joaquim. A prática teve validade por décadas. “Eu parava tudo e ia olhar como estava lá dentro”.

Se, nas calçadas da rua do Hospício, o epicentro cultural mais genuíno e agitado do Recife, houvesse discussão acalorada entre os cambistas dian-

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Artistas e público enchiam a Lanchonete Estrela, de propriedade de seu Joaquim Argemiro, localizada defronte ao Parque até hoje. Na rotina do comércio, era o encarregado a partir das 12h até a beira da madrugada. “Cansei de botar gente para fora da lanchonete às 23h de tão lotada”. Corta o bolo, frita a isca de carne do tira-gosto, abre o refrigerante para criança e a cerveja do adulto. A Lanchonete Estrela passou a ser termômetro do sucesso ou insucesso de público dos espetáculos e filmes do Teatro do Parque – quando estava cheio cá, era sinal de que estava lotado lá. Recife, 2020: seu Joaquim completa quase meio século de onipresença para o (e no) Teatro do Parque. É o olho da plateia. O encantamento do cidadão do Recife para este patrimônio da cidade. Com a vista voltada para o ângulo frontal ao número 81 da Rua do Hospício, endereço do Parque, “sem tirar férias”, seu Joaquim se fez consultor informal de ativistas pró-cultura; de funcionários públicos com alto grau de especialização em arquitetura e engenharia; de estudiosos do mercado cultural. De pas-


santes. “Cheguei quase menino aqui, vindo de São Paulo, e amadureci junto com o teatro”. Nas últimas duas décadas, seu Joaquim estreitou sua relação com o teatro. É agora vizinho, como um dos moradores do edifício Iêda (nº 111 da rua do Hospício). Foi convidado a participar de visitas aleatórias – e gostou – quando técnicos da Prefeitura do Recife iniciaram a jornada para realizar a recuperação do prédio do Parque, em meados de 2013. Custou a acreditar, até que vibrou diante da decisão da Prefeitura de ampliar recursos para a obra e realizar um inédito restauro, que começou a ser executado de maneira sistemática a partir de 2018. Nós o encontramos em uma manhã de outubro de 2020, sob a névoa da preocupação com os danos provocados pela pandemia do coronavírus. De bermuda e portando o tradicional chapéu xadrez à boemia, seu Joaquim foi convidado a outra inspeção informal no Parque. A cada passo, dentro da obra em momento de retoques, acenava com discrição, era cumprimentado pelos trabalhadores da construção. Sentou-se em um banco empoeirado, dando de ombros à tinta fresca das portas, admirou adornos agora reluzentes e a maestria dos detalhes espetaculares redescobertos pela equipe da reforma e restauro. Diante das grandes árvores do jardim do Parque, ensaiou um sorriso nostálgico, de canto de boca. Contemplou por alguns minutos a ambiência inebriante de 105 anos de existência do teatro e tentou esconder o choro com os fragmentos de cenas da infância dos filhos, da esposa (de quem ficou viúvo)

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e amigos. “Desculpe. É que vivi muitos momentos felizes aqui”. Dizia-se ansioso para ver concluída esta espécie de ode, composição poética para um monumento que é, por conquista própria, símbolo, representante cultural singular da capital pernambucana – com respeito aos demais. O antigo Teatro do Parque, parte do complexo de diversões criado pelo comendador Bento de Aguiar, foi inaugurado em 24 de agosto de 1915. O teatro que 14 anos depois mobilizou o empresário Luiz Severiano Ribeiro com seu ousado plano de trazer palácios cinematográficos e grandes produções de Hollywood, sendo ele o representante da Metro-Goldwyn-Mayer no Brasil. Que reverberou o talento do maestro Nelson Ferreira, do escritor Gilberto Freyre, do cantor Luiz Gonzaga e de centenas de celebridades, intelectuais e autoridades. Que se manteve lotado por décadas com plateia atenta para assistir a talentos da música, dança, dramaturgia, literatura e do cinema brasileiro e local.

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O Parque, que voltou a ser do município em 1959, quando desapropriado após pressão de artistas que clamavam por uma programação mais educativa e democrática. Este teatro, lembrado por eventos como o “Projeto Pixinguinha” nos anos 1970 e “Seis e Meia”, a partir de 1990, com shows de atrações nacionais e ingressos a preço do mais barato dos lanches na lanchonete do seu Joaquim. O mesmo espaço que foi lugar de matinês em festas escolares e de formaturas, lastro cultural de sucessivas gerações, responsável pela iniciação artística de crianças, acaba de ser refundado. E reinaugurado. Dez anos depois de ser fechado com gravíssimos problemas de infiltrações, drenagem e comprometimento de estrutura física.

“O Teatro do Parque renasceu”, comemora seu Joaquim, com as obras de restauro e reforma concluídas e com a autoridade que lhe conferem os 42 anos vividos de frente para o teatro que mais se adequou às pautas populares no Recife.


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dadão menos abastado igual chance desfrutada por cavalheiros e senhoras da alta sociedade que compraram caras entradas. Assim o fez. “Era um desejo do meu avô. Eu ouvi muito esta história do meu pai, Arlindo de Aguiar, de mandar abrir os portões, e confesso que é um orgulho que tenho”, afirma Fernando José da Costa Aguiar, professor e médico no Recife, um dos seis netos vivos do comendador e hoje o tutor das memórias dele.

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A determinação de Bento Aguiar é consonante com a ascensão social dele. Havia fugido do destino de ser padre em Portugal, foi ajudado pelo padrinho, frei Bento do Monte Carmello Flores, veio para o Brasil e, no Recife, trabalhou no comércio e fez fortuna. “(...) Sendo a sua riqueza adquirida com esforços próprios e honradez a toda prova (...)” (1). Vendedor de tecido, torna-se sócio e prosperou. Chegou a assumir o prestigiado posto de provedor do Hospital Real Português e, graças ao seu desempenho, recebeu do Rei Dom Carlos I o título de comendador.

“Abram as portas do Parque para o povo”.

A ordem para que os portões do teatro fossem abertos talvez explique a superlotação do local e reduz as suspeitas de que houve falha na “encomenda” ou venda de ingressos para o espetáculo. Naquele dia, em vez de público de mil pessoas, conforme previsto, havia o dobro.

O comendador mandou anunciar a venda dos bilhetes até as 12 horas daquele dia de estreia de “O 31”, da esperada Companhia Portuguesa de Operetas e Revistas do Teatro Avenida, de Lisboa. Sem alarde, na sombra dos brilhos reluzentes, deu ao ci-

“Na primeira sessão, a que comparecemos (...), em recita ordinária ou extraordinária, com pompa ou sem pompa, é o record entre nós. Pela circunstância mesmo de que aqui nunca existiu theatro de tão vasta proporção, o Parque pela primeira vez em Per-

Um minuto de sua atenção enhoras e senhores, sejam bem-vindos. A seguir, eis que um segredo de família está prestes a ser revelado. É o elo perdido para se entender a origem da vocação democrática deste teatro; talvez até sirva como reparo à história impressa em jornais de época. No dia da suntuosa inauguração do Teatro do Parque, em 24 de agosto de 1915, o comendador Bento Luiz de Aguiar, idealizador e proprietário deste luxuoso sonho de diversão, determinou:

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nambuco reuniu 2.000 pessoas diante de um palco, no maior ajuntamento humano que seria possível conjugar”, resenhou o Jornal Pequeno. (2) O sonho do comendador havia sido realizado. Pela materialização deste sonho, Bento de Aguiar morreu exatos oito dias depois, aos 54 anos. Um enredo para filme de cinema. Foi infectado pela leptospirose, uma doença bacteriana transmitida pela urina de ratos - neste caso, adquirida em constantes visitas às obras do empreendimento. “Isso é fato, não é uma hipótese. Ele contaminou-se no Parque porque estava preocupado que nem tudo fosse concluído até a inauguração e fazia visitas frequentes. Além de neto, sou médico e posso lhe assegurar que assim se deu a doença dele”, afirma Fernando.

Na semana seguinte à visita, o Parque - agora restaurado - foi entregue ao público. Ao povo.“O povo, essa ‘entidade’ não personificada que construiu com seu afeto a história e deu importância para este edifício na cidade”, frisa a arquiteta e pesquisadora do projeto de restauro do Teatro do Parque, Simone Arruda. (3)“O povo que atribuiu valor e deu significado ao teatro”. Por 105 anos.

Desde os 10 anos que Fernando frequenta o Teatro do Parque e - confidencia - é sempre um momento de comoção e lembranças. Aos 85 anos, Fernando de Aguiar esteve no Parque no final de novembro de 2020, como convidado para conhecer a maior restauração já realizada no prédio. Resgatou parte da história da família. “O mosaico da casa dos meus pais, na rua Manoel Borba, nº 869, por exemplo, era igual ao da atual entrada do Parque”, recorda. No passeio para conhecer o novo Parque, foi acompanhado por descendentes de Bento de Aguiar, que moram no Recife, como a tataraneta, Giovanna, com quem Fernando andou de mãos dadas. Ao todo são seis netos, 22 bisnetos e tataranetos. Eles fazem a transição entre o passado e o presente.

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2020, Rua do Hospício, nº 81

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Portão escancarado: o Teatro do Parque é reaberto em dezembro de 2020, ao fim do maior projeto de requalificação e restauro desde a sua fundação, em 1915. A obra deste exemplar raro dos teatros-jardim no Brasil apresenta-se com vestes semelhantes à da década de 1930, em uma versão apoteótica. O novo Parque devolve a ambiência fiel do passado arquitetônico de um dos maiores teatros do país; apresenta-se aos mais jovens, dá vida e renova a memória imaterial da cidade, impressiona pela versatilidade e múltipla capacidade técnica e lança uma profusa e potente luz à cultura do Recife do futuro.

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Os primeiros passos de quem visita pela primeira vez o novo cineteatro do Parque oferecem uma forte experiência sensorial. O piso em mosaico, com referência Art Déco, conduz o visitante ao êxtase. É cercado por paredes pintadas, simulando blocos de pedra calcária neocolonial. Flutua-se pelo hall de entrada e foyer sobre essa espécie de tapete, reconstruído com técnicas de alto-relevo, usando-se tecnologia e a persistência para se achar o pigmento, textura e aparência mais próximos do protótipo. Portas, janelas, paredes, adornos e pendentes revelam uma atmosfera em que o ontem e o hoje se fundem para uma observação de um prédio que teve sua primeira reforma em 1929. O ano foi tomado como principal referência para o projeto porque em torno dele se reunia o maior volume de informações históricas e em função da proporção da “remodelação” promovida naquele ano, ao ser transformado em cineteatro. O passeio pelo interior deste patrimônio leva o visitante a conhecimentos arquitetônicos e sensações semelhantes às vivenciadas por turistas dos maiores museus e teatros europeus. “É como apreciar uma obra de arte”, compara Cannibal, músico pioneiro no movimento punk e ativista de movimentos culturais comunitários em Pernambuco. “Há uma comoção dos artistas com a reabertura. O Teatro do Parque é diferente; todo mundo tem uma história com este lugar. Nele, se vê o povo”, afirma o vocalista da banda Devotos, do Alto José do Pinho. Artista visionário, André Madureira, fundador do célebre Balé Popular do Recife, faz previsões. “A reforma trará um novo movimento cultural para a

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cidade”, crê. “Sempre foi um teatro das pautas populares e muito concorrido. Tenho um amor muito grande por este teatro”, diz ele, que fez estreia triunfal do Balé nos palcos do Parque “em 20 de maio de 1977, às 21h33”. Lembra até dos minutos. O Parque está no Centro do Recife, integra o rol de bens públicos da população do município, mas com esta intervenção volta a ser cosmopolita, atração cultural para o Brasil. Feita a obra de reforma e restauro, o Parque torna-se o maior teatro municipal e o mais bem equipado de Pernambuco. Passa a ostentar capacidade de até 800 pessoas bem acomodadas – sendo 637 nas poltronas da plateia e 163 nos camarotes. Tem capacidade estrutural para receber musicais, peças de teatro, dança e outros espetáculos de grande porte, pela dimensão e variedade de recursos técnicos. Conta agora com excelente estrutura para ensaios da Banda Sinfônica do Recife, que tem sede no teatro. O mesmo se pode falar da nova cinemateca e do sistema para reprodução de filmes, com qualidade de imagem e nitidez em 4K e cinema 3D, propriedade para imagens com profundidade ampliada. Um cineteatro do Parque esculpido a lâminas de bisturi, espátulas odontológicas e artísticas – instrumentos empregados para o trabalho de restauro em áreas milimétricas. Com rigor técnico, nas paredes o processo cirúrgico focou a decapagem de áreas de até dez camadas de tintas sobrepostas para que fosse encontrada a tonalidade ou material específico usado em 1929. Imperioso foi o uso de agulhas e seringa de injeção para se aplicar produtos químicos


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especiais e facilitar o processo de investigação sem danificar o material pictórico existente, além de soprador térmico para aquecer pequenas partículas de elementos decorativos e pinturas artísticas assinadas por Mário Nunes, Henrique Elliot e Álvaro Amorim. Esses utensílios ressaltaram a perícia da tarefa e se somaram às pás de pedreiro e martelos da obra civil tradicional. O projeto inicial do Parque previa a conservação preventiva, tendo sido idealizado em meados de 2012-2013. A segunda modelagem acrescentou em 2014 o restauro memorialista da estrutura predial, estendendo-se para um projeto de conservação e restauro de bens integrados. Em 2015, houve uma tentativa interrompida de alavancar a obra até que foi retomada em 2018 de forma continuada para ser concluída. Piso, teto e paredes, recomposição de elementos decorativos para devolver o projeto arquitetônico da época da construção, reposição de alicerces e teto, sistema de drenagem, novo sistema de climatização suprimindo tubulações aparentes de dois metros de diâmetro, novas instalações de eletricidade, segurança, sinalização. Paisagismos refeitos, mobílias recuperadas, novo aparelhamento de circuito de TV e de acústica. Além de luz, som e maquinários cênicos e de projeção com qualidade de última geração. Esta é a volta triunfal do cineteatro ao circuito cultural nacional. Desde os portões de ferro da entrada da Rua do Hospício, bilheteria, hall de entrada, foyer e jardim até as galerias e palco principal, abrem-se cortinas para infinitas narrativas, incluin-

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do da própria obra civil, que envolveu cerca de R$ 20 milhões, exigiu especialização e o perfeccionismo do entrelaçamento de estudos. A obra dependeu da orquestração de execução de mais de 20 projetos, tendo o de restauro orientado a compatibilização histórica. Foram pelo menos seis anos de pesquisa e planejamento, e dois anos de reforma continuada. Exigiu-se a sincronização de um bailado de operários e artistas, reunindo mais de 200 pessoas. A eles, presta-se reverência.


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Quando, no respirar entre uma ordem e outra, era provocada a explicar detalhes do complexo que administrava, respondia caminhando. “A gente está fazendo coisa que o Brasil não faz. Administração pública não faz restauro. Não faz”, ressalta, de forma quase seca de tão objetiva e sem margem para dúvidas.

Bastidores de uma paixão

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e coturno e capacete, didática e operacional, estava ocupada demais em mostrar o Parque e preferia assim a conceder entrevista formal. Iniciava antes das 7h, sábado ou domingo à tarde. Sol de 35 graus, feriado nacional ou local, era tempo bom para checagens – revelam os que conviveram com ela nos últimos anos. Simone Osias ocupou papel de protagonista nesta cena, ainda que tenha se mantido nas coxias. Simone Osias, a gerente geral do projeto de reforma e restauro do Teatro do Parque, parecia tomada pelo comprometimento e pelo desafio. Tocou a obra da vida dela enquanto arquiteta, usando experiência profissional de três décadas.

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“Alô? Estou ouvindo. O quê? Não, não é assim. Tem de passar na Prefeitura para eu olhar os detalhes”, interrompeu a explicação anterior para atender a uma ligação. Ao desligar, retomou o raciocínio. Funcionária da Fundação de Cultura, neste projeto ela trabalhou sob a regência do Gabinete de Projetos Especiais da Prefeitura do Recife – uma pasta vinculada ao gabinete do prefeito e destinada a tocar compromissos prioritários da gestão. “Quantos tiveram a oportunidade de fazer obra de restauro, de patrimônio que tem simbologia tremenda para uma cidade? E quantos fizeram?”, questiona, referindo-se não só a arquitetos, restauradores, mas a prefeitos do Brasil. “O prefeito apaixonou-se pelo projeto”, afirma. “Defendeu o teatro como pôde”, completa, referindo-se ao prefeito Geraldo Julio (2013-2020), que no exercício de dois mandatos teve o soerguimento deste equipamento cultural como meta, conforme narram assessores e ex-secretários. A paixão, citada por Osias, foi uma conquista de muitos. Precedeu ao convencimento de que o Parque se tratava não só de uma pauta de primeira ordem para a cidade, como viável. E que, dada a determinação administrativa, seria a obra dos sonhos dos técnicos,


artistas e da população. Restaria buscar fontes de financiamento, equacionar recursos, prazos e limites financeiros, equilíbrio para driblar a crise econômica nacional. Simone Osias vistoriou cada milímetro do feito ou refeito. Comemorou e propagou – deixando à mostra espécie de orgulho maternal – as soluções encontradas pelos profissionais que atenderam e moldaram o teatro com genialidades próprias.

“Restauro é como artesanato”, compara, lembrando da feitura manual. A excelência, arremata, deve ser atribuída “à criatividade dos profissionais” e ao manuseio das ferramentas dos que apresentam conceitos ou empunham navalhas de bisturis e seringas. Os graduados reconhecidos pela academia e os trabalhadores incógnitos. Gente que ressignificou o manejo de matérias-primas, que se entregou a um sonho artístico.

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Somam-se dois anos de dedicação exclusiva ao teatro. Todos os dias. Jaelson Alves personalizou portas, janelas, forros acústicos e esquadrias de madeira. A maior parte do empenho demandado por ele voltou-se à perfeição na recuperação das esquadrias modelo venezianas que cercam o salão principal do teatro. Foram inseridas cerca de 30 mil baguetes ou taliscas, espécies de encaixe para vedar por completo todas as 164 folhas de todas as portas situadas no entorno da plateia. A execução precisou ser engenhosa: cada peça ganhou numeração para caber no lugar certo; era única.

Os anônimos e suas genialidades

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o internato de Maraial, Zona da Mata de Pernambuco, para a história. Foi lá, naquela instituição educacional administrada pela Santa Casa da Misericórdia, em um município distante 300 quilômetros da mãe e de outra leva de irmãos, que Jaelson Alves descobriu a madeira como forma de expressão artística. Confeccionava camas aos 12 anos. Hoje, aos 44, anda orgulhoso do ofício e do dom que aprimorou, parte dele agora emprestado ao Parque, ao Recife – cidade que o acolheu aos 15 anos. “Vou contar o meu maior prazer: é saber que agora eu faço parte da história, mesmo no anonimato”, confessa Jaelson, marceneiro entalhador, lembrando da felicidade que pode dar no futuro aos dois filhos. “Eu vou passar, mas o que fiz vai se perpetuar”, filosofa.

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As portas venezianas, inseridas na reforma promovida no teatro na década de 1980, são cópias do que se via na década de 1930 e, por isso, acabaram mantidas agora em 2020. Quem forneceu o modelo para a reforma de 1988 foi a pianista Josefina Aguiar, neta do comendador Bento de Aguiar, ao mostrar uma foto da infância vestida com roupas de carnaval tendo as portas da imagem ao fundo. Uma matéria publicada no Jornal do Recife de 11 de maio de 1929 reforçou a referência ao modelo:

“...A remodelação que aquelle antigo Theatro está sofrendo é completa sob o ponto de vista da esthética e conforto (...) localizado em um extenso porque tem contacto de ambos os lados com o arvoredo exuberante de jardim. O pizo em mosaico e o tecto à altura bastante elevada deixa um espaço mais que suficiente para uma ventilação perfeita que se faz atravez das venezianas em redor de todo o Theatro…”, diz o texto, um achado do projeto de restauro. O Teatro já havia passado por outras restaurações. A intervenção promovida entre 1986 e 1988 foi eficien-


te na reprodução das venezianas. Tinha a intenção de devolver a ventilação para o salão principal, no entanto trouxe um problema: por elas, vazava luz durante os espetáculos noturnos. Ao longo do tempo, surgiu outra questão: com a instalação de um sistema de refrigeração do ambiente, havia fuga do ar-condicionado. A obra de 2020 conseguiu, com a habilidade de Jaelson e outros anônimos da equipe de marcenaria, fazer com que as portas reconquistassem a aparência da década de 1930, preservando o conforto da plateia. Jaelson agora contempla as venezianas adaptadas para preservar o tempo, compondo-as de acordo com as necessidades atuais. Com experiência em restauração de 20 obras de porte e representatividade (grande parte igrejas, como a tradicional Basílica Nossa Senhora do Carmo, no município de Olinda, Pernambuco), este é o primeiro prédio no qual Jaelson atua e que já havia frequentado um dia antes de ser operário. “Estive muito na Boa Vista, ia ao cinema e ao Teatro do Parque. Ele tinha preços populares e isso sempre foi um atrativo. Minha maior expectativa é de que continue assim”, diz o marceneiro, um mestre, mesmo que rejeite o título.

“Eu venho de um universo de restauração de igrejas barrocas. O que vi aqui foi impressionante: uma sintonia perfeita entre trabalhadores de marcenarias diferentes. Gente de confecção de esquadrias novas, de restauração de móveis e da restauração”, comenta o artífice da madeira. “Tenho muito orgulho deste trabalho. Me envolvi por inteiro nesta obra do Parque. E tem de ser assim: a marcenaria criativa não existe sem envolvimento”.

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da Boa Vista, com sequência até a rua da Conceição. Neste local, realizou o sonho de construir um refinado Parque Internacional de Diversões, semelhante ao que via na França, Portugal, Espanha, Áustria e outros países europeus. Abrigaria hotel, casa de bilhar, restaurante e um teatro. “Ele encomendou o teatro na Alemanha (...) toda a estrutura veio de navio. (...) um teatro para o clima tropical”, contou Eunice de Aguiar, neta do comendador (4). Móveis, objetos de decoração e até profissionais também foram importados.

Desde o comendador, um teatro incorporado à vida das pessoas

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oi um alarde nos jornais da época; um evento que mobilizou toda a população do estado de Pernambuco. Ouviam-se ecos do “acontecimento sensacional” (como descrito pelo Jornal do Recife, em 24 de agosto de 1915) em estados com grande atividade artística, como o Rio de Janeiro. No início da década de 1910, o comendador Bento de Aguiar estava determinado a usar a influência que possuía como parte da aristocracia do Recife e a sua condição financeira para inovar com um empreendimento surpreendente e criativo aos modelos da época. O empresário queria oferecer um lugar no Recife para acolher o morador ou visitante da cidade. O comendador era proprietário de uma área compreendida entre a Praça Maciel Pinheiro e a Conde

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Ergueu o Hotel do Parque com 40 quartos. Bento de Aguiar então encomendou a construção do teatro, obra estimada em 200 contos. A art nouveau, modernista, serviu de inspiração para a arquitetura em ferro. No hotel, vendiam-se ingressos para o teatro. “Este teatro vai se incorporar a outra forma de lazer urbano, que era um tanto diferente daquele que se praticava no Teatro Santa Isabel. Ao Teatro Santa Isabel eram mais as óperas, as cantatas e os concertos... Ali era o Vaudevilles”, explica o urbanista, arquiteto e professor José Luiz Mota Menezes. Vaudevilles, um gênero de entretenimento que combinava espetáculos com canções, acrobacias e monólogos. Segundo Mota Menezes, o Parque funcionaria como uma “revista de variedades”, tipo adequado para uma “diversão da tarde”. O conceito da área de divertimentos era de um teatro-jardim, cercado por hortênsias e pequenas mesas redondas de ferro e madeira. Um dos maiores conhecedores da evolução urbana do Recife, José Luiz Mota Menezes, explica a particularíssima im-


portância do Parque: “Ele é singular e importante porque é um dos poucos que ficaram. Se existiam outros no Brasil e em outras partes, não importa. No momento, é o mais importante no grupo de teatro-jardim existente na região” (5). A inauguração foi um acontecimento propagado pela imprensa por semanas. A Companhia de Revistas e Operetas do Theatro Avenida de Lisboa inaugurou o Teatro no dia 24 de agosto de 1915. O comendador vivia dias de glória, havia se dedicado por anos aos detalhes da obra do Parque, quando foi golpeado pelo destino. Lá estava no Jornal do Recife, dia 2 de setembro, o anúncio fatídico: “(...) O comendador Bento Luiz d´Aguiar foi victimado por uma lymphatite perniciosa”. Adoeceu três dias antes. O corpo deste idealista ousado foi levado em “coche da casa Agra”, “conduzido em rico ataúde até o cemitério de Santo Amaro”, dizia a nota. Tinha apenas 54 anos.

Do núcleo familiar do comendador para a população, o Teatro do Parque passou a ser um lugar de pertencimento para a cidade. Como se a família agora fosse estendida à capital. Irradia-se dele uma cumplicidade que se faz presente dentro e fora do prédio da rua do Hospício, nº 81. Era assim no início do século; vê-se o mesmo em dias atuais. E, ao longo desta última obra de restauro de 2020, o fenômeno se tornou comum.

No inventário do comendador, está a partilha entre a esposa, Josephina de Aguiar, e os filhos, dos sobrados onde foi erguido o Teatro. Ela passou a morar no sobrado de nº 3, defronte à Rua da Conceição. Para a família, virou lugar de lembranças do avô morto e da avó. Manteve-se como lugar de uma “atmosfera acolhedora, onde a comunidade de artistas e seus frequentadores podem sentir-se à vontade, em casa”, como definiu a historiadora Lêda Dias, especialista em conservação e Organização de Acervos Documentais (6).

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Do passado para o futuro. Mas que passado?

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ra hora do almoço. Portão de metal com inspiração neogótica aberto para que os funcionários saíssem. Um senhor espreitava a bilheteria, usando um buraco no tapume que escondia a fachada. “O senhor está procurando por alguém?”, perguntou a arquiteta consultora e autora do projeto de bens integrados, Simone Arruda. “Será que a senhora permitiria que eu entrasse?”, respondeu o estranho. “Eu só queria olhar um pouco”. Homem de meia idade, seguiu com passos lentos até a plateia. Em cadeiras ainda puídas, antes da conclusão do restauro, sentou-se. Chorou de emoção, ali solitário naquele salão, lembrando do pai que havia perdido há pouco. “Meu pai me trazia aqui. É como se este prédio me devolvesse a memória do meu pai. Nunca imaginei que o verdadeiro modelo do teatro fosse este”, confidenciou. A cena de um desconhecido bater à porta do teatro durante a obra pedindo para entrar, que se repetiu com dezenas de visitantes errantes e demais curiosos, comoveu a arquiteta restauradora Simone Arruda.

“Com este senhor e outros tantos comecei a perceber como o teatro faz parte da vida das pessoas. Sentir esse afeto, a ponto de gente se acorrentar na porta do teatro, foi determinante para mim”, afirma, em alusão ao episódio em que artistas promoveram uma vivência intitulada Acorrentados ao Teatro do Parque, em janeiro de 2018, parte do movimento Virada Cultural do Teatro do Parque.

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“Foi com respeito às pessoas que a gente se debruçou para fazer o melhor, buscar o projeto mais fiel, com informações e prospecções para trazer de fato uma aparência que correspondesse à importância que tem na vida do recifense”, diz Arruda. O maior desafio de Simone Arruda foi decidir sobre qual destino daria à conservação dos bens do Parque. “Eu precisava de uma resposta sobre a que fim se queria chegar e como a obra seria conduzida. O mais coerente seria retroceder até 1929. Muita coisa foi perdida, mas queríamos dar a ambiência de 1929, fazer com que cada elemento reconstituído tivesse presença no novo teatro”, explica a arquiteta, um nome com experiência reconhecida dentro do espectro do patrimônio histórico e artístico em Pernambuco. Simone Arruda passou dias e noites concentrada no que seria o principal impasse com relação à obra do Parque – este que dizia respeito à premissa conceitual e estilística serviria como referência para a obra. Quando chegou a uma conclusão, e sendo a gestão da obra convencida dos argumentos, o trabalho foi guia para os demais projetos do teatro. Simone prestou consultorias históricas sobre cores e padrões de época para inspirar os projetistas setorizados. O projeto de bens integrados assinado por ela foi pela primeira vez produzido em 2014 e atualizado em 2019 para nortear com mais precisão projetos complementares e que dependiam da tecnologia.

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Nas paredes, “um testemunho”

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respeito à história está registrado de forma documental por todo o Parque para ser apreciado por meio de um testemunho arquitetônico. O “testemunho” ou “janela” é a técnica de atestar a busca, deixando à vista uma pequena mostra da decapagem feita nas paredes, camada por camada. Foram estes elementos testemunhais mais fortes que levaram o restauro de 2020 à “remodelação” realizada em 1929, quando nesta ocasião o Parque passou a ser classificado como cineteatro. Na recuperação da pintura decorativa em estilo marmorizado das colunas que atraem olhares no salão da plateia principal, observa-se este cuidado. No “testemunho” das colunas, vê-se a variedade de cores já usadas em outras reformas e consegue-se entender o porquê de a equipe técnica do restauro de 2020 optar pela mescla de tons em verde e azul. A decisão pela década de 1930 é sustentada pela extensa pesquisa histórica elaborada para subsidiar o projeto de bens integrados. “No restauro, não há achismo”, ressalta Simone Arruda. Para a intervenção de resgate da configuração dos elementos artísticos do teatro, tomou-se por relevante o material iconográfico descoberto e cartas patrimoniais da Unesco (ONU) e outras instituições, publicadas ao longo do século XX e que versam sobre a conservação e preservação de bens


culturais. Na carta de Burra (Austrália, revisão em 2013), um trecho do que é preconizado e mencionado no recente projeto do teatro recifense diz que: “A restauração só pode ser efetivada se existirem dados suficientes que testemunhem um estado anterior da substância do bem (...) A restauração se baseia no princípio do respeito ao conjunto de testemunhos disponíveis, sejam materiais, documentais ou outros, e deve parar onde começa a hipótese”. Em torno das diretrizes de Simone Arruda e com o gerenciamento de Simone Osias, os projetos foram adaptados para atender à conceituação que aludia à década de 1930. A obra do Parque, pensada e concluída na gestão de Geraldo Julio na Prefeitura do Recife, ficou a cargo do Gabinete de Projetos Especiais, que tem status de secretaria e coordenou os serviços com a participação de três secretários. Eles responderam pela titularidade da pasta de Projetos Especiais em momentos distintos durante o período da execução da obra, de 2013 a 2020 – João Guilherme Ferraz, Aldemar Santos e Otávio Calumby. Como partícipes ativos estiveram ainda a Secretaria de Cultura e Fundação de Cultura do Recife, pensando sobre o destino do teatro como bem cultural da cidade. Mais de cem páginas de orientações estéticas e estilística sobre como deveria ser feita cada interferência e recuperação, cores, moldes, rebocos, frisos, estuques, colunas e demais fundamentos. Para elas, Arruda realizou pesquisas nos arquivos documentais e fotográficos da Biblioteca Nacional, do Museu da Cidade do Recife, da Fundação Joaquim

Nabuco e em jornais e revistas locais – como A Província, Diario de Pernambuco e Jornal do Recife – e de outros estados. No contexto do restauro, faz-se necessário dimensionar e dar a glória da requalificação após arrendamento pelo empresário Luiz Severiano Ribeiro (1929) com a ideia original de fazer do Teatro do Parque um local moderno para a exibição de filmes. Algo como os moviepalaces, dos Estados Unidos, ou no modelo das luxuosas salas de cinema Glória, Odeon, Império e Capitólio e Cinelândia, do Rio de Janeiro, conforme enfatiza projeto oficial do restauro. Severiano Ribeiro queria trazer para o Recife a ambiência vista nos moviespalaces e a estética Art Déco, na visão dele, contribuía para a imagem do novo. Havia, à ocasião, uma intenção clara em criar uma ruptura na visão do público. Seria preciso diferenciar o ambiente dos frequentadores do teatro, circos, cabarés e music halls. “Inteiramente remodelado, passando por completa transformação que somente respeitou a estrutura metálica”, anunciou o jornal A Província, em 18 de julho de 1929. Na revista Frou-frou, do Rio de Janeiro, um artigo detalhava com entusiasmo a “remodelação”: “Agora sim, vamos ter no Recife um cinema digno de uma grande Capital e que será – ninguém de bôa mente poderá contestar – o melhor do Norte do Brasil (...) A realidade estava muito acima do que imaginara. Tudo fora modificado. A não ser na estructura do edifício, em tudo mais havia inovação”.

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O artigo era também propaganda para a reabertura em julho de 1929, com o “grande film da Metro, Ben-Hur.”

Tamanho impacto, descontado o hiato temporal, o Parque traz hoje, nove décadas depois, com a recente obra de restauro, a imponência e grandiosidade que impressionavam em 1929.

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Denominação do levantamento arquitetônico (2013-2020) Galeria - AMB 01

Salão de espera, salão de entrada ou Salão de espelhos

Primeiro salão

Bilheteria - AMB 02

2ª seção do salão de espera

Salão dos espelhos

Hall - AMB 03

Não existia em 1915

Vestíbulo e bilheteria

Foyer - AMB 05

Não existia em 1915

Hall

Plateia - AMB 09

Plateia

Salão de projeções

Fonte: Projeto para conservação e restauro de bens integrados e revestimentos parietais do Teatro do Parque | Simone Arruda Arquitetura

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Muito além do primeiro script

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uando Aldemar Santos conheceu enquanto secretário a obra do Parque, lembrou da primeira vez em que esteve no salão do teatro. Era pequeno demais; tinha seis anos. Foi levado pelas mãos de dona Gláucia, uma professora sonhadora que usou uma casa da Cohab, no município de Olinda, para abrigar o Instituto Cantinho Feliz. “Andava admirando o piso e diziam para mim: ‘Olha pra frente”’. Estava impressionado com a beleza do lugar. Dona Gláucia fazia excursões com os alunos de origem humilde para conhecer a atração da Rua do Hospício. “Fui pensando que atuaria como um ator e seria aplaudido, mas estava sendo levado para assistir a uma peça. Era Os Saltimbancos, adaptação de Chico Buarque, e eu

vi uma zebra... Fiquei maravilhado. Pensei: ‘Rapaz, transformaram a zebra. ’”. Não importa se em “Os Saltimbancos” não há zebra; a memória afetiva o leva décadas depois para aquele momento incrível. Analista do Tribunal de Contas, assumiu em 2018 o cargo de secretário-chefe do Gabinete de Projetos Especiais. Foi encarregado de fazer a construção jurídica da obra de conservação e acrescentar aditivos referentes à retomada do projeto. A obra, antes mais modesta, estava parada. “Acreditava que restauro seria um item do aditivo. Não tinha ideia do que era. Não tinha entendido o tamanho da obra até então”. Quando ouviu Simone Osias “falando sobre as técnicas francesas” percebeu a estatura da ousadia.

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“Fui de novo na obra do Teatro do Parque. Vi um senhor de cabeça branca que aplicava um líquido com uma seringa. Fiquei impactado. Me explicaram que era um produto que aplicavam de 12 em 12 horas para ver a reação, para se saber se a estrutura resistia à pancada de um escopo. Perguntei: ‘Este produto que estava dentro da seringa foi orçado na planilha?’. Naquele caso específico não estava. Não estava porque restauro é assim: Não se tem controle nenhum sobre a obra”, relata ele, falando sobre as surpresas que vão surgindo ao se iniciar um restauro e os recursos financeiros que são demandados no curso de um projeto. O mesmo aconteceu com robustas colunas da plateia. Durante a obra, se descobriu: eram ocas. A estrutura interna, que parecia firme, era falsa. “Um choque”. Durante a execução de conservação e restauro, surgiram os percalços: “Tinha a questão do dólar, da nossa inércia natural e questões burocráticas do serviço público que são imensas, mas a intenção havia. O Teatro do Parque era para a gestão uma obra prioritária e, por mais que tivéssemos cortes e remanejamento de verbas, a obra não poderia parar”, relata Aldemar, que continuava olhando para frente, junto a assessores, e levando as demandas para o prefeito. Coube muitas vezes a ele a captação de recursos em Brasília, ajudar no equacionamento de crise econômica e tratar com o prefeito sobre percentuais de grandes obrigações orçamentárias como saúde e educação. Surgiram pressões da área de cultura após os 100 anos do Teatro, segundo ele, “com razão”. E foi preciso parar a obra em muitas ocasiões

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para dar atenção a outros setores. Nesses momentos, pensava: “O Teatro é diferente. Serve a uma gama de cidadãos muito grande. A gente não pode desistir. Tem de dar um jeito e terminar”. (Por motivo de saúde, no início de 2020 ele deixou a titularidade do Gabinete de Projetos Especiais, tendo passado o cargo e a responsabilidade da obra para o advogado Otávio Calumby). Para Aldemar, o menino que saiu do Instituto Cantinho Feliz, houve a hora de aproveitar a chance como gestor para que outras crianças tivessem o mesmo encontro lúdico que a arte proporciona. Aquela magia que o faz lembrar mais de 40 anos depois de uma zebra fazendo graça como se viva fosse.


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Era uma segunda-feira no Recife, dia 29 de julho de 1929, quando o Parque se lançou como cineteatro, quatorze anos após a realização de um sonho do comendador Bento de Aguiar. E então, com Ben-Hur, peitoral estufado e pernas musculosas à mostra, o galã mexicano radicado nos Estados Unidos Ramon Navarro surge na imensa tela do Parque como protagonista do filme. “Ramon Navarro vem empolgando toda a plateia recifense com o papel que encarna na fita colosso da Metro-Goldwin”, escreveu o Jornal Pequeno (9).

O dia que ficou na história

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amanha a ansiedade, uma multidão invadiu os salões da rua do Hospício, nº 81, às 19h30, sessenta minutos antes do horário anunciado para a abertura do Parque luxuosamente remodelado. Ficou “super-lotado” (7). Dezenas de pessoas entraram sem ingresso. Muitas famílias assistiram de pé às 14 partes da estreia do filme “Ben-Hur” (película épica da Metro-Goldwyn-Mayer). Repercutiu mal na imprensa a “desconsideração” (8) com o chefe da polícia; ele não foi “contemplado” com um camarote, assim como outras autoridades. O governador de Pernambuco, Estácio Coimbra, o senador Júlio Bello e o prefeito, Francisco da Costa Maia, tiveram mais sorte.

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A primeira sessão do Parque acabou às 23h15. Ben-Hur foi considerada a maior produção cinematográfica que já havia passado por Recife até então e marcou o “grande sucesso” (10) da reabertura do teatro, um acontecimento para a vida social da cidade. Excetuando-se a gafe administrativa com o chefe de polícia, nos jornais só se liam elogios pelo conforto e opulência dos detalhes do Parque.


Cenas de um tesouro resgatado

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assaram-se 91 anos. Dezembro de 2020: as minúcias da obra de reforma e restauro do cineteatro do Parque trazem de volta a atmosfera sentida pelos que estiveram na estreia de Ben-Hur, projetado numa grande tela, instalada no centro do palco. O público daquele dia, ao mesmo tempo em que suspirou com as aventuras de Navarro, admirou entre uma cena e outra uma imensa obra de arte pintada sobre a parede por dois dos mais importantes artistas plásticos do final da década de 1920: o mural de boca de cena, uma espécie de painel que emoldura artisticamente o palco e fica defronte às poltronas da plateia e camarotes. Nele, na área superior do frontão, três figuras femininas aparecem centralizadas, como se estivessem em uma paisagem com palmeiras e sob um céu azul. Nas duas laterais do palco, a pintura segue com delicados querubins dentro de janelas estilo vitral. Este mural de boca de cena acaba de ser todo retocado, em um exímio trabalho de restauro, e deve ser uma das grandes atrações do teatro para a plateia de hoje. O campo da pintura da boca de cena tem a predominância na cor ocre, igual à que se via em 1929. É originalmente uma obra assinada pelo aclamado cenógrafo Mário Nunes. Jovem artista, Nunes havia trabalhado as pinturas primitivas do Parque em 1915 em dueto com Henry Elliot. Eles usavam o estilo renascentista europeu com molduras e guirlandas. Em 1929, Mário Nunes foi convidado a participar da “remodelação” proposta por Severiano Ribeiro. Fez uma pintura sobre a anterior, desta vez contando com a parceria de

Álvaro Amorim, colega de inúmeras exposições de Belas Artes. A visão de quem fita a boca de cena corre por 106 metros quadrados de área resgatada. O resultado exigiu trabalho meticuloso, de pequena evolução diária. A equipe de engenharia da obra recente estranhava. “Quanto falta?”. Era uma pergunta comum. Ao final de uma semana, fazendo a medição, o saldo não chegava a meio metro de remoção de camadas de tintas que encobriram a pintura de 1929. “Tenhamos calma”, pediam em sussurros os restauradores em meio à obra. Uma ponta afiada de um bisturi e a paciência da equipe de restauradores garantiram os avanços. Primeiro, a raspagem da camada de uma repintura realizada em 2000, que recobria inteiramente o mural. Começaram fazendo prospecções pelas áreas inferiores. No momento em que descobriram o verdadeiro pé de uma das mulheres, pintadas por Nunes, instalou-se um contentamento coletivo. Chegou-se à fase de restauração.

“Fico pensando em quantos não passaram por aqui e quantos ainda vão passar”, diz Eduardo Souza da Silva, 40 anos, que na obra do Parque ficou famoso pelo apelido de Miguelito. “É satisfatório demais a gente resgatar uma época e conseguir levar para o futuro”, afirma o auxiliar-técnico em pintura de restauro. No Teatro do Parque, Miguelito ingressou na equipe de marcenaria; depois, foi direcionado à pintura, área na qual ele já tem experiência acumulada por ter trabalhado em outros restauros de prédios históricos do estado. Foram três anos na obra do Parque. “A esta al-

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tura, eu não sei nem o nome verdadeiro de Miguelito porque virou o Michelangelo da obra”, define Simone Osias, gerente geral do projeto. Na exposição da pintura artística, era comum Osias fazer menção a profissionais como Miguelito: “Aqui tem a mão de um bom pintor-restaurador”, apontava. Eles trabalhavam suspensos por andaimes e faziam certo malabarismo para acessar áreas difíceis, lançando precisão centimetrada para salvar do ostracismo elementos do que havia sido encoberto em outras épocas. O histórico do frontal ou mural de boca de cena, elencado pelo projeto de bens integrados, indica que foi vedado por painéis de lambris, na década de 1960. Na reforma de 1986-1988, após duas décadas escondidos, os lambris foram retirados. Na intervenção de 2000, o mural foi repintado por completo e até assinado por quem ignorou a criação de Nunes e Amorim.

Ao final, são 105 anos de existência e encantamento para com o mural de boca de cena do Teatro do Parque. Este é um dos mais ricos fragmentos da recente conservação e restauro dos bens integrados do teatro da memória do recifense.

“No alto do palco vê-se uma alegoria representando a Folia cercada de anjos e de lado estão duas dançarinas espanholas”, já o citava a edição do Jornal do Recife de 20 de agosto de 1915, ano da inauguração do teatro. Para fins documentais, segue uma explicação: as dançarinas foram pintadas em 1915, e continuam cobertas. “Paramos na remoção que caracterizava o ano de 1929 para seguir os preceitos que embasam e tornam esta restauração científica”, explica Arruda.

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Da galeria ao foyer, as boas-vindas

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sava calças formais, sapatos bem engraxados e acompanhava o pai no dia em que fez a primeira visita ao cineteatro fundado pelo comendador Bento de Aguiar, o seu avô. Caminhava pelo longo corredor inicial que dava acesso ao Parque, quando se rendeu à surpresa: era um salão grande, teto alto, com um belo lustre de cristal pendente e composto por duas escadas em granilite (uma técnica que era novidade em 1920) oferecendo acesso aos camarotes. Embaixo delas, tinha uma porta para a plateia. “Lembro muito daquele corredor e da minha sensação ao chegar nesse ambiente. Recordo do quanto tudo era tão fantástico”, diz o neto do comendador, o médico Fernando Costa de Aguiar, hoje responsável pelo acervo do avô visionário.

“Não o conheci. Ele morreu poucos dias após a abertura, em 1915, vítima da leptospirose, mas convivi com as histórias contadas sobre ele”, frisa. “Meu avô inspirou várias gerações, é um orgulho que segue de geração em geração”. Fernando Costa de Aguiar tinha dez anos quando visitou pela primeira vez o Parque; era 1945. Hoje tem 85 anos. Muitas das histórias do avô Bento e da família de Aguiar passaram pelo corredor e salões do teatro. Agora, o neto está empenhado em manter viva a memória do comendador como empresário idealista. As paredes, o piso, os lustres. Cada fração do cineteatro, o relato das reformas por que ele passou, as amizades com artistas como o teatrólogo Valdemar de Oliveira, e os momentos de glória do Parque fazem o olho de Fernando de Aguiar brilhar.

Atenção às paredes restauradas do corredor citado pelo neto do comendador e que servem de guia para o fundo do Parque. Elas são obras de arte. Com técnica francesa denominada “símile pierre”, reproduzem argamassa com delicada aspereza personalizada e pinturas decorativas em efeito de blocos calcários. Os tons terrosos prevaleceram sobre os ambientes restaurados. Nesta reforma de 2020, houve um cuidado para que as cores das pinturas não concorressem com as cores da reforma de 1929, conforme dizia o projeto da obra de restauro. Tonalidades de ocre, branco, rosa e cinza, típicas da mesma pedra, completaram a harmonização.

“Note: a equipe parou e precisou entender para qual momento histórico iríamos levar o Teatro do Parque e, a partir de pesquisas, chegamos a um porquê para esta escolha”, frisa Otávio Calumby, secretário de Projetos Especiais da Prefeitura, responsável pela obra no último ano da gestão de Geraldo Julio. “Tivemos um grande cuidado com a história do prédio”, reforça. Se, no passado, as paredes receberam fina argamassa pintada, para oferecer a “impressão de se tratar de superfície pétrea”, agora, via-se a satisfação nos olhos de um engenheiro químico que se dedicou à obra e compôs uma argamassa de aparência parecida à usada naquela década. Esta alquimia, que chega para aproximar um passado de quase 100 anos, surgiu de um homem que

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foi abraçado pelo Recife: Samir Ahmad Abu Laila, de origem palestina. Samir esteve sempre disposto, voluntariamente, para colocar à prova a sua perícia técnica em favor do resgate histórico de cada parede. Imprimiu ritmo, dedicação total para encontrar a fórmula perfeita entre cal, areia, pó de pedra, caulim (espécie de argila) e demais composições para formar um composto cimentício especial, que aderisse à estrutura já existente. “Não adaptamos. É um processo completamente artesanal”, afirma. Todas as paredes do teatro precisaram de intervenção. “Aqui no Brasil, a gente não tem coisas ou materiais prontos para que a gente possa atingir esse objetivo, então tem que ir muito na tentativa e erro”, explica. O corredor de entrada do Teatro do Parque é atualmente composto pela seguinte sequência: uma galeria com prolongamento para o salão dos espelhos, bilheteria e foyer. A partir da bilheteria, há duas saídas: a da frente leva ao jardim; à esquerda, ao foyer. Nesta reforma de 2020, um portão de ferro que dividia estes ambientes e ficava perto dos guichês de compra de ingresso foi retirado para proporcionar melhor circulação do público por toda área que circunda a plateia, em especial antes dos espetáculos.

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Ambiência das fotos amareladas para os dias de hoje

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otografias estampando imagens de elegantes senhores de terno completo branco, alguns de chapéus, em filas sobre o piso da galeria do Parque, confirmam uma informação encontrada durante a reforma. Em um canto, havia um conjunto de 14 peças remanescentes de um antigo piso de mosaico. Estavam discretas, assentadas como espécie de soleira em um vão próximo da plateia. A reconstituição do piso de ladrilho virou um desejo de quem se envolveu com esta obra recente do Parque. No último biênio, fase final da execução do projeto, os recursos para ele foram aprovados.

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“Cadê seu Amaury (um experiente mestre-artífice em estucaria que fez parte da obra)? Ele não faz molde?”, questionou alguém. Seu Amaury confeccionou a fôrma. Uma pesquisa da equipe de restauro mostrava que o belíssimo mosaico havia sido removido na reforma de 1980 e trocado por uma cerâmica. “Tínhamos a descoberta do ladrilho hidráulico, mas a gente precisava entender mais sobre os encontros das peças, o modelo exato. Um dia, fui tomar um café na Livraria da Praça, em Casa Forte, quando observei que lá havia um mosaico idêntico. Eu parecia um louco, fotografando os arremates e encontros”, conta o engenheiro Pau-


lo Carvalho, que respondeu tecnicamente pela obra civil de 2018 a 2020, junto com o engenheiro Epitácio Gomes - ambos da construtora Multicon Engenharia. No dia seguinte ao café, Paulo foi recebido pelo proprietário da livraria, que abriu o estabelecimento apenas para ele completar o estudo. Calcula Paulo Carvalho que, para se chegar a este piso mosaico, foram de três a quatro meses de testes.

“É um trabalho feito em Pernambuco. Mão de obra local, assessoria técnica daqui e pessoas do estado que se empenharam nesta reprodução”, afirma

Otavio Calumby, sem esconder a alegria da origem do planejamento à execução. A empresa Ladrilho Olinda produziu o piso projetado, em alto-relevo e com combinação de cores. E foi assim que a grande área do mosaico de entrada reconquistou a sua identidade. O novo piso de mosaico segue até o hoje denominado “foyer” (em 1929, chamado de hall), um espaço de convivência às margens da plateia.

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A pergunta silenciada: E os espelhos?

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salão dos espelhos emparelhados volta a compor os afetos dos antigos frequentadores do Teatro do Parque e conta vasta história para os mais novos, como a tataraneta do comendador, Giovanna, de 14 anos. Doze lâminas de espelhos, seis de cada lado, medindo 3,20 metros de altura por 70 centímetros de largura. Sem moldura, com 6 milímetros de espessura. Contornando-os, há uma iluminação especial em tom amarelado, o que acaba por valorizá-los. Os espelhos estão afixados no segundo salão do corredor de entrada, conforme na década de 1930.

“E no dia 29 de julho deste ano (1929) o Cine Parque abria seus salões suntuosos, com seus espelhos verticais imensos e numerosos, para as exibições do filme da Metro-Goldwyn-Mayer” (11). Todas as informações sobre os espelhos indicam que eles foram instalados em 1929. A galeria dos espelhos se manteve até início da década de 1960. Ninguém, à ocasião, soube explicar o destino dado àquele patrimônio. E a indignação parecia proliferar no Recife: contou com a pressão do jornalista e crítico teatral Adeth Leite, do Diario de Pernambuco, que encerrava as suas crônicas com a pergunta: “Onde estão os espelhos do Parque?”. (12) Somente na década de 1980, a composição de um salão de espelhos teve reedição no teatro - foram instalados no primeiro salão, como em 1915. Agora, ganharam destaque no segundo salão do corredor de entrada - conforme reforma promovida pelo grupo Severiano Ribeiro.

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Lustres como os da realeza

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novo cineteatro do Parque é garimpo de preciosidades. Lição de história, arquitetura e de costumes.

Nas mãos de Euclides Lucena, ficaram o destino e restauro dos quatro lustres que impressionam os visitantes do novo Teatro do Parque. São dois magistrais lustres idênticos ao modelo imperial, que lembram pinhas; e um terceiro que ganhou cobertura branca e cristais. E o último lustre, cuja descoberta comoveu: o chandelier de 21 braços de fabricação da F&C Osler, marca inglesa, fundada em 1807 e que produzia encomendas da Rainha Vitória. “Oh, isso é história! Muita história que tem por trás desse nome importante”, suspira Euclides Lucena, falando sobre as minúcias do ofício que o motiva. O chandelier F&C Osler foi içado e encanta hoje a área do foyer, após tilintar a 20 quilômetros por hora desde o bairro da Torre até a Boa Vista. Na Torre fica o ateliê de Euclides Lucena, mestre artífice de metais reconhecido para além de Pernambuco. Lucena participou de inúmeros leilões no estado de São Paulo e em cidades do Sul para achar os elementos para os lustres, próximos do conceito original ou que ajudassem numa reestilização com base histórica. Às vezes, o rastreio visava um mínimo prato, copo que cobrisse lâmpadas ou espécies de pirulitos frágeis de cristal. Juntava até 600 peças miúdas para compor um único lustre dos que estão pendurados nas principais salas do Parque. Os lus-

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tres substituíram os que fizeram parte da decoração de 1929; eles passaram a integrar o acervo do teatro a partir da década de 1960. O aproveitamento deles foi a melhor opção encontrada pelo projeto de restauro. Faziam parte do cenário do teatro e poderiam ser recuperados ou reestilizados, afora não haver qualquer outro registro documental quanto ao destino dos lustres de 1929. Euclides Lucena é neto do dono da antiga Fundição Capunga (E. Lucena S/A, fundada em 1932) e toda a família tem tradição na funilaria. Com o avô e o pai, enquanto moldava soldadinhos de chumbo, aprendeu a profissão. No Parque, além dos lustres, fez o restauro de oito placas das inaugurações e reinaugurações. Por meio da galeria das placas do Parque, percorre-se a história do teatro.


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Plateia e camarotes em traje de gala

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m par de cadeiras com espaldar alto estava em suspiros agonizantes numa sala do fundo do teatro. Estilo similar ao das adotadas em salas de cinema do Brasil do início do século XX, eram duas relíquias da mobília do Parque. Sabe-se que a do cine Santa Cecília (inaugurado em 1930, em São Paulo) era análoga. Imponentes e elegantes, as duas cadeiras serviram de referência estilística para a encomenda das novas cadeiras dos camarotes do novo teatro. O mobiliário do Parque era afeito a elogios da imprensa: “O mobiliário é de apurado bom gosto, parte fabricado pelos srs. Ramos & Moreira e parte de procedência do Rio Grande do Sul”, conforme visto em A Província, em 1915. (13) Falavam das cadeiras as resenhas sobre a exibição do filme de “Ben-Hur”. As recém-adquiridas cadeiras para os camarotes estão agora dispostas em 22 cabines, em grupos de seis ou oito. Têm, contudo, espaldar baixo. A preocupação da reforma atual era buscar uma opção de cadeiras com espaldares menores para oferecer mais conforto ao público. As últimas disponíveis no ambiente dos camarotes, remanescentes da década de 1980, tinham encosto com altura ultrapassando os 80 centímetros do gradil metálico do guarda-corpo, uma peculiaridade que impedia a visão dos espectadores e os deixava vulneráveis à altura.

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Já as poltronas da plateia, da década de 1930, haviam sido vendidas e trocadas no ano da desapropriação de 1959 por parte da Prefeitura do Recife. Desde então, as de 1959 vinham passando por mudanças apenas quanto à aparência dos estofados. Na busca por peças do fabricante original para a reforma das atuais poltronas, descobriu-se que a empresa da década de 1960 continuava na ativa. Era a Kastrup. E foi ela que fez o serviço. As 637 poltronas que acomodarão o público da plateia no piso térreo tiveram madeira e ferragens restauradas ou trocadas. Agora os assentos são de acolchoado, feito de material antichamas, coberto com tecido alinhado marrom-escuro. O piso deste ambiente é um outro mosaico em tons terrosos, também recuperado. Antes, um vinílico tipo paviflex plástico o encobria. Toda a área em torno do camarote no piso superior se mantém cercada por um belo guarda-corpo: um gradil de serralharia com aplicação de ornatos de chumbo fundido, remanescente da construção original de 1915. Para este gradil, a recente equipe do restauro de metais precisou fabricar mais de 800 rosetas de ferro; eram detalhes que estavam danificados. “Tivemos muito trabalho porque eram detalhes boleados. Também nos preocupamos com a questão do alinhamento e, quando dava diferença de um centímetro, era preciso refazer, como de fato aconteceu”, diz Adgilson Pereira Correia, proprietário da empresa Serviços de Montagens de Máquinas Industriais, que cuidou deste restauro.


“A exigência da perfeição foi grande”, completa. Para não prejudicar a estética, as peças de ferro foram montadas sem solda, em espécies de encaixes. Por determinação das atuais normas de segurança do Corpo de Bombeiros, foi acrescentada uma estrutura com discreto vidro sobre elas visando evitar riscos ao público.

Uma outra raridade da plateia é o longo corrimão de madeira maciça de luxo, confeccionado em pinho-de-riga, ou pinheiro-silvestre, uma espécie avermelhada, oriunda da Europa Central. O corrimão contorna o camarote, em formato de ferradura, que resvala para o palco.

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Para as colunas, o regozijo

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entinelas da boca de cena e do palco, elas poderiam ser figurantes de poucas falas; mas se elevaram a coadjuvantes respeitadas nesta obra de restauro. As colunas e pilastras que sustentam a estrutura da plateia abrem margem para uma longa resenha por parte de gestores, arquitetos, engenheiros e restauradores, satisfeitos com o resultado que poderá ser visto pelo público. A complexidade deste item de pintura pode ser traduzida com minimalismo métrico: “(...) A profundidade da cava não deverá exceder 1,5 cm e a altura da mesma deverá ser suficiente para acomodar uma cinta de 2,5 cm a ser confeccionada com recorte de malha de aço inoxidável (...)”, lia-se entre as recomendações do projeto para a intervenção promovida de 2020. Antes de os artistas da pintura entrarem em cena, técnicos da obra civil deram atenção dobrada à reconstituição da base das colunas que sustentam a laje do camarote (A própria laje é uma raridade da engenharia, datada de 1915). Verificaram-se nas colunas comprometimentos estruturais derivados da corrosão metálica interna; e fissuras externas graves na capa do entorno das colunas. Já no primeiro momento da obra do Parque, em 2013, via-se que o quadro “apontava uma série de reparos estruturais para a preservação do imóvel”, lembra o secretário do Gabinete de Projetos Especiais da época, João Guilherme Ferraz. “Todos os ambientes e estrutura do casarão precisavam ser recuperados”. Depois, “ficou evidente a necessidade de ir além de uma reforma e requalificação”, conta.

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“O Teatro do Parque precisava, e merecia, um cuidado diferente e nós apresentamos a proposta de também realizar uma significativa obra de restauro”. A investigação histórica, com a retirada das camadas de tintas sobrepostas, trouxe novidades dia a dia. A maior descoberta histórica quanto ao conjunto de pilastras se deu na parte intermediária entre a extremidade superior e a base, chamada de fuste, de uma das estruturas: um marmorizado em cor azulada. A coluna foi restaurada e serviu de padrão para as demais, que acabaram pintadas com modelo semelhante ao mármore. Chegam a confundir um leigo desavisado. As colunas da plateia (14 ao todo), do hall de entrada (estas são oito) e da bilheteria (duas) foram vestidas por círculos de gesso na parte alta (os capitéis), e outros adornos. Muitas das quais representavam a intervenção de 1929 que fundiu estilos de épocas diferentes, como Art Déco e o clássico Jônico, com linhas mais leves. Quem dá aula sobre técnicas construtivas do passado arquitetônico e estilos de ornamentação é seu Amaury de Queiroz, mestre artífice, especialista em estucaria e moldagem em gesso. No Parque, seu Amaury cuidou do feitio do teto de áreas como o foyer e de detalhes decorativos que reconstituíam, muitas vezes, pedaços de ornatos rebuscados, cujos protótipos estavam estampados em fotos antigas. “Olhe, se me chamam, primeiro cuido do diagnóstico. Sem o diagnóstico, não tem como fazer. Me preparo muito para apresentar este estudo”, diz.


Seu Amaury perdeu as contas de quantos moldes de metros de frisos de contas, folhas de acanto, corações, capitéis e modilhões (peças acima do capitel) reconstituiu no Parque. A equipe dele era cobrada ainda para a recuperação ou recomposição de arestas, curvas, contracurvas e reentrâncias. “Outra coisa: tem de prestar atenção porque parecem iguais, mas são diferentes. Preciso de peças que façam simetrias e se encaixem”, destaca ele.

fessor. Ensina a prática a arquitetos e outros profissionais graduados que querem se especializar nesta área. “Se você pergunta para mim qual o meu estilo, eu respondo: conservador. Gosto de preservar o passado”, diz ele, que já participou do restauro de igrejas e prédios importantes em Pernambuco, como o edifício do Chanteclair, na avenida Rio Branco, e a Faculdade de Direito, mais recente.

Conhecedor de uma prática exercida ao longo de 30 anos, em uma escola para restauradores ele é pro-

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O jardim dos encontros

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ente de prestígio e de posses da sociedade frequentava o Parque. E o jardim era atração para esse público. O jardim que acomodou belas mulheres, exibindo chapéus armados e comprados no movimentado comércio dos bairros da Boa Vista, São José e Santo Antônio, continua cercado por frondosas árvores. E pelo verde de um jambeiro, sapotizeiro, mangueira, palmeira e uma cerejeira silvestre. “O jardim era um ponto de encontro. Meu avô pensou em um teatro tropical, então esse jardim era área importante e muito agradável. Lembro que as pessoas gostavam de tomar sorvete”, menciona o neto do comendador, Fernando Costa de Aguiar. De 1915, resgata-se esta descrição sobre o jardim:

“Cerca de 200 mezas e 500 cadeiras estão dispostas no jardim que dispõe de farta iluminação electrica, extensiva também à arborização”. (14) “Este era nosso objetivo maior: manter o sombreado”, explica Simone Osias. Embaixo das copas, os antigos bancos de argamassa armada oferecem espaço agradável para o público que espera um espetáculo ou que o visita desejando uma experiência arquitetônica. No centro do atual jardim, um grande círculo de granito delimita área que servirá para saraus e outras apresentações diurnas. Para manter a perfeição das lâminas circulares, o granito foi cortado a jato d´água, serviço feito por empresa de Minas Gerais.

Para recompor a atmosfera de um teatro tropical, adaptando-o às necessidades dos dias de hoje, dois jardins verticais foram acrescentados após reforma do Parque. Além da função decorativa, eles servem para encobrir paredes construídas e que poderiam deixar interferências visuais. Os jardins verticais estão defronte à casa das bombas e motores de refrigeração e cobrindo a edificação erguida para separar o pátio dos artistas. Por trás deste muro de plantas verdes, o pátio é área reservada para os novos e bem equipados camarins. Aos olhos dos novos visitantes do Teatro do Parque, o jardim se presta a observatório de um telhado feito de placas na cor vermelha e branca em forma de losangos e sobreposto - um restauro feito a muito suor. Assim era a coberta de todo o teatro em 1915 e foi replicada em 1929, quando construíram o foyer e a bilheteria, mas delas só restava esta área resumida. “Eram telhas importadas e representavam inovação tecnológica (...)”, lembra a arquiteta restauradora Simone Arruda. O teatro tem telhas que seguem inspiração francesa. É inclinado, ao estilo europeu (dos usados para evitar acúmulo de neve). Está previsto no projeto, mas quem o tirou da teoria foi uma dupla de profissionais da construção civil. “Aqui na obra tem um encarregado que todos chamam de ‘professor Pardal’. Ele gosta de pesquisar, de inovar. Nós o chamamos e lhe demos a missão”, conta o engenheiro Paulo Carvalho.

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“Paulo, vou então fazer um expositor para meus testes”, disse Antônio Marcionilo, o professor Pardal. “Está dando certo assim?”. “Não? Vamos ajustar a cor e o material”. A constituição original era de amianto, um produto hoje proibido na indústria por causar graves riscos à saúde. “Desenvolvemos então revestimentos em cimento muito semelhantes”, conta o engenheiro.

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“Paulo e equipe foram determinantes nesse item; um desafio que ele tomou para si”, informa Arruda. O jardim, que outrora era exaltado como lugar aprazível e que acabou por elevar o Parque ao destaque por ser exemplar raro de teatro-jardim no Brasil, volta a ter o cenário bucólico e tropical desejado pelo comendador.


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Fachada: a simplicidade reluz

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or dentro, o Teatro do Parque é um gigante, amplo e cheio de divisões. Por fora, a entrada é estreita e lembra a de um sobrado. Existe explicação para esta composição; está na divisão dos imóveis do casario da família após a morte do comendador Bento de Aguiar. A fachada agora é cinza, com frisos em prata em contorno. São adornos que seguem o fundamento do restauro do Parque, baseado em 1929 - avisa-se para quem espera reencontro com memória mais recente, construída por faixas verticais em arco-íris. A opção do restauro justifica esta opção argumentando que o “cromatismo adotado na intervenção de 2000 era uma configuração que se distancia do caráter de arquitetura e tratamento estético da década de 1930”. Os estudos realizados sobre a pintura desta fachada mostraram que ela havia sido pintada integralmente em prateado no ano de 1929.

O portão de ferro fundido passou por grande restauro. Em 1915, a porta de entrada do teatro era “(...) constituída por uma grande cortina de ferro ondulada, dividindo-se em 3 secções, havendo de cada lado um guichet para a venda de bilhetes (...)”, conforme detalhou matéria no jornal A Província. Entre a década de 1930 e a intervenção de 1980, usava-se uma grade de enrolar, tipo esteira de aço. Ao fim da obra da década de 1980, adotou-se o portão atual, que se apresenta com referências à estética neogótica. É um portão produzido originalmente pela Fundição Aurora. Toda a estrutura metálica do Parque ganhou restauro e iluminação moderna para destacar o endereço mais famoso da Rua do Hospício e atrair a atenção de quem passa.

O nome afixado no cume da fachada, em letras garrafais, parece nobre e é acompanhado por uma nova placa luminosa da lateral. O letreiro volta a exibir painel em vitral de calha de chumbo, semelhante ao usado na década de 1930. Parte das gambiarras de fios de telefonia e ligações elétricas, que interligavam postes do lado oposto da rua impediam a visualização da fachada do Teatro do Parque, foram retiradas. A visão melhorou para quem está sentado numa cadeira da lanchonete Estrela, de propriedade de seu Joaquim Argemiro.

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Herança e o grande desafio da obra civil

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Parque é vizinho de uma sequência de edificações geminadas; muitas das quais passaram por transformações. Imóveis próximos elevaram o terreno ao longo das décadas. Com as intervenções pontuais, quem mais sofreu foi o teatro. Tendo um sistema de drenagem antigo, qualquer chuva era suficiente para fazer com que a água minasse por todos os lados e aflorasse do piso. Simone Osias conta uma história curiosa e ilustra o tamanho do problema que já ameaçava o funcionamento do teatro décadas atrás.

O comendador Bento de Aguiar inaugurou o Teatro do Parque em 24 de agosto. A obra custou 200 contos de réis, moeda da época. Foi realizada pelo engenheiro McGregor. Funcionava como extensão do Hotel do Parque. Os dois empreendimentos compunham um complexo chamado de Parque de Diversões.

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O empresário Luiz Severiano Ribeiro arrendou o Teatro do Parque (somente o teatro). Promoveu grande “remodelação”; teve despesa de 300 contos de réis (mais que o valor da construção), com o objetivo de transformar o prédio em um cineteatro com a ambiência dos palácios de exibição de filmes hollywoodianos. A reinauguração deu-se em 29 de julho de 1929.

Certo dia, uma chuva torrencial inundou o espaço, imprevisto que seria impedimento para um espetáculo vindo de outro estado. Às pressas, arquitetos precisaram dar uma solução. Abriram um buraco imenso perto do palco e, com a ajuda de uma bomba, a água inundada foi sugada. Anos depois, quando se iniciou análise para uma outra reforma, alguém sugeriu que a passagem deveria ser um fosso antigo. Havia sido apenas uma saída desesperada para um rápido escoamento do alagado. Entre os técnicos e autoridades ouvidos para este livro, muitos deles citam a drenagem e a necessária impermeabilização dos pisos como um dos

A Prefeitura do Recife, sob comando de Pelópidas Silveira, desapropriou o Teatro do Parque em 28 de abril, com o objetivo de que ele voltasse a servir a pautas populares e educativas. A negociação custou Cr$ 8.100.000,00 - oito milhões e cem mil cruzeiros. Foi reinaugurado em 13 de dezembro, após dois meses de reforma.

A gestão de Augusto Lucena como prefeito do Recife promoveu nova reforma. As principais intervenções foram o fechamento lateral da plateia, a instalação de um forro sobre o salão da plateia e mudanças realizadas no proscênio e camarotes.


maiores desafios desta obra de reforma e restauro. O sistema de drenagem comprometia gravemente a plateia. Por vezes, como o terreno é mais baixo que o nivelamento da maior parte do entorno da área, os substratos do solo do salão em que ficam as poltronas causavam forte pressão sobre o mosaico e alvenaria. A água chegava a atravessá-los. Para resolver o problema, foi necessário projeto específico. No telhado, o problema eram as infiltrações. “Além disso, tinha muito problema de mofo e cupim”, pontua Diego Rocha, presidente da Fundação de Cultura. “Essa primeira etapa tirou todos esses problemas que havia no teatro. Literalmente arrancamos as coisas que estavam estragadas. De-

A prefeitura interditou o Parque, após a queda de parte do teto e princípio de incêndio. Após dois anos e meio fechado e em reforma, foi reinaugurado em 28 de outubro de 1988, na gestão do prefeito Jarbas Vasconcelos. De grande impacto, fez-se a reabertura do salão da plateia, foi retirado o forro desta área e o fosso da orquestra acabou encoberto pelo prolongamento do palco.

mos esta estabilidade ao prédio em 2015 para 2016, na primeira etapa”. Esta é a maior reforma desde a fundação do Parque. O cineteatro, contudo, sofreu inúmeras intervenções de grandes e pequenos portes, que mudaram o conceito da divisão de cômodos ou grandes áreas. Sobre as principais, compilamos um resumo da linha histórica do teatro a partir da inauguração feita por Bento de Aguiar:

A reforma deste ano, também promovida pela Prefeitura do Recife, ficou centrada na instalação dos sistemas de climatização com ar-condicionado e tratamento acústico para a plateia. O mural de boca de cena ganhou repintura. O Parque foi transformado em Imóvel Especial de Preservação (IEP) do município em 2001.

A Prefeitura do Recife iniciou projeto de reforma em 2013. Começou os trabalhos em 2015, mas logo os interrompeu. Em 2018 eles foram retomados até serem concluídos, na gestão de Geraldo Julio. A Fundação de Patrimônio Artístico e Cultural de Pernambuco (Fundarpe) prevê que nos próximos meses concluirá o processo de tombamento do conjunto arquitetônico.

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tomar cafés, admirar o casario, igrejas, e se dirigiam à casa de familiares. Ou apenas rumavam para o trabalho. De toda maneira, muitas vezes a Boa Vista constava no caminho entre dois pontos do Recife.

“O Teatro do Parque tem esta característica: hoje as pessoas não só vão; estão”, diz o atual secretário do Gabinete de Projetos Especiais que entregou a obra, Otávio Calumby. “Há um pertencimento com relação ao bairro. A sensação de pertencimento é a cereja do bolo”. Não é à toa que, ressalta, quando se trata deste bairro, “as pessoas se referem a ele como ‘a cidade’”. É como se ali, naquelas quadras, estivessem o resumo do Recife inteiro.

Um clarão para toda a Boa Vista

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esde o início do século XX maxambombas (considerado o primeiro trem urbano da América Latina, circulou até 1916) e bondes tinham estações no bairro da Boa Vista. Os destinos se multiplicaram e incluíam os bairros de Apipucos, Encruzilhada, Beberibe e Campo Grande. Circulavam pela Rua do Príncipe, Gervásio Pires e seguiam espalhando progresso. “No caminho onde ela passava, começavam a construir mansões”, afirma o historiador José Lins Duarte, em sua dissertação “Recife no Tempo da Maxambomba”, O Primeiro Trem Urbano do Brasil (15). O trem acabou por se firmar como “vetor de progresso da cidade”, diz Duarte. As cercanias do Parque concentravam quem ia à ou passava pela “cidade”. Caminhantes paravam para

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Esta característica faz do Parque “diferente de todos” os outros equipamentos culturais deste setor, afirma Otávio Calumby, citando o Santa Isabel, o Apolo, o Barreto Júnior. E torna a obra de reforma e restauro, segundo ele, “mais significativa”. Do Parque e da Boa Vista, Otávio Calumby fala com facilidade e conhecimento: ele e as duas irmãs perambulavam enquanto meninos e jovens por este bairro, levados pelo pai, Fernando, e a mãe, Tereza. “Avenida Manoel Borba, Foto Beleza, Praça Maciel Pinheiro. Minha vivência, da infância à adolescência, meu primeiro emprego. Todo o meu passado passa por ele”, pontua. Seu Fernando e dona Tereza ainda moram na Boa Vista e, por certo, serão frequentadores do novo Parque. Como gestor, a expectativa de Otávio Calumby é de que o novo Parque abra um clarão para a cidade. Re-


vigore “a efervescência” da Boa Vista, nas palavras dele. Para este movimento se consolidar, destaca, a entrega da obra do teatro foi precedida por outra ação da área. Meses antes da reinauguração do novo Teatro do Parque restaurado e equipado, a Prefeitura do Recife concluiu a requalificação da Boa Vista, obra que custou na ordem de R$ 15,7 milhões e teve como ponto central a “humanização” da avenida de mesmo nome, dando prioridade aos pedestres e transportes públicos. “Devolvemos a possibilidade de as pessoas caminharem pelas calçadas”.

O projeto de requalificação das vias do bairro da Boa Vista envolveu o alargamento das calçadas, 2 mil metros quadrados de passeio, qualificação do piso, instalação de floreiras e lixeiras e inauguração de quiosques para 100 comerciantes populares. Na região da Boa Vista e bairros Santo Amaro e Soledade, houve a implantação de mais de 12 km de infraestrutura cicloviária, pontua informe da Prefeitura.

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Pernambuco e a cena dos anos de 1930 a 1950

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s teatros dependiam dos bondes e era comum que empresas teatrais pedissem que os trens esperassem os frequentadores dos espetáculos, quando passava da meia-noite, ainda que o custo da passagem fosse dobrado neste caso (16). Antes as maxambombas tiveram seu papel na expansão do Recife e, por consequência, na Boa Vista. No ciclo que se deu entre a década de 1930 e 1950, Recife “respirava um ar de modernidade”, diz o pesquisador, crítico de cinema e jornalista Alexandre Figueirôa (17).“Nas áreas de transportes, comunicações, infraestrutura urbana com “ruas largas e vilas operárias das fábricas têxteis (...)”. A cidade estava entrando nos anos 1930, conquistava novos espaços urbanos e figurava como sendo a quarta do Brasil quando se tratava de população. A vida “mundana ficou mais animada”, com o surgimento de clubes esportivos, como o Internacional e o Português, que surgiram nesta época, lembra Figueirôa, que realizou estudo para o projeto Obscuro Fichário Para Artistas Mundanos (2020). Bailes de elite surgiam. “As salas de teatro e de cinema conquistaram novas plateias”. A Rádio Clube, conhecida pelo slogan de “PRA-8, a pioneira”, foi inaugurada em 1919, o que contribuiu para o incremento da vida artística. Havia uma intensa atividade cultural. Ganharam relevância ensaístas e romancistas, que participa-

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vam “ativamente das tertúlias e dos recitais de músicas”, diz o pesquisador no estudo. Foi época em que Gilberto Freyre organizou no Recife a Semana Regionalista do Nordeste (1926). Ascenso Ferreira, Manuel Bandeira, Joaquim Cardozo, Mário Sette e Lucilo Varejão também são escritores citados entre os destaques. Muitas mudanças e transformações moldaram preocupações de autoridades do governo. Houve endurecimento do controle estatal. Em 1927, o governo Estácio Coimbra criou um código de normas direcionado aos divertimentos, intitulado Instruções Regulamentares para Teatros e Diversões, e logo depois um setor específico, a Seção de Teatros e Diversões Públicas - lembra Figueirôa, citando ainda a tese de doutorado da historiadora Sylvia Couceiro (18). O ritmo frenético, tomado pelo lançamento de comédias de operetas e revistas vindas de outros estados, se manteve temporada a temporada a partir de 1930. O Teatro do Parque já era parte do circuito, junto com o Teatro de Santa Isabel e o Teatro Moderno. O Recife do início dos anos 20 era o retrato de uma década que acabou marcada por uma grande transformação social, cultural, das artes, da política e do reordenamento territorial em Pernambuco. Havia intenso fluxo migratório de muitos agricultores para as fábricas nos centros urbanos. No campo político, tinha-se notícias de rebeliões dos oficiais de baixa e média patentes do Exército, movimento que ficaria conhecido como “tenentismo”.


Naqueles tempos, banho de mar era recomendado para fins terapêuticos. Nas ruas, pregões tomavam o bairro da Boa Vista, segundo lembra o historiador e escritor Leonardo Antônio Dantas. Assim como o comércio formal e informal. Tinha o “homem do munguzá, com as duas latas de flandre penduradas pelo galão apoiado ao ombro, cantava em ritmo de marcha marcial – “mamãe não chore /que a guerra não vem aqui / alemães só tomaram o sul / do Brasil (bis) / mamãe lá vem / o homi do munguzá (bis) / ó meu filhinho, chame ele pra comprá”; o homem do cuscuz, com o seu tabuleiro de flandre equilibrado à cabeça; o miudeiro, com o seu tabuleiro deixando aparecer os pés do boi (mocotó); o padeiro, com a sua voz de baixo cantante a despertar do sono alguns retardatários – “pães fresquinhos/ pães quentinhos/ pães de dois por um tostão/ pães franceses, portugueses/ que bonzinhos que eles são…” (19). Circulavam na década de 1920 no Recife os jornais Diario de Pernambuco, Jornal do Recife, A Província, Jornal do Commercio, Diario do Estado. E os vespertinos Jornal Pequeno, A Rua, A Notícia, A Noite e as revistas ilustradas, A Pilhéria e Rua Nova. (20) Os leitores eram cidadãos com maior instrução e recursos financeiros. Mas havia uma maioria na capital pernambucana; e ela era descrita assim pelo poeta Manuel Bandeira: O Recife era onde “a vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros / Vinha da boca do povo na

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língua errada do povo / Língua certa do povo / Porque ele é que fala o gostoso português do Brasil.” Neste Recife, o Carnaval desfilava pelas ruas do Hospício, Nova, Imperatriz e da Princesa Isabel. E a escritora Clarice Lispector usufruía da infância como moradora do nº 347 da Praça Maciel Pinheiro, vizinhança do Parque. Na praça, hoje, há uma estátua dela para lembrar do passado que a encantou. O Recife dos anos 20 e 30, para Clarice, mesclava lugar, pessoas e impressões. Deixou na vida da escritora marcas, preenchidas por meninos flanando em uma paisagem cheia de afetos e vasta produção literária. Pelo centro da cidade deste tempo, ela brincava, ia ao colegial e frequentava espetáculos teatrais ao lado das irmãs, Elisa e Tânia (21). A ucraniana Clarice Lispector, que veio a se tornar uma das maiores escritoras da literatura brasileira, morou no Recife dos cinco aos quatorze anos. Em maio de 1976, um ano antes de sua morte, esteve em Pernambuco para proferir uma palestra.

“O Recife continua existindo em Clarice?”, perguntou o jornalista José Mário Rodrigues, ao que ela respondeu: “O Recife está todo em mim”. (22) “De uma forma muito presente, porém, a cidade interage com quem nela vive. O indivíduo e a cidade não se fundem, mas se interligam numa troca profunda. E com Clarice não foi diferente. O Recife estava sempre todo vivo nela”, diz Henrique Inojosa Cavalcanti (23), pesquisador que estudou a

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escritora e o encontro dela com o Recife. A memória mais afetiva a que Clarice se referia correspondia à época da primeira reinauguração do Parque (1929). A reabertura do teatro agora em 2020, por coincidência, foi marcada para 11 de dezembro, dia seguinte ao centenário de Clarice.


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Com a instalação de aparelhos da Western Electric Company, em março de 1930, o grupo estrearia duas grandes novidades: o cinema sonoro e o falado. Luiz Severiano Ribeiro expõe seus planos e distingue os modelos em entrevista ao Jornal do Commercio: o filme sonoro é inteiramente dialogado, sem legendas; o segundo, falado, tem os ruídos, música e “algumas interjeições” (25), dizia Severiano.

A inovação de ontem e de hoje

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o Parque, “cinema dos grands films, o mais bello, confortável e luxuoso do Norte e Nordeste do Brasil”, a atriz e cantora Pola Negri é evidenciada como “soberana nas telas” (24) em “Morta para o mundo”, uma produção da Paramount com Warner Baxter e Tulio Carminatt.

“Morta com seu passado que ela propria matara. Pola sofreu as angustias de duas mulheres: a mulher que ella fôra e a mulher que ella viera a ser”. No Parque, “às 18 horas e ¼”, dia 27 de agosto de 1929. A pauta era concorrida. No dia seguinte, Clara Bow estrelava “Me leva para casa”; no sábado seria dia de “Pecadora sem mácula”, com Norma Talmadge e Gilbert Roland. Aqui, um mês após a reabertura do Parque pelo grupo Severiano Ribeiro, o cinema ainda era mudo.

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A “Divina Dama”, dia 24 de março de 1930, inaugurou o cinema sonoro, produto desta vez da First National com distribuição Paramount. “Um soberbo film cantado, musicado e synchronizado”, dizia anúncio (26). Matinée às 12h e 14h e soirée às 18h e ¾ e 20h e ¾. Na telona do Parque, no dia 31 do mesmo mês, Anita Page, Charles King e Bessie Love estrearam o cinema falado com “Broadway Melody”. Letreiros destacáveis em jornais anunciavam: Uma produção Metro-Goldwyn-Mayer “cantada, falada (mas com legendas sobrepostas de portuguez), bailada e musicada”. Ao som de “You Were Meant for Me” (Você Foi Feito Para Mim, em tradução livre). “Não percam a oportunidade de assistir a esse formidável romance e ouvir a voz de Corinne Griffith”, anunciava a revista Pra Vocês (27). Naquele ano, “Broadway Melody” ganhou o Oscar de melhor filme. A modernidade do cinema falado gerou grande debate em jornais e revistas. Como se pode constatar a partir de pesquisa, já naquela época havia polêmica em torno do Parque - um teatro sobre o qual até hoje muitos sentem necessidade em deixar uma opinião. “(...) É por isso que eu creio que o cinema falado só poderá prevalecer sob o aspecto de revista (...) como


cinema é a maior droga que já se fez. Mas a gente não vê com olhos de cinemáticos - aceita-o como divertimento, como pretexto de distração (...)”, dizia o crítico da tradicional coluna Theatro & Cinema, do jornal A Província logo após a estreia do cinema falado, em 1930, no Parque. Pede-se aqui um aparte para se falar da modernidade, da cena atual e das primeiras impressões provocadas pela recente reforma e restauro do Parque:

“Uma joia assim existir numa cidade tão destruída e descaracterizada como a minha me espanta e me deixa feliz, e lembra que Recife talvez seja mais contraditória do que outras cidades. Recife lembra a fábula russa, ‘a cobra troca de pele, mas não de

coração’”, diz o cineasta, diretor e roteirista de filmes Kleber Mendonça Filho (28). Ele esteve no Teatro do Parque no início de dezembro de 2020, uma semana antes da reinauguração. No quesito técnico, o novo teatro traz o que há de mais moderno. A nova tela preenche o espaço de abertura do palco do teatro, uma tela que equivale à dimensão de 10,5 metros de largura por 4,40 metros de altura. Os filmes serão exibidos em projetor DPC da marca Christie, resolução 4K, com possibilidade de tecnologia em 2D ou 3D. Os óculos que ajudarão no efeito tridimensional serão disponibilizados ao público a depender da rotina pós-pandemia do coro-

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navírus, que implica protocolos rígidos de compartilhamento de objetos. A administração do Parque disse, em conversa com cineastas, que no futuro a cabine pode receber o projetor analógico 35 mm que se encontra sem uso no cineteatro Apolo. O som (Dolby digital) do cinema ficará a cargo de 28 caixas acústicas distribuídas ao redor da plateia. O diferencial é que as caixas frontais estarão acima da tela, voltadas para o público; e não escondidas por trás da tela, como de costume.

“A estrutura está, enfim, pronta para ser eleita como novo templo dos cinéfilos, dos amantes das

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artes cênicas e de fãs de shows musicais no Recife”, afirma Luiz Felipe, crítico pernambucano, jornalista e diretor de cinema. “Para tanto, a programação precisa fazer jus à estrutura (...)”, lembra. (29) O Parque terá capacidade para 800 poltronas, bem superior à dos cinemas dos shoppings. Passa a ser a 2ª maior sala de cinema de Pernambuco (a do São Luiz é a primeira, com 1.050 lugares). A tela poderá ser usada tanto para o cinema quanto para o teatro.


Das varas manuais ao aplicativo de celular

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deixa do texto era curta: “Que venha o arauto”. A voz do palco ficava cada vez mais forte: “Que venha o arauto! Que venha o arauto!”. E o arauto, espécie de mensageiro oficial da monarquia no enredo, nada de aparecer. O intervalo entre as falas do personagem era tão longo que o ator do arauto esqueceu que a peça continuava em curso. “Estava todo maquiado, no jardim, conversando. Esqueci completamente, até que ouvi um grito de longe e me dei conta de que eu era o arauto. Corri tanto que cheguei sem ar. Nunca esqueço”, conta aos risos o ator Marcelino Dias. Falava sobre a sua interpretação no palco do Parque em “O Rei e o Jardineiro”, uma opereta infantil de autoria de João de Jesus Paes, musicada pelo Quinteto Violado e lançada na década de 1980. Marcelino conheceu a casa de espetáculos aos oito anos com a tia e descobriu que seu lugar não era sentado numa cadeira da plateia; era sob holofotes, com os artistas. “Acho maravilhoso porque todo mundo tem uma história afetiva com este teatro. A minha é a da minha tia, que já se foi, e para quem eu queria contar que estou à frente deste patrimônio da cidade”. Hoje, Marcelino é diretor do Parque. Nos últimos dias, já na finalização da obra de restauro, apresentava o teatro a grupos de produtores culturais, atores, músicos e cineastas. Por vezes, deixava evidente a empolgação com os novos equipamentos cênicos.

Manobras para ajustar varais de luzes, peso e contrapeso para cordas que erguem cortinas e cenários, isso, sim, ficou no passado ao final da reforma e restauro do Teatro do Parque em 2020. Toda mecânica cênica da área que envolve o palco agora é high-tech. A operação poderá ser feita via aplicativos para celulares ou tablets, protegidos por senhas de acessos individuais. A chamada “caixa cênica” nunca havia recebido intervenção e melhoria durante as reformas a que o Parque foi submetido. “Basta dizer que as varas de manobras eram acionadas manualmente”, conta Simone Osias. “Era um peso descomunal”, relata, falando das antigas varas de luz, cenário e traves fixadas no teto do palco (os urdimentos) e que serviam para dar vida artística a um espetáculo. A caixa cênica é como o coração do teatro. Sendo assim, compara a gestora da obra, “este coração recebeu todas as pontes safenas e mamárias possíveis”. A estrutura antiga ficou mantida, como registro histórico, e foram criadas estruturas suplementares para acionamento eletrônico. “Na prática, é um ganho imenso porque, muitas vezes, recebemos espetáculos de outros estados com grandes estruturas. Agora temos padrão para estandardização que nos permite receber os mais diversos cenários sem precisar diminuí-los”, explica. Em razão desta adaptação e do custo dela, segundo relato de projetistas a Osias, muitas produções preterem certos teatros quando cogitam fazer suas turnês pelos estados. “Ou seja, com a nossa reforma, temos as melhores condições para colocar o Parque no circuito nacional”, diz ela.

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De volta ao palco: foram montadas 15 varas de operação manual funcionando por contrapesos, cinco varas com operação por artefatos de manivelas (sarilhos), além de 5 varas motorizadas de alta performance. “As varas motorizadas serão operadas via estação de comando de última geração, com operação digital de todos os equipamentos de forma individual ou sincronizada, além do comando das cortinas”, de acordo com a Full Tec, empresa responsável pela instalação do sistema. A fixação foi completamente adaptada para que suportasse mais cenários e iluminação. Agora, os cenários podem ter posições simultâneas, como exigem muitos eventos e espetáculos nacionais e internacionais. O mesmo pode-se dizer sobre a iluminação, com 120 tomadas para montagem de refletores com intensidade regulável (dimerização) e 51 tomadas para equipamentos convencionais. Neste caso, o comando pode ser feito manualmente na mesa ou eletronicamente com o auxílio de um computador. Não fica às vistas do público, mas o teatro passa a ter uma cortina de proteção contra incêndio que isolará a área do palco da área da plateia em um eventual acidente durante espetáculos. Um projeto de sinalização e de acessibilidade foi incorporado à reforma para atender melhor o público. No quesito modernização, a troca do sistema de climatização gerou grande efeito visual na reforma e restauro. O projeto teve cinco versões para então ser enviado à Diretoria de Preservação Cultural (DPPC) e à Fundação de Patrimônio Histórico e

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Artístico de Pernambuco (Fundarpe). “A gente tinha 2 metros de diâmetro de dutos dentro da estrutura do Teatro. Conseguimos uma aparência harmônica e fizemos com que este equipamento quase que sumisse. Traz uma interferência mínima”, diz Simone Osias. O sistema de ar-condicionado considerou a necessidade de compatibilidade com os projetos de restauro dos bens integrados, arquitetura, acústica, iluminação e de estrutura. O maior ganho foi o emprego de uma tecnologia mais moderna que viabilizou a implantação de uma rede de dutos compacta, em substituição aos largos dutos que serpenteavam por total a plateia. Até a visão do mural de boca de cena foi beneficiada com a retirada dos dutos antigos.

O palco tem 14,50 m por 14,60 m, ou 211 m² de área, e ganhou substituição completa do assoalho, “mantendo-se o projeto original de quarteladas, espécie de fossos para entrada de objetos e atores de debaixo do palco”, explica Simone Osias. Nas apresentações musicais, serão utilizados os mesmos equipamentos de som do cinema. A ideia era otimizar os custos da obra. Para isso, a empresa desenvolveu um sistema onde é possível identificar qual será o destino do espaço alterando eletronicamente a configuração de som para cada tipo de evento. Este recurso atende a uma especificidade: durante espetáculos musicais, apenas as caixas frontais costumam ser ligadas.

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Os projetos de tecnologia do novo Parque foram adaptados para respeitar as orientações do restauro e a estética do teatro da década de 1930. Sobre o futuro, a arquiteta-restauradora Simone Arruda ressalta: “O restauro de um edifício não finaliza quando a obra é concluída; terá continuidade em processo permanente de conservação”.

Holofotes para os camarins

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imprensa esteve no prédio no final de novembro de 2020, antes da reabertura, para conferir de perto as novidades prediais, históricas e tecnológicas do Parque. O prefeito Geraldo Julio foi espécie de cicerone. A atriz e secretária de Cultura do Recife, Leda Alves, aos 89 anos, também participou da visita, mostrando intimidade com a aura que encantou tantas gerações do teatro.

“Aqui no Parque nos sentimos donos e aproveitadores da cultura. Eu ouvi dizer muita coisa dele e vivi muita coisa nele. Tudo isso me passa pela cabeça como um sonho: ‘Que casa é essa?’ ‘O que ela tem?’ É porque as pessoas que passaram por aqui se tornam íntimas com o espaço e também não se esquecem umas das outras”, disse Leda aos jornalistas. Para a atriz, que acompanhou o Parque por décadas de maneira ativa, a entrega de um patrimônio cultural como este à cidade “é um fecho” da sua carreira, a representação de uma “missão cumprida”. Estudiosa da cultura popular, Leda é uma mulher que traz consigo inúmeras narrativas, entre elas a experiência do casamento com o escritor, diretor e dramaturgo Hermilo Borba Filho.

“Para mim, algo que chama a atenção dos produtores que têm nos visitado é os equipamentos. O Parque vai ser o mais bem equipado da cidade, o que significa que terá as melhores condições de trabalho”, destaca Marcelino Dias, gestor do teatro.

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Outra notícia que agradou à classe artística foi a reforma dos camarins. Muitos dos quais não funcionavam ou eram precários. A partir da reforma de 2020, os 11 camarins estão equipados, climatizados e contam com maior privacidade. Um jardim vertical esconde os camarins dentro do pátio dos artistas, e deixa os espaços reservados e isolados dos fãs. Por vezes, contam os que lá trabalhavam, os fãs não se continham diante de ídolos e chegavam a dificultar o trabalho dos artistas em alguns espetáculos. Sobre o preenchimento da pauta, Marcelino Dias informou que haverá chamadas públicas que possam ofertar espaços para a produção artística, seja ela teatro, dança, música ou cinema. “Queremos uma grade de programação que contemple tanto a produção local quanto produções vindas de fora”, afirma. O objetivo é preservar o perfil do Parque, oferecendo espetáculos de baixo custo para atrair

um maior público, tornando o acesso à cultura mais democrático. A programação do cinema deve funcionar com exibições entre segunda e quarta-feira. A pauta de quinta a domingo servirá às artes cênicas. Foi assim até 2010; e este é um modelo considerado bem-sucedido pelos amantes do Parque. Tanto a estrutura interna quanto a externa dos jardins do Parque serão utilizadas para a pauta artística. “O jardim sempre foi protagonista deste equipamento cultural, justamente porque ele subverte completamente as expectativas, porque você está em uma área bem adensada, bem urbana, asfalto, muito prédio, centro comercial”, completa Diego Rocha, presidente da Fundação de Cultura. “Então, é mais uma possibilidade para uso por parte de circos, teatros, para música...”, finaliza.

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gente, com pessoas sentadas até nos espaços laterais. Ao final, toda a plateia se levantou e me aplaudiu por longos minutos. Não paravam, não paravam”, conta o regente. Ser maestro era um sonho de Nenéu. Sob a batuta dele, a Banda Sinfônica do Recife é aclamada pela marca do ecletismo (toca do jazz à MPB, música pernambucana e trilhas de cinema) e pelo vasto público que conquistou. Todos os ensaios da Banda Sinfônica do Recife são no Parque; o teatro é a sede oficial da BSR.

Uma obra de arte desejada “Olê, mulé rendera Olê, mulé rendá Tu me ensina a fazê renda Que eu te ensino a namorá Tu me ensina a fazê renda Que eu te ensino a namorá” O arranjo ao xaxado regionalista “Mulher rendeira” e os acordes de “Arioso”, de Johann Sebastian Bach, executados pela Banda Sinfônica do Recife (BSR) em 2002 no palco do Parque embalam o maestro Nenéu Liberalquino durante quase duas décadas. As músicas foram escolhidas por Nenéu para a estreia dele como titular e diretor artístico da Banda; é o regente com mais tempo no cargo. “Foi emocionante. A plateia estava abarrotada de

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Com a reinauguração do teatro, a Banda Sinfônica do Recife, o maestro e 78 pessoas entre músicos e profissionais da área administrativa ganharam casa nova e bem equipada para que promovam novas emoções em jovens e adultos. A reforma do Parque criou uma sala de ensaio com acústica apropriada (chama-se “sala de naipes”; os naipes representam os diversos grupos de instrumentos que compõem um grupo instrumental). Ela tem capacidade para cerca de 30 músicos ensaiarem juntos. Além deste espaço, a Banda Sinfônica do Recife contará com a sala do regente, áreas para arquivo e administração.

“Todo mundo está eufórico. É a volta à nossa casa. Passamos este período longe e agora recebemos ela reformada e com ganhos de espaços. Uma grande alegria”, diz ele, sobre o sentimento da equipe. Os músicos não veem a hora de ensaiar também no palco, o que é muito comum. “A acústica é outra”, diz Nenéu.


A programação de reabertura do Parque se deu com “Vozes do Recife”, encenado pela Companhia Fiandeiros de Teatro, em evento reservado para autoridades. No palco, um mosaico poético do Recife e sua trajetória para se tornar uma metrópole, segundo a visão de cinco escritores extraordinários - Ascenso Ferreira, João Cabral de Melo Neto, Joaquim Cardozo, Manuel Bandeira e Carlos Pena Filho. O texto “Vozes do Recife” é de autoria de André Filho, com pesquisa dele e de Carlos Mendes. Quem respondeu pela direção geral do espetáculo foi André Filho. A música teve assinatura de Samuel Lira e a direção de arte de Manuel Carlos.

Na inauguração do cinema, no dia seguinte (12 de dezembro), foi exibido o filme “O Canto do Mar” (de 1952), de Alberto Cavalcanti. A película integra o acervo da cinemateca do teatro, batizada em homenagem ao diretor. Os primeiros recifenses que conheceram o resultado da intervenção do Parque, ao vivo ou por meio de fotos, disseram-se tomados pela “emoção”.

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Recanto para aclamação de talentos

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elson Gonçalves, Cauby Peixoto, Nana Caymmi, Chico Anísio, Elza Soares, Joana, Gilberto Gil para citar alguns ícones das últimas décadas. Grandes nomes da música nacional passaram pelo Parque. Do teatro, da dança, do cinema local e nacional. Cada estreia de temporada conta uma crônica de bastidores.

“Gilberto Gil escolheu o Recife para fazer sua primeira apresentação no Brasil, depois da longa temporada em Londres. Ele chega ao Recife amanhã, tendo shows programados para quinta-feira, sexta e sábado, no Parque”, escreveu o colunista social João Alberto, no Diario de Pernambuco, em 1972 (30). “Os ingressos para os três shows do compositor começam a ser vendidos amanhã na bilheteria do Teatro do Parque”, avisava a nota. Gil adaptou a ciranda pernambucana e esteve acompanhado de Lanny, Tuti, Moreno, David e Perna, integrantes do seu conjunto. Foi a primeira exibição no Brasil, após o seu esperado regresso de Londres, e Gilberto Gil estava acompanhado de sua esposa, Sandra, Caetano Veloso e a mulher, Dedé.

país com Caetano Veloso. Há 45 eu o vi pela primeira vez, no Teatro do Parque”, conta o colunista de música do Jornal do Commercio, o jornalista José Teles, que testemunhou o show de Gil. “Tinha um monte de artistas na plateia. Gal veio de carro de Salvador com uma turma, acho que Macalé e Capinam faziam parte”, recorda Teles. (31) O Parque também esteve na carreira do cantor Alceu Valença, que lembra a criação do frevo “Sou eu teu amor” (Lá vem lá vem o bloco/ Cadê o bloco já passou/ Lá vem lá vem o bloco/ Cadê o bloco já passou/ É um bloco veloz feito um raio/ Chamado Sou Eu Teu Amor), feito em parceria com Carlos Fernando. “Carlinhos fez o refrão e a inscreveu num festival promovido pela Prefeitura do Recife. Quando a escutei, no Teatro do Parque, em Recife, achei que precisava de uma segunda parte. Tempos depois, no Rio, completamos a música. A gravação original tem um dueto de Jackson do Pandeiro com Gilberto Gil”, contou Alceu ao lançar o álbum “Amigo da arte” (2014).

O inesperado: faltou eletricidade exatamente na hora em que ele cantava Electric, uma de suas novas criações. “Eu não tinha dinheiro pro ingresso. O teatro às escuras, pedi ao porteiro para entrar e ele, talvez achando que o show não iria continuar, deixou. Gil se acompanhava ao violão, no escuro. O clima era meio tenso. Foi o primeiro show dele no Brasil desde que, três anos antes, fora banido do

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Flashs do teatro mais popular de Pernambuco “O Parque é, sem dúvidas, o teatro mais popular de Pernambuco”, diz Leidson Ferraz, ator, pesquisador e reconhecido memorialista dos teatros do estado. “Além de possibilitar uma miscelânea de linguagens, sempre ofereceu os ingressos mais baratos e teve uma localização estratégica”. Todas estas razões, afirma, contribuem para o papel que este teatro tem no estado. “O Parque sempre foi centro de referência para todas as artes”, lembra o autor da série de livros “Memórias da cena pernambucana” (Funcultura) e “Panorama do teatro para crianças de Pernambuco - 2000-2010” (Funcultura e Governo de Pernambuco), entre outras publicações. Cita como exemplo multifacetário do teatro os tempos áureos dos festivais de dança, projetos musicais como o Seis e Meia, as exposições de fotografia e artes plásticas e as sessões de cinema a R$ 1. Afora as presenças de artistas como o Palhaço Chocolate e atores da Trupe do Barulho. Leidson Ferraz já viveu grandes emoções como ator e como espectador. Atuando, recorda dos dias em que corria para troca de figurinos de dois papéis em “O Auto da Compadecida”. Na peça, representou por 17 anos os personagens do frade e do demônio (“O Auto nunca teve casa fraca no teatro do Parque”). Como parte da plateia, revela a maior emoção vivida no Parque: “Foi no dia em que saí de mim”. Assistia ao espetáculo “Rua da Amargura”, do grupo galpão de Minas Gerais. Era a versão circense

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da história de Cristo. Além de emotivo, tinha belo figurino e uma música ao vivo, que era cantarolada. “Olhe o que foi meu bom José/ Se apaixonar pela donzela/ Dentre todas a mais bela (...)”, de Georges Moustaki. A canção ficou conhecida na década de 1970 na voz de Rita Lee quando ela ainda era vocalista de Os Mutantes. “Eu tinha levado minha mãe, que é muito religiosa. Quando olhei, vi minha mãe do outro lado diante daquela beleza. Chorei o espetáculo inteiro e até hoje me arrepio só de falar”. Noutra ocasião, lembra o pesquisador, ficou espantado. Viu com seus “próprios olhos” uma fila que fazia um impressionante caracol de gente. Seguia do Parque, na rua do Hospício, até a antiga Mesbla (hoje, Loja Riachuelo). Leidson ia assistir à apresen-

tação da Trupe do Barulho, em cartaz com “Cinderela - A história que sua mãe não contou”, quando se deparou com este fenômeno de bilheteria. A trupe se apresentaria em espetáculo único com o incentivo do Projeto Todos com a Nota, no qual a população trocava notas fiscais por ingressos.

“Veja, se havia uma fila que saía do Parque até a Mesbla, era porque as pessoas queriam ver teatro. O problema é que as pessoas querem, mas nem sempre se tem esta oportunidade”, conceitua, tomando como base sua experiência de mais de duas décadas. Por vezes, cita, são pessoas oriundas da periferia, que têm poucos recursos, mal possuem dinheiro para o ônibus. Acreditando nesta teoria, Leidson defende a reedição de uma política de ingressos populares.

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Novo protagonista da cena do Recife

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iante do Parque, nunca houve conformismo quanto às condições físicas em que o teatro se apresentava nem quanto ao enfraquecimento dele como equipamento e fomentador cultural. Tanto por parte dos artistas, quanto da população e imprensa. Pode-se dizer, foi assim por décadas.

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“Uma boa oportunidade para se ver o trabalho artístico (elogiadíssimo por toda a crítica do Sul) de Gal Costa é assistir a esse seu “show” - Gal Tropical - O espetáculo começa quarta-feira, infelizmente, no Teatro do Parque, que está em péssimas condições (até é uma vergonha trazer de fora uma artista do gabarito de Gal para se apresentar ali) (...)”, dizia nota no Diario de Pernambuco em 1980. (32) Ela tinha acabado de fazer uma turnê que incluía passagem pelo Japão.


À época, no Parque, falava-se que se viam rebocos pendurados. Ruídos de uma rádio FM interferiam no áudio dos espetáculos. Antes desta, que é a maior obra de reforma e restauro do Parque, a imprensa registrou por anos manifestações sobre o desprestígio do teatro e a falta que ele fazia ao cenário cultural quando fechado. Cobranças, assim como as apresentadas em meados de 2020, quando 11 entidades ligadas à cultura enviaram um abaixo-assinado a gestores da Prefeitura pedindo detalhamento sobre o funcionamento e a política cultural para o futuro. (33) Defendiam no documento um espaço que “em quase um século de funcionamento ofereceu ao público uma consistente programação de espetáculos e cinema, contribuindo para a democratização e popularização da cultura, formação do público e visibilidade para a produção artística local, brasileira e estrangeira”. Como parte do movimento permanente para cobrar a reabertura do Parque, a Câmara de Vereadores do Recife promoveu audiências públicas e compôs uma comissão junto à Prefeitura, Conselho Estadual de Cultura e sociedade. Com frequência, a pauta voltava ao debate. Símbolo da cena cultural da cidade, o Parque com o seu fechamento havia deixado produtores e artistas quase órfãos - diziam eles.

“A gente fica super feliz [com a notícia do restauro do Parque] porque foi uma luta nossa, dos artistas”, diz Leidson Ferraz.

Na classe artística, a expectativa é de que, com a reforma, restauro e consequente reabertura, o Parque volte a ser ponto de convergência, de pluralidade e de encontros. “Abra as portas para outras culturas”, diz o cantor Cannibal. “Que seja um espaço para todos”. Kléber Mendonça Filho, após fazer uma visita ao Parque restaurado e classificá-lo como uma “joia”, disse desejar que a nova gestão da Prefeitura “faça desse espaço espetacular algo democrático e diverso”. É esta presença popular que ampliará e dará fôlego à maior intervenção já realizada no Teatro do Parque desde a sua fundação, em 1915, pelo visionário comendador Bento Luiz de Aguiar. A inauguração oficial do novo Parque aconteceu em 11 de dezembro de 2020. Com os portões novamente abertos, ao fim de um enredo longo, a história deste ator inconteste da cena social e cultural do Recife é recontada. O Teatro do Parque volta para respirar momentos de glória, assistir a consagrações e ouvir ecos de palmas reverberadas. Ele está pronto para dialogar com a nova geração da cidade, reencontrar o amor de fãs fiéis e compor outras memórias. Entregar-se aos recifenses. O próximo ato é do personagem mais importante deste enredo, o público - que tanto ansiou vivê-lo.

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7 | Jornal Pequeno. Recife, 30 jul. 1929. 8 | A Província. Recife, 30 jul. 1929. (Biblioteca Nacional) 9 | Jornal Pequeno. Recife, 31 jul. 1929. (Biblioteca Nacional) 10 | Jornal Pequeno. Recife, 30 jul. 1929. (Biblioteca Nacional) 11 | Crônica de Jota Soares. Programa Memória de nossa gente. Recife: Rádio Universitária FM/ UFPE, 29 de julho de 1968. Programa de Rádio. 1 | Jornal Pequeno. Recife, 7 ago. 1915.

12 | DIAS. Op. cit., nota 6.

2 | Jornal Pequeno, Recife, 25 ago. 1915.

13 | ARRUDA, Simone. Op. cit., nota 3.

3 | ARRUDA, Simone. Projeto para conservação e restauro de bens integrados e revestimentos parientais do Teatro do Parque. Recife, 2019 [2014].

14 | A Província. Recife, 24 ago. 1915.

4 | DE AGUIAR, Eunice. TV Pernambuco, Recife, 26 abril 2007.

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15 | DUARTE, José Lins. Recife no tempo da maxambomba (1867-1889): o primeiro trem urbano do Brasil. Dissertação (Mestrado) Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2005.

5 | MOTA MENEZES, José Luiz. Diario de Pernambuco, Recife, 30 out. 2006.

16 | DIAS. Op. cit., nota 6.

6 | DIAS, Lêda. Cine-teatro do Parque: um espetáculo à parte. Recife: Fundação de Cultura da Prefeitura do Recife, 2008.

17 | FIGUEIRÔA, Alexandre. Projeto Obscuro Fichário. 2016. Disponível em: . Acesso em: 11 nov. 2020


18 | COSTA COUCEIRO, Sylvia. Artes de viver a cidade: Conflitos e convivências nos espaços de diversão e prazer do Recife nos anos 1920. Tese (Doutorado). Programa de Pós Graduação em História. Universidade Federal de Pernambuco. Recife, 2003 19 | SILVA, Leonardo Dantas. O Recife dos anos 20. Jornal GGN, 2013. Disponível em: <https://jornalggn.com.br/cidades/o-recife-dos-anos-de-1920/> Acesso em: 09 nov. 2020 20 | Diario de Pernambuco, 23 mar. 2018. 21 | CAVALCANTI, Henrique Inojosa. Histórias do Recife (1925 a 1935): Clarice Lispector e o encontro com a cidade. Anais do 30° Simpósio Nacional de História - História e o futuro da educação no Brasil / organizador Márcio Ananias Ferreira Vilela. Recife: Associação Nacional de História – ANPUH-Brasil, 2019. 22 | Entrevista de Clarice Lispector. Jornal do Commercio, 30 maio 1976.

36, Jan-Jun, Recife, 2018. Disponível em: <http:// dx.doi.org/10.22264/clio.issn2525-5649.2018.36.1.14> Acesso em: 21 nov. 2020 26 | A Província. Recife, 30 mar. 1930. 27 | Revista P’ra Você. Recife, 22 fev. 1930. 28 | MENDONÇA FILHO, Kleber. Recife, 4 dez. 2020. Facebook. Disponível em: facebook.com/ kleber.m.filho.1. Acesso em: 4 dez. 2020 29 | Cinemaescrito. Disponível em: <http://cinemaescrito.com/>. Acesso em: 6 dez. 2020 30 | Diario de Pernambuco, 27 fev. 1972. 31 | Jornal do Commercio, 26 jun. 2017. 32 | Diario de Pernambuco, 28 set. 1980. 33 | Carta aberta do setor cultural à Prefeitura do Recife, 2020.

23 | CAVALCANTI, Henrique Inojosa. Op. cit., nota 21. 24 | A Província. Recife, 27 ago. 1929. 25 | NASCIMENTO, Arthur Gustavo Lira do. O cinema falado é o grande culpado da transformação: a chegada do cinema sonoro em Pernambuco (1930). CLIO: Revista de Pesquisa Histórica, n.

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Execução das Obras Fase 1. Concrepox Engenharia Fase 2 e 3 Multicon Engenharia Engenheiros responsáveis técnicos da obra pela Multicon - Paulo Carvalho, Epitácio Capela, José Octávio Paganini e Ackiles Duarte Equipamentação e Modernização da Caixa Cênica Full Tec Engenharia

Prefeito Geraldo Julio de Mello Filho Vice-prefeito Luciano Roberto Rosas de Siqueira Secretário-chefe de Gabinete de Projetos Especiais Otávio Calumby Fernandes Secretária de Cultura Leda Alves Presidente da Fundação de Cultura Diego Rocha Gerente Geral do Projeto Simone Osias

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Atualização e Compatibilização dos Projetos Colmeia Arquitetura e Engenharia Engenheiros responsáveis - Hilda Wanderely Gomes, Alessandro Gomes da Silva, Jorge Paurílio de Souto Crasto Júnior Arquitetos responsáveis - Estella Suzana Matias Braga, Luiz Antonio Wanderley Neves Filho, Marcelo de Melo Neves, Mohana Barros Bezerra de Lima, Maria Berenice Fraga Gusmão Lins, Júlia Bird Matias de Almeida Projeto de Arquitetura Ronaldo L’amour Projeto de Bens Integrados Simone Arruda Projeto de Acústica Maria Berenice F. G. Lins

Diretora de Engenharia do Gab. de Projetos Especiais Maria Carolina Azevedo

Projeto de Cabeamento Estruturado Adriano Galindo Castor

Gerenciamento e Fiscalização das Obras TPF engenharia

Projetos de Modernização Cênica Sandro Aparecido Virgolino


Projeto de Cenotecnia Gustavo Andrade

Projeto de Instalações Cenotécnicas Sandro Aparecido Virgolino

Projeto de Circuito Fechado de TV (CFTV) Adriano Galindo Castor

Projeto de Luminotécnico do Memorial Regina Coeli Barros

Projeto de Climatização Arthur Geraldo França da Cunha

Projeto de Mobiliário de Exposição Josemar Ferraz de Souza

Projeto de Drenagem Dilson Teixeira

Projeto de Combate à Incêndio (PCI) Epitácio Capela Gomes

Projeto de Estruturas Gustavo Andrade

Projeto de Instalações Elétricas Adriano Galindo Castor

Projeto de Iluminação Ambiente Regina Coeli Barros

Projeto de Sistema de Proteção Atmosférica (SPDA) Adriano Galindo Castor

Projeto de Iluminação Cênica Sandro Aparecido Virgolino

Projeto da Subestação Adriano Galindo Castor

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Teatro do Parque/Acervo Pag. 70 Museu da Cidade do Recife/Acervo Pags. 105, 107 A Província/Acervo Pag. 111 Acervo Fundação Joaquim Nabuco/Acervo Pag. 103

Andréa Rêgo Barros/PCR Pags. 8, 18-19, 31, 44, 51, 53, 64-65, 68-69, 70, 71, 72, 79, 83, 84, 86, 94, 95, 97, 108, 117, 118, 121, 126, 132, 133, 134, 135 Daniela Nadler Pags. 10, 12, 15, 17, 20, 23, 26-27, 29, 35, 36, 39, 45, 48, 54, 58, 59, 60, 62, 63, 66-67, 70, 71, 73, 76, 77, 80, 81, 85, 87, 88, 90-91, 97, 98-99, 100, 115 Cristiana Dias Pags. 24, 74-75, 112, 114, 116, 122, 124, 130-131, 137 Wilton Marcelino/Multicon Engenharia Pags. 32, 70, 96 Marcelo Lyra/Acervo Dramart Produções Pag. 125

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Revista Pra Vocês Reprodução/Acervo Pag. 40 Revista Frou-frou/Reprodução/Acervo Pags. 49, 66 Família do comendador Bento Luiz de Aguiar/Acervo Pag. 43


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ILVIA BESSA é jornalista e recifense. Passou a amar o Parque ainda criança, quando foi levada pelo pai, Luiz Bezerra da Cunha. Vencedora de três Prêmios Esso e de mais de 20 outras premiações jornalísticas locais, nacionais e internacionais. Coautora de Relatos de la gris pobreza (IPS América Latina, 2010) e de Heroínas desta história (Instituto Vladimir Herzog, 2020). Foi repórter especial do Diario de Pernambuco e iniciou a carreira na Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe). Tem um canal de webreportagem no YouTube, Vidas que contam. Dedica-se à escrita humanizada, valorizando memórias e sensações daqueles que contam a história.

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Este livro foi composto na tipologia Day Roman, em corpo 13,5 e impresso em papel Couchê Fosco 150g pela Gráfica e Editora Liceu.


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