Revista Compostela nº61

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Revista de la Archicofradía del Apóstol Santiago

Número 61

SÃO TIAGO EM MAZAGÃO VELHO (AMAPÁ/BRASIL): CULTURA RELIGIOSA E LÍNGUA Marilucia Barros de Oliveira (UFPA/USC) Professora da Universidade Federal do Pará e Investigador Visitante da Universidade de Santiago de Compostela

1  Com o pé nos três continentes

M

azagão Velho fica localizada no município de Mazagão, no Amapá, estado que integra a região amazônica do Brasil. Essa comunidade afro-brasileira fica a 62 quilômetros da capital do estado, Macapá. Nova Mazagão, local onde se localiza atualmente a comunidade de Mazagão Velho, foi fundada no século XVIII como consequência de um projeto geopolítico da coroa portuguesa. Em 1769 decidiu-se que Mazagão, colônia portuguesa localizada no Marrocos, seria transladada para a Amazônia, a fim de ocupar as terras brasileiras e protegê-las da invasão de espanhóis, franceses, ingleses. O início do transporte da Mazagão marroquina para Nova Mazagão, nome que recebeu a vila que acolheu os mazaganeses na Amazônia, só se deu em 1772. Até esse ano os mazaganeses ficaram em Belém. Mas antes disso, passaram pelo menos seis meses em Lisboa (Cf. Vidal, 2008; Silva & Tavim, 2013).

A comunidade de Mazagão Velho conta com 7.598 habitantes. Apresenta uma história de imigração fascinante que tem impacto sobre sua vida social, especialmente sobre sua cultura religiosa. Apenas parte da comunidade se considera quilombola e, por conta desse impasse, ainda não tem o reconhecimento da Fundação Palmares1. A comunidade celebra a festa de São Tiago em período semelhante em que é celebrada em Santiago de Compostela, na Espanha. Em Mazagão Velho celebra-se o São Tiago Guerreiro. Isso também está ligado à sua história de imigração; afinal de contas, a população que foi deslocada para o Brasil se compunha de muitos militares, já que defendia o território e a fé portuguesa no Marrocos e celebrava o defensor da fé católica, o São

Tiago Matamouros. Obviamente, os aspectos ligados à imigração e à sua forte cultura religiosa têm impacto sobre os usos linguísticos da vila. É sobre aspectos ligados à sua socio-história que nos debruçaremos para apontar aspectos híbridos da cultura da vila que se manifestam, inclusive, na língua.

2  São Tiago no Brasil? São Tiago é conhecido como pai da fé, na Espanha, e pelos povos que por ela foram evangelizados. A penetração do apóstolo na América é forte. São vários os países americanos que celebram São Tiago e apresentam suas marcas, traços em sua história, geografia, cultura, arquitetura etc. Ele se destaca especialmente nos espaços americanos de colonização espanhola, mas não só neles. Na obra Santiago y América, que reúne um conjunto de trabalhos sobre a presença de Santiago nesse continente, fica evidenciada sua presença na América (Cf. Costa, 1993; Martinez, 1993). Mas ela é ínfima no Brasil, o que corroborado por Mott (1993). Mas como um espaço de colonização portuguesa privilegia a figura de São Tiago e não a de São Jorge, especialmente numa comunidade negra? Uma possibilidade é pensar que São Tiago teria sido levado para a Nova Mazagão, hoje espaço ocupado por Mazagão Velho, pela Mazagão marroquina, já que lá havia a celebração a São Tiago, conforme confirmam dados históricos. Cosme (2003), tomando como base correspondências de 1677, dá-nos notícias da forte presença de São Tiago em Mazagão marroquina2. Ao tratar de seu cotidiano, refere que havia na praça um espírito religioso e completa que a festa de São Tiago era

1   Trata-se de uma fundação que avalia os processos de reconhecimento de comunidades afro-brasileiras. No Brasil, uma comunidade pode ser denominada de negra, afro-brasileira, por exemplo, mas não se reconhecer nem ser reconhecida como quilombola, termo que tem teor político, legal. Esse procedimento precede, necessariamente, a reivindicação da titulação da terra que ocupam essas comunidades. Para mais detalhes, consultar www.palmares.gov.br

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