5ª Edição

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APNEIA revista de poesia livre e crua 5ª Edição março 2019


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NOTA EDITORIAL Amigos, Amigas e outros eufemismos de Felicidade,

Hรก uma fogueira Hรก os gritos e os sussurros Hรก aves que nos voam das mรฃos E hรก o lugar onde somos todos harmonia

e

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Amigo, Olhos de homem não olham olhos de homem Honestamente Mas a ti se rende a minha vida E contigo me deito nos cantos segredo Para não te dizer Amor Na noite dos sós que nos mente o sonho Onde julgamos vencer com grito o medo Rimos como riem crianças E brincamos como brincam crianças E caímos como caem crianças E não choramos como choram crianças Mas corremos como correm crianças Nus iguais como somos crianças Amantes de beijos de peito

- M. Forro 4


—— (obra por instrução: ler, recortar, dobrar e transportar em qualquer bolso.)

dentro do bolso moedas de 20 cêntimos, coisas esquecidas e o que mais cabe [nas miudezas (?) .o que não tem tamanho : luzes acesas de dia assinalam o nevoeiro que descobre o silêncio [da serra, juntamente a comoção que nos ocupa somos seres portadores do que não tem lugar, ei-lo

- Ana Valquaresma 5


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Não sei que fogo em mim corre Que tinta jorra desta caneta Que face têm estas palavras Não sei se é fogo aquilo que em mim corre Se é tinta que jorra desta caneta Ou se a face de outras palavras Presumo que o fogo que em mim corre Seja tinta de outra caneta Pela face destas palavras O fogo vem. As palavras passam. A tinta fica.

- João Gama 6


—— Lavoisier

Supostamente, tudo é proporcional, O bom, o mau e a moderação. E esta dor vem-nos de não conhecer esse compasso da repetição, O epicentro de cada movimento Que simultaneamente o cria e justifica, O faz insubstituível. E é no entanto uma fé dispersa e sem origem Que nos faz crer, esperar o ritmo, Religião da demora e do porvir Que, de escasso fruto, nos vergou à submissão. Poderá ser o agora o núcleo E este engodo um medo próprio, Auto sabotagem misericordiosa de infante levado pela mão Por uma justiça cega, morta, nula desde o início?

- Juliana Senra 7


———

Digam aos generais do Estado-Maior que eu encontrei os terroristas! Estão em minha casa e só agora reparei. Estão nos cantos da casa-de-banho e no sótão são aquelas aranhas gigantes e aqueles ratos que vejo passar. No dia que vir uma barata chamo logo os B-52 para [largarem o que usaram no Japão deixou aquilo num brinco Venham com a invasão aérea com cobertura naval que eu estou aterrorizado! Não cago faz um mês! Tomar banho, já não me lembro quando foi o último foi na banheira que vi as primeiras! Venham-me salvar destes violadores de liberdades individuais, que já a carta cheia de pó diz eu ter direitos e valores! Salvai-me que tenho medo!

- Nemo Luz 8


—— novus

quando a vida voltar a ameaçar-te com a segurança de um sorriso cândido, o conforto de um afago no qual terás a tentação de ler o universo, e, nos cristalinos quadros que pintarem os olhos de ti, tentares compilar toda a indefinição caótica que és em capítulos sem esqueleto, palavras de outros sobre uma morfologia [sem correspetivos, (ninguém me sabe mais, desenganem-se) larga a metáfora que o vento sossegado, a invadir o quarto, te instala [no peito, e recusa a restauração de um novo ideal, porque somos mais nos outros do que em nós, é certo, mas, nesse mais, comprime-se a multitude de perceções, tão erradas quanto as tuas, e tu sabes o quanto erras, e quanta verdade imbuis em dogma.

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e, se nem me conheço, fará conhecer outros, ou outros me saberem dizer de mim. basta de estilhaços nos campos perdidos ao alheio, o sangue que te vai manchando a roupa não cai bem com os olhos luzidios da que queres crescer em ti. não quero que me pintem mais nas vossas palavras enquanto na minha tela divagar o traço desnorteado e ficar, em lembrança, uma miríade de explicações, em dívida eterna com o sentido. por agora, embriago-me no devaneio deste bucolismo, na seara invernal de um renascer sóbrio, na mata de geada com a manhã do ano novo espreitando, e furo esse infinito, em pletora, decaída pelos escombros.

- Inês Branco 10


—— Há um deserto no meu país

Há um deserto no meu país onde ainda se cultiva a terra. Semeiam-se campos de camélias e as montanhas já não chamam como dantes. Há um deserto no meu país, onde as casas eram projetos e a saudade foi um sentimento. As cidades eram miragens. À sombra já lhe foi dedicado o seu próprio pó. Há um deserto no meu país onde os homens não são mais homens e as mulheres deixaram de ser mulheres. Um local em que os filhos se confundem com os pais e as mães já muitas partiram. Que fatídica tristeza é a de uma terra sem mães.

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Há um deserto no meu país ao qual os animais vadios regressam e os portugueses esquecem. Ou preferem esquecer. Um deserto que é um país absoluto. Um país reinventado de pobre. Na fronteira do meu país, desse país, há um espelho de vento, verdura e poeira. Fabrica uma reflexão perfeita, e no outro lado dessa simetria também mora um deserto. Um deserto fronteiriço. Um deserto com outros tons e texturas, mas um deserto com o mesmo sabor só. E existem rios e ribeiros que fundem esses desertos, preservam o seu pasmo e a figura hirta. Não há sinal de homem que ali tenha passado. E ao mar, quantos marinheiros já não lho deu?

- Sousa Casteleiro 12


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Coupable du jour où tu ne seras plus qu'un pauvre sourire nostalgique. Trop peur de ne plus être hantée par le souvenir de tes doigts sur ma peau. Trop lâche pour partir. Trop amoureuse de ton amour. Je suis qu'une gamine paumée, en manque de tes yeux tristes, qui n'ose pas aller de l'avant par culpabilité. En prise d'un conflit intérieur, de nouvelles peurs qui s'entremêlent et me déchirent, je suis bien trop fragile pour écrire autre chose que des mots d'amour. Puis-je inscrire dans l'avenir ces flammes vibrantes qui m'animaient quand ton âme n'était jamais assez proche de la mienne? Puis-je graver tes mots toujours trop tranchants pour mon esprit blessé? Juste bonne à insulter la vie, à m'ecorcher le cerveau de peurs affligeantes, mon corps est bien trop petit pour tout ça. Ce n'est pas un vide que tu laisses en moi. Mais des braises encore trop chaudes.

- Margot 13


—— Ninguém está acordado cá em casa

Ninguém está acordado cá em casa Os cantos das horas vão-se enchendo com pó e calores vazios Respiram-se os silêncios sem deixar de atentar os reflexos [das luzes de rua que fogem dela pelas entrelinhas dos estores semi cerrados O meu involuntário e sofrido sorriso aguarda as sombras atrasadas que não encontram o caminho pela falta de lua Os ponteiros que levem a culpa para outro que os esteja a olhar Não sei como funcionam os vossos medos, mas os meus, mudos, caminham ao de leve livres de rumo ou lógica mapeada Só tenho medo da vida quando me desligam dela por tanto tempo Depois só tenho medo dela quando ela volta a mim em forma [de grandes cidades Nunca tanto tempo fora de mim foi tão ávido de si Mas não importa, ninguém reparou Dormem todos a espera de amanhã, que, digamos de passagem, vem mesmo a calhar

- de Oliveira Borges 14


—— Outros tempos

Somos incapazes de existir, pelo menos por nós próprios. Por isso, depositamos a nossa existência. Objetos e pessoas e palavras e emoções e tudo o que há de efémero. Somos incapazes de ver além disso, do fugaz Presente. Os diferentes tempos: Que interessam? O que representam? A existência, à nascença – a nossa única garantia. Destruída por nomes, pelas palavras. Símbolos, de que me servis quando tudo é por si só? De que me servem as metáforas perante a única realidade? Para que prospetar-nos nos objetos se já nos encontrámos, em tempos? Quando jurámos nunca ser e só existir?

- J. C. Bourgeous 15


——— as montanhas ecoam à minha volta: uma paisagem árida, desconcertante, sem-fim li algures que as urzes medram em solo pobre - sinceras. amontoam-se sem que eu lhes ache o motivo – enquanto isso [a bruma impetuosa que delas emana, sintomática de carências sumidas dentro. a verdade reside aí - na ideia de um lugar onde todos os corpos [se equivalem. e é esta ideia de ti, sem forma, que me abala e enternece, que me ocupa. preocupam-me as árvores que morrem depenadas, os bagos e raízes [que se perdem nas trajectórias das aves, as crias que goelam nas tocas [à falta dos progenitores, as fagulhas que se disseminam, as cinzas que restam do pós-incêndio, os animais seduzidos perante a derrocada, o sopro cortante que é o acaso por habitar e a vontade de fazer disso casa, pois, perante esta crosta intempestiva e agreste, também sei ser terna. erguer-se-ão monumentos às urzes - e foi por isso [que chegaste até aqui.

- Ana Valquaresma 16


—— Uma casa que é a esperança no meio que é a vida. Amigo, nunca te compreendi bem ainda assim vês como os olhos tremem quando digo a ti a palavra amigo. Um sorriso terno e curto e calmo e molhado pela minha respiração forte. Nunca fomos à montanha juntos, há um outro amigo, mais velho, 40 e tal vidas, que vive para baixo de chaves e tem um casebre e uma horta e ovelhas [e um riacho à porta de casa. Tudo no meio do nada, no meio de uma estrada, e pouco depois da casa, nessa estrada, umas fragas, se te puseres no sítio certo, são o rosto cansado e seco de um velho. Amigo, hás de vir lá comigo. Sabes porque gosto de ti? Porque nos ligamos e ouvimos e percebemos mal, muito bem [e com muito carinho. Amigo, compreendemo-nos bem demais. E tudo o que é demais é erro, bem o sabes e bem o riste ,deitado feliz e tótó, no chão do concerto.

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Tudo o que é demais é erro portanto o erro, o erro é a vida, a água que enche o copo e também verte. o meu amor encheu-me o copo mas também verteu, e também tu me farás pingar, e também tu pingarás. Não te esqueças que o fruto só é fruto depois de arrancado. Não te esqueças que te amo como um irmão Não te esqueças que tenho medo. Amigo, imagina uma pedra. É uma pedra, tiago, mas eu juro que fizemos dela uma flor. Amigo, imagina-te cego, cego, tiago, juro que sei que me olharias por uns binóculos, caso eu fugisse [para longe. Amigo, és poeira ao vento, espero de ti o que espero do vento: tudo e silêncio. Amigo, juro que vamos caminhar e falar pelas ruas estreitinhas do mundo [a vida toda. Somos as pequenas, grandes, pedras no lago um do outro.

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Amigo, dizes muito mais do que falas, choraste quando te li um poema, guarda essas lágrimas. Grita e aperta-me a mão mais vezes. Amigo, nascemos do mesmo amor, temos o mesmo amor, somos o mesmo amor, irmão, deixa-me saber quem sou. Amigos, pessoas, nomes: temos alguma coisa. aprendemos sempre alguma coisa. somos sempre uma coisa. Parece-me, hoje, que a vida é o aparecer e desaparecer ,no meio do nevoeiro, desta casa pequenina e amarela que é a esperança. Serei as flores que plantar, nada mais, nada menos. até ser outra coisa.

- Lucas 19


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O vazio sai fora e ninguém espera por ele. É o cansaço junto com as palavras más que a boca muda não mordeu. Ele está por todo o lado, mas ninguém o vê. No olhar, no toque, na falta dele. Paira pelo ar e tenta fugir do movimento. Resguarda-se entre páginas cuidadosas e muito precisas, como o carinho, e por ruas que gente esqueceu. Uma noite, encheu-se de vida e levou alguém a viajar por elas. Na tentativa - porque não? - de se perderem os dois e se encontrarem somente no Amor.

- Maria Luís de Matos Coutinho 20


—— ruído

Rios vermelhos escoam no escuro. Mãos pegajosas, apalpo por luz – o néon dos peixes apressa-me a ânsia. Engulo moscas, e o zumbido é esta caverna levito na força conjunta das suas asas. Encho-me de sangue. Voo, E empresto sem critério a maldição.

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- Maria Araújo


—— Antar é com desapego que censuro quando não são capazes de tecer a crítica real ao despotismo em que gerem os seus círculos; desbravando essa mata de gente, o ser vai-te matando mais a ti, e embravecendo, em processo concatenado; a corrosão é permanente e os dentes cravam na pele, aspirando ser veneno, instalados, propagando-se pelos sensores do medo, medo de sentir, medo de saber, medo de catalisar o trémito, medo de dilacerar em remorso, medo de intumescer em mágoa raivosa, medo de ressentir as perdas dos pedaços libidinais; com um jarro, colho desse veneno que todos duvidam ser cura; mas estimo a convicção pérfida: é a frieza que nos comprará os anos à morte, que compactuará com a leveza e comporá sinfonias orgânicas acompanhando orgias exortadoras do êxtase; guardo o vasilhame no canto do meu peito; descarregarei em glória quando, de rompante, cansar de percutir a adaga.

- Inês Branco

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——— Serôdias lágrimas que te choro. Fontes de outros tempos me falam dos seus altares. Julgam ser contemporâneas desta dor, companheiras destas angústias. Não foram e não serão nunca refletidas, ficarão para sempre como fósseis, arreigados a uma vista presente que sente tudo o que não vê. Quero amar-te sem elas. Livre. Ser-me ao teu lado, num futuro nunca a três Meu anjo, deito-me contigo. Sem o peso das mantas, corpos nus, despidos de começos e recomeços, só nus, na simples nudez dos bichos. Beijo-te num sorriso. Desterrado. Apátrida.

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Quero sentir-me uma pena. Suar sem a roupagem que trago. Falar-te apenas o que digo, mais nada senão palavras que desconhecem os Oceanos navegados. Vou-me sentar. Olhar-te aqui do alto sem nunca descer. Ver-me ali contigo, sob os lençóis daquelas serôdias lágrimas, de que te falei . Ali estamos nós, meu anjo. Retratos de um amor enxuto. Ladeados pelos dois Oceanos. Livre, contigo, falo-te do reflexo sublimado destas palavras na promessa de não te perder para mim. Serei sempre aquele. Prometo.

- João Gama

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———

Os meus olhos ressacavam nos teus embrulhando mares de pensamentos mudos antes de ires embora de cada vez que ias embora Volta e meia assinava-te uma carta ou o sinónimo dela nesta era digital (já que agora as cartas não envelhecem como as que escrevias e que são quase ilegíveis) e esperava poemas ou longas prosas ritmadas como resposta O vento é muito calado quando esperamos Talvez sejas mais mas depois não

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Tratar-te-ia pelo nome, homónimo, se não fosse pelo grau de afinidade ou outro receio humano qualquer Declaro-me cúmplice passivo ao que me agita e por vezes morro Não arranjo forma mais civilizada de descrever o que sinto [quando os teus olhos rondam os meus A pequenez que me arrasta da cama antes do sol nascer [para ser alguém plantou-se cedo “Esse vou ser eu um dia” mas depois Londres era longe e filhos não se criam à distância Agora a distância é só minha

- de Oliveira Borges 26


———

Sentado, à espera no terminal, Com bilhete multimodal de ida, Junto solipsismo com fobia social, Proeza paradoxal fodida. Nas costas queimam-me os olhares, Deste pelotão de fuzilamento: Observam, avaliam, julgam, desprezam Sempre... a cada momento. Tantos olhares, um só fitar. Tantos vultos, um só perfil. Ecos da minha voz, réplicas das fúrias, Repetição atroz de próprias injúrias. Sentado no banco do terminal, Bilhete entre os dedos amarrotado, Volto-me e vejo afinal Que é meu o mau-olhado.

- Costa Neto 27


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Escorre-nos dos olhos um segredo uno. Precioso o damos um ao outro com gestos graves, Enquanto luzem nossas mãos com o mesmo dom vital. Ceamos do mesmo peso das palavras mortas E a boca evita a tentação de se fundir, Força magnética, nosso alicerce, E há por um momento palavras vivas Pendendo sobre essa demora, Nossa queda fluída no mesmo abismo. Tu, meu estranho, és a última resposta. Para o final te guardo, Prolongando até à dor Teu olhar de âncora no meu procurar. Todo o querer em mim é amor. Quero-te e, súbita, A única maneira de falar é entregar-me. Na tua cara aprendo o que desejo E nasce teu. Distante corpo sonhado, és a entrada para o que aguardo, E nada te ressinto se tudo me negares, Pois olhar-te só é confiar-me a ti E desse antigo medo me alimento. E desse antigo corpo me protejo Até à inevitabilidade.

- Juliana Senra 28


———

I come to you armless Raw flesh stained with darkness Broken ribs protruding out of my poisoned skin Fear not those blood blotches They're the remains of life in this mummified heart Fear not those sharp bones if they cut you in half White teeth and a planted dimple on the east cost of your shore Delusion my purity not Once a dissolved milk teeth in your mouth A hunting tusk sown in your back I come to you in my seasonal revival White paper of mine Allow those exhausting hands Write you down a fever of logic and a fever of mind Infected corpse dressing in white Chanting life in the cavities of your skull Laying word by word in your broken path

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Follow the trail blindly or by sight Fragile hands offering you a bite of sin A bite of light and a fall of man Test not my patience I aim not your heart Test not my patience I, eve the head filled with hymns of Satan Keep your hands off my raging waves I, eve the one cursed with racing footsteps to nowhere I come to you with a crafted role For a day or two I, the desert rose sprung once in the middle of the earth Suppressed by boarders, grown by lines Doubt not, no boarders will be crossed No land will be occupied No castles will be conquered Lights are green Break a leg or break a heart.

- Naval 30


—— Bichos

Olho-os de prazer amarelo, Vejo-lhes carapaça e cachaço, Pódio meu não muito acima. Fito-os em fila, cada qual no seu espaço. (A fila é longa e agitada) Por suas intenções talvez empurrados Trepam uns a corrente, Mais perto se julgam. Ruminados de certezas, outros tantos Se agitam a contrariar tal fado em tal fila. Rói-se de ruídos a rua, E por fim flui a fila. É apertado o espaço do bicho Que não é bicho. Bichos a quererem ser outra coisa que não bichos. Bichos de nomes. Bichos.

- Rogério Canhoto 31


—— Deserto

Como posso sobreviver ao teu deserto De dunas, curvas e ondas infinitas? Ajoelhado, o corpo nu, espírito aberto À aridez da miragem que imitas. Rogo aos céus que me atinjas de perto Com o vermelho do sangue que vomitas. Rasga então o meu peito descoberto Com sorriso de ternura enquanto gritas. Desfaz-me a carne mole do corpo incerto, Solta em êxtase palavras malditas! E cairemos abraçados no deserto: Tu a mim e eu às dunas infinitas, Ensanguentados e despidos no deserto: Tu em mim e eu nas dunas infinitas...

- Katsushika. 32


—— Anedonia

Hoje é dia. Fez-se há horas o fim dos livros – Incêndio azul da azeda espera Que eu te pedi – E leva, de novo à vez, as percas de loiro, cansado, verde Ou um lábio torto, que não sabe pedir, Que quando o peço o sou eu, O sou eu, de novo à vez. Se espera O lábio torna-se à água, De novo; Grita do fundo, grita de baixo. Quebra-se ao toque da seda, Lambe a saudade umbilical, Lanosa a pele que quis o que eu quis, Que não sabe o que sabe, Que eu não sei o que eu quero:.

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Perna a tosca de barro Lateral à mágoa vítrea duma força sem força, De lado e lado aberto Que dá E que eu não sei pedir. Um fresco, pinta-se deus entre as virilhas contadas, De costas viril, morto afinal – Deus entre as pernas. E mexe degredado E mexe em termos combinados dos dois lados, de costas contra [os prados, viris e pintados, Vem com o som que admira a adoração que eu faço, [eu faço eu faço eu faço Que eu me faço em favos de mel insuportáveis; Tão doce o deus que me criou. ...Mãos tenras à terra da minha dor, que é nada, que nada E que eu vejo agora, Que eu quero, Que não tem nada para pedir. Carne morta. Morta, morta é a morte de deus, Não é nada, é vanidade.

- Naegleria Fowleri 34


—— Er(o)pção

Natureza À mercê de dois corpos em chama Envoltos na erva Cama molhada em quimera Galho de árvore alçado Pelo seu vento atraído Mergulha na cratera Do vulcão desejado Por entre o murmúrio do universo Soltam-se os gritos de quem Arde na lava Matéria terrena Na terra se funde E húmida transborda Dá-se pura e perde-se No vento…

- Cecília Torcato 35


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